artigo original / original article Avaliação do tratamento cirúrgico da cifose congênita na mielomeningocele com o uso da via posterior pela técnica de Dunn-McCarthy modificada Study of surgical treatment of congenital kyphosis in myelomeningocele by posterior approach with the modified Dunn-McCarthy technique Evaluación del tratamiento quirúrgico de la cifosis congénita en el mielomeningocele con el uso de la vía posterior por la técnica de Dunn-McCarthy modificada Ricardo Correa da Costa Dias1 Ivan Guidolin Veiga2 Wagner Pasqualini3 Marcus Alexandre Mello Santos4 Élcio Landim5 Paulo Tadeu Maia Cavali6 Resumo Objetivo: avaliar resultados do tratamento da cifose lombar congênita em portadores de Mielomeningocele submetidos à instrumentação e artrodese da coluna vertebral. Métodos: realizamos um estudo retrospectivo incluindo 12 pacientes com média de idade de oito anos, tratados cirurgicamente por via posterior exclusiva, e fixação pela técnica de Dunn-McCarthy modificada, sendo que, em oito pacientes, utilizamos parafuso pedicular e em quatro fios de Luque. O segmento médio foi de 26 meses (9 a 45 meses). Foram avaliados os potenciais de correção, de perda da correção e percentuais de fusão. Resultados: A cifose inicial média de 116° (60° a 170°) obteve correção média para 9,1° (-63° a 95°) na radiografia ABSTRACT Objective: to report the results in the treatment of congenital lombar kyphosis related to myelomeningocele with posterior spinal instrumentation and fusion. Methods: data analysis of 12 patients, with mean age of 8 years old treated by posterior approach and internal fixation with a Dunn-McCarthy procedure. Eight patients had implanted pedicular screws and in four were used sublaminar wires like Luque´s technique. The mean follow-up was about 26 months (9 to 45 months). Deformity improvement and its loosening and fusion rate were studied. Results: initial kyphosis mean was 116° (60° to 170°) turning into 9,1° (-63° to 95°) at final outpatient visit. Pedicular screw fixation got total deformity correction and solid RESUMEN Objetivo: evaluar los resultados del tratamiento de la cifosis lumbar congénita en portadores de Mielomeningocele, sometidos a la instrumentación y artrodesis de la columna vertebral. Métodos: realizamos un estudio retrospectivo incluyendo 12 pacientes con un promedio de edad de 8 años, tratados quirúrgicamente por la vía posterior exclusiva y fijación por la técnica de Dunn-McCarthy modificada, siendo que en 8 pacientes utilizamos tornillo pedicular y en 4, hilos de Luque. El seguimiento promedio fue de 26 meses (9 a 45 meses). Fueron evaluados los potenciales de corrección, de pérdida de la corrección ý porcentajes de fusión. Resultados: la cifosis inicial promedio de 116° (60° a 170°) obtuvo corrección Trabalho realizado na Associação de Assistência a Criança Deficiente – AACD - São Paulo (SP), Brasil. Assistente do Grupo de Coluna de Botucatu; Médico Cirurgião de Coluna do Hospital Estadual de Bauru ( SP), Brasil. Cirurgião de Coluna do Departamento de Ortopedia e Traumatologia da Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP – Campinas (SP), Brasil. Cirurgião de Coluna do Departamento de Ortopedia e Traumatologia da Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP – Campinas (SP), Brasil. 4 Cirurgião de Coluna do Grupo de Escoliose da Associação de Assistência à Criança Deficiente - AACD – São Paulo (SP), Brasil. 5 Professor do Departamento de Ortopedia e Traumatologia da Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP – Campinas (SP), Brasil; Chefe do Grupo de Escoliose da Associação de Assistência à Criança Deficiente - AACD – São Paulo (SP), Brasil. 6 Cirurgião de Coluna do Grupo de Escoliose da Associação de Assistência à Criança Deficiente - AACD – São Paulo (SP), Brasil e do Departamento de Ortopedia e Traumatologia da Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP – Campinas (SP), Brasil. 1 2 3 Recebido: 11/03/2007 Aprovado: 24/10/2007 COLUNA/COLUMNA. 2008;7(2):146-152 ao_50_146_152.indd 1 08-07-2008 18:07:11 Avaliação do tratamento cirúrgico da cifose congênita na mielomeningocele com o uso da via posterior pela técnica de Dunn-McCarthy modificada 147 obtida na última consulta. Obtivemos melhores resultados nos casos onde utilizamos parafuso pediculares os quais demonstraram um alto potencial de correção e 100% de fusão. A taxa global de complicações foi de 46%; entretanto a morbidade cirúrgica foi muito baixa. Conclusão: a técnica descrita se mostrou eficiente no tratamento das deformidades com um alto potencial de correção, alto percentual de fusão e baixo potencial de perda de correção. Todas as complicações foram de fácil resolução. fusion in all cases. The complication rate was 46%; however, surgical related morbidity was very low. Conclusion: the technique brought good results in deformity improvement with high fusion rates and few complications. promedio para 9.1° (-63° a 95°) en la radiografía hecha en la última consulta. Obtuvimos mejores resultados en los casos donde utilizamos tornillo pedicular, los cuales demostraron un alto potencial de corrección y 100% de fusión. La tasa global de complicaciones fue de 46%; sin embargo la morbilidad quirúrgica fue muy baja. Conclusión: la técnica descrita se mostró eficiente en el tratamiento de las deformidades con un alto potencial de corrección, alto porcentual de fusión y bajo potencial de pérdida de corrección. Todas las complicaciones fueron fácilmente resultas. DESCRITORES: Meningomielocele; Cifose/congênito; Fusão vertebral/métodos; Fusão vertebral/instrumentação; Resultado de tratamento KEYWORDS: Meningomyelocele; kyphosis/ congenital; Spinal fusion/methods; Spinal fusion/ instrumentation; Treatment outcome DESCRIPTORES: Meningomielocele; Cifosis/congénito; Fusión vertebral/métodos; Fusión vertebral/instrumentación; Resultado del tratamiento INTRODUÇÃO O tratamento da deformidade cifótica em pacientes portadores de mielomeningocele é um desafio para os cirurgiões do mundo todo. Isto se deve às dificuldades técnicas e ao alto risco de complicações. Menos comum que a escoliose, a incidência de cifose congênita associada à disrrafismos da coluna vertebral varia de 8 a 21% e esta deformidade é geralmente rígida e progressiva1-5. O tratamento conservador não impede a progressão da curva, ficando restrito à adaptação da cadeira de rodas com uma abertura no encosto exatamente na região do ápice da cifose aliviando a pressão local (Figura 1). A utilização de coletes é menos efetiva e muitas vezes intolerável devido à ausência de sensibilidade que facilita a formação de lesões de pele nos pontos de apoio da órtese2, 6. As escaras no ápice da deformidade causam grande sofrimento aos pacientes. O desequilíbrio do balanço sagital do tronco que apresenta seu centro de gravidade alterado é um inconveniente para a utilização da cadeira de rodas e, além disso, provoca dificuldade no livre movimento dos membros superiores, já que os mesmos são utilizados como apoio para se manter na posição sentada3-7. Tais fatores causam uma piora do quadro psicológico do paciente, pois impedem uma maior integração social. A alteração respiratória ocorre por uma diminuição do volume abdominal realizando pressão das vísceras abdominais contra o diafragma8. Além disso, a flexão exagerada do tronco pode ainda gerar dificuldade na drenagem urinária pelos ureteres e o intertrigo formado na região abdominal é um problema para realização de ureterostomia, vesicostomia e ileostomia. O tratamento cirúrgico é, portanto, um meio eficaz para melhorar a qualidade de vida destes pacientes1, e pode ser realizado por via posterior exclusiva ou por dupla via, a anterior mais a posterior, os defensores desta última afirmam que ela confere um maior potencial de fusão em relação à via posterior exclusiva, apesar de impor riscos adicionais ao paciente. O objetivo deste trabalho é avaliar a correção cirúrgica da cifose congênita em pacientes portadores de mielomeningocele, utilizando-se exclusivamente da via posterior e realizando a ressecção de uma ou mais vértebras do ápice da deformidade associada à instrumentação rígida. Figura 1 Cadeira de rodas adaptada para portadores de cifose lombar congênita Fonte: AACD COLUNA/COLUMNA. 2008;7(2):146-152 ao_50_146_152.indd 2 08-07-2008 18:07:12 Dias RCC, Veiga IG, Pasqualini W, Santos MAM, Landim E, Cavali PTM 148 MÉTODOS No período entre março de 2002 e janeiro de 2006, doze pacientes portadores de cifose congênita rígida associada à mielomeningocele foram submetidos ao tratamento cirúrgico pela técnica de Dunn McCarthy9 modificada no Hospital Abreu Sodré, sede da Associação de Assistência a Criança Deficiente (AACD) em São Paulo. Numa revisão retrospectiva, os autores efetuaram uma avaliação completa que abrange o prontuário hospitalar, a evolução clínica, a descrição cirúrgica, as radiografias, o exame físico, o questionário ambulatorial e as fotografias. Dentre os pacientes avaliados nove eram do sexo masculino e três do sexo feminino, com média de idade de oito anos (6 a 12 anos) no dia do ato cirúrgico. Nenhum paciente apresentava função motora abaixo do nível torácico sendo o grupo formado exclusivamente por não deambuladores. Todos receberam tratamento neurocirúrgico com fechamento da bolsa de mielomeningocele imediatamente após o nascimento. Todos os pacientes com indicação cirúrgica foram submetidos a uma criteriosa investigação préoperatória que inclui teste de alergia ao látex, por meio do antígeno do látex k82 usado para detectar anticorpos IgE específicos pelo método enzimaimunofluorimétrico, exame de urina tipo I e urocultura. Do sangue, foram analisados uréia, creatinina, glicemia de jejum, hemograma completo, sódio, potássio e coagulograma. Todos os pacientes fizeram radiografia de tórax póstero-anterior. Após a coleta dos exames, todos foram submetidos à avaliação pré-operatória por médico pediatra. Por critério da instituição, foram efetuados estes procedimentos apenas em pacientes com peso superior a 20 kg e estado nutricional adequado. Este cuidado encontra justificativa nos grandes volumes de sangramento pertinentes a este porte de cirurgia. Por motivos de preservação parcial do desenvolvimento pulmonar, a idade mínima preconizada para o procedimento foi de cinco anos. Foram avaliadas as radiografias laterais e ânteroposteriores obtidas sempre na posição sentada e numa segunda sessão com tração no pré-operatório, e apenas lateral e antero-posterior no pós-operatório imediato e na última visita do paciente ao consultório. Em todas as incidências, foi realizada a medida da cifose pelo método de Cobb, de modo a quantificar em graus positivos para cifose e negativos para lordose. TÉCNICA CIRÚRGICA A abordagem, sempre por via posterior, foi realizada no sentido longitudinal da região torácica até o nível de S2, com pequenos desvios na região da cicatriz do fechamento da mielomeningocele evitando-se as regiões de pele menos vascularizadas. Iniciando-se de uma região normal continuamos aprofundando a incisão até a dura-máter com cuidado adicional para prevenir lesões do saco dural ou fistula liquórica. Em seguida, rebatemos o saco dural não funcional, ligando e seccionando as raízes e seus respectivos vasos, proximais a região foraminal, expondo o canal vertebral desde a vértebra apical a ser removida até o nível de S2 (Figura 2). A discectomia é realizada pela mesma via posterior nos espaços intervertebrais desde o ápice da curva até L5-S1, preservando os discos acima da deformidade, e consequentemente o crescimento do segmento torácico. A vertebrectomia consiste da ressecção de uma a quatro vértebras no ápice da deformidade com preservação do ligamento longitudinal anterior, sendo que, quanto maior for a rigidez e o grau de cifose, maior o número de vértebras a serem ressecadas. Deve ser utilizado instrumental adequado a fim de minimizar o risco de lesão de estruturas nobres adjacentes ao corpo vertebral, tais como a aorta e as artérias ilíacas. A instrumentação com duas hastes de 5mm moldadas em “S” distal (Figura 3), tem por finalidade obter uma alavanca. Para isso, introduzimos a porção terminal da haste no forâmen de S1 e seguimos com a fixação das vértebras de distal para proximal reduzindo a deformidade cifótica como numa manobra de “Cantilever”. Neste passo, a moldagem é realizada antes do início da cirurgia com base em uma radiografia em perfil, ganhando tempo cirúrgico e evitando um maior sangramento. Efetuamos a instrumentação com amarria sublaminar associada a duas hastes de aço pela técnica de Luque ou a instrumentação com parafusos pediculares de titânio fixados a duas hastes de titânio (SpineCall II, Spinestahl Co®, Rio Claro, São Paulo, BR). Figura 2 Saco dural rebatido, superiormente Fonte: AACD Figura 3 Haste moldada em “S” distal, introduzida no 1° forâmen sacro, nas posições de perfil e antero-posterior, respectivamente Fonte: AACD COLUNA/COLUMNA. 2008;7(2):146-152 ao_50_146_152.indd 3 08-07-2008 18:07:14 Avaliação do tratamento cirúrgico da cifose congênita na mielomeningocele com o uso da via posterior pela técnica de Dunn-McCarthy modificada A amarrilha sublaminar foi realizada da maneira clássica na região proximal à espinha bífida onde as vértebras possuem lâminas normais e quando possível também distal (Figura 4). Os parafusos pediculares foram introduzidos desde a coluna torácica normal até as vértebras que apresentam espinha bífida nas quais introduzimos os parafusos com uma inclinação exageradamente medial devido a grande displasia de seus pedículos e à visualização direta de todo saco dural, corpo vertebral e discos (Figura 5). Os “clamps” que ligam os parafusos pediculares a haste na região torácica são de diâmetro discretamente maior a fim de funcionarem como um sistema que permite o crescimento vertebral neste segmento. Figura 4 Cifose Lombar pré-operatória e com instrumentação de Luque Dunn Fonte: AACD Figura 5 Instrumentação pela técnica de Dunn McCarthy modificada com a utilização de parafuso pedicular Fonte: AACD 149 A decorticação foi realizada de maneira criteriosa envolvendo a lâmina e apófises articulares no segmento normal e os processos transversos e apófises articulares remanescentes nas vértebras com espinha bífida promovendo assim um leito ósseo com um maior potencial de consolidação para o enxerto ósseo autólogo associado ao enxerto artificial. A colocação do enxerto também foi feita nos espaços onde os discos foram retirados, realizando uma artrodese intersomática desde o ápice da vertebrectomia até o espaço intervertebral de L5-S1. Para se obter uma maior estabilização do sistema dois dispositivos de travamento transversais foram colocados nas extremidades da montagem, evitando a rotação das hastes principalmente na região distal onde podem gerar lesão das estruturas intrapélvicas. Para se obter melhor análise dos dados, a casuística foi dividida em dois grupos: Grupo A, formado por pacientes tratados com fios de Luque e Grupo B, formado por pacientes tratados com parafuso pedicular. Os parâmetros avaliados neste trabalho foram os índices de complicações, os potenciais de correção, de perda de correção, percentual de fusão, o grau de satisfação da família e do paciente além da melhora funcional obtida. Tais parâmetros foram avaliados com base na medida dos ângulos de cifose e exame físico onde avaliamos a capacidade funcional do paciente com relação ao livre movimento dos membros superiores e capacidade de sentar-se adequadamente. Um questionário contendo as opções: insatisfeito, pouco satisfeito, satisfeito ou muito satisfeito foi aplicado ao familiar que acompanha o paciente no consultório e ao próprio paciente. RESULTADOS Os 12 pacientes relatados, com média de idade de oito anos, obtiveram segmento médio de 26 meses (9 a 45 meses). A cifose média pré-operatória de 116° (60° a 170°) foi corrigida em média para 9,1° (-63° a 95°) como é possível ser observado nas radiografias da última consulta (Tabelas 1 e 2). A correção média foi de 106,9° comparando o préoperatório com o resultado final, e a perda de correção média de 1,3° comparando o pré-operatório imediato com a última visita do paciente (Tabela 3). A taxa global de complicações foi de 46%, com 33% de infecções, sendo dois casos de infecção superficial e um caso de infecção profunda e 8,3% de pseudartrose que ocorreu em um único paciente. O paciente nº. 7 apresentou infecção profunda que culminou na retirada do implante após um ano, este fato determinou nova intervenção cirúrgica com rotação de retalho músculo-cutâneo pelo cirurgião plástico, curativo e antibiótico-terapia. As infecções superficiais foram observadas nos paciente nº. 2 e 3 e a necrose de pele ocorreu no paciente nº. 1, estas complicações foram solucionadas em curto espaço de tempo, por meio de curativo diário. Nas lesões de pele com mais de 0cm de profundidade os curativos foram realizados com fitas de alginato de cálcio, nos casos mais superficiais com pouca secreção preconizamos placa de hidrocolóide, sendo efetuada a COLUNA/COLUMNA. 2008;7(2):146-152 ao_50_146_152.indd 4 08-07-2008 18:07:14 Dias RCC, Veiga IG, Pasqualini W, Santos MAM, Landim E, Cavali PTM 150 troca do curativo a cada 72 horas. O desbridamento das lesões foi efetuado com soro fisiológico a 0,9% levemente aquecido lançado sob pressão com seringa de 60 ml e agulha 40x12. O hematoma ocorrido no paciente nº. 4 foi drenado precocemente e o paciente evoluiu bem sem apresentar nenhuma nova queixa durante seu seguimento. Obtivemos um percentual de fusão de 100% e correção média de 118° nos pacientes do grupo A formado por pacientes tratados com parafuso pedicular, enquanto que no grupo B tratados com fios de Luque, o percentual de fusão foi de 75%, e a correção de 88,7°. A diferença de perda de correção entre os grupos foi de 1,1° no grupo A e 1,7° no B (Tabela 3). Todos os pacientes e seus familiares, após o questionário, consideraram-se muito satisfeitos com os resultados obtidos. Durante o exame físico, ficou constatado que todos os pacientes apresentavam plena condição de se manter na posição sentada de forma independente e manipular objetos com as mãos sem a necessidade de utilizar os membros superiores como apoio. TABELA 1 – Características dos pacientes e tempo de seguimento Nº. do paciente/ Idade Ápice da Cifose Cifose sexo (anos) curva inicial pós-operatório Cifose final Seguimento (meses) imediato 01/ M 11 L3 135° -63° -63° 9 02/ M 7 L2 140° 10° 10° 15 03/ M 7 L2/L3 109° 0° 0° 13 04/ M 12 L3 105° 18° 18° 28 05/ F 6 L3 114° -10° -16° 42 06/ F 8 L2 135° 12° 14° 18 07/ M 9 L2 135° 88° 95° 12 08/ M 10 L2 60° 2° 15° 44 09/M 9 L1 92° 23° 23° 45 10/M 7 L2 170° 5° 5° 36 11/M 6 L3 90° 5° 5° 12 12/F 6 L2 108° 4° 4° 40 Fonte: Hospital Abreu Sodré (AACD) TABELA 2 – Valor dos ângulos de cifose pré-operatório, pós-operatório, correção obtida e perda de correção, relacionados ao tipo de instrumental e suas complicações Nº. do Cifose Cifose pós- Cifose Correção no Perda de paciente inicial operatório final pós-operatório correção imediato Instrumentação Complicações imediato 1 135° -63° -63° 198° 0 pedicular Necrose de pele 2 140° 10° 10° 130° 0 pedicular Infecção superficial 3 109° 0° 0° 109° 0 pedicular Infecção superficial 4 105° 18° 18° 87° 0 pedicular Hematoma 5 114° -10° -16° 124° - 6° Luque - 6 135° 12° 14° 123° 2° pedicular - 7 135° 88° 95° 47° 7° pedicular Infecção profunda 8 60° 2° 15° 58° 13° Luque Pseudartrose 9 92° 23° 23° 69° 0 Luque - 10 170° 5° 5° 165° 0 pedicular - 11 90° 5° 5° 85° 0 pedicular - 12 108° 4° 4° 104° 0 Luque - Fonte: Hospital Abreu Sodré (AACD) COLUNA/COLUMNA. 2008;7(2):146-152 ao_50_146_152.indd 5 08-07-2008 18:07:14 Avaliação do tratamento cirúrgico da cifose congênita na mielomeningocele com o uso da via posterior pela técnica de Dunn-McCarthy modificada Tabela 3 – Correlação entre os tipos de instrumentação utilizados e seus resultados Grupo Instrumentação Percentual de A B A+B Parafuso Fios de - pedicular Luque 100% 75% 118° 88,7° 106,9° 1,1° 1,7° 1,3° 8 4 12 91,7% fusão Potencial médio de correção Perda de correção Número de pacientes Fonte: Hospital Abreu Sodré (AACD) DISCUSSÃO A mielomeningocele é uma doença congênita desenvolvida entre os 24º e 28º dias de gestação e está associada a uma vasta gama de complicações como, por exemplo, a alergia ao látex, a hidrocefalia, deformidades da coluna vertebral, deformidades dos membros inferiores, comprometimento de marcha, escaras de decúbito, doenças do aparelho urinário e estresse psicológico. Por este motivo, seu tratamento deve ser realizado de forma mais adequada em centros especializados, onde uma equipe multidisciplinar treinada por profissionais experientes esteja sempre à disposição para atender todas as necessidades de seus portadores. Odent et al. demonstraram um estudo no qual realizaram a dupla via em nove pacientes, num segmento médio de 34 meses sem nenhum caso de pseudartrose, porém, observaram complicações como, bursite asséptica, fistula liquórica, lesão de dura máter, complicação cardíaca, necrose de pele e fistula siringo-pleural5. Estas complicações geraram a necessidade de pelo menos quatro re-intervenções cirúrgicas, sendo a maioria delas relacionadas a abordagem por via anterior. Em nossa casuística, dos 12 pacientes analisados apenas um foi submetido a novo tratamento cirúrgico devido à infecção profunda. Odent et al. obtiveram potencial médio de correção de 95°, em nosso estudo obtivemos 106,9°. Autores relataram três casos de anafilaxia ao látex10 em um trabalho relacionado à mielomeningocele. No hospital Abreu Sodré, sede da AACD, um trabalho com 187 pacientes portadores de mielomeningocele mostrou um índice de 29,5% de alérgicos ao látex11. Todos os pacientes citados neste trabalho foram submetidos ao teste que, se positivos, determinava o preparo do centro cirúrgico para realização da cirurgia em ambiente 100% látex-free. Os pacientes portadores de rigidez do quadril não são candidatos a este procedimento cirúrgico, isto porque, a contratura em flexão não permite o posicionamento adequado do paciente na mesa de cirurgia e a contratura em extensão não permite que o paciente mantenha-se na posição sentada no pós-operatório imediato, que é um dos principais objetivos deste tratamento. Portanto, a rigidez do quadril deve ser tratada antes do procedimento 151 cirúrgico corretivo da coluna. Outro ponto a ser observado é a presença de infecção urinária e o estado clínico geral do paciente que podem ser também motivos de contraindicação para a realização da cirurgia. Apenas um caso perdeu mais de 10° de correção comparando a radiografia do pós-operatório imediato com a radiografia controle com um ano de pós-operatório configurando pseudartrose. Entretanto, não foi necessário nenhum procedimento adicional em seus três anos e seis meses de seguimento já que a deformidade vem sendo mantida estável em 15° de cifose nos últimos dois anos e seis meses, e tanto o paciente como os seus familiares estão muito satisfeitos com o resultado do procedimento. Banta relatou 54 pacientes operados por dupla via no tratamento de deformidades da coluna associadas à mielomeningocele e obteve nove casos de pseudartrose12. A infecção é uma complicação bastante preocupante, isto porque, se não for devidamente tratada no momento adequado pode levar à morte. Em 2000, foi publicado um trabalho multicêntrico no qual foram avaliadas as infecções profundas em portadores de escoliose neuromuscular, incluindo portadores de mielomeningocele. Neste estudo, concluiu-se que os pacientes com retardo mental profundo e aqueles que receberam enxerto artificial estão mais sujeitos à infecção e conseqüentemente à pseudartrose13. Nosso índice de infecção e lesões de pele em geral foi de 33%, ficando abaixo dos índices observados na literatura. Na série de Hull et al. tais complicações chegaram a 45%14. A via de acesso anterior exclusiva está contra-indicada neste procedimento, já que a cifose máxima permitida para tal procedimento é de 30°15, ficando em discussão apenas duas possibilidades, na primeira uma via posterior exclusiva, na segunda, a combinação das vias anterior e posterior. Após a introdução dos parafusos pediculares em 1991 o índice de pseudo-artrose vem diminuindo16 e com os novos avanços, uma maior confiança poderá ser depositada nos implantes a fim de seguir a tendência mundial de realizar cirurgias cada vez menos invasivas e menos associadas à co-morbidades e mortalidade. Em nosso estudo, utilizando parafuso pedicular pela via de acesso posterior exclusiva, com os ótimos resultados obtidos, principalmente quanto ao percentual médio de fusão (100%), e desprezível perda de correção média, (1,1°), observamos que o risco cirúrgico pode ser minimizado evitando-se a realização da via de acesso anterior. CONCLUSÃO A técnica de Dunn McCarthy9 modificada e executada em associação ao parafuso pedicular é uma opção segura e eficaz no tratamento da cifose lombar congênita associada à mielomeningocele, o que demonstra um alto percentual de fusão e excelente potencial de correção, com perda de correção baixa e clinicamente insignificante. Apenas um paciente necessitou de reintervenção cirúrgica, demonstrando que a via posterior exclusiva tem baixa morbidade e é suficiente para a realização da técnica em estudo. COLUNA/COLUMNA. 2008;7(2):146-152 ao_50_146_152.indd 6 08-07-2008 18:07:14 Dias RCC, Veiga IG, Pasqualini W, Santos MAM, Landim E, Cavali PTM 152 REFERÊNCias 1. Banta JV, Hamada JS. Natural history of the kyphotic deformity in myelomeningocele. J Bone Joint Surg Am. 1976; 58:279. 2. Huang TJ, Lubicky JP. Kyphectomy and segmental spinal instrumentation in young children with myelomeningocele kyphosis. J Formos Med Assoc. 1994; 93(6): 503-8. 3. Lindseth RE, Stelzer L Jr. Vertebral excision for kyphosis in children with myelomeningocele. J Bone Joint Surg Am. 1979; 61(5): 699-704. 4. Lintner SA, Lindseth RE. Kyphotic deformity in patients who have a myelomeningocele. Operative treatment and long-term follow-up. J Bone Joint Surg Am. 1994; 76(9): 1301-7. 5. Odent T, Arlet V, Oullet J, Bitan F. 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Correspondência Ricardo Corrêa da Costa Dias Rua Rio Branco, nº 15-45 Bauru (SP), Brasil CEP: 17015-311 Tel: +55 14 3226-4666 E-mail: [email protected] COLUNA/COLUMNA. 2008;7(2):146-152 ao_50_146_152.indd 7 08-07-2008 18:07:14