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IDENTIFICAÇÃO DE BACTÉRIAS PRESENTES NA ÁGUA DA TUBULAÇÃO DE
EQUIPOS ODONTOLÓGICOS
Elaine Fernandes Felipe; Dra Ana Claudina Prudêncio Serratine (orientadora).
Introdução:
O sistema rotatório veio como aliado para o cirurgião-dentista a fim de auxiliá-lo no
desempenho de suas funções. Por outro lado, este mesmo sistema acaba produzindo calor
quando é utilizado, comprometendo a polpa dentaria e o ligamento periodontal. Com o
objetivo de minimizar este efeito negativo, ao qual o dente e seus tecidos estão sujeitos, são
usados spray de ar e água juntamente com a utilização do equipamento rotatório. Esses
sistemas de água são compostos por túbulos plásticos de pequeno diâmetro susceptíveis à
contaminação bacteriana no seu interior (CHIBEBE et. al, 2002; ARAÚJO, LOPES-SILVA,
2002; MOREIRA et. al., 2006). Quando essas unidades do equipo odontológico não estão
sendo usadas, os microrganismos contaminantes multiplicam-se formando um biofilme nas
paredes da tubulação. Assim, a água distribuída posteriormente pela caneta de alta rotação
e seringa tríplice estará igualmente contaminada (MOREIRA et. al 2006).
A contaminação destas tubulações de água pode ocorrer a partir da própria água presente
no reservatório das unidades odontológicas, geralmente obtida do sistema municipal de
abastecimento, ou ainda por aspiração de fluidos bucais, que resulta de uma pressão
negativa de alguns sistemas do equipamento odontológico, no momento da desaceleração
dos motores (ALVAREZ-LEITE, 2005).
Para determinar a qualidade microbiológica da água, universalmente, é recomendada a
detecção de microrganismos que indicam a possibilidade da presença de microrganismos
patogênicos. A contagem de bactérias heterotróficas, que são definidas como
microrganismos que requerem carbono orgânico como fonte de nutrientes, fornece
informações sobre a qualidade bacteriológica da água de uma forma ampla. Este tipo de
análise inclui a detecção de bactérias ou esporos de bactérias, de origem fecal, os
chamados coliformes, componentes da microbiota natural da água ou provenientes de
biofilmes formados na tubulação do sistema de distribuição da água (BRASIL, 2005;
BASTOS, ALVES, 2000; LIMA, BOTEGA, SERRATINE, 2007). O grupo dos coliformes é
formado por diferentes gêneros bacterianos. Dentre eles estão os gêneros: Klebsiella,
Escherichia, Serratia, Erwenia e Enterobactérias. A presença de coliformes na água indica
que ela é imprópria para o consumo e traz risco para a saúde (BRASIL, 2004).
O Ministério da Saúde do Brasil, em conformidade com a Portaria nº 518/2004, determina
que para avaliar as condições sanitárias dos sistemas de abastecimento público de água
seja realizada a contagem de bactérias heterotróficas. Esta contagem em placas, contendo
um meio de cultura específico, fornece informações sobre a qualidade bacteriológica da
água de uma forma ampla (DOMINGUES et. al., 2007). Indica o número aproximado de
bactérias aeróbias e anaeróbias facultativas, capazes de se multiplicar a 35ºC, presentes em
uma amostra de água analisada (FANTINATO et. al., 1992). Este número deve ser inferior a
500 Unidades Formadoras de Colônia por mililitro (UFC/mL) de água. Entretanto, para que a
água seja adequada para o uso durante os tratamentos odontológicos a carga de bactérias
nela presente não deve exceder a 200 UFC/ml (ANVISA, 2006).
Diversos estudos mostram que as contagens de bactérias patogênicas acima do permitido
ocorrem com freqüência nas águas de equipos odontológicos (WALKER et. al., 2000;
MILLS, 2003; MOREIRA et. al., 2006; OLIVEIRA, 2008). Além do mais foi observado que os
condutos de água nos consultórios oferecem meios para o desenvolvimento de
microrganismos como Streptococcus mutans, Actinobacillus actinomycetemcomitans e
Candida albicans entre outros, que fazem parte do cotidiano do cirurgião dentista
(GUIMARÃES JR., 2001).
Poucos trabalhos abordando a contaminação da água em equipos odontológicos foram
publicados na última década, no Brasil e em outros países, principalmente abordando as
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espécies bacterianas contaminantes. No entanto, são de importância as pesquisas que
verificam a presença de microrganismos nas tubulações destes equipamentos visto que, o
potencial das infecções cruzadas está aumentado com a contaminação por biofilmes. Eles
colocam em risco a saúde dos pacientes e da própria equipe odontológica, que estão em
contato com os aerossóis gerados pela caneta de alta-rotação e da seringa-tríplice. Assim
justifica-se a realização desta pesquisa que avaliará a qualidade bacteriológica da água que
está sendo utilizada durante tratamentos odontológicos. Objetivos: Identificar as bactérias
heterotróficas na água das torneiras que abastecem os reservatórios dos equipos
odontológicos destas duas clínicas; Identificar as bactérias heterotróficas na água dos
reservatórios, das mangueiras dos aparelhos de alta-rotação e das seringas tríplices dos
equipos odontológico destas duas clínicas.
Palavras-chave: bactérias heterotróficas, equipamentos odontológicos, biofilmes.
Métodos
Foi realizado um estudo observacional transversal, para identificar bactérias presentes na
água da tubulação dos equipos odontológicos.
Amostra: Dos 68 equipos que estão distribuídos nas duas clínicas do Curso de
Odontologia foram sorteados 18 para este estudo. Para o cálculo da amostra estabeleceuse trabalhar com uma confiabilidade de 95% e um erro de no máximo 10%. No total 72
amostras de água foram coletadas: 18 das torneiras que abastecem os reservatórios dos
equipos, 18 dos reservatórios, 18 das mangueiras dos aparelhos de alta-rotação e 18 das
seringas tríplices dos equipos odontológicos instalados nas referidas clínicas.
Coleta das amostras de água: Antes da coleta fez-se uma limpeza, com água e
detergente, e desinfecção das mangueiras da alta-rotação e da ponta das seringas tríplices
com algodão embebido em álcool 70% com fricção, evitando-se não colocar excesso de
álcool no algodão para que não penetre no interior das mangueiras e mascare os
resultados. Um volume mínimo de 100 ml de água, de cada ponto de coleta, foi recolhido em
frascos estéreis de vidro neutro, com boca larga rosqueável a prova de vazamentos. Para a
coleta da água dos reservatórios foram utilizadas pipetas volumétricas de 10ml estéreis,
enquanto que para ser coletada a água das mangueiras o pedal da caneta de alta-rotação
será acionado e os frascos preenchidos, o mesmo método sendo empregado para obtenção
das amostras de água das seringas tríplices. Os frascos foram parcialmente enchidos, desta
forma possibilitou a sua agitação e a manutenção da temperatura local. Imediatamente após
as coletas foram fechados, acondicionados e encaminhados para o laboratório de
Microbiologia da UNISUL, Campus de Tubarão, e processadas até quatro horas após as
coletas.
Análise bacteriológica das amostras de água: A contaminação da água por bactérias
heterotróficas, aeróbias e anaeróbias facultativas, foi analisada a partir da semeadura das
amostras de água no meio de cultura Agar Triptona de Soja (TSA da HIMEDIA, New Delhi,
Índia), de acordo com a metodologia utilizada por Araújo e Silva (2002). As placas de Petri
foram identificadas, semeadas através da técnica de espalhamento do inóculo com a
utilização de uma alça de Drigalski e incubadas em estufa bacteriológica a 35ºC – 37ºC por
48 horas. Foram semeados 0,1ml de cada amostra de água em cada placa de ágar triptona
de soja. Após o período de incubação, foi realizada a triagem das colônias para a
identificação do microrganismo isolado quanto ao gênero e/ou espécie. Em seguida,
realizou-se a coloração de Gram, seguida de novas semeaduras. As colônias cujas
bactérias coraram em roxo, as Gram-positivas, foram semeadas em ágar sangue,
novamente incubadas e depois submetidas às provas bioquímicas de identificação. As
colônias cujas bactérias coraram em vermelho, as Gram-negativas, foram semeadas em
ágar MacConkey e depois de nova incubação foram identificadas através de provas
bioquímicas.
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Análise dos resultados: Os dados obtidos foram tabulados e arquivados em planilha
eletrônica Microsoft Office Excel, possibilitando o cruzamento de dados. Deste modo, foi
realizado uma análise estatística descritiva dos resultados.
Resultados e Discussão
Foram analisadas, através de provas bioquímicas, 118 colônias provenientes da
água de 18 equipos representativos dos 68 instalados nas Clínicas do Curso Odontologia da
UNISUL, que eram abastecidos com água de uma fonte particular. As colônias cresceram
no Ágar sangue e/ou no Ágar MacConkey. Foram encontradas as espécies de coliformes:
Serratia liquenfaciens; Escherichia coli, Moxarella morganii, Hafnia alvei, Enterobacter
agglomerans; os bacilos Gram-negativos oxidase positivos: Pseudomonas alcaligens,
Burkholderia cepacia, Pseudomonas sp, Alcaligens xylosoxidans; cocos Gram-positivos
Staphylococcus coagulase negativos; e bacilos Gram-positivos esporulados oxidase
positivos os Bacillus cereus. Além dessas bactérias, elementos com forma de leveduras
apareceram sob a microscopia óptica. Estas leveduras cresceram no Ágar sangue. A
distribuição de cada espécie encontrada está descrita da Tabela 1.
As bactérias do grupo dos coliformes são sabidamente patogênicas para o homem,
tanto que a normatização do Ministério da Saúde contra-indica a utilização de água por elas
contaminadas, independentemente da quantidade dessas bactérias. Oito equipos (44,5%)
apresentavam água contaminada por bactérias coliformes presentes em fezes humanas,
sendo inadequada para consumo e oferecendo risco para os usuários dos serviços
odontológicos (Tabelas 2).
As bactérias não coliformes presentes na água dos equipos, em quantidade muitos
superiores às recomendadas pela ANVISA (BRASIL, 2006) (Tabela 2) podem, também,
levar os pacientes das Clínicas odontológicas a contraírem doenças graves.
As da espécie Alcaligens xyloxidans podem causar meningite, pneumonia, peritonite,
infecções do trato urinário, endocardite, otite crônica e infecções de pele/osso em pacientes
imunodeprimidos (SHIE et al., 2005). Pacientes com fibrose cística são particularmente
susceptíveis às infecções pulmonares causadas por estas bactérias, que são geralmente
refratárias ao tratamento com antibióticos. Por isso 30% desse pacientes desenvolvem uma
doença pulmonar de evolução rápida e fatal (MATOS, 2005)
A espécie Burkholderia cepacia é composta por bactérias capazes de causar infecções
em sítios cirúrgicos, sendo resistentes aos antibióticos torna-se uma ameaça aos indivíduos
que recebem uma alta dose de infecção (FREITAS et al., 2007).
As infecções causadas por bactérias do gênero Pseudomonas são patógenos
oportunistas que causam problemas graves em pacientes com sistema imunológico
deficiente, principalmente infecções do aparelho respiratório e urinário. São causa freqüente
de infecções em ambientes de atenção à saúde, sendo resistentes aos antimicrobianos e
aos antissépticos (FERREIRA, LALA, 2010).
As bactérias Gram-positivas do grupo Staphylococcus coagulase negativos
pertencem à microbiota residente da pele e das mucosas humanas. Entretanto são
considerados verdadeiros patógenos quando são encontrados em outras regiões do corpo
que não fazem parte do seu “habitat”. No Brasil de junho de 2006 a maio de 2007 as sepses
hospitalares por Staphylococcus coagulase negativos corresponderam a 23% do total de
casos notificados (PEREIRA et al.2007). Os mesmos pesquisadores, também, verificaram
que eles são altamente resistentes aos antibióticos que apresentam o anel betalactâmico
(penicilinas e cefalosporinas), drogas usualmente empregadas para debelar infecções
causadas por bactérias Gram-positivas. Assim enfatizaram a utilização de medidas
preventivas que dificultem a colonização do hospedeiro, dentre elas a aplicação de técnicas
eficazes de assepsia, antissepsia e desinfecção. O emprego de água com carga
bacteriológica adequada nos equipos odontológicos faz parte desta prevenção.
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Os Bacillus cereus, que são bacilos Gram-positivos esporulados aeróbios,
encontrado aderido às superfícies de tubulações como componente de bifilmes. Os seus
esporos contribuem para o seu processo de adesão e lhe conferem resistência a alguns
sanitizantes. Infecções com esta bactéria provocam vômitos e diarréia em seres humanos
(SOARES, et AL., 2008).
Assim a contaminação bacteriana encontrada na água que estava sendo utilizada
nos tratamentos odontológicos traz grande preocupação, uma vez que em clínicas de
Cursos de Odontologia é atendida uma ampla população de usuários, dentre os quais
pessoas com sistema imunológico deficiente.
Embora as torneiras tivessem a mesma caixa d’água como fonte de abastecimento a
quantidade de bactérias presentes na água das torneiras era bem variada, indicando que o
biofilme instalado na tubulação influencia diretamente na qualidade da água (Tabela 2).
Os reservatórios foram avaliados com a água que estava em uso para os tratamentos
odontológicos, podendo se verificar que a quantidade de bactérias era muito superior à
encontrada nas das torneiras que os abasteciam. Este fato indica a falta de limpeza e
desinfecção dos ditos reservatórios, que permitiu a formação de biofilme em suas paredes
(Tabela 2).
As mangueiras dos aparelhos de alta-rotação e das seringas tríplices estavam
altamente contaminadas com o biofilme formado durante o tempo de uso das mesmas (não
conseguimos a informação de quando fora a última troca de mangueiras nos equipos
avaliados). Assim a água que estava refrigerando as canetas de alta-rotação tinha em média
10345 UFC/mL e a água das seringas tríplices, utilizadas para lavar a boca dos pacientes,
apresentava em média 12431 UFC/mL de bactérias heterotróficas.
A ANVISA normatizou, em 2006, que a água utilizada durante os tratamentos
odontológicos tenha no máximo 200 UFC/mL. Apenas um dos equipos avaliados
apresentava a água da mangueira do aparelho de alta-rotação e da seringa tríplice dentro
dos parâmetros recomendados, este equipo tinha o sistema Flush, que provavelmente
estava sendo acionado corretamente pelos acadêmicos que o utilizavam (Tabela 2).
Verificou-se que a maioria das bactérias anaeróbias facultativas da cavidade bucal,
que poderiam se estabelecer na tubulação das mangueiras dos aparelhos de alta-rotação,
no momento de desaceleração dos motores (ALVARES-LEITE, 2005), que são as do gênero
Streptococcus, não estava presente em nenhum dos equipos avaliados. Como a formação
do biofilme nas tubulações é consequência de uma sucessão ecológica de várias espécies
bacterianas, este gênero de bactérias não teve afinidade com as espécies que primeiro se
instalaram (KANOWSKI, 2010), que foram as provenientes da fonte de abastecimento dos
reservatórios dos equipos. Assim a preocupação maior dos cirurgiões-dentistas deve ser
com a qualidade da água que utiliza para abastecer seus equipos.
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Tabela 2: Quantidade de bactérias heterotróficas na água da tubulação dos equipos
odontológicos das Clínicas de um Curso de Odontologia, abastecidos com água de
uma fonte particular.
Equipos
401
Unidades formadoras de colônias por mL de água
(UFC/mL)
Torneira Reservatório Mangueira AR
Seringa
Tríplice
290
2300
24200
49000
402
210
6260
79000
2200
403
290
10500
12280
14000
405
10
300
2380
40560
407
1100
2690
3480
11200
301
190
12280
100
160
303
130
90
1680
790
309
900
950
5600
3880
333
450
13
1280
600
304
520
1530
3570
4860
305
920
3250
12700
10800
326
620
440
4200
16000
330
400
800
2380
1340
408
360
370
6400
11120
416
370
2000
6360
1320
413
560
630
1100
830
414
456
600
4300
7200
415
Média
Desvio
Padrão
370
453
278
2900
2661
3542
15200
10345
18205
47900
12431
16229
Fonte: elaborada pelos autores, 2012
AR= aparelho de alta-rotação
7
Conclusões



44,5 % dos equipos odontológicos apresentaram suas águas contaminadas com
bactérias coliformes fecais.
A qualidade da água que está sendo utilizada durante os tratamentos odontológicos
realizados nas clínicas da UNISUL não obedece aos parâmetros recomendados pelo
Ministério da Saúde.
Nenhuma das bactérias presentes nos equipos odontológicos era do gênero
Streptococcus, excluíndo assim a hipótese de contaminação das mangueiras devido
ao desaceleramento das canetas de alta rotação.
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