UNIVERSIDADE FEDERAL DO ABC PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS CRÉDITO, ESTADO E DESENVOLVIMENTO: O CRÉDITO AO CONSUMIDOR NO GOVERNO LULA Tadeu Vaz Pinto Pereira SANTO ANDRÉ ANO 2014 ii UNIVERSIDADE FEDERAL DO ABC CRÉDITO, ESTADO E DESENVOLVIMENTO: CRÉDITO AO CONSUMIDOR NO GOVERNO LULA O TADEU VAZ P PEREIRA DISSERTAÇÃO APRESENTADA COMO PARTE DOS REQUISITOS PARA A OBTENÇÃO DO GRAU DE MESTRE EM CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS. ORIENTADOR: PROFESSOR DR RAMON GARCIA FERNANDEZ COORIENTADOR: PROFESSOR DR GIORGIO ROMANO SCHUTTE SANTO ANDRÉ ANO 2014 iii “Não me cobrem coerência. Não tenho compromisso com o erro” Juscelino Kubitschek "Só um economista imagina que um problema de economia é estritamente econômico." Celso Furtado “O Brasil não é para principiantes” Tom Jobim iv AGRADECIMENTOS A Deus pela oportunidade, sustentação e graça em poder seguir meus estudos em nível de pós-graduação. Uma longa jornada de formação até aqui. A amizade, carinho, e apoio de minha mãe. Pelos desabafos de madrugada, por me ajudar a não desistir e sempre me incentivar na busca pelo conhecimento e formação. Minha dissertação não teria sido possível sem a ajuda e dedicação de meu orientador, Professor Doutor Ramon Garcia Fernandez. Sempre atencioso, amigo, disponível para qualquer dúvida, e de muita e muita humildade. O meu muito obrigado. Ao meu coorientador, o Professor Dr Giorgio Romano Schutte, agradeço pelas sugestões e orientações sempre pertinentes. A UFABC em poder cursar um programa de mestrado tão diferente e tão distinto como este. Pude experimentar e estudar tantos assuntos diferentes, encontrar tanta gente de formação distinta e enriquecedora, que marcou muito minha vida profissional. Interdisciplinaridade levada a sério e com muita qualidade. Aos meus queridos amigos de curso, especial Diego, pela amizade, conversas nos corredores, trem / metrô e pelas “comilanças” regadas a boa conversa durante todo o curso. Aos professores, sempre atenciosos e dispostos, meu muito obrigado pela paciência e dedicação. Aos meus amigos de longa data, me desculpem pela minha ausência durante este mestrado. Obrigado em especial pela amizade do meu amigo Mateus, pela força de minha tia Cecília sempre pronta a me ajudar e a “puxar minha orelha”, a minha tão brava e amada irmã, e a todos aqueles que direta e indiretamente me ajudaram a concluir este trabalho, meu muito obrigado. v RESUMO O presente trabalho explora as transformações ocorridas durante os dois mandatos do presidente Lula (2002-2010) no que tange ao papel do Estado e seu papel na condução do desenvolvimento econômico. Analisa as características do denominado novo desenvolvimentismo, e elege o crédito destinado ao consumidor como forma de analisar parte das características destas transformações. Observa-se a partir da eleição do presidente Lula um conjunto de políticas e ações que visam uma retomada do papel do Estado na condução e intervenção da economia. O governo atribuiu uma missão especial às empresas e bancos públicos, passando estes a serem agentes principais na condução e execução de políticas públicas do governo. O mercado de crédito não ficou a margem destas mudanças, e observase neste período um aumento considerável na oferta de crédito, nos prazos, custos e demais condições, conseguidos em grande parte através da concorrência dos bancos públicos, e na atuação das autoridades monetárias na queda da taxa básica de juros. Governo consegue avanços importantes na área social através da intensificação das políticas de transferência de renda, elevando milhões de pessoas a classe média, e suas políticas anticíclicas permitiram o país sair da crise de 2008 sem afetar o emprego e renda nacional. Todavia, estas mudanças não permitiriam ao país a consolidação de um crescimento econômico sustentado. O governo Lula se propôs em realizar reformas pontuais e não estruturantes. Modificou onde foi permitido modificar, através da sua ampla e irrestrita base governista, sem, contudo, conseguir atuar em temas sensíveis como reforma agrária ou, política, tributária, dentre outras. Parou nos grandes interesses e se acovardou diante das grandes mudanças. vi ABSTRACT This paper explores the transformations that occurred during the two terms of President Lula (2002-2010) regarding the role of the state and its role in driving economic development. Analyzes the characteristics of the new so-called developmentalism, and elects the credit for the consumer as a way to analyze the characteristics of these transformations. It is observed from the election of President Lula a set of policies and actions aimed at a resumption of the role of the state in managing the economy and intervention. The government has allocated a special mission to companies and public banks, passing these to be key players in driving and implementing public policies of the government. The credit market was not the scope of these changes, and it is observed in this period a considerable increase in the supply of credit, in time, cost and other conditions, achieved largely through competition of public banks, and the role of the monetary authorities the fall of the prime rate. Government manages to important advances in the social area through intensification policies transfer income, raising millions to the middle class, and their countercyclical policies allowed the country out of the 2008 crisis without affecting the employment and national income. However, these changes would not allow the country to consolidate a sustained economic growth. The Lula government has proposed to hold off and not structural reforms. Which was modified modify, through its broad and unrestricted government base, without, however, can act on sensitive topics such as agrarian reform, or policy, taxation, among others. He stopped in the major interests and cower in the face of major changes. vii SUMÁRIO INTRODUÇÃO ................................................................................................. 12 CAPÍTULO I - DO DESENVOLVIMENTISMO À PRIMAZIA DO MERCADO: CARACTERÍSTICAS DO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO BRASILEIRO ............................................................................ 15 PARTE I ........................................................................................................ 16 1.1 A MONTAGEM DO NACIONAL-DESENVOLVIMENTISMO .................. 16 1.2. A VIRADA NACIONALISTA: O GOVERNO DE GETÚLIO VARGAS (1930 – 1952) ............................................................................................ 20 1.3 - GOVERNO JK E O PLANO DE METAS ............................................... 25 1.4 - ANOS 1960: DA CRISE AO MILAGRE ................................................. 29 1.4.1. PANORAMA POLÍTICO ................................................................... 30 1.4.2. PANORAMA ECONÔMICO ............................................................. 30 1.5. O PAEG E OS GOVERNOS MILITARES .............................................. 32 1.5.1. POLÍTICAS CONJUNTURAIS DE COMBATE A INFLAÇÃO .......... 33 1.5.2. A REFORMA TRIBUTÁRIA ............................................................. 33 1.6. O MILAGRE ECONÔMICO .................................................................... 35 1.7. O II PND ................................................................................................. 38 1.7.1. O DESENVOLVIMENTO DO II PND ............................................... 40 PARTE II .......................................................................................................... 42 1.8. BRASIL E A DÉCADA DE 1980 ............................................................. 47 1.9 - PRIMAZIA DO MERCADO: UM ESTADO MAIS “ENXUTO”, TENDÊNCIA A PRIVATIZAÇÃO E A BUSCA PELA ESTABILIZAÇÃO. ....... 49 1.10 - O GOVERNO FERNANDO HENRIQUE CARDOSO - FHC ............... 52 CAPÍTULO II - O GOVERNO LULA: O RETORNO DO DESENVOLVIMENTISMO? ............................................................................. 58 2.1 - O NOVO DESENVOLVIMENTISMO................................................. 59 2.1- GOVERNO LULA – ALGUNS RESULTADOS E CONSIDERAÇÕES ... 67 2.3. A QUESTÃO SOCIAL ............................................................................ 76 CAPÍTULO III - MOEDA, CRÉDITO E DESENVOLVIMENTO NO BRASIL CONTEMPORÂNEO ........................................................................................ 84 3.1. MOEDA E BRASIL ................................................................................. 84 3.2 .A CRISE DA DÍVIDA DA DÉCADA PERDIDA A LIBERALIZAÇÃO DOS ANOS 1990 ................................................................................................... 90 1.3. EVOLUÇÃO DO CRÉDITO DURANTE O GOVERNO LULA .............. 93 viii CAPÍTULO IV – O CRÉDITO AO CONSUMIDOR NO GOVERNO LULA ...... 102 4.1. O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL (SFN) ..................................... 102 4.2. MODALIDADES DE CRÉDITO – PESSOA FÍSICA (PF) ..................... 105 4.2.1. CRÉDITO DIRETO AO CONSUMIDOR – CDC............................. 105 4.2.2. CHEQUE ESPECIAL .................................................................. 105 4.2.3. CARTÃO DE CRÉDITO .............................................................. 106 4.2.4. CRÉDITO IMOBILIÁRIO ............................................................. 106 4.2.5. LEASING .................................................................................... 106 4.2.6. CRÉDITO CONSIGNADO .......................................................... 107 4.2.7. CONTRATO DE CRÉDITO PESSOAL ....................................... 107 4.3. O CRÉDITO AO CONSUMIDOR DURANTE O GOVERNO LULA (2003-2010) ................................................................................................ 107 4.3.1. O CRÉDITO A PF .......................................................................... 108 4.4. COMPROMETIMENTO DA RENDA E INADIMPLÊNCIA ................. 113 4.5. CRÉDITO X ATIVIDADE ECONÔMICA ............................................ 116 CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................... 119 BIBLIOGRAFIA .............................................................................................. 124 9 LISTA DE TABELAS E GRÁFICOS TABELA 1 - TAXA DE DESEMPREGO NA POPULAÇÃO ECONOMICAMENTE ATIVA DURANTE A GRANDE DEPRESSÃO - PAÍSES SELECIONADOS......................................................................................................... 16 TABELA 2 - TAXAS DE CRESCIMENTO DO PRODUTO E SETORES (1955 – 1961) .............................................................................................................................. 28 TABELA 3 - ALGUNS INDICADORES ECONÔMICOS - PLANO DE METAS (1955-1961) .................................................................................................................. 28 TABELA 4 - PRODUTO E INFLAÇÃO: 1961-1965 ................................................ 29 TABELA 5 - PRODUTO E INFLAÇÃO (1964 – 1968) ........................................... 34 TABELA 6 - - PRODUTO – TAXAS DE CRESCIMENTO (%): 1968-1973 ........ 35 TABELA 7- PRODUTO – TAXAS DE CRESCIMENTO (%): 1968-1973 ........... 48 TABELA 8 - BALANÇO DE PAGAMENTOS BRASIL - ITENS SELECIONADOS ........................................................................................................................................ 54 TABELA 9 - QUADRO COMPARATIVO NOVO DESENVOLVIMENTISMO, ANTIGO DESENVOLVIMENSTISMO E ORTODOXIA LIBERAL ....................... 61 TABELA 10 - INDICADORES ECONÔMICOS - ECONOMIA BRASILEIRA (2003-2010) .................................................................................................................. 72 TABELA 11 - CRESCIMENTO DO PIB ENTRE 2003 A 2010 ............................. 73 TABELA 12 - PIB SETORIAL E TOTAL - TAXAS MÉDIAS DE CRESCIMENTO ........................................................................................................................................ 75 TABELA 13 - EXPORTAÇÕES SEGUNDO FATOR AGREGADO(%) .............. 76 TABELA 14 - BOLSA FAMÍLIA: CONTRIBUIÇÃO PARA A REDUÇÃO ............ 82 TABELA 15 - RESULTADOS BOLSA FAMÍLIA – ALGUMAS CONSIDERAÇÕES ..................................................................................................... 83 TABELA 16 - TABELA VARIAÇÃO DO PIB E OPERAÇÕES DE CRÉDITO .... 90 TABELA 17 - EVOLUÇÃO DA PARTICIPAÇÃO DOS SISTEMAS FINANCEIROS PÚBLICO E PRIVADO NAS OPERAÇÕES DE CRÉDITO DO SISTEMA FINANCEIRO ............................................................................................. 91 TABELA 18 - OPERAÇÕES DE CRÉDITO DO SISTEMA FINANCEIRA - % DO PIB .................................................................................................................................. 93 10 TABELA 19 - OPERAÇÕES DE CRÉDITO DO SISTEMA FINANCEIRO RECURSOS DIRECIONADOS (2003=100) ............................................................ 96 TABELA 20 - ESTRUTURA DAS OPERAÇÕES DE CRÉDITO DAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS ................................................................................ 98 TABELA 21 - TAXA MÉDIA ANUAL DAS OPERAÇÕES DE CRÉDITO COM RECURSOS LIVRES REFERENCIAIS PARA TAXA DE JUROS - % A.A. ..... 100 TABELA 22 - ESTRUTURA DO SFN ..................................................................... 104 TABELA 23 - OPERAÇÕES DE CRÉDITO DO SISTEMA FINANCEIRO PESSOAS FÍSICAS .................................................................................................. 108 TABELA 24 - SALDO DAS OPERAÇÕES DE CRÉDITO RECURSOS LIVRES PESSOA FÍSICA (EM MILHÕES) ........................................................................... 109 TABELA 25 - TAXA MÉDIA DAS OPERAÇÕES DE CRÉDITO RECURSOS LIVRES - PESSOA FÍSICA (% A.A.) ...................................................................... 109 TABELA 26 - OPERAÇÕES DE CRÉDITO PF -LEASING (EM MILHÕES) .... 110 TABELA 27 - VOLUME ANUAL DE CRÉDITO COM RECURSOS LIVRES CHEQUE ESPECIAL- PESSOAS FÍSICAS .......................................................... 110 TABELA 28 - OPERAÇÕES DE CRÉDITO - CARTÃO DE CRÉDITO - PESSOA FÍSICA ......................................................................................................................... 111 TABELA 29 - CONCESSÕES DAS OPERAÇÕES DE CRÉDITO - FINANCIAMENTO IMOBILIÁRIO - PESSOA FÍSICA¹ ........................................ 111 TABELA 30 - SALDO DAS OPERAÇÕES DE CRÉDITO - SETOR HABITACIONAL - (MILHÕES)................................................................................. 112 TABELA 31 - OPERAÇÕES DE CRÉDITO PF - CRÉDITO CONSIGNADO .. 112 TABELA 32 - - TIPO DE DÍVIDA POR RENDA FAMILIAR - DEZEMBRO DE 2010 ............................................................................................................................. 114 TABELA 33 - COMPROMETIMENTO DE RENDA DAS FAMÍLIAS COM DÍVIDA COM O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL - COM AJUSTE SAZONAL - % ............................................................................................................ 115 TABELA 34 - COMPROMETIMENTO DA RENDA FAMILIAR COM DÍVIDAS ...................................................................................................................................... 115 TABELA 35 - RENDIMENTO, PRODUÇÃO E CONSUMO DAS FAMÍLIAS (2002-2010 .................................................................................................................. 116 TABELA 36 - EXPANSÃO DO CONSUMO E VENDAS (2002=100)¹ .............. 117 11 LISTA DE FIGURAS E GRÁFICOS GRAFICO 1 - EMPREGO E SALÁRIO MÍNIMO (2003-2010) ......................... 77 GRAFICO 2 - TAXA DE JUROS SELIC (META) ............................................ 98 GRAFICO 3 - ESTRUTURA DO SFN............................................................ 104 GRAFICO 4 - CRÉDITO HABITACIONAL X PREÇO DOS IMÓVEIS ........... 117 GRAFICO 5 - CRÉDITO PF X ECONOMIA REAL ........................................ 118 12 INTRODUÇÃO A eleição do Presidente Lula permitiu pela primeira vez na história do Brasil a chegada ao governo de um grupo político e social que há muito tempo reivindicava o direito de comandar o país, defendendo uma agenda política mais voltada à questão social. Suas propostas caracterizavam-se pela defesa de um Estado muito mais atuante e mais corresponsável na busca do desenvolvimento e na correção das desigualdades e injustiças sociais. A chegada do Partido dos Trabalhadores à presidência pode ser também compreendida pelo limite das políticas neoliberais implementadas desde o início dos anos 1990; com efeito, havia uma percepção generalizada de que o combate à inflação e o ajuste fiscal não foram suficientes para gerar novos postos de trabalho nem para diminuir a histórica e crônica desigualdade do processo de desenvolvimento brasileiro. No fim da década de 1990 e no início da década de 2000, além do acontecido no Brasil, o mundo também questionava os efeitos das políticas neoliberais nos países em desenvolvimento, especialmente na América Latina; nesta região observou-se, a partir da vitória do Presidente Hugo Chávez em 1998 na Venezuela, a eleição de presidentes com discurso mais à esquerda, e que defendiam em suas plataformas políticas uma maior participação estatal e políticas sociais mais agressivas. Em todo o continente ficava cada vez mais claro que o neoliberalismo não estava conseguindo satisfazer os anseios das massas, e que a sociedade civil exigia por parte de seus governantes um novo modelo estatal, visando, acima de tudo, políticas mais efetivas no combate ao subdesenvolvimento e à desigualdade social. Características de um Estado mais condutor do desenvolvimento foi retomado, fazendo com que a questão nacional, muito criticada pelas políticas neoliberais, fosse resgatada. Assim o Estado Nacional passou a retomar (em certa medida) sua função como coordenador e fomentador do desenvolvimento econômico e social. Este processo pode ser melhor compreendido se considerarmos que houve um fio condutor dado por uma nova perspectiva de políticas econômicas 13 e sociais orientando as mudanças, o que pode ser denominada como “novo desenvolvimentismo”. Esta denominação leva implícita uma contraposição com o desenvolvimentismo do pós-guerra, caracterizado pela forte intervenção estatal na coordenação e na promoção do desenvolvimento econômico; este processo foi conduzido por um Estado Nacional voltado à industrialização através da adoção de políticas protecionistas que garantiam uma virtual reserva do mercado interno para as empresas instaladas no país. O Novo Desenvolvimentismo estaria caracterizado por uma maior preocupação com as políticas sociais e com a participação popular através de processos democráticos, enquanto que no plano estritamente econômico estaria mais preocupado do que seu antecessor com a estabilidade macroeconômica; ao mesmo tempo, promoveria uma política industrial preocupada também com a questão da competitividade. O objetivo deste trabalho é contribuir para entender as mudanças ocorridas durante a primeira década deste século no que se refere às visões sobre o papel do Estado na condução e na coordenação do desenvolvimento econômico, bem como a sua atuação efetiva, focando a análise no estudo dessas mudanças no que se refere às características e comportamento do crédito destinado ao consumidor. O trabalho foi dividido em quatro capítulos. No primeiro é realizado uma breve síntese sobre o desenvolvimento econômico brasileiro dos anos 1930 até a década de 1990. Este capítulo faz uma revisão da atuação do Estado, desde uma fase mais desenvolvimentista, na qual ele assume o papel de condutor do processo de desenvolvimento, até as mudanças que o Estado brasileiro passou a ter após os anos 1980, período em que o Estado nacional-desenvolvimentista passou a ser questionado, e no qual medidas mais liberais (voltados a uma menor intervenção estatal na economia) foram defendidas e aplicadas. O segundo capítulo busca fazer uma conceptualização do “Novo Desenvolvimentismo”, trazendo a retomada da “questão nacional” no mundo capitalista discutindo este novo tipo de ação estatal. O capítulo também faz uma breve análise do Governo Lula, comparando e analisando algumas questões e indicadores de seu governo. 14 Já o terceiro capítulo busca entender como se deu a evolução do crédito na história recente do Brasil, passando pelo papel e importância do crédito na economia, até os resultados e caraterísticas do mercado de crédito nos últimos anos. E por fim, no quarto capítulo, são apresentados os dados referentes ao crédito ao consumidor no governo Lula, no que tange ao seu volume, características, prazos e comportamento. Encerra-se a dissertação com um breve capítulo de conclusões. 15 CAPÍTULO I - DO DESENVOLVIMENTISMO À PRIMAZIA DO MERCADO: CARACTERÍSTICAS DO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO BRASILEIRO O Processo de Desenvolvimento Econômico Brasileiro tem suas particulares e especifidades. Segundo Oliveira (2003), o Brasil se insere na economia global na fase do Capitalismo Tardio, quando o capitalismo global enfrenta a fase da concorrência monopolística e já está consolidado a nível global. O objetivo deste capítulo é trazer algumas características do desenvolvimento econômico brasileiro a partir de 1930, quando se iniciou num país um processo claro de medidas estatais para promoção do desenvolvimento econômico, características estas, em grande parte, tendo como base as concepções do que se denomina como “desenvolvimentismo” sobre o processo de desenvolvimento brasileiro. O capítulo traz também o momento no qual o desenvolvimentismo é colocado em xeque, e as relações e intervenções do Estado na economia são reanalisados e realinhados, e a primazia do mercado se transformou em corrente hegemônica de pensamento, com estratégias e políticas voltadas para a globalização. Sendo assim, este capítulo subdividido em duas partes: na parte I são analisadas as características desde o Primeiro Governo Vargas, que intensificou o processo de intervenção do Estado na economia brasileira até o fim do II PND. Já na Parte II, é analisado o momento no qual a intervenção do Estado na economia é contestada, até as reformas de tendências neoliberalizantes dos anos 1990, o que Bielschowsky (2011) afirma que “Este [momento], entretanto, não consegue ser desenvolvimentismo”1. 1 Bielschowsky (2011):20. 16 PARTE I 1.1 A Montagem do Nacional-Desenvolvimentismo A montagem do nacional-desenvolvimentismo brasileiro é fortemente influenciada por uma corrente teórica conhecida como “desenvolvimentismo”. Pedro Fonseca (2004) assina que essa ideologia foi criada como uma espécie de mistura eclética de diferentes escolas teóricas: o nacionalismo, protecionismo industrial, papelismo e o positivismo. Esta ideologia ganha força após as consequências oriundas da crise de 1929, a maior do capitalismo até então. Impactou toda economia mundial, e mudou consideravelmente o papel do Estado e do planejamento governamental na condução do desenvolvimento econômico, e colocou em xeque as teorias do liberalismo, utilizada como regra até então. Durante este período, observou-se uma forte redução das atividades econômicas por tudo mundo (com exceção da União Soviética que estava sofrendo um processo político específico após a Revolução Russa de 1917). O comércio mundial teve uma redução em 60% e os empréstimos pelo mundo diminuíram em 90%. Tabela 1 - TAXA DE DESEMPREGO NA POPULAÇÃO ECONOMICAMENTE ATIVA DURANTE A GRANDE DEPRESSÃO - PAÍSES SELECIONADOS PAÍS TAXA DE DESEMPREGO Inglaterra 22 % 1. Suécia EUA Alemanha 24 % 27 % 44 %2 Fonte: REGO e MARQUES, 2003. Como afirma Hobsbawm, “(...) A Grande Depressão destruiu o 17 Liberalismo Econômico por meio século”3. Como forma de tentar superar as consequências da Depressão, os Governos Nacionais intensificaram políticas econômicas de caráter mais “intervencionista”, que na sua síntese, atribuía ao Estado um importante papel na coordenação a promoção do desenvolvimento econômico. No Brasil não é diferente: a crise de 1929 impactou fortemente os resultados financeiros do café no mercado internacional, nosso principal produto vendido no mercado internacional, impactando fortemente a estrutura da economia nacional. A “escola do desenvolvimentismo” vem como uma das respostas das economias periféricas para tentar implementar reformas que pudessem romper com o subdesenvolvimento e a pobreza, logrado através do crescimento econômico de suas economias. Castelo (2012) comenta que o desenvolvimentismo foi elaborado e discutido por importantes teóricos da realidade brasileira, de distintas filiações políticas e ideológicas, que discutiam a formação econômica-social brasileira, sua inserção na divisão internacional do trabalho, alianças políticas entre classes e grupos sociais, educação, território, etc. Destaca-se neste contexto Alberto Guerreiro, Caio Prado Jr, Celso Furtado, Darcy Ribeiro, Ignácio Rangel, Josué de Castro, Milton Santos, dentre outros. E o que defendiam os clássicos do nacional‑ desenvolvimentismo? Em primeiro lugar, tinham como ponto de partida as questões estruturais, levando em conta os múltiplos aspectos da realidade. [...] Eles trabalharam a partir de uma perspectiva multidisciplinar, explicitando suas concepções do mundo e seus propósitos político‑ ideológicos. [...] Em termos gerais, eles partiram das questões externas que envolvem o Brasil desde a sua fundação como colônia. Historicamente, o processo da nossa formação econômico‑ social é entendido como subordinado aos interesses das nações colonialistas e imperialistas. [...]Defendiam reformas típicas das revoluções democrático‑ burguesas, como a agrária, a tributária, a consolidação de leis trabalhistas (especialmente dos trabalhadores rurais), o direito ao sufrágio universal, a livre organização classista e um conjunto de políticas econômicas para a geração de emprego e aumento da massa salarial (Costa, 2012:620-22). Segundo Silva (2010), o desenvolvimentismo apresenta diversos elementos estruturantes, do ponto de vista ideológico, formativos da interpretação/orientação 3 HOBSBWAM, E., 1995. do desenvolvimento. Entre estes elementos 18 estruturantes, Silva destaca: i) análise do subdesenvolvimento, ii) a visão do desenvolvimento brasileiro, iii) o problema do financiamento do desenvolvimento e iv) a questão distributiva. O desenvolvimentismo foi amplamente difundido através de estudos e pesquisas realizadas pela CEPAL - Comissão Econômica para América Latina e Caribe, um escritório regional criado pela ONU após o fim da II Guerra Mundial, com o objetivo de entender as especifidades do subdesenvolvimento capitalista na América Latina. Dentro das discussões e correntes teóricas deste órgão, desenvolve um conceito de dicotomia entre Centro (representado pelos países desenvolvidos que participaram da primeira e da segunda fase de propagação do capitalismo) e Periferia (países que estavam se inserindo no capitalismo global). A relação entre centro x periferia trazia importantes colaborações para o entendimento das características do subdesenvolvimento destes países. Segundo esta corrente, a dicotomia entre centro x periferia estava baseada na deterioração dos termos de troca, onde os países do centro forneciam aos países da periferia produtos industrializados, com maior valor agregado, e a periferia, se inseria no capitalismo global como fornecedora de bens primários, com menor valor agregado. Porém, o mais importante desta escola estava no diagnóstico do processo de subdesenvolvimento, o que para os países da periferia não era um estágio ou uma etapa para que conseguissem atingir o desenvolvimento no futuro, mas sim que esta organização da economia mundial perpetuaria as desigualdades. O subdesenvolvimento não constitui uma etapa necessária do processo de formação das economias capitalistas. É, em si, uma situação particular, resultante da expansão das economias capitalistas com o fim de utilizar recursos naturais e mão de obra de zonas de economia pré-capitalistas (Furtado, 1967:16) Portanto, era necessário encontrar uma solução para que os países periféricos conseguissem superar estes problemas e romperem com as barreiras do subdesenvolvimento. Entre as ideias que prevaleceram, sem dúvida, a mais importante, é o conceito de Processo de Substituição de Importações (PSI). 19 O PSI sugere que os países periféricos devem internalizar os processos industriais dentro de suas fronteiras, fazendo com que os ganhos oriundos do processo de exportação dos bens primários pudessem ser usados na aquisição de mercadorias produzidas localmente, permitindo assim com que o excedente que antes era utilizado para adquirir produtos industrializadas via importação fossem produzidos internamente, fortalecendo a economia nacional. O PSI atribuía ao Estado um papel importante para a internalização da indústria nos países periféricos, tendo este um papel de coordenador, planejador e de até produtor de certos produtos que a iniciativa privada por si só não teria condições de “sozinha” produzir; inviável economicamente para a iniciativa privada. Sendo assim, a presença do Estado era de suma importância para a aplicação do PSI. O Estado atuaria nos pontos de estrangulamento, ou seja, setores econômicos que não permitiam o desenvolvimento capitalista, como o caso do setor de Bens Intermediários (BI), como a indústria siderúrgica, combustíveis e etc, além dos investimentos em infraestrutura, de alto custo e de lenta maturação econômica. Além do mais, esperava-se que a atuação do Estado, investindo e eliminando os pontos de estrangulamento, criaria por consequência os chamados pontos de germinação, ou seja, setores, que seriam incentivados em decorrência dos investimentos do Estado. Em síntese, o PSI visava: Deslocamento do Centro Dinâmico: internalizar a produção industrial dentro do país, para evitar o descolamento do excedente interno para fora das fronteiras nacionais. Expansão do Mercado Interno: gera-se uma onda de investimentos nos setores substituidores de importações, aumentando a renda nacional. Diminuição do Estrangulamento Externo: com a internalização da produção, espera-se que a demanda por bens importados seja diminuída, diminuindo assim a pressão no Balanço de Pagamentos. Bielschowsky (2011) divide o período desenvolvimentista em dois ciclos ideológicos: o primeiro foi de 1930 a 1964, no qual o desenvolvimentismo era o 20 projeto de industrialização integral como via de superação do subdesenvolvimento, conduzido com exclusividade pelo Estado. O segundo ciclo, de 1964 a 1980, é subdividido em dois momentos: de 1964-68, foi um período marcado pela busca de soluções e respostas na tentativa de promover políticas econômicas para a sustentabilidade macroeconômica de então, para o qual se deu uma solução conservadora: arrocho salarial e concentração de renda. Segundo momento, entre os anos 1968 a 1980, inclui a etapa do auge conhecido como “milagre econômico” (1968-1973), um modelo de desenvolvimento modelado na concentração de renda, e que não levava os frutos do progresso técnico ao conjunto da população. 1.2. A virada nacionalista: o governo de Getúlio Vargas (1930 – 1952) Nos primeiros anos do governo de Getúlio Vargas, verificou-se uma continuidade nas medidas adotadas por governos anteriores, principalmente no que se refere a política de valorização do café. Neste período o Governo Vargas foi marcado por preocupações econômicas voltadas para a manutenção das contas públicas, ao controle monetário e na condução de um câmbio favorável às exportações. Segundo Celso Furtado (1991), em seu livro a “Formação Econômica do Brasil”, estas políticas de valorização do café, vão permitir: Existência de um câmbio favorável à exportação. Dificuldade de importar, e assim, consequentemente, estimular a intensificação da Substituição de Importações. Uma política monetária expansionista, para financiar o déficit público e também a valorização do café. De acordo com André Carraro e Pedro Fonseca (2005), o Governo Vargas vai comandar no país a construção de um “Estado Inovador”, isto é, o Governo Vargas adotou políticas visando realizar uma ruptura e passagem, do modelo agroexportador, para a inserção do país no mundo industrial. “(...) o Estado Nacional assumiu a responsabilidade de formar, dentro do sistema existente, não só uma rede de órgãos com o objetivo de acelerar o desenvolvimento econômico brasileiro, mas inclusive tentando transformar-se num Estado empresário, inovador e, em 21 menor intensidade, banqueiro(...)”4 Os autores analisam que durante o primeiro governo de Vagas, verificou-se o surgimento de instituições e agências reguladoras que tomaram para si o papel de coordenação do desenvolvimento econômico do país. Estas instituições que permitiram ao Estado Brasileiro uma modernização de sua economia, criando novas leis, novos órgãos, que passaram agora a implementar políticas públicas voltadas para o planejamento da produção e da distribuição. Conforme afirmou o próprio Vargas: Na época em que os fins sociais são preponderantemente econômicos, em que se organiza de maneira científica a produção e o pragmatismo industrial é elevado a limites extremos, assinala-se a função do Estado, antes, e acima de tudo, como elemento coordenador desses múltiplos esforços, devendo sofrer, por isso, modificações decisivas (VARGAS, 1938, v.1, p. 192 in: CARRARO, A e FONSECA, P, 2005:9). Com isso, observa-se que o Estado está sim intervindo e coordenando sua economia. Os aparelhos do Estado melhoraram sua eficiência, pois os novos órgãos eram compostos por técnicos especializados, ganhando um caráter mais impessoal e técnico, uma vez que estas ações coordenadas pelas instituições criadas eram independentes, e seu caráter “técnico” lhe dava sustentabilidade em suas ações. Estavam acima de tudo ligados a uma ideia de “interesse nacional” na coordenação e condução das políticas de desenvolvimento econômico no país. Entre os órgãos criados ligados ao desenvolvimento industrial, que tinham como objetivo de pensar a organização e o desenvolvimento da Indústria Nacional. Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, em 1930. Departamento Nacional do Trabalho, em 1931. Conselho Federal do Comércio Exterior , em 1934. O Plano Geral de Viação Nacional e Comissão Similares, em 1934. 4 Conselho Técnico de Economia e Finanças, em 1937. CARRARO, A e FONSECA, P, 2005:9 22 Além destas instituições, verificamos a importância do surgimento de instituições e órgãos do governo para o financiamento da produção. A criação em 1937 da Carteira Agrícola do Banco do Brasil para financiar a compra de máquinas e equipamentos agrícolas a juros baixos, foi um avanço considerável da estratégia estatal para o fomento da agricultura. Assim, verificamos que durante o primeiro Governo de Getúlio Vargas (1930-1945) a existência de ações estatais claras voltadas para o desenvolvimento industrial, com destacado papel do Estado voltado a promoção e difusão do desenvolvimento econômico. Outro aspecto importante do período é a o surgimento de um novo elo entre o Estado e o empresariado nacional. O segundo Governo de Getúlio Vargas (1950-1954) foi caracterizado por forte intervenção estatal na economia. Durante a sua campanha política, Vargas, como relata Rômulo Almeida, deixou claro sua “(...) plataforma que sinteticamente poderia se denominar de emancipação política e progresso social, trabalhismo e nacionalismo(...)”5 Vargas foi eleito com uma ampla margem de votos, mas, contudo, não conseguiu maioria no Congresso Nacional para a aprovação de seus projetos. O Congresso, como denuncia o próprio Almeida “(...) era tradicional, gente oligárquica, gente que não desejava transformações; gente liberal em política econômica (...)”6 No que se refere a análise da política econômica, no período se destaca a criação da Comissão Mista Brasil - Estados Unidos que tinha como grande objetivo ajudar o Governo a criar políticas econômicas e desenvolver projetos que pudessem ser candidatos ao financiamento junto ao governo dos EUA. A Comissão trabalhou em projetos específicos, como o projeto da Usina de Piloto no Rio Grande do Sul e na modernização do Porto de Santos. O projeto nacionalista de Vargas era orientado pela Assessoria Econômica da Presidência da República. O único projeto de grande porte projetado pela comissão e que teve consequências efetivas foi a criação do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE) em 1952, devido à necessidade de se administrar um 5 6 ALMEIDA, R, 2004: 129. ALMEIDA, R, 2004:130. 23 fundo de reaparelhamento econômico, para o financiamento de projetos de infraestrutura de transporte e energia. O projeto de energia ia de encontro com as bandeiras levantadas na campanha de Vargas, uma vez que em sua visão a emancipação econômica passava pela matriz energética. Para atingir tal objetivo, Vargas criou a estatal Petrobrás, que tinha como finalidade produzir e nacionalizar todo o refino e transporte de petróleo e derivados. Outro aspecto delicado no período era a questão da energia elétrica, pois o ramo estava na mão de duas grandes multinacionais, a canadense que administrava o Grupo Light e o grupo Bond & Share, que administrava a Companhia de Força e Luz (CPFL). O grande problema destas empresas era que os seus investimentos em ampliação de capacidade geradora e na melhoria na distribuição de energia elétrica eram insuficientes para sustentar o crescimento do país desejado naquele período. Estas empresas visavam apenas a atender a demanda existente, até por meio de alguns racionamentos de energia esporádicos; as empresas apenas respondiam, tardiamente, ao aumento de consumo de eletricidade, ficavam ao “reboque”, não fazendo o “papel de locomotiva”, que era necessário para o avanço da industrialização no país. A justificativa que estas empresas apresentavam para não ampliação de sua capacidade era que o Governo não autorizava o aumento de suas tarifas, e isto não lhe dava condição para a acumulação de recursos para inversões no aumento da capacidade e melhoria na produtividade. Almeida (2004) afirma que o Governo, às vezes, tinha um comportamento de “pai para filho” com essas empresas, conseguindo empréstimos junto a organismos internacionais a baixo custo. Partindo deste problema de investimentos e da necessidade de promover a sonhada emancipação econômica, a necessidade da forte presença do Estado e o controle público, faziam-se necessários e o Governo de Vargas criou um programa de energia elétrica que visava: Criação da Lei de Imposto Único de Eletricidade: meio que o governo se utilizou para angariar recursos próprios para o investimento em eletricidade. Criação do Fundo Federal de Eletrificação: administrado pelo BNDE 24 para financiar inversões na Rede Elétrica. Plano Nacional de Eletrificação: definiu a rede nacional de usinas e linhas de transmissão e interconexão e prioridades. Criação da ELETROBRÁS: holding nacional de eletricidade, funcionando como uma agência de desenvolvimento e investimento no setor elétrico. Regime de Concessões e Tarifas: previa que concessões dos serviços públicos fossem primordialmente explorados por empresas nacionais. O projeto não chegou a ser apresentado no Congresso Nacional. Assim, com ampliação do investimento público na geração de energia e nas próprias concessionárias estrangeiras, o Estado aos poucos acabou se tornando sócio majoritário dessas empresas estrangeiras, uma vez que as mesmas não formavam capital novo, e com o passar do tempo, o capital estatal se tornou maior que o estrangeiro, se tornando o Governo acionista majoritário dessas empresas. Já no que se refere a políticas para o fomento industrial, e principalmente na consolidação do departamento de Bens Intermediários e Bens de Capital no país (grande objetivo do Governo de Vargas), se destaca a criação da Instrução 70 da Superintendência da Moeda e Crédito (SUMOC) que definia múltiplas taxas de câmbio de acordo com o tipo de atividade econômica. Esta medida foi importante para viabilizar a importação de bens de capital. Furtado7 elencou as principais vantagens de uma política cambial com taxas múltiplas: Encarecer o produto importado que pudesse competir com o nacional. Subsidiar, pela taxa de câmbio mais baixa, a importação de Bens de Capital e insumos básicos essenciais ao crescimento econômico. Permitir maiores recursos para o Governo investir em infraestrutura nacional. O Governo Vargas, antes da Instrução 70 da SUMOC, havia promulgado 7 FURTADO, M, 2000: 178. 25 a Lei 1807 de janeiro de 1953 (Instrução 43 da SUMOC) que colocou um teto remessa de lucros para o exterior, pois em apenas um ano (1952) as remessas de lucros aumentaram 65% no ano. A nova lei limitou a 10% do capital registrado e a 8% dos empréstimos obtidos no exterior. Vale destacar também a criação da Comissão de Desenvolvimento Industrial (CDI) no período, que tinha o trabalho de estudar e propor medidas econômicas, financeiras e administrativas ligadas a Política Industrial. O Projeto Nacionalista de Vargas tinha “muitos inimigos”. Com o passar dos anos do mandato presidencial, aumentavam as divergências entre os trabalhadores urbanos e burguesias nacionais, que em tese, sustentavam politicamente o Governo de Vargas. Os trabalhadores cada vez mais pressionavam o governo para participar mais do ganho de produtividade de seu trabalho, em contrapartida a burguesia nacional resistia em repassar esse “ganho” aos salários dos trabalhadores e, apesar de ser beneficiada direta e indiretamente pelo Governo de Vargas, a Burguesia Nacional também reclamava da Instrução 70, que havia desvalorizado o câmbio e consequentemente, aumentado o custo das importações de Bens de Capital. Neste mesmo período, a cultura cafeeira estava passando também por uma crise, crise esta que foi creditada ao governo. A oposição, através do Congresso, conseguiu o apoio dos agricultores contra o Governo Vargas, uma vez que a oposição capitalizou os agricultores para amenizar a crise. O desfecho da crise foi o suicídio de Vargas e o fim de um projeto nacionalista para o Brasil. José Luiz Fiori8 compara que no Governo Vargas houve o que Fiori chama de “prussianismo desfigurado”. Ou seja, o Governo Vargas não conseguiu articular o Estado e a burguesia nacional e financeira em prol da construção de uma sociedade industrial avançada. 1.3 - Governo JK e o Plano de Metas Segundo Costa (2012), foi no Governo de Juscelino Kubitschek (JK) que o nacional-desenvolvimentismo atingiu seu auge. Seu governo vai lançar o 8 FIORI, J. L. in: REGO, J. M.e MARQUES, R. M, 2003: 87. 26 Plano de Metas (1956 – 1961), um conjunto de medidas e prioridades que deveriam ser tomadas para superar alguns pontos de estrangulamento na economia e promover uma montagem de uma economia integrada, aprofundando principalmente o setor de Bens de Consumo Duráveis (BCD). O Plano de Metas foi montado pelos técnicos do grupo BNDE-CEPAL que haviam identificado uma demanda de BCD reprimida na economia. O crescimento deste setor gera um forte efeito positivo sobre outros setores, promovendo um ótimo dinamismo econômico. Os técnicos elegeram 5 setores que iriam receber pesados investimentos: 1. Energia 2. Transportes 3. Alimentação 4. Indústria de Base 5. Educação Vasconcellos (2002)9 divide o Plano de Metas em três pontos principais: 1. Investimentos estatais em infraestrutura, com destaques para os setores de transporte e Energia Elétrica. No que cabe aos transportes, vale destacar a mudança de prioridades, que, até o Governo Vargas, centrava-se na ferrovia, e passou para o rodoviário, que estava em consonância com o objetivo de introduzir o setor automobilístico no país. 2. Estímulo ao aumento de produção de bens intermediários, como aço, carvão, cimento, zinco e etc., que foram objetos de planos específicos. 3. Incentivos à introdução dos setores de consumo duráveis e de capital. Para a execução do Plano, foi criado um esquema administrativo que compreendia basicamente, como demonstra Furtado10: 9 10 Conselho Nacional de Desenvolvimento, com poderes para VASCONCELLOS, 2002: 378-379. FURTADO, M: 180. 27 formular e executar a política de desenvolvimento do país. Grupos de Trabalho: estes grupos tinham como objetivo assessorar o Conselho, e os grupos eram compostos por técnicos provenientes da Comissão Mista Brasil e Estados Unidos, do grupo BNDE-CEPAL e da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Coube aos grupos estudar e viabilizar projetos existentes, estabelecer metas quantitativas de produção e elaborar normas reguladoras, visando à mobilização dos recursos necessários a execução do Plano. Grupos Executivos: órgãos instituídos por decretos, que tinham autoridade para coordenar esforços no sentido da realização das metas que envolvessem o setor privado. Em síntese, o Plano de Metas previa a superação de “pontos de estrangulamento”, dando condições para que a crescente indústria não sofresse com a oferta reprimida, principalmente em Bens Intermediários e na modernização do parque industrial através da importação de máquinas e equipamentos e também na infraestrutura. Outro aspecto levantado pelo Plano de Metas foi gerar os chamados “Pontos de Germinação”, investimentos que por decorrência dos seus “efeitos multiplicadores” criariam outros investimentos. Lafer (1975) afirma que: “(...) uma vez identificado os setores e, dentro dos setores, as metas – através do emprego integrado dos conceitos de pontos de crescimento, pontos de estrangulamento interno e externos, interdependência dos setores e demanda derivada – o plano procurou fixar para cada meta um objetivo (Lafer, C: 1975) As metas foram estabelecidas, segundo Lafer (1975), através de estudos de recentes demandas e de oferta de cada setor privilegiado pelo Plano e projetou-se, com base neles, a provável demanda após a aplicação dos investimentos. O cumprimento das metas estabelecidas pelo Plano de Metas foi satisfatório, e alguns setores foram até expandidas. O crescimento da produção industrial foi além das expectativas, em destaque para a indústria de material de transporte que cresceu 711%, materiais elétricos e de comunicações 417%, têxtil 34%, alimentos 54% e bebidas 15%. 28 .0. TABELA 2 - TAXAS DE CRESCIMENTO DO PRODUTO E SETORES (1955 – 1961) ANO PIB INDÚSTRIA AGRICULTURA SERVIÇOS 1955 8,8 11,1 7,7 9,2 1956 2,9 5,5 - 2,4 0 1957 7,7 5,4 9,3 1,5 1958 10,8 16,8 2 10,6 1959 9,8 12,9 5,3 10,7 1960 9,4 10,6 4,9 9,1 1961 8,6 11,1 7,6 8,1 Fonte: IBGE in VASCONCELLOS (2002) O grande problema do Plano foi o seu financiamento. Os gastos públicos, na ausência de uma Reforma Fiscal que garantisse a arrecadação condizente com os investimentos, precisaram ser financiados através de emissão de moeda, o que gerou uma alta onda inflacionária no país. A dívida externa também cresceu muito no período, uma vez que o saldo negativo nas transações correntes aumentou vertiginosamente, como demonstra a tabela 4 abaixo: TABELA 3 - ALGUNS INDICADORES ECONÔMICOS - PLANO DE METAS (1955-1961) VARIAÇÃO DO SALDO EM DÍVIDA VERIAÇÃO SALÁRIO TRANSAÇÕES EXTERMA ANOS INFLAÇÃO DA BASE MÍNIMO REAL CORRENTES TOTAL (US$ MONETÁRIA (%) (US$ MILHÕES) MILHÕES) 1955 23 15,8 - 9,5 2 1.445 1956 21 19,3 - 1,3 57 1.580 1957 16,1 35,1 - 9,6 - 264 1.517 1958 14,8 18 14,5 - 248 2.044 1959 39,2 38,7 - 12,7 - 311 2.234 1960 29,5 40,2 19,4 - 478 2.372 1961 33,2 60,4 -- 14,7 - 222 2.835 Fonte: IBGE, in VASCONCELLOS (2002). Contudo, o Plano de Metas foi um plano que colocou em xeque o 29 modelo de substituição de importações (PSI). Isto ocorre porque o plano vai além da resposta a um problema de estrangulamento externo, pois a partir de então a interação entre os diferentes setores e subsetores da economia brasileira que passam a ditar o ritmo desta nova economia. Outro fator de suma importância, que levanta Lafer (1975), é o papel da pressão política que levou o Plano a ser proposto pelo então candidato a presidência, Juscelino Kubitschek. Segundo o mesmo, a crescente urbanização que o país vinha sofrendo (em 1950 a população urbana representava 36,2% da população brasileira, e 10 anos depois, 1970, passa a representar 45,1%), exigia por parte dos governantes um controle maior do planejamento e crescente aumento do emprego urbano. Costa (2012), ao comentar os efeitos das políticas econômicas implementadas pelo Governo JK, afirma que: Nesse período, o modelo desenvolvimentista aprofundou‑ se com a implementação do capital financeiro no Brasil. O desembarque das multinacionais durante o governo JK, que então investiram nos setores de bens de consumo duráveis, e o início da construção do setor de bens de capital e da indústria de base com vultosos aportes estatais no governo Vargas, são constitutivos dessa fase do desenvolvimento capitalista brasileiro (Costa, 2012:619). 1.4 - Anos 1960: da Crise ao Milagre Após a aplicação do Plano de Metas e suas consequências como já foram mencionadas anteriormente, com destaque para crescente escalada da inflação, o Brasil, segundo Vasconcellos (2002), viveu sua primeira grande crise econômica na fase industrial, com destaque para a crescente escalada da inflação. Durante a primeira metade da década de 1960, a taxa de crescimento do produto brasileiro caiu vertiginosamente em relação ao período anterior, a taxa de inflação disparou, e o crescimento industrial estava ficou muito aquém do esperado, como demonstra a tabela 5 abaixo: ANO 1961 TABELA 4 - PRODUTO E INFLAÇÃO: 1961-1965 CRESCIMENTO DO CRESCIMENTO DA PRODUÇÃO PIB (%) INDUSTRIAL (%) 8,6 11,1 TAXA DE INFLAÇÃO (%) 33,2 1962 6,6 8,1 49,4 1963 0,6 -0,2 72,8 30 1964 3,4 5,0 91,8 1965 2,4 -4,7 65,7 Fonte: Abreu (1990) Para explicar tal negativismo, esse fraco desempenho dos primeiros anos da década de 1960, é necessário analisar o panorama político e econômico do período. 1.4.1. Panorama Político O início dos anos 1960 é marcado por uma grande instabilidade política. Com eleição do presidente Jânio Quadros, tendo como vice um membro de uma coligação rival, João Goulart (Jango), e com sua estranha renúncia após 8 meses de mandato presidencial, criou-se dentro do país uma grande incerteza de sobre qual grupo viria exercer a liderança a política do Brasil. O vice, João Goulart - Jango, ligado tradicionalmente a “políticas de esquerda”, defendia, entre suas diversas propostas, uma melhor distribuição de renda mais ampla e uma Reforma Agrária. Vasconcellos (2002) comenta que a crise no período se deu, entre os motivos, devido a uma “crise do populismo”; os interesses das classes urbanas não eram mais incorporados pelo sistema político sem, contudo, se exageradas do ponto de vista patronal. A elite brasileira também se viu preocupada com a capacidade dos governantes conterem estas pressões urbanas, sem precisar mudar consideravelmente a estrutura social do país. Devido a essa instabilidade política, em março de 1964 ocorreu um golpe de Estado que instaurou um regime militar no Brasil. 1.4.2. Panorama Econômico Como já foi mencionado, o Plano de Metas criou as condições para uma grande elevação na inflação, e o começo da década de 1960 foi marcado por uma política restritiva por parte das autoridades: foram cortados gastos públicos e reduzido o crédito disponível, com o intuito de controlar o aumento generalizado dos preços. 31 Para explicar a queda no nível de crescimento e de investimentos do período, alguns economistas apresentaram duas interpretações distintas: a visão “estagnacionista” e a visão de “crise endógena” do capitalismo brasileiro. Vasconcellos (2002) afirma que segundo a visão estagnacionista, o baixo crescimento do PIB brasileiro era ocasionado principalmente pelo esgotamento do Processo de Substituição de Importações (PSI), que segundo os teóricos provocava: a) diminuição do coeficiente de importação e diminuindo a amplitude das substituições promovidas pelo modelo. b) com o passar do tempo, as substituições exigem mais divisas para se concretizar, sendo a falta de divisas um problema decorrente da economia brasileira. c) problema de demanda: os novos setores a serem criados pelo PSI exigiam ganhos de escala, precisando de uma demanda expressiva para que os investimentos se viabilizassem. Os “estagnacionistas” também entendiam que o grande problema da inflação era decorrente do PSI. Para eles, o modelo exigia uma política de proteção às empresas que estavam no início de suas atividades, e que não conseguiam produzir a preços competitivos em relação ao comércio internacional, repassando seus custos para toda a economia brasileira; isso explicaria, portanto, o alto índice de inflação do período. Já outros teóricos que acreditavam que o país estava vivendo uma crise endógena decorrente da própria evolução do capitalismo brasileiro, segundo Vasconcellos (2002), após os anos 1950 o país já havia superado a fase a Industrialização Restringida, e a queda do nível de investimento era explicada pela necessidade de maturação do bloco de investimentos anteriores, causando assim o baixo crescimento do início dos anos 60. Estes teóricos acreditavam que para superação da crise era necessário que o país realizasse reformas institucionais adequadas para garantir um financiamento não inflacionário dos investimentos públicos; eles também acreditavam que o problema da falta de demanda no país era ocasionado principalmente por problemas estruturais crônicos, como o problema da estrutura fundiária, por exemplo. 32 1.5. O PAEG e os Governos Militares Segundo Vasconcellos (2002), após o Golpe, o primeiro presidente militar, o General Castelo Branco, lançou o “Plano de Ação Econômica do Governo (PAEG)” com o objetivo de acelerar o ritmo de desenvolvimento econômico do país, conter o processo inflacionário e atenuar os desequilíbrios regionais e setoriais do Brasil. Após a implementação do Plano de Metas durante o Governo de JK, esperava-se que a maturidade da Economia Brasileira encontrasse mecanismos endógenos para superação da crise e também que os desequilíbrios setoriais presentes no processo de desenvolvimento brasileiro se extinguissem durante o processo de industrialização. Segundo Martone11, os problemas mais importantes eram: A. O processo inflacionário crescente que acompanhou todo o esforço de industrialização B. O próprio sentido da industrialização, que se fez mediante técnicas intensivas de capital e baixa absorção de mão-de-obra. C. O aumento vertiginoso da participação do setor público na economia; D. A relativa estagnação do setor agrícola do ponto de vista da produtividade. O autor também coloca a preocupação do problema da absorção de mão de obra que estava aquém do necessário, pois segundo o mesmo “(...) o Brasil necessitava de um milhão e cem mil novos empregos por ano, a fim de absorver a mão-de-obra que anualmente aflui ao mercado(...)”12 Portanto, era urgente encontrar um mecanismo que permitisse acelerar o ritmo de desenvolvimento econômico do País, que havia sido interrompido em 1962 e encontrar mecanismos para conter a constante elevação dos 11 Cf. Martone, C. L. “Análise do Plano de Ação Econômica do Governo, PAEG (1964-1966)” in Mindlin Lafer, op. cit., 12 MARTONE, 1975: 75 p. 69-89; p. 75-76. 33 preços. Para isso, foi elaborado pelos economistas Roberto Campos (19172001) e Otávio Gouvêa Bulhões (1906 – 1990) o PAEG, que se dividia em duas linhas: 1.5.1. Políticas Conjunturais de combate a inflação Medidas e ações para que o aumento generalizado dos preços cedesse. Os autores do plano acreditavam que a inflação era decorrente de um grande déficit público e da elevada propensão a consumir, mantidos através do que consideravam arroubos populistas, que davam consideráveis reajustes reais à massa salarial. Defendiam: Redução do déficit público e da redução dos gastos públicos e da ampliação da receita por meio de uma Reforma Tributária. Restrição do crédito e do impulso monetário. Contenção da demanda por Política Salarial e redução do salário real. 1.5.2. A Reforma Tributária O PAEG previa uma ampla Reforma Tributária nos seguintes termos: Introdução da correção monetária no sistema tributário, aumentando assim a arrecadação real do setor público; Alteração no formato do sistema Tributário, passando a se calcular os impostos sobre o valor adicionado e não mais em cascata, como realizado até então; Criação de novos impostos, como IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados), ICM (Imposto sobre Circulação de Mercadorias, depois virou ICMS) e ISS (Imposto sobre Prestação de Serviços). Estes impostos permitiram uma maior segmentação da tributação, rompendo assim com o estímulo a verticalização da produção. Redefinição do espaço tributário brasileiro entre as esferas: a união passaria a recolher impostos únicos e os impostos sobre o comércio exterior; os estados ficariam com o ICM e com o imposto sobre Transmissão, e os 34 municípios ficariam com o IPTU e o ISS. (Ver tabela 2.6). Foram criados fundos de repasse federais para tentar diminuir a desigualdade de renda na federação, principalmente nos estados da região Norte e Nordeste do país. Criação de fundos parafiscais como FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço), PIS (Programa de Integração Social), que serviram de grandes fontes de poupança compulsória para o Setor Público. De acordo com Vasconcellos (2002), o principal objetivo do PAEG que era conseguir que o crescimento do PIB Brasileiro se situasse na taxa média de 6% a.a., o que não foi atingido. 0. ANO 1964 TABELA 5 - PRODUTO E INFLAÇÃO (1964 – 1968) PIB (%) PRODUÇÃO INDUSTRIAL (%) INFLAÇÃO (%) 3,4 5,0 91,8 1965 2,4 - 4,7 65,7 1966 6,7 11,7 41,3 1967 4,2 2, 30,4 1968 9,8 14,2 22,0 Fonte: IBGE. As medidas de controle da demanda agregada com o intuito de segurar a elevação dos preços fizeram com que os investidores privados ficassem paralisados, uma vez que segundo Martone, um dos fatores que fazem o agente investirem é (...) expectativa de crescimento futuro da demanda: na medida que o empresário preveja um aumento da demanda por seus produtos no futuro, tratará de ampliar sua capacidade instalada para fazer face ao incremento esperado em suas vendas (MARTONE, 1975: 87). Outro fator que ainda prejudicava os novos investimentos era o aumento radical da carga tributária, que tinha dois objetivos: angariar fundos para financiar o déficit público e tirar renda disponível dos consumidores para frear a demanda. Contudo, o PAEG apesar de não ter atingido seu principal objetivo, obteve alguns resultados duradouros, como destaca o diplomata Paulo Roberto de Almeida. Seus efeitos [medidas do PAEG] foram basicamente institucionais, consistindo numa ampla reorganização da ação do Estado e 35 preparando-o para as próximas etapas de alto intervencionismo governamental na economia – contra a própria filosofia econômica do regime em vigor(ALMEIDA, 2008:20). O autor destaca no seu artigo “A experiência Brasileira em planejamento econômico: uma síntese histórica”13 que as ações do PAEG permitiram uma importante reforma do Estado principalmente na área gerencial e orçamentária, que fez com que o país conseguisse altas taxas de crescimento nos anos seguintes. 1.6. O Milagre Econômico O período chamado de “O Milagre Econômico Brasileiro” abrange os anos de 1968 a 1973, quando a taxa de crescimento do PIB atingiu uma média em torno de 10 % anuais. Segundo Vasconcellos (2002), essa taxa alta (ver tabela 7) foi decorrente da capacidade ociosa gerada no período anterior e também das reformas institucionais que o governo realizou nos anos anteriores, como já mencionado anteriormente. TABELA 6 - - PRODUTO – TAXAS DE CRESCIMENTO (%): 1968-1973 ANO PIB INDÚSTRIA AGRICULTURA SERVIÇOS 1968 9,8 14,2 1,4 9,9 1969 9,5 11,2 6,0 9,5 1970 10,4 11,9 5,6 10,5 1971 11,3 11,9 10,2 11,5 1972 12,1 14,0 4,0 12,1 1973 14,0 16,6 0,0 13,4 Fonte: IBGE As orientações das autoridades governamentais colocavam já em 1967 a retomada do crescimento econômico como o grande objetivo do país, como destaca Vasconcellos (2002): É importante salientar que o crescimento colocava também como uma necessidade para legitimar a desordem econômica e políticoinstitucional e recolocar o país nos trilhos de desenvolvimento (VASCONCELLOS, 2002:383). 13 Idem, ibidem. 36 O Ministro da Fazenda de então, Antônio Delfim Neto, considerava que o problema da inflação brasileira não era de demanda, como os formuladores do PAEG diagnosticaram, mas sim de custos. Nesse sentido, o governo tomou medidas para fomentar a demanda, mas colocou simultaneamente na pauta uma política de controle de preços.. Para isso, as autoridades criaram em 1968 o Conselho Interministerial de Preços (CIP) que se tornou um braço importante para controlar a inflação. Segundo Vasconcellos (2002) as principais fontes do crescimento no Milagre foram: Retomada do investimento público em infraestrutura: possibilitada pela recuperação financeira do Setor Público, devido à Reforma Fiscal e aos mecanismos de endividamento interno (financiamento não inflacionário dos déficits); Aumento do investimento em empresas estatais: com a política da verdade tarifária associada à maior liberdade de atuação dessas empresas, observou-se, no período, um aumento nos investimentos e o processo de conglomeração dessas empresas, por meio da criação de várias subsidiárias; a Petrobrás, e a Vale do Rio Doce, são exemplos típicos desse processo. Nesse período surgiram 231 novas empresas estatais; Demanda por bens duráveis: ocorreu devido à grande expansão do crédito ao consumidor pós-reforma financeira. Percebe-se que a opção para ampliação do mercado consumidor se deu em grande medida pelo endividamento familiar. Esse setor foi líder do crescimento, apresentando uma taxa média anual de 23,6% no período. Construção civil: cresceu à taxa média de 15% a.a. por força do aumento dos investimentos públicos nessa área e pela maior demanda por habitação provocada pela expansão do crédito do SFH. Crescimento das Exportações: verificou-se no período um crescimento de 2,5 vezes no valor das exportações (volume e termos de troca), graças ao crescimento do comércio mundial e à melhora nos termos de troca, bem como às alterações promovidas na política externa 37 do país e aos incentivos fiscais; isso permitiu uma ampliação significativa da capacidade de importar da economia. José Serra, no seu artigo “Ciclos e Mudanças estruturais na economia Brasileira no pós-guerra”14, salienta que o rápido crescimento verificado no período deveu-se principalmente a uma acentuada abertura estrutural ao exterior: o coeficiente de importações subiu de 5,4% do PIB para 8,6%, e as exportações mais do que dobraram, devido principalmente ao abundante fluxo de financiamento externo. Outro fator para a recuperação que José Serra (1998) destaca motivos foi o dinamismo da demanda por bens de consumo duráveis. Esse aumento refletiu, segundo o autor: a maior concentração pessoal da renda, que permitiu aumentar o poder de compra dos grupos de renda média-alta; a elevação da margem de endividamento das famílias, facilitada pelo desenvolvimento da intermediação financeira na compra de bens de consumo. No Milagre Econômico foi também grande o aumento da concentração de renda. Entre as causas, como expõe Vasconcellos (2002), devemos destacar a forma como o Milagre se dava, uma vez que ao estar baseado no crescimento da indústria de bens de consumo duráveis, necessitava de uma classe social com uma renda mais elevada para consumir e demandar seus produtos. Também houve um aumento na demanda de profissionais qualificados,e portanto os salários destes aumentaram acima da média, uma vez que a oferta destes quadros à época era baixa. Ao comentar o período, Prado (2011) afirma que o governo militar deu continuidade em vários aspectos à agenda desenvolvimentista, fortalecendo a capacidade de intervenção do Estado. A nova administração ignorou as questões sociais do país, mas, tomou medidas necessárias à continuidade do crescimento brasileiro. A política de estabilização não foi radical, preferiu-se buscar uma redução progressiva da inflação. A reforma fiscal, aumentou a 14 SERRA, J: 1998. 38 capacidade do Estado intervir na economia, sendo um dos elementos fundamentais para o período de crescimento acelerado na década de 1970. Por outro lado, coerentemente com as ideias dos setores que apoiavam a ditadura militar, saíram de pauta preocupações com justiça social, com problemas como acesso à terra e/ou distribuição de renda (Prado, 2011:29). 1.7. O II PND Segundo Anita Kon (1999) o II Plano Nacional de Desenvolvimento foi importante, uma vez que ele “(...) consagrou a forma pelo qual o Governo Brasileiro de então enfrentou a crise mundial deflagrada pelo rompimento de Bretton Woods e pelo Primeiro Choque do Petróleo”15 A década de 1970 enfrentou sérias mudanças estruturais na economia mundial, tais como o rompimento do acordo de Bretton Woods (que resumidamente, estabelecia entre outras coisas um câmbio fixo para as transações internacionais) e como o aumento do preço do petróleo (quando a OPEP16 aumentou o preço do barril que era de US$ 2,90 para US$ 11,90 em apenas três meses durante o ano de 1973). Tais acontecimentos demandaram do Governo Brasileiro medidas urgentes para que o crescimento se mantivesse a níveis aceitáveis. O significativo crescimento ocorrido ao longo do Milagre fez com que toda a capacidade ociosa da economia fosse ocupada, o que por consequência, pressionava a elevação dos preços pelo lado da oferta, e também pressionava em muito o Balanço de Pagamentos, uma vez que para manter este crescimento era necessária a importação de máquinas, equipamentos e insumos, somando-se ainda com a elevação do preço do barril do petróleo. O contexto político interno também não era muito favorável aos militares. A sociedade civil já demonstrava a insustentabilidade do Regime Militar e exigia políticas para promover a distribuição de renda e a abertura política para o retorno da democracia. Para enfrentar a crise econômica o governo tinha dois caminhos: o primeiro, adotar uma política econômica de ajustamento, ou seja, medidas restritivas para frear a demanda e assim, no longo prazo, diminuir os desequilíbrios, e segundo, uma política econômica de financiamento, ou seja, 15 16 KON, 1999:68 OPEP: Organização dos Países Exportadores de Petróleo. 39 medidas que promovessem a procura de recursos para a manutenção do crescimento econômico. As autoridades optaram primeiramente pelos caminhos do ajustamento defendido pelo então Ministro da Fazenda Mario H. Simonsen que buscava um controle da demanda através de um controle rígido da liquidez. As medidas restritivas não foram levadas à frente devido a turbulências internas, como a quebra do Banco Halles e a grande derrota do partido da situação (ARENA) nas eleições para o congresso em 1974, que inviabilizaram a política proposta pela Fazenda. Assim, as autoridades abandonaram as medidas de controle da demanda e criaram o II PND, optando por uma saída desenvolvimentista como resposta à crise. O Plano, em síntese, tinha como objetivo: Alterar profundamente a estrutura produtiva brasileira, e a longo prazo, diminuir a necessidade a necessidade de importação (diminuir a vulnerabilidade externa). Diminuir a pressão no Balanço de Pagamentos. Manter o crescimento em torno de 12% a.a. Procurar um crescimento baseado na expansão dos setores de bens de produção e de insumos17, mediante garantias de demanda, incentivos fiscais e creditícios, reserva de mercado e política de preços. Promover a desconcentração industrial através da distribuição espacial dos principais projetos18. Aumento na produção de insumos básicos: metais não-ferrosos, exploração de minérios, petroquímica, fertilizantes e defensivos agrícolas, papel e celulose; 17 Investimento em infraestrutura e energia: ampliação da prospecção e O II PND previa o fortalecimento dos setores de Bens de Capital e de insumos, ou seja, acreditava-se com o fortalecimento destes setores a economia, enfim, chegaria a sua maturidade. O II PND foi diferente dos planos anteriores, uma vez que até aquele momento os planos que surgiram foram aqueles que previam o fortalecimento do setor de Bens de Consumo Duráveis. 18 Entre as medidas para promover a desconcentração industrial, destaca-se a construção da maior siderúrgica em Itaqui (MA), a prospecção do petróleo passaria para a plataforma litorânea do Nordeste, os investimentos os investimentos para a produção de soda de cloro seriam localizados em Alagoas, a petroquímica na Bahia e no Rio Grande do Sul, os fertilizantes potássicos em Sergipe, o fosfato em Minas Gerais, o carvão em Santa Catarina, por exemplo. 40 produção de petróleo, investimentos em energia nuclear, ampliação da capacidade hidrelétrica (Itaipu) e substituição dos derivados de petróleo por energia elétrica e pelo álcool (Proálcool), expansão das ferrovias e a utilização de carvão. O II PND previa o amadurecimento completo da economia brasileira, uma vez que se considerava que o Setor de Bens de Capital era incompleto no país e para que a matriz industrial brasileira se completasse, seria necessário um grande fluxo de investimentos no desenvolvimento desse setor. O Plano também, segundo Anita Kon (1999), era um retorno ao discurso nacional-desenvolvimentista dos anos 1950, uma vez que previa “(...) que a autonomia nacional deveria passar pela internacionalização de toda a base técnica de produção(...)”19. Ou seja, o II PND trazia novamente à tona o discurso da substituição das importações como motor do crescimento nacional. 1.7.1. O Desenvolvimento do II PND Para executar os objetivos do II PND, foi criado o “Conselho de Desenvolvimento Econômico (CDE)” que foi responsável pelo gerenciamento do Plano. Segundo Vasconcellos (2002): (...) lógica do modelo estava em que, conforme as empresas estatais avançassem, seus projetos de investimento no setor de insumos gerariam demanda derivada que estimularia o setor privado a investir no setor de Bens de Capital. Assim, criava-se, portanto o que Kon (1999) chama de tripé para a execução do PND: setor público, setor privado nacional e capital externo. 1.7.1.1. Setor Público Caberia ao Setor Público a liderar a execução do Plano. Atuaria nas áreas onde o Setor Privado não poderia atuar, com destaque para os projetos de infraestrutura e para as empresas estatais que atuariam na produção de 19 KON, A, 1999:73. 41 Bens Intermediários, que exigem grandes aportes de recursos financeiros. De acordo com Kon (1999), o investimento do setor público isoladamente correspondeu a 12% ou 13% do PIB entre 1974-1978, sendo responsável por mais da metade de todos os investimentos do II PND. 1.7.1.2. Setor Privado As empresas privadas atuariam no atendimento à “demanda derivada” gerada pelos investimentos do Setor Público. Para isso, foram criadas linhas de financiamentos subsidiados, como o FINAME (Financiamento de Máquinas e Equipamentos do BNDE), ancorados nos fundos parafiscais PIS/PASEP. O Governo ainda concedeu aos investidores privados crédito do IPI sobre compra de equipamentos, possibilidade de depreciação acelerada, isenção de imposto de importação, formas de reserva de mercado para novos empreendimentos e uma garantia de política de preços. 1.7.1.3. Capital Externo Existia no período uma grande soma de recursos disponíveis para captação, o que Vasconcellos (2002) denomina de processo de reciclagem dos petrodólares. De acordo com o autor, os países pertencentes à OPEP estavam com um grande superávit em suas contas externas, e como os países centrais estavam em recessão, estes dólares se encaminhavam aos países em desenvolvimento, com grande margem de lucratividade. 1.7.2. O II PND: Balanço Final Segundo Kon (1999), não se pode desconsiderar os avanços que o II PND trouxe para a economia brasileira, principalmente no que se refere à substituição de importações e ao aumento das exportações. A indústria cresceu na média 35% no período, destacando-se os setores metalúrgico (cresceu 45%), de material elétrico (49%), papel e papelão (50%) e químico (48%). Mesmo setores que cresceram abaixo da média atingiram valores expressivos, como o setor têxtil (cresceu 26%), o de alimentos (18%) e 42 o de material de transporte (28%). Como observa Vasconcellos (2002), “Observa-se, um redirecionamento na atividade industrial, agora para o setor de insumos e de máquinas e equipamentos”20 Entre os setores que tiveram maiores êxitos no Plano, destacam-se os setores de fertilizantes, cimento e papel e a produção de soda cáustica, cloro, etano, amônia e celulose. O grande problema do II PND, segundo Kon (1999), é que se verificou no período um aumento vertiginoso da dívida externa, sendo suas consequências também visíveis nas contas fiscais. O grande problema que se colocou para a economia brasileira durante os anos posteriores foi que a responsabilidade final pelo enorme volume de transferências de recursos ao exterior cabia ao setor público, estabelecendo-se um imbricamento perverso entre a dívida externa e interna (KON, 1999:97). O Estado assumiu para si o ônus da execução do II PND, sendo que um dos fatores que mais deixaram consequências para os anos posteriores foi a estatização da dívida. Uma resolução do Banco Central previa que os tomadores de empréstimos em moeda estrangeira poderiam saldar suas dívidas antes dos vencimentos das mesmas, fazendo com que o Estado ficasse responsável pelo risco cambial daí por diante. Assim, o setor privado, que era responsável por 80% da dívida externa total em 1974, passou a deter menos da metade dela cinco anos depois. Os problemas associados ao aumento da dívida externa durante o II PND se refletiriam durante muito tempo na economia brasileira; o Estado perderia sua capacidade de intervenção, especialmente a de fazer investimentos, principalmente após os anos 1980. Contudo, apesar do seu gigantismo, o II PND merece destaque, pois como afirma Matos (2002), o II PND “(...) foi importante para estimular de forma definitiva a implantação da indústria de bens de capital no Brasil.” 21 E assim como completa Giambiagi (2000), o II PND foi a mais bem sucedida intervenção do Estado brasileiro na condução do desenvolvimento econômico PARTE II A partir da década de 1980 foi se configurando a visão de que seria 20 21 VASCONCELLOS, 2002:403 MATOS, 2002:53. 43 necessário ter um novo tipo de Estado, mais enxuto e mais voltado à coordenação e regulação das políticas e do desenvolvimento, em detrimento a um tipo de Estado mais “interventor” no processo de desenvolvimento econômico, observado de 1930 até então. Segundo Bielschowsky (2011), durante a década de 1980 o Estado se fragilizou devido à gigantesca crise financeira no período. De acordo com o autor: Os anos 1980 foram caracterizados pelo baixo crescimento da economia, pelo enfraquecimento do Estado e, ao mesmo tempo, pelo início da entrada do pensamento neoliberal no Brasil. O pensamento desenvolvimentista foi inibido pela instabilidade macroeconômica. No período de hiperinflação, as estratégias nacionais de desenvolvimento não tinham difusão, já que o alvo principal passou a ser o controle da inflação (Bielschowsky, 2011:20) Giambiagi (2000) analisa que em nenhum momento o Estado brasileiro tinha o interesse de ocupar o espaço do setor privado, mas sim de consolidar o sistema capitalista no país. De acordo com o mesmo autor, a intervenção estatal na economia brasileira era inevitável, tendo em vista: A existência de um setor privado relativamente pequeno. Os desafios colocados pela necessidade de enfrentar as crises econômicas internacionais O desejo de controlar a participação do capital estrangeiro, principalmente nos setores de utilidade pública e recursos naturais. O objetivo de promover a industrialização rápida de um país atrasado. Conforme afirma Giambiagi (2000), o (...) Estado Desenvolvimentista no Brasil não apenas assumiu o papel de planejador do processo de industrialização, como também investiu diretamente em setores estratégicos para o desenvolvimento brasileiro, com destaque para a infraestrutura, principalmente, estradas, energia e telecomunicações (Giambiagi, 2000:86) . O surgimento de empresas estatais no Brasil aconteceu devido a incapacidade ou desinteresse do setor privado em investir em setores estratégicos que exigiam grandes aportes financeiros. A atuação do Estado como “condutor” do processo de desenvolvimento industrial no país e sua forte ação permitiram que os planos econômicos implementados até o final dos anos de 1970 eliminassem em grande parte os 44 pontos de estrangulamento garantindo a conclusão do “processo de substituição de importações”. Contudo, com o começo dos anos de 1980 o Estado começou a perder fôlego. Problemas de financiamento do Setor Público, somados ainda a sucessivos choques externos e uma falta de uma hegemonia política interna que cada vez mais contestava a ditatura implantada, fez com que o papel de agente fomentador do desenvolvimento econômico se enfraquecesse. Segundo Carneiro (2005), a política e ações macroeconômicas a partir do final da década de 1970 foram cada vez mais direcionadas pelo combate à inflação e pela procura do controle da dívida pública, lograda através da política monetária, cambial e fiscal restritiva; as políticas de desenvolvimento implantadas resumiram-se a reformas relativas à regulação da relação EstadoMercado, com significativa perda de participação do Estado na economia. Como observa Pochmann (2009):”(...) na ausência de um projeto de desenvolvimento social, o ciclo da financeirização da riqueza saiu fortalecido, tendo como principal sustentáculo do seu financiamento e legitimação política do próprio Estado”22. Nos anos 1980, o Brasil vivia um momento de transição, pois estava em curso o processo da Abertura Política que deveria ser “lenta, gradual e segura” segundo seu idealizador, o presidente Gel. Ernesto Geisel. Afonso(1989) afirma que nesse período resultou evidente a dificuldade de se estabelecer uma aliança social e política capaz de responder a crise, redirecionando o desenvolvimento do país. Segundo Matos (2002), a partir dos anos 1980 foi dificultada a realização de uma aliança política que pudesse elaborar planos de desenvolvimento devido às divergências sobre a transição institucional. Com efeito, em todo processo de planejamento econômico são realizados “ajustes” e são eleitas “prioridades”, e segundo Matos (2002), as condições políticas e sociais dos anos de 1980 não permitiam tais processos. Entre os fatores que geraram esta “incapacidade”, encontra-se o rompimento do padrão de financiamento do Setor Público que se verificou nos anos de 1970. Entre os principais fatores responsáveis por esta ruptura 22 Pochmann, 2009:58 45 destacam-se os amplos incentivos e subsídios ao setor privado que o Governo concedeu (principalmente devido à marcha forçada23 induzida pelo II PND), bem como uma política de preços e tarifas públicas que, adotada com o intuito de frear a subida generalizada de preços, ocasionava significativos prejuízos às empresas estatais. Carneiro (2005) observa que a partir do final dos anos 1970 e início dos anos 1980, profundas transformações estruturais ocorreram na economia internacional, observando-se uma crescente liberalização financeira e cambial que ocasionou uma mudança significativa nos padrões de concorrência intercapitalista; isso provocou um aumento nos fluxos de comércio internacional e no Investimento Direto Estrangeiro – IDE. O autor salienta também um aumento significativo das desregulamentações dos fluxos financeiros, comerciais e produtivos, que na periferia (como no caso do Brasil) traduziu na abertura comercial e financeira, acompanhada com uma ampla desregulamentação do IDE. Ocorreu no período um significativo aumento nos juros internacionais devido a uma nova postura assumida pelas autoridades dos EUA. Eles perceberam que desde o fim do acordo de Bretton Woods, sua moeda (o dólar), vinha perdendo fortemente seu valor real em relação com outras moedas estrangeiras, devido à adoção do câmbio flutuante. Para tentar reverter esta tendência, em 1979 o FED24 adotou uma política monetária restritiva com intuito de frear a tendência de perda real do dólar. O FED restringiu o crédito e dificultou o financiamento do Tesouro Americano, forçando o ajustamento da economia. Em 1980 assumiu a presidência dos EUA Ronald Reagan, que apresentou uma nova política econômica ao país, baseada na teoria da “supply side economics”, que recomendava uma forte redução do tamanho e atuação do Estado. Esta teoria recomendava uma grande reforma nas políticas sociais e trabalhistas, pois os encargos decorrentes delas, segundo os formuladores desta visão, fazem com que aumente a carga fiscal sobre as empresas. Por sua vez, estas, supostas vítimas de um Estado sanguessuga, ficariam 23 24 Ver CASTRO, A. B. de e SOUZA, F. (1985) FED: Banco Central Americano. 46 impossibilitadas de realizarem novos investimentos; e, sem investimentos, a economia não cresce e o país corre o risco de ficar estagnado ou em recessão. Esta política previa ainda uma grande reforma nos encargos sociais e trabalhistas, pois estes encargos, segundo os formuladores desta política, fazem com que aumente o custo sobre as empresas, e estas, “vítimas” de um Estado “sanguessuga”, ficam engessadas de realizarem novos investimentos e, sem investimentos, a economia não cresce e o país corre o risco de ficar estagnado ou em recessão. Tal política restritiva fez com que a situação fiscal estadunidense piorasse ainda mais, fazendo com que suas autoridades recorressem ao mercado de crédito internacional para financiar seu déficit fiscal, aumentando violentamente a taxa de juros básica americana. Com tal elevação, os EUA se tornaram o grande absorvedor da liquidez mundial, prejudicando em muito a capacidade dos países em desenvolvimento para captarem recursos para o financiamento de seus déficits. Como os EUA possuem a moeda internacional e são a maior economia do planeta, seu mercado de títulos públicos é considerado o de menor risco e mais atrativo. Como este mercado aumentou consideravelmente sua remuneração (aumentando os juros dos títulos), os países em desenvolvimento precisavam oferecer uma remuneração maior que a americana para captarem recursos, aumentando consideravelmente os juros de seus títulos acima dos juros americanos, o que fez com que suas dívidas externas aumentassem vertiginosamente. Em 1982 aconteceu uma série de problemas nos mercados financeiros internacionais que provocaram o rompimento quase completo do fluxo de recursos externos voluntários aos países em desenvolvimento, levando inclusive à insolvência polonesa e argentina e a moratória mexicana. Este novo cenário econômico mundial fez com que se invertesse a tendência dos anos 1970 onde o endividamento externo era visto como maneira de se superar os constrangimentos externos e os países em desenvolvimento começam uma tendência forte de superávits comerciais para poder fazer frente aos serviços da dívida externa. 47 1.8. Brasil e a Década de 1980 O Brasil, que também vinha recorrendo ao sistema financeiro internacional para a rolagem da sua dívida, principalmente através de suas estatais, se viu obrigado a realizar mudanças para poder se adequar ao novo contexto internacional. Foi necessário gerar saldos favoráveis no balanço comercial, sob orientação e tutela do FMI. A nova política baseava-se, segundo Vasconcellos (2002): Na contenção da demanda agregada por meio de redução do déficit público, com contenção dos gastos, principalmente investimentos; houve aumento na taxa de juros interna e restrição do crédito, redução do salário real mediante critérios de subindexação dos salários contidos na política salarial, e do desemprego gerado pelo quadro recessivo; Em tornar a estrutura de preços relativos favorável ao setor externo. Nesse sentido, houve uma forte desvalorização real do cruzeiro, levando à elevação da relação câmbio/salário, e á elevação do preço dos derivados de petróleo; isso tudo significou um estímulo à competitividade da indústria brasileira, por meio da contenção de alguns preços públicos e de subsídios e incentivos a exportação. O resultado desta política de ajustamento fez com que a década de 1980 fosse marcada por uma profunda recessão em 1981 e 1983 e um baixo crescimento em 1982, somando-se ainda ao problema da inflação devido a um choque de oferta interna. 48 TABELA 7- PRODUTO – TAXAS DE CRESCIMENTO (%): 1968-1973 ANO PIB INDÚSTRIA AGRICULTURA SERVIÇOS IGP-DI (%) 1980 100,00 100,00 100,00 100,00 110,2 1981 95,75 91,17 107,98 97,51 95,2 1982 96,63 91,30 107,75 99,57 99,7 1983 93,81 85,91 107,27 99,06 211,0 1984 98,90 91,38 110,07 104,37 223,8 1985 106,75 99,08 120,59 11,66 235,1 1986 114,81 110,73 110,92 120,73 65,0 1987 118,99 111,90 127,53 124,78 415,0 1988 118,92 109,00 128,60 127,67 1.037,6 1989 122,73 112,15 132,27 132,30 1.782,9 1990 117,51 103,20 127,35 131,35 1.476,6 1991 118,93 103,20 130,05 134,06 480,2 1992 117,86 99,38 136,94 133,92 1.158,0 1993 123,75 108,33 134,34 138,61 2.708,6 FONTE: Vasconcellos, 2002: 411 Como demonstra a tabela 8, a década de 1980 ficou marcada como sendo a da “década perdida” pelo seu fraco desempenho econômico. Observe os índices comparativos: colocando como fator 100 o ano de 1980, percebe-se que o produto gerado pela economia brasileira entre 1981 e 1984 foi menor que o de 1980. Foi registrado, porém, um significativo crescimento entre 1984 e 1987, ficando o PIB praticamente estagnado a partir dai até 1992 inclusive. No que se refere aos setores da economia, destaca-se a péssima desempenho da indústria, que novamente colocando 1980 como fator 100, permanece a década de 1980 estagnada com níveis de produção inferiores ao ano de 1980, com uma ligeira recuperação a partir de 1986. Entre as possíveis explicações para esta elevação generalizada dos preços, destaca-se o aumento da taxa de juros interna na tentativa de conter a demanda agregada, comportamento este que provocou uma queda da arrecadação, aumentando consideravelmente a dívida interna e prejudicando ainda mais uma ação consolidada do Estado. O resultado todo desta crise, somando-se a retração das estrangulamento externo, inflação fora do controle e falta de uma hegemonia que indicasse um “caminho” a ser seguido, fez com que muitos passassem a 49 defender um padrão diferente para a intervenção do Estado brasileiro na economia. 1.9 - Primazia do Mercado: um Estado mais “enxuto”, tendência a privatização e a busca pela estabilização. O mundo já colocava em xeque a atuação do Estado keynesianodesenvolvimentista que prevaleceu até a década de 1970. A crescente deterioração das contas públicas colocava para as autoridades dos países a necessidade de uma nova forma de atuação deste Estado visto como gigante, que não conseguia mais atender as crescentes pressões da sociedade em suas demandas sociais. A Inglaterra de Margareth Thatcher inaugurou a tendência dos países capitalistas em promover a privatização de suas empresas e de assumir esse papel modernizador da intervenção estatal. Os países capitalistas passaram neste período pelo renascimento das políticas liberais, quando o Estado passa a ter seu papel mais de regulador que de condutor do desenvolvimento econômico. Como observa Carneiro (2005): (...) a política macroeconômica foi sendo progressivamente direcionada para a obtenção de estabilidade, tanto da inflação quanto da dívida externa (...) sob égide da ideologia liberal (...) renunciou-se ao caráter anticíclico dessas políticas na era keynesiana (Carneiro, 2005: 1). Carneiro (2005) divide estas mudanças estruturais em dois momentos: o primeiro, conhecido como desmonte do nacional-desenvolvimentismo, entre os anos de 1990 e 1998, acabando com o caráter regulatório e intervencionista do Estado, e no segundo momento em reformas microeconômicas para criar um contexto mais favorável ao funcionamento do livre mercado. O rompimento do padrão de financiamento demandava uma ação rápida do Estado na tentativa de reverter o grande déficit público. Uma medida crucial utilizada pelo Estado para conseguir maiores recursos foi a privatização. No Brasil a privatização foi realizada em três fases: Privatização durante os anos de 1980: neste período não foi privatizada nenhuma empresa estatal de grande porte; só aconteceu no 50 período a reprivatizarão das empresas que haviam passado para o controle do Estado via BNDES devido ao não pagamento dos empréstimos e / ou dívidas. Privatização dos anos 1990 a 1995: diferentemente da primeira fase, neste momento começaram a ser privatizadas empresas tradicionalmente estatais. Foi lançado também o Plano Nacional de Desestatização (PND) pelo presidente Collor que indicava a nova estratégia geral do Governo. Giambiagi (2000), contemplava as chamadas reformas de mercado (abertura comercial, desregulamentação da economia, redução do tamanho do Estado). Na segunda fase privilegiou-se a privatização não de empresas isoladas, mas sim se setores, como siderúrgico, petroquímico e de fertilizantes. Entre os exemplos de empresas tradicionalmente estatais e de grande aporte financeiro que foi privatizada no período, destaca-se a Usiminas, cuja venda representou duas vezes o total arrecadado na venda de 40 empresas durante a década de 1980. A partir de 1995: marcada pela Lei de Concessões, que concedeu o direito de terceiros de explorar serviços públicos, foi diferente das demais fases de privatização pela magnitude de receitas envolvidas, principalmente pela venda de empresas na área de telecomunicações e energia elétrica. Foi o momento das “mega privatizações” e como afirma Giambiagi (2000) a venda das “jóias da coroa” do Tesouro Nacional. O processo de privatização, principalmente após os anos de 1990, com o lançamento do PND, reconfigura um novo tipo de atuação do Estado na economia. Segundo Giambiagi (2000): (...) a ideia era que o Estado deveria retirar-se de setores nos quais o setor privado estivesse apto a operar. A ação direta do Estado deveria concentrar-se nas atividades tipicamente púbicas, como educação, saúde, justiça, segurança e regulamentação (Giambiagi, 2000:190). As mudanças deveriam ocorrer também no aspecto institucional do Estado, ou seja, na maneira de como o Estado deveria se organizar neste novo papel. Segundo Paula (2007), a necessidade de se realizar uma nova reforma 51 administrativa se dava por causas de três importantes crises que abalaram profundamente a legitimidade e governabilidade do Estado: crise fiscal, crise no modo de intervenção e crise de sua forma burocrática de administração. Surgiu neste contexto um novo modelo de gestão do Estado em ascensão, a escola da Administração Pública Gerencial. Em suma, ela previa uma gestão voltada para os resultados, isto é, uma gestão cujo principal objetivo seria proporcionar ao cidadão/usuário os melhores serviços e políticas públicas voltadas as suas necessidades, geridas por características até então observadas unicamente na iniciativa privada. Portanto, o enfoque seria o gerencial, e a ideia geral desta nova concepção de Estado seria o da descentralização das ações públicas e da delegação de deveres, fazendo que o Estado seja responsável pela coordenação e regulação dos serviços e produtos públicos. Assim, esse “novo desenho” do Estado previa uma série de novas e importantes concepções de como esse Estado deveria funcionar; os setores em que o Estado deveria atuar diretamente. O projeto de Reforma Administrativa defendia que o Estado deveria atuar diretamente no setor estratégico, ou seja, no núcleo no qual são definidas as leis e as políticas públicas, bem como no cumprimento das mesmas. Integram este setor as forças armadas; as polícias; as agências arrecadadoras de impostos; as agências reguladoras; as agências de financiamento, fomento e controle de serviços sociais e da seguridade social. A Reforma Administrativa previa a necessidade de delegar a execução de atividades não exclusivas do Estado, tais como educação, saúde, cultura, dentre outras, que poderiam ser oferecidas pelo setor público não-estatal e também pela iniciativa privada, e pela sociedade civil organizada. Entretanto, cabia ao Estado financiar e fomentar tais serviços não-exclusivos de sua área de atuação. É esse consenso sobre o interesse público que permite a emergência, neste último quartel do século XX, de um novo direito de cidadania, os “direitos republicanos”: o direito que cada cidadão tem de que o patrimônio público seja de fato utiliza-lo de forma pública. Carneiro (2005) resume bem as consequências deste “novo” modelo de Estado: Não é demais reafirmar que o projeto teria uma dimensão essencial: 52 a integração comandada pelo mercado e o redesenho do papel do Estado dando-lhe como prioridade a promoção da estabilidade e a facilitação do funcionamento dos mercados. Estavam pois excluídas as políticas de natureza discricionária tais como a regulação dos fluxos de capitais, direcionamento do IDE, escolha de setores industriais prioritários ou seja, aquelas políticas de natureza seletiva, relativa a setores, grupos ou processos (Carneiro, 2005:3). Cano (2007) destaca as seguintes políticas e reformas que permitiram o funcionamento deste novo modelo de Estado: Ampla liberdade para o capital financeiro se apropriar de elevados ganhos setoriais e regionais de toda a ordem; Reformas dos sistemas financeiros nacionais para permitir a liberalização e a alta velocidade do movimento de capitais exigidos na esfera global; Abertura comercial e de serviços; isto veio acompanhado pela valorização cambial, que ocasionou um aumento vertiginoso das importações e dos gastos internacionais o que contribuiu ainda mais para enfraquecer o capital nacional; Flexibilização das relações capital-trabalho; Reformas previdenciárias, para permitir um novo mercado para o capital privado através dos serviços de previdência privada, para abrir fundos para garantir o pagamento dos juros da dívida pública, além da diminuição dos gastos do governo; Reforma do Estado Nacional, para desmantelar suas estruturas, com a diminuição e extinção de órgãos e instituições, privatização de empresas públicas e etc. 1.10 - O Governo Fernando Henrique Cardoso - FHC Foi durante os dois mandatos do governo FHC, que as reformas de tendência de cunho mais liberais foram implementadas no país. Giambiagi (2005) elenca, em ordem de importância, as reformas e medidas implantadas no período do FHC. Entre elas: I. Privatizações; II. Fim dos monopólios estatais nos setores de petróleo e telecomunicações; III. Mudança no tratamento do capital estrangeiro; 53 IV. Saneamento do sistema financeiro; V. Reforma parcial da Previdência Social; VI. Renegociação das dívidas dos estados da Federação; VII. Aprovação da Lei de Responsabilidade Fiscal; VIII. Ajuste Fiscal a partir de 1999; IX. Criação de uma série de agências reguladoras de serviços de utilidade pública; X. Estabelecimento do sistema de metas de inflação como modelo de política monetária; Uma reforma que não foi implementada em sua gestão, mas foi de suma importância para o período, foi o Plano Real, iniciado no Governo Itamar Franco (1993-1994). Com objetivo de frear o problema de inflação, os formuladores do plano diagnosticaram o problema da inflação brasileira como sendo em grande parte inercial, e propuseram a substituição da moeda existente por uma nova, o real. Esperavam os formuladores do plano que essa substituição fosse algo tão tranquilo que parecesse quase natural. Vasconcellos (2002) afirma que o Plano Real dividiu o ataque ao processo inflacionário em três fases: I. Ajuste Fiscal; II. Indexação completa da economia com a introdução da Unidade Real de Valor (URV); III. Reforma monetária através da transformação da URV em reais; Os efeitos das medidas acima apontados foram num primeiro momento positivas, obtendo uma espetacular queda da inflação num período muito curto; mais difícil foi perceber que o plano embutia também um custo muito alto: o aumento vertiginoso da dívida pública interna e externa e forte consequência na estrutura produtiva nacional. A abertura comercial, o câmbio valorizado e a enxurrada de importações destruíram importantes elos de várias cadeias produtivas, potenciando ainda mais a destruição de empregos. 54 TABELA 8 - BALANÇO DE PAGAMENTOS BRASIL - ITENS SELECIONADOS ITENS 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 Balança Comercial 10.466 (3.466) (5.599) (6.753) (6.575) (1.199) (698) 2.650 13.121 Exportações 43.545 46.506 47.747 52.994 51.140 48.011 55.086 58.223 60.362 Importações 33.079 49.972 53.346 59.747 57.714 49.210 55.783 55.572 47.240 Balança de Serviços e Rendas (14.692) (18.541) (20.350) (25.522) (28.299) (25.825) (25.048) (27.503) (23.148) Serviços (5.657) (7.483) (8.681) (10.646) (10.111) (6.977) (7.162) (7.759) (4.957) Rendas (9.035) (11.058) (11.668) (14.876) (18.189) (18.848) (17.886) (19.743) (18.191) (1.811) (18.384) (23.502) (30.452) (33.416) (25.335) (24.225) (23.215) (7.637) 8.692 29.095 33.968 25.800 29.702 17.319 19.326 27.052 8.004 1.460 3.309 11.261 17.877 26.002 26.888 30.498 24.715 14.108 50.642 9.217 21.619 12.616 18.125 3.802 6.955 77 (5.119) (27) 18 (38) (253) (460) (88) (197) (471) (356) 43.557 16.200 673 (4.833) (14.285) (13.620) (18.202) 2.767 (1.062) 7.215 12.919 8.666 (7.907) (7.970) (7.822) (2.262) 3.307 302 38.806 51.840 60.110 52.173 44.556 36.342 33.011 35.866 37.823 Saldo de Transações Correntes Conta Capital e Financeira Investimentos Diretos Investimentos em Carteira Derivativos Outros Investimentos Resultado da BP Reservas Internacionais Fonte: Vasconcellos (2002):458 Segundo Cano (2008), no período entre 1989 a 2004, o PIB se expandiu na média de 2,4% ao ano, e a relação de investimento / PIB que no final da década de 1970 era de aproximadamente 25%, caiu para 18%. Ao mesmo tempo, as importações dispararam, aumentando 203% entre 1989 a 2001, enquanto as exportações só expandiram 69% no mesmo período. Entre as mudanças estruturais na economia nacional, houve um aumento na participação da agricultura e da extração mineral no total produzido pelo país e forte queda na participação da indústria de transformação na economia. A necessidade de poder conter a enxurrada de dólares para fora do país fez com que o governo aumentasse a taxa de juros básica para atrair capital estrangeiro, o que fez com que os juros pagos pelo Estado passassem a equivaler cerca de 8 a 9% do PIB, segundo Cano (2007). De acordo com o mesmo autor, o aumento da dívida pública (tanto interna quanto externa), somada â necessidade de crescentes superávits primários para pagar os serviços da dívida, imobilizaram a capacidade do Estado em atender a população com serviços públicos, provocando a precarização em serviços como educação e saúde, por exemplo 55 Entretanto, Giambiagi (2005) avalia que no final da gestão de FHC, seu governo deixou como saldo positivo: I. Um tripé de políticas – metas de inflação, cambio flutuante e austeridade fiscal; II. Um elenco bastante robusto de mudanças estruturais importantes, como a Lei de Responsabilidade Fiscal, uma reforma parcial na Previdência Social, ajuste fiscal nos estados, o fim dos monopólios estatais nos setores de petróleo e telecomunicações, reinserção do Brasil no mundo através de obtenção de fluxos de investimento direto estrangeiro, certa autonomia por parte do Banco Central; Segundo Giambiagi (2005), as reformas (consideradas pelo autor como essenciais e de suma importância) não foram avaliadas corretamente pelo aumento constante no endividamento público em relação ao PIB, e pelo grande déficit em transações correntes. Isso tudo acarretou que a análise cética por parte dos investidores colocasse em xeque a capacidade de pagamento do Estado brasileiro; foi importante também um contexto externo negativo, destacando-se a grande crise na Argentina e os ataques terroristas em Nova York. Contudo, entendemos que essa análise não destaca que a abertura comercial e a entrada de investimento estrangeiro direto não se traduziram em crescimento econômico através da formação de capital fixo, como era esperado; ao contrário, sua consequência foi a transferência de propriedade de ativos que estavam em mãos do poder público e privado nacional para o setor privado internacional. Assim o Estado, que antes destas medidas liberalizantes tinha condições de exercer um papel mais ativo na economia, com um projeto a ser desenvolvido e seguido, passou apenas a ser um espectador do processo de desenvolvimento. Cabe mencionar que, apesar de outras mudanças na política econômica nos governos seguintes, estas medidas deixariam marcas duradouras. Como afirma Pochmann (2009), o país “(...) demonstrou nas últimas duas décadas 56 enorme incapacidade de combater o câncer da financeirização da riqueza que asfixia a produção e o trabalho desde a década de 1990”. Esta dificuldade prejudica a capacidade do país em ingressar na nova onda do desenvolvimento, que permite aos países em desenvolvimento (categoria esta que o Brasil faz parte) atingir crescimentos em torno dos 5-7%, comenta Pochmann (2009). O mesmo autor ainda afirma que o ajuste fiscal realizado entre 1994 a 2002, promoveu o “desajuste social”. Entre as consequências, Pochmann (2009) observa que o salário mínimo perdeu 50,9% de seu valor de compra no período, enquanto que o volume de desempregados cresceu 5 vezes no mesmo período. Os impactos negativos ocorridos no período também são mencionados por Cano (2005), que comenta que entre 1991 e 2000, segundo o DIEESE, a taxa de desemprego aberto na Região Metropolitana de São Paulo, saltou de 7,9% para 11,0% e a do desemprego oculto, de 3,8% para 6,6%, pulando portanto os totais de 11,7% para 17,6%. O autor também comenta a queda no rendimento médio anual do total dos trabalhadores assalariados do setor privado, a qual caiu 26,2% nesse período, enquanto que ados trabalhadores com carteira assinada caiu 25,3%. (...) a política neoliberal, iniciada por Collor em 1990 e aprofundada por Fernando Henrique Cardoso e mais tarde por Lula, conseguiu ainda mais diminuir a taxa anual de crescimento do PIB. A enxurrada de importações, as privatizações e os juros elevados completam o quadro para que o investimento privado se mantivesse baixo. A profunda deterioração das finanças públicas e a elevada carga de juros no orçamento deprimiram, por sua vez, o investimento público (Cano, 2005:210). Pochmann (2009) observa que a perda da dinâmica na economia brasileira veio acompanhado de enormes prejuízos de cunho social, como problemas estruturais na universalização das políticas de saúde, educação, habitação, saneamento básico, cultura, transporte, trabalho, dentre outras. O autor comenta, baseando-se no livro “Agenda não liberal da inclusão social no Brasil”25 , que a dívida social26 no Brasil atingiu no ano de 2004 a somatória de R$ 7,2 trilhões. 25 Ver POCHMANN, M. (Org.) ; BARBOSA, A. (Org.) ; SILVA, Ronnie (Org.) ; PEREIRA, M. A. (Org.) ; PONTE, V. (Org.) . Atlas de Exclusão Social - Agenda não Liberal da Inclusão Social. 1. ed. São Paulo: Cortez, 2005. v. 5. 168 p. 57 A piora nos índices sociais e o crescimento da pobreza também são comentadas por Graziano (2001): (...) [a pobreza] cresceu significativamente no período pós-real (1995/99) a uma taxa pouco menor que a do crescimento demográfico do período (população brasileira cresceu a uma taxa de 1,4% a.a. nesse período). Mas o mais surpreendente ainda, é que esse crescimento se deu fundamentalmente nas regiões metropolitanas, onde o número de pessoas pobres cresceu a uma taxa de 5% ao ano no período considerado (Gráfico 4). (...) as causas do crescimento da pobreza nas áreas metropolitanas após o Plano Real à deterioração no mercado de trabalho e ao crescimento do desemprego, uma vez que a maioria das áreas periféricas das regiões metropolitanas são “cidades dormitórios” (Graziano, J:20121). Vasconcellos (2002) observa que, apesar da recuperação do setor externo, e apesar de o país não dispor mais da trava cambial do primeiro mandato, não foi possível apresentar índices satisfatórios de crescimento no final do segundo mandato do presidente Cardoso. Apesar de ter uma política monetária comprometida com a estabilidade dos preços, o mandato de Fernando Henrique Cardoso se encerrou com a inflação em profunda aceleração. Mesmo adotando o tripé que é considerado o mais adequado em termos de política econômica – metas de inflação, superávit primário e taxa de cambio flutuante. É nesse quadro de instabilidade econômica que se fez a transição do Governo FHC para o Governo Lula (Vasconcellos, 2002: 489-90). A estabilidade sonhada não trouxe os resultados esperados, tampouco este novo modelo de Estado apresentou respostas eficientes para enfrentar os profundos problemas estruturais do país, como a desigualdade social e o desemprego. Por dívida social Pochmann (2009) se refere o que considera como “atraso nacional relativo aos oito principais complexos sociais”: educação, saúde, infraestrutura e habitação, cultura, informática, pobreza, previdência social, emprego e reforma agrária. 26 58 CAPÍTULO II - O GOVERNO DESENVOLVIMENTISMO? LULA: O RETORNO DO A eleição do presidente Luís Inácio Lula da Silva representou um novo paradigma para a história recente do país: não representou apenas a eleição de um líder sindical proveniente das camadas populares, mas sim a ascensão ao poder de um partido que durante anos evocou as necessidades de haver reformas políticas, econômicas e sociais profundas para que o Brasil alcançasse o desenvolvimento econômico com justiça social. O presidente Lula foi eleito através de uma coalizão que concentrava, além da oposição originariamente de esquerda, membros da elite industrial que havia sofrido fortemente com a abertura e com a desregulamentação da economia brasileira ao longo da década de 199027. Cardoso (2011) destaca que o caso brasileiro não fugiu a regra do que aconteceu em toda a América Latina: A primeira década do século XXI deixou evidentes as fraquezas do modelo de desenvolvimento liberal em proporcionar prosperidade econômica e equalização social no Brasil e na América Latina. (...) este modelo foi perdendo legitimidade, o que contribuiu, sobretudo a partir de 2002, para vitórias eleitorais de muitos governantes latinoamericanos que adotaram, em maior ou menor grau, proposições de políticas do tipo nacional-popular ou neodesenvolvimentistas, que haviam sido menosprezadas ao longo de praticamente 30 anos (Cardoso, 2011:487). Esta observação também é realizada por Moyo e Yeros (2011) que comentam que a tendência da financeirização da economia mundial a partir da década de 1980, juntamente com as deliberações do Consenso de Washington, foram nocivas para economia dos países periféricos, fazendo com que tais políticas neoliberais fossem amplamente contestadas, e que a questão nacional, isto é, o papel das nações no seu processo de desenvolvimento, fosse retomada. The new Washington Consensus set as its main objective to create the conditions for parasitic capitalism to penetrate the peripheries of 27 Cabe mencionar que a coalização que saiu vitoriosa em 2002 (PT, PL, PC do B, PMN e PCB) além de abraçar partidos de orientação tidas de “esquerda”, tinha um outro grande destaque: o PL (Partido Liberal), que indicou o então candidato a vice-presidência, o tradicional industrial de Minas Gerais, Jose Alencar. 59 the system. And even though new industrial centres sprouted in Asia, stagnation and regression took over much of the global South, while financial crises swept across both to throw ‘developing’ and ‘emerging’ economies into disarray. (...)At the turn of the century, these contradictions would mature: fundamentalism would strike indiscriminately at the symbols of financial and military power within the United States, and social movements would launch an ‘International’ of their own, the World Social Forum, and in some cases go further to radicalise states. We are now on the cusp of historical change. (...) The Washington Consensus has suffered setbacks within the West, evident in the serial interventions in the economy and nationalisations. Furthermore, despite the continued imposition of neoliberal demand, important steps are being taken in the South to reorganise the centre-periphery relationship (MOYO, S. e YEROS,2011: 15). Sendo assim, com esta nova tendência nacional, com esta retomada do Estado Nacional no seu papel de condutor do seu desenvolvimento econômico e social, surgiu o que alguns autores concebem como Novo Desenvolvimentismo ou neodesenvolvimentismo. 2.1 - O Novo Desenvolvimentismo Carneiro (2013) observa que o novo desenvolvimentismo surge como um contraponto as medidas neoliberais e esta corrente critica fortemente uma política macroeconômica consubstanciada em altas taxas de juros e moeda apreciada, destacando sua incompatibilidade com o crescimento e desenvolvimento econômico. O Novo Desenvolvimentismo, segundo análise de Carneiro (2013), critica o “velho” desenvolvimentismo no que se refere a sua ênfase excessiva no seu intervencionismo estatal e na política industrial. Considerando que a industrialização já estivesse num alto grau de maturação, o mais importante para que a economia se desenvolvesse seria garantir preços macroeconômicos adequados, com destaque para a taxa de câmbio competitiva. “Em síntese, o desenvolvimento econômico seria conseguido pelo manejo apropriado dos preços relativos – juros, câmbio e salários – por parte do Estado. O mercado faria o resto”, concluiu Carneiro, 2013:18. No que tange ao intervencionismo investimento em forma, também papel do Estado, postula-se que a postura de maior por meio da mobilização da poupança e do setores pesados estaria ultrapassada. Da mesma estaria superada a política industrial ativa. O 60 essencial seria o caráter regulador do Estado e a gestão macroeconômica com o correto estabelecimento dos preços macroeconômicos – juros e câmbio (Carneiro, 2013:20). De acordo com Bresser-Pereira (2012), este novo modelo de Estado se baseia nas ideias keneysianas da primeira metade do século XX, contudo, se diferencia no que se refere na capacidade deste Estado promover suas economias para participar da concorrência do capitalismo global, baseado nas boas experiências vivenciadas pelos países asiáticos. Este novo modelo de Estado é democrático, deve ser social e inclusivo, bem como apresenta importantes avanços no que o autor denomina como macroeconomia do desenvolvimento. O Estado novo-desenvolvimentista é uma forma de Estado adaptado ao capitalismo global, a um estágio do capitalismo onde a competição econômica entre as nações é fundamental. (...) O papel do Estado, nesse caso, é criar oportunidades de investimento, investir ele mesmo quando necessário e regular os mercados, os financeiros em particular, para assegurar o crescimento com estabilidade de preços e a estabilidade financeira (Bresser-Pereira, 2012:823). Bresser-Pereira é um dos pioneiros em conceber este novo desenvolvimentismo diferente daquele aplicado no século XX, contrapondo-o tanto ao consenso de Washington quanto ao antigo desenvolvimentismo. Em 2010 é lançado o um documento a respeito das “Dez Teses sobre o Novo Desenvolvimentismo”,28 assinado por 80 dos principais economistas do desenvolvimento no mundo. O novo desenvolvimentismo, segundo Bresser-Pereira (2012) tornou-se, uma estratégia alternativa ao consenso de Washington e ao antigo desenvolvimentismo. Segue abaixo quadro comparativo que realiza uma breve comparação entre o novo, velho desenvolvimentismo e ortodoxia liberal, tendo como base Bresser-Pereira (2012). Ver “Dez Teses sobre o Novo Desenvolvimentismo”. Acessado em 01/10/2013. Disponível em <http://www.tenthesesonnewdevelopmentalism.org/theses_portuguese.asp> 28 61 TABELA 9 - QUADRO COMPARATIVO NOVO DESENVOLVIMENTISMO, ANTIGO DESENVOLVIMENSTISMO E ORTODOXIA LIBERAL ITENS ANTIGO NOVO ORTODOXIA DESENVOLVIMENTISMO DESENVOLVIMENTISMO NEOLIBERAL O desenvolvimentismo Era aplicado aos países ESCOPO novo aplica-se que estavam começando renda sua revolução industrial. a média países de que já completaram sua revolução capitalista O ESTADO NA PRODUÇÃO ao Estado papel importante um um papel ativo do Estado na aos setores monopolistas produção. ou pretende ser aplicável a todos os tipos de países.. novo desenvolvimentismo limita atribuía A ortodoxia liberal quase monopolistas, (infraestrutura, mineração A ortodoxia liberal não lhe atribui papel algum nesta questão. e serviços públicos). A ortodoxia liberal limita o papel do FUNÇÃO ESTRATÉGIC A DO ESTADO Atribuem um papel estratégico ao Estado na definição, em conjunto com a sociedade, de uma estratégia desenvolvimentista nacional e, em sua implementação. Estado a garantir os direitos de propriedade e os contratos e a de defesa da concorrência. O novo desenvolvimentis PLANEJAME NTO O antigo desenvolvimentismo atribuía um papel fundamental ao planejamento econômico. A ortodoxia liberal rejeita-o mo divide economia a em setor competitivo e em setor monopolista O antigo, o novo desenvolvimentismo e a ortodoxia liberal recomendam déficits orçamentários limitados para os momentos de crise. Os três RESPONSAB ILIDADE FISCAL. defendem, portanto, a responsabilidade fiscal, mas, enquanto os desenvolvimentistas estão sempre ameaçados por uma visão vulgar do keynesianismo que recomenda o aumento da despesa pública para quase todas as dificuldades, a ortodoxia liberal está ameaçada por uma visão também vulgar, a qual recomenda corte da despesa pública como uma espécie de panaceia. 62 O TAXA DE O antigo desenvolvimentismo JUROS E dava pouca atenção à taxa de TAXA DE juros e à taxa de câmbio e CÂMBIO. enfatizava a política industrial novo A ortodoxia desenvolvimentismo liberal também afirma que, nos países não em desenvolvimento, a atenção a esses taxa de juros tende a preços ser muito alta e a taxa macroeconômicos de câmbio, cíclica e porque cronicamente determinados pelo sobrevalorizada mercado. O DOENÇA HOLANDESA . presta são novo O antigo desenvolvimentismo desenvolvimentismo, tinha uma intuição da doença por sua vez, define com holandesa e procurava clareza neutralizá-la por meio holandesa, de . a doença vendo-a regimes de taxa de câmbio como uma múltiplo, ou combinação de sobreapreciação tarifas de importação. permanente da taxa de A ortodoxia liberal a ignora. câmbio Supõe O antigo desenvolvimentismo não acredita na possibilidade WAGE-LED X de EXPORT-LED desenvolvimento ( países bens em exportarem manufaturados - defendia a substituição de importações estar a Ignora a estratégia de discussão e substituição de afirma que a lei importações esgotada das vantagens há muito para países de comparativas do renda média e que o comércio coeficiente de internacional importações deve ser determinará o razoavelmente constante. modelo de crescimento. O mercado, se funciona bem, tende a levar a TAXA DE CÂMBIO COMPETITIV A. Não prestava atenção à necessidade de uma taxa de câmbio competitiva estava voltado mercado interno. porque para o taxa de câmbio para o Supõe que a taxa equilíbrio corrente mas, de câmbio quando há doença determinada pelo holandesa, a verdadeira mercado é taxa de câmbio de normalmente equilíbrio, a taxa competitiva. competitiva, é a de “equilíbrio industrial” 63 O INFLAÇÃO novo desenvolvimentismo Não vê razão para concorda os com visão países em a teoria da inflação estrutural, neoliberal, e se o país desenvolvimento baseada já é um país de renda apresentarem oferta e aceitava uma inflação média, taxas de inflação de até 20% ao ano. caso, os gargalos de acima abastecimento padrões em gargalos de pois, deixaram neste já de ser dos internacionais. relevantes. Supõe que a indústria Defendia tarifas alfandegárias PROTEÇÃO altas e taxas de câmbio X TAXA DE múltiplas a fim de proteger as CÂMBIO. indústrias que assumiam serem “indústrias nascentes”. de transformação de países de renda média não é mais infante e Rejeita não vê razão para a tipo de proteção. proteção, mas qualquer exige uma taxa de câmbio competitiva. O RESTRIÇÃO EXTERNA E POUPANÇA EXTERNA. Acreditava na existência de uma restrição estrutural novo apoia tal tese, desenvolvimentismo porque afirma que o problema interessa, por um das elasticidades nunca lado, foi fundamental e perde déficit em conta- importância à medida corrente crônico, que o país passa a portanto câmbio exportar cronicamente produtos que haja externa para o crescimento manufaturados: econômico – uma escassez restrição ou escassez por permanente crônica de dólares só que os países em existe porque a taxa de desenvolvimento câmbio sejam financiados tende a a a ser cronicamente sobreapreciado e, por outro lado, meio sobreapreciada nos empréstimos países em investimentos desenvolvimento. diretos. de e 64 O novo desenvolvimentismo rejeita TAXA DE Aceitava o regime de taxa de CÂMBIO câmbio FIXA OU Bretton Woods e defendido FLUTUANTE fixa definido em por Keynes. a rígida A ortodoxia liberal alternativa “fix or float”, pede o free float recomenda a compra e que, venda de reservas, os supostamente, controles de capital e, acabaria com para possibilidade neutralizar a doença holandesa, um a de crises financeiras. imposto variável sobre as exportações. O novo desenvolvimentismo DESENVOLVI MENTO SOCIAL O antigo desenvolvimentismo geralmente era geralmente parte de uma implementado estratégia de desenvolvimento novas democracias e de um regime autoritário que pretende ser também estava envolvido na revolução um desenvolvimentismo nacional e industrial do país. “social” Defendia desenvolvimentismo uma melhor é em – distribuição de renda, mas não que tinha uma política de bem- preocupado estar social. distribuição um também está com a A ortodoxia liberal está apenas preocupada com o livre comércio supondo que o mercado cuidará do resto. mais igualitária de benefícios na sociedade. Para Mercadante (2010a), o Novo Desenvolvimentismo é alicerçado na participação popular, na ampliação do mercado interno de consumo de massa e na inclusão social. Segundo Araújo (2006) foi no que se refere a noção de Estado que o novo desenvolvimentismo se diferencia em relação ao antigo desenvolvimentismo. De acordo com autor, o papel importante das empresas estatais (como Petrobrás, Infraero, Caixa Econômica, etc) foram chaves para o sucesso das políticas públicas do governo novo desenvolvimentistas. Para justificar sua tese, Araújo (2006) confirma a existência de duas tendências distintas no que se refere ao papel das empresas estatais: num primeiro momento (1995-2002) verificou-se uma significativa redução do 65 número de empresas estatais e, consequentemente, da quantidade de empregados e do volume de dispêndio global. Num segundo momento (2003-2010) foi marcada pelo crescimento do número de empresas estatais, ampliando assim sua força de trabalho, bem como seus gastos totais, o que teve papel fundamental para minorar os efeitos da crise internacional recente no Brasil. Além das estatais, destaque-se também a discussão a respeito da atuação dos bancos públicos federais no sistema econômico, sobretudo para manutenção do ciclo de crescimento (...) a função de direcionamento de crédito para setores econômicos, tais como o industrial, o rural e o imobiliário, bem como para as diversas regiões do país. (...) Ao lado, por sua vez, das estatais e dos bancos públicos, os fundos de pensão e públicos são considerados, importantes instrumentos governamentais à disposição potencial do Estado para fins de planejamento. No caso dos fundos públicos do governo federal, ressalte-se a discussão a respeito dos instrumentos que o Estado brasileiro dispõe para realizar determinadas políticas públicas (Cardoso, 2011: 506) Outra característica que merece importante destaque, comentada por Mercadante (2010a), é a mudança na inserção externa do Brasil no contexto mundial, o que o autor classifica como “soberana”. Segundo o mesmo autor, a inserção externa do país concebida no governo FHC (orientada pelos ditames liberais e na crença do livre mercado) fez com que o Brasil perdesse importância relativa no comércio global, a redução do protagonismo regional e internacional do país. (...) tal política enfraquecia a capacidade do Estado Nacional de formular e implementar diretrizes e ações destinadas à conformação de um novo ciclo de desenvolvimento e de um maior protagonismo internacional do Brasil (Mercadante, 2010b:32) Mercadante (2010a) afirma que no governo Lula este ciclo foi rompido, com o aumento substancial dos parceiros comerciais do Brasil no mundo, permitindo que o país apresentasse sucessíveis superávits comerciais, além do crescimento mundial e do aumento das commodities. Ele ainda não se resume a questão comercial, mas ainda afirma um outro papel importante que o Brasil apresentou no governo Lula, de ser um dos porta-vozes dos países emergentes e de incentivar e fomentar a Relação SUL-SUL. Já no que se refere a análise dos fundos públicos como instrumentos de planejamento e execução do desenvolvimento não são triviais, como 66 demonstra Cardoso (2011). Para ele, os fundos permitem alocação de recursos para o planejamento de longo prazo e execução de políticas públicas em prol do investimento produtivo e, possivelmente, do desenvolvimento nacional. (...) a necessidade de aprofundamento das análises e dos estudos a respeito do papel que tais fundos desempenham no sistema econômico e dos impactos das políticas públicas viabilizados por eles. Tarefa esta que se mostra não trivial, haja vista os diferentes setores econômicos e sociais que são – ou poderiam ser – beneficiados por este tipo de política, tanto de forma direta quanto indireta. Em especial, o montante e o perfil dos recursos financeiros mobilizáveis pelos fundos públicos mostram-se instrumentos de políticas públicas não desprezíveis, no âmbito estatal brasileiro, para a montagem de arquiteturas de gestão e financiamento direto do desenvolvimento, talvez mais atuantes e adequadas do que aquelas atualmente vigentes, ainda mais quando se leva em conta as ainda perversas condições de vida de grande parte da população brasileira (Cardoso, 2011: 506) Para Cardoso (2011) o Governo Lula utilizou recursos provenientes de fundos públicos para a alocação de recursos e financiamento (principalmente de longo prazo) de programas e ações de seu governo; ou seja, para o autor, o governo Lula utilizou como ferramenta (ou melhor, financiamento) os recursos provenientes dos fundos públicos para executar seus projetos e ações de governo. Contudo, há críticas em relação ao novo desenvolvimentismo. De acordo com Gonçalves (2012), esta nova concepção de Estado defendida não passa de uma falsa inflexão do processo de desenvolvimento econômico, e as mudanças que o Brasil vivenciou durante o governo Lula são apenas “mote de campanha” de seu governo; apenas se diferenciam do fraco desempenho da economia nos anos do governo FHC, analisa Gonçalves (2012). Gonçalves (2012) comenta ainda a criação de uma espécie de “desenvolvimentismo às avessas”, destacando a ausência de transformações estruturais que podem caracterizar um processo de transformação baseada no desenvolvimentismo. Durante o governo Lula os eixos estruturantes do nacional‑ desenvolvimentismo foram invertidos. O que se constata claramente é desindustrialização, dessubstituição de importações; reprimarização das exportações, maior dependência tecnológica, maior desnacionalização, perda de competitividade internacional, crescente vulnerabilidade externa estrutural em função do aumento do passivo externo financeiro, maior concentração de capital; e crescente dominação financeira, que expressa a subordinação da política de desenvolvimento à política monetária focada no controle da inflação (Gonçalves,2012:638). 67 O autor ainda concebe este novo modelo de Estado muito distinto do original nacional-desenvolvimentista e ainda concebe que o novo desenvolvimentismo tem uma espécie de “liberalismo enraizado”; e que vai ao encontro de muitas medidas defendidas pelo Consenso de Washington, além de incorporar elementos que estão presentes numa concepção liberal de desenvolvimento, como um crescimento liderado pelas exportações (export‑ led growth) e ênfase na estabilidade macroeconômica. A crítica dos novos desenvolvimentistas ao “tridente satânico” (superávit primário, juros, altos e câmbio flutuante) não os impedem de defender equilíbrio fiscal e taxa de câmbio competitiva, que são diretrizes básicas do Consenso de Washington. O mesmo ocorre com a liberalização comercial e produtiva (investimento estrangeiro direto). O novo desenvolvimentismo aproxima‑ se também do Pós‑ Consenso de Washington ao enfatizar reformas centradas na correção de falhas de governo e de mercado (Gonçalves, 2012:664). 2.1- Governo Lula – Alguns Resultados e Considerações Conforme demonstrado anteriormente neste trabalho, o Governo Lula evocou para si o “Novo Desenvolvimentismo”, isto é, um “novo conceito de Estado”, onde este é alicerçado no aumento do mercado de consumo de massa, participação e inclusão social (Ver Mercadante, 2010b). Contudo, de acordo com Cano (2012), Giambiagi (2011), Vasconcellos (2008), Leite (2012), Schincariol (2012), dentre outros, o Governo Lula nos seus dois mandatos pode ser dividido em dois momentos: primeiro, com o Ministro Antônio Palocci no comando do Ministério da Fazenda, onde se observou uma certa continuidade nas ações e nos programas ainda implantados no governo anterior (tendência na continuidade de políticas neoliberais); num segundo momento, com Guido Mantega a frente Ministério da Fazenda, com medidas e ações com tendência a um Estado mais “intervencionista” na economia, promovendo um menor superávit primário e defendendo uma taxa básica de juros menor, por exemplo. Apesar de o Governo Lula ter sido historicamente ligado às bandeiras do Partido dos Trabalhadores, que, em suma, contestava há décadas questões ligadas principalmente a maneira como o Estado deve se comportar em relação 68 ao pagamento de sua dívida externa, mercado de juros e etc, já no ano de 2002 o então candidato a presidente Lula fez questão de afirmar que não iria fazer nenhuma mudança de rota que pusesse em risco a estabilidade econômica do país. De fato, a escolha de Henrique Meirelles, ex- presidente do Banco de Boston e deputado federal eleito pelo PSDB, para a presidência do Banco Central e a nomeação de Antônio Palocci, ex-prefeito de Ribeirão Preto, para o Ministério da Fazenda, reforça a decisão de atuar com firmeza no combate à inflação e o rigor no ajuste fiscal. Para Giambiagi (2011), o Governo Lula “rompeu com a ruptura”29, e a mudança do PT foi de caminho para “politicas de centro”. O autor relaciona três importantes documentos lançados pelo PT que confirmam esta tese: 1. Carta ao Povo Brasileiro: lançada em junho de 2002, confirma o proposito do futuro Governo Lula em preservar o superávit primário; 2. Plano de Governo: a campanha do candidato a presidência Lula, apresentou um documento final muito mais moderado, defendendo alguns pontos que viam ao encontro do mercado, tais como compromisso de pagamento da dívida externa e superávit primário; 3. Nota sobre o Acordo com o FMI: lançado em agosto de 2002, este documento confirmava a disposição do então candidato à presidência em assumir e respeitar o acordo com o FMI realizado no final do governo anterior; Giambiagi (2011) ainda relaciona as seguintes ações que representaram uma mudança clara em relação as bandeiras históricas defendidas pelo PT, e que permitiram, segundo o autor, uma menor desconfiança por parte do mercado internacional ao novo governo. Nomeação do ex-presidente mundial do Bank Boston Henrique Meirelles para o Banco Central e manutenção de toda diretoria o Banco Central anterior; Anuncio Metas de Inflação para 2003 e 2004, de 8,5% e 5,5% respectivamente; 29 Giambiagi, 2011:197. 69 Aumento da meta do superávit primário, passando de 3,75% para 4,25% do PIB em 2003; Ordenou cortes do gasto público para viabilizar o objetivo fiscal; De acordo com Leite (2012) o governo propôs importantes avanços na área microeconômica nesta primeira fase do governo. Estas propostas ganharam destaque, uma vez que, devido à luta contra a inflação, a política econômica dos governos anteriores estava focada essencialmente em questões macroeconômicas. Segundo o autor, a agenda microeconômica, elaborada pela equipe comandada pelo Secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Marcos Lisboa, previu diferentes medidas, dentre elas podemos destacar: a instituição de operações de crédito consignado em folha de pagamento; a definição de patrimônio de afetação (somente o patrimônio da empresa responde por suas dívidas, impedindo que empreendimentos imobiliários, por exemplo, fossem bloqueados em caso de falência da construtora ou incorporadora); a facilitação do mecanismo de alienação fiduciária de imóveis e veículos; a separação do valor incontroverso, do valor reclamado na justiça, o que permite que somente seja questionada a parte controversa e liberada a parte incontroversa; a instituição do sistema de informação de crédito do Banco Central, que ajuda na simetria de informações sobre o histórico dos tomadores de crédito; o fim da cumulatividade do PIS/PASEP e do Cofins; as alíquotas decrescentes de Imposto de Renda nas aplicações de longo prazo; o incentivo ao microcrédito; a nova Lei de Falência, que busca a recuperação da empresa falida ao invés de sua liquidação; 70 a Lei das Parcerias Público-Privadas, que permite a participação da iniciativa privada nos investimentos públicos; a abertura do mercado de resseguros; a instituição de instrumentos de crédito e securitização do mercado imobiliário, que permite alongar os prazos de financiamento e facilitar o acesso a fontes de recursos para investimentos de longo prazo. Giambiagi (2011) comenta que, entre as reformas estruturais introduzidas pelo Governo Lula indicavam uma forte continuidade com o Governo anterior (FHC). Entre essas propostas, o autor destaca: O envio ao Congresso uma proposta de reforma tributária; Em paralelo ao projeto anterior, uma proposta de reforma da Previdência Social; A reforma tributária enviado pelo Governo ao legislativo visava quatro objetivos: i. Uniformizar a legislação de ICMS; ii. Prorrogar a desvinculação de Receitas da União (DRU); iii. Renovar a CPMF visando evitar a queda na receita do Estado no ano de 2004; iv. Transformar a COFINS em um tributo baseado no valor adicionado, não mais “em cascata”; Já na reforma proposta para a Previdência Social, ela basicamente se concentrou no regime dos servidores públicos, incluindo: i. Taxação a servidores inativos; ii. Aplicação de um redutor para os novos pedidos de benefícios; iii. Fixação de idade mínima para aposentadoria, sendo de 60 anos para homens e 55 anos para mulheres; iv. Definição do mesmo teto de benefícios do INSS para beneficio dos novos entrantes, com a possibilidade da criação de fundos de pensão com intuito de complementar o beneficio; 71 Segundo Giambiagi (2011), Carneiro (2009) e Schincariol (2012) o Brasil nos anos do Governo Lula se beneficiou fortemente com os bons resultados da economia global. De acordo com Carneiro (2009) e Schincariol (2012) o Brasil, assim como os demais países emergentes, manteve um crescimento de quase 5% a.a. entre os anos de 2004-2008, devido em grande parte do crescimento da demanda de commodities dos países asiáticos, que demandaram produtos primários para manter seu crescimento econômico, sendo o Brasil um dos grandes beneficiados. Teixeira (2012) analisa que os resultados no que se refere a expansão do produto foram muito maiores nos dois mandatos do Governo Lula que do seu antecessor: “Entre 2003 e 2010, o Brasil atravessou o maior ciclo de crescimento das últimas três décadas. O PIB cresceu 4,1% ao ano, quase o dobro do observado entre 1980 e 2002 - 2,4% ao ano”(Teixeira, 2012:923). Cano (2010), assim como Giambiagi (2011), observam que durante os primeiros anos do Governo Lula o que foi verificado foi uma continuidade do Governo anterior, em relação a políticas de manutenção do superávit primário, metas de inflação com câmbio flutuante, superávit fiscal, visando principalmente o controle inflacionário e ajuste fiscal. Giambiagi (2011) analisa que durante os primeiros anos do Governo Lula, apesar de grande resistência por parte de seus correligionários, a política fiscal do Governo foi muito mais contracionista que no Governo anterior. “Em que pese a obtenção de superávits primários relativamente robustos, o rigor da política monetária se traduziu em despesas expressivas com o pagamento de juros, num primeiro momento” (Giambiagi, 2011: 214). Contudo, o autor observa uma mudança significativa no rumo da política econômica após a substituição do Ministro Palocci pelo professor Guido Mantega. Entre as mudanças ocorridas em sua gestão, Giambiagi (2011) destaca que: Aumento do gasto público no pagamento de servidores no segundo mandato do Governo Lula; Afrouxamento no superávit primário; 72 Divergências claras entre as medidas adotadas pelo Banco Central e as defendidas pelo Ministério da Fazenda acerca da condução da política monetária; Aumento substancial da importância e do papel do BNDES na economia; TABELA 10 - INDICADORES ECONÔMICOS - ECONOMIA BRASILEIRA (2003-2010) TAXA DE DIVIDA TAXA DIVIDA VARIAÇÃO TAXA CÂMBIO GOVERNO ANO SELIC INTERNA COTAÇÃO PIB MEDIA FEDERAL REAL (% PIB) R$/US$ (em reais) (% PIB) 2003 1,1 12,9 3,1 43,7 24,7 -18,2 2004 5,7 8,0 2,9 42,7 24,6 -8,1 2005 3,2 12,6 2,4 45,2 28,7 -11,8 2006 4,0 11,6 2,2 48,4 33,0 -8,7 2007 6,1 7,1 1,9 53,0 38,7 -17,2 2008 5,2 6,2 1,8 49,5 35,8 31,9 2009 -0,6 5,4 2,0 52,0 39,2 -25,5 2010 7,5 3,6 1,8 50,0 37,8 -4,3 Fonte: Giambiagi (2011) - Apêndice Estatístico (Dados Selecionados) Teixeira (2012) observa uma mudança do crescimento econômico no último ano do primeiro mandato do Governo Lula (2006), verificado no restante do seu mandato: A partir de 2006 (último ano do primeiro governo Lula) e ao longo do segundo mandato de Lula, irá somar-se aos fatores externos a importante expansão do mercado interno, decorrente de certa flexibilização da orientação contracionista da política econômica. Essa flexibilização, associada às benesses externas, criou uma expansão econômica sustentada pelos investimentos e consumo das famílias (crescimento médio entre 2007 e 2010 de 10,5% e de 5,8%, respectivamente) que parece ter criado a partir de 2006 um consumo de massas o qual articula crescimento e distribuição de renda (Teixeira, 2012:926). O autor ainda observa que a implementação de políticas anticíclicas em decorrência da crise econômica global iniciada em 2008, com aumento significativo no crédito disponível. Neste período, o mercado interno foi estimulado: crédito expandiu-se de 26,1% do PIB para 45,2% do PIB; foram adotadas também outras medidas de desoneração fiscal, objetivando incentivo a produção e consumo de massa e diminuição da taxa de juros SELIC a partir 73 de janeiro de 2009 que passou de 13,75% a.a. para 8,75% a.a. em junho de 2009. Vasconcellos (2002) analisa que a expansão do consumo das famílias no Governo Lula, pode ser explicada por dois motivos: uma forte expansão das transferências às pessoas por meio de programas assistenciais e uma forte expansão do crédito para pessoa física. TABELA 11 - CRESCIMENTO DO PIB ENTRE 2003 A 2010 VARIÁVEL 2003-2006 2007-2010 2003-2010 CONSUMO TOTAL 3,0 5,3 4,1 CONSUMO DO GOVERNO 2,5 3,9 3,2 CONSUMO DAS FAMÍLIAS 3,2 5,7 4,4 FBCF 4,3 9,0 6,6 EXPORTAÇÕES 10,0 1,7 5,8 IMPORTAÇÕES 9,7 13,6 11,6 PIB 3,5 4,5 4,0 FONTE: GIAMBIAGI, 2011: 223 Entre as medidas lançadas pelo Governo Federal para combater os efeitos da crise econômica, e ainda tentar resolver os problemas de infraestrutura no país, o Plano de Aceleração do Crescimento (PAC), um plano de investimentos para o período 2007-2010. O PAC contou com um orçamento de R$ 504 bilhões, sendo R$ 275 bilhões para a área de infraestrutura energética, R$171 bilhões para a área de infraestrutura social e urbana e R$ 58 bilhões para a infraestrutura logística. De acordo com próprios dados do Governo, publicados no “Balanço 4 anos” do PAC30, os resultados positivos do PAC permitiram uma melhor expansão do crescimento da economia entre 2007-2010 (4,5% a.a.), dobrando a taxa de investimento do Setor Público (passa de 1,6% para 3,27% do PIB), além do impacto positivo no saldo líquido de geração de empregos acumulado no período do PAC: 8,2 milhões. A taxa de desemprego de outubro de 2010 foi a menor observada em toda série histórica do IBGE até esse momento: 6,1%. 30 COMITE GESTOR DO PAC. Balanço 4 Anos 2007 a 2010. Brasília, 2010. Disponível em < http://www.pac.gov.br/pub/up/relatorio/6c57986d15d0f160bc09ac0bfd602e74.pdf> Acessado em 15/09/2013. 74 As observações realizadas por Vasconcellos (2002) e Teixeira (2012) são confirmadas pelos dados apresentados por Giambiagi (2011), que mostra um considerável avanço no gasto de Famílias em relação ao PIB entre os anos de 2007 a 2010, além de também ser observável um aumento considerável do gasto do Governo no mesmo período, que cresceu a uma taxa de 6,4% a.a. entre os anos de 2005-2010, muito abaixo do crescimento verificado entre os anos de 2003-2004, onde o aumento foi apenas de 2,2% a.a. Giambiagi (2011) destaca a existência de um aumento considerável nos gastos do governo, fortemente baseada nas transferências diretas a indivíduos (aposentadorias, aumentos reais do salário mínimo, seguro desemprego e Bolsa Família), e analisa que implicou num importante impacto no aumento do consumo. De acordo com Secretaria de Assuntos Estratégicos (2012), nos últimos 10 anos, 35 milhões de pessoas entraram na classe média, parcela da população que passou de 38% da população, em 2002, para 53%, em 2012, somando hoje mais de 100 milhões de brasileiros. Segunda a pasta, quatro fatores foram determinantes para ascensão da classe média no período: DEMOGRAFIA: observou-se no período de 2002 a 2012 um envelhecimento da população, fazendo com que o número de pessoas dependentes (isto é, aqueles que não estão aptos a trabalhar e a gerar renda) diminuísse, ou seja, a renda per capita cresceu à medida que se reduz a razão de dependência demográfica das famílias. Este fator contribuiu com menos de 20% do crescimento na renda da classe média. TRANSFERÊNCIAS: trata-se da ampliação dos programas de transferência de renda (Programa Bolsa Família) e da consolidação de outras transferências, como o Benefício de Prestação Continuada (BPC) e a previdência rural. Segundo a Secretaria de Assuntos Estratégicos, 30% da ascensão da classe média decorreram da expansão das transferências governamentais. ACESSO AO TRABALHO: mais de ¾ da renda das famílias que compõem a classe média ainda provê do trabalho. No período de 2002 a 2012 a porcentagem dos adultos na classe média que se encontravam 75 ocupados (taxa de ocupação) cresceu ligeiramente, passando de 60% para 64%, fazendo com que o acesso ao trabalho contribuísse com pouco mais de 10% da ascensão da classe média. GANHOS DE PRODUTIVIDADE: a renda do trabalho tem dois determinantes imediatos: o acesso e a produtividade. Segundo Secretaria de Assuntos Estratégicos (2012), na última década, a remuneração média dos trabalhadores ocupados que pertencem à atual classe média cresceu 1,7% ao ano, permitindo assim que o fator “Ganhos de Produtividade” representasse 40% do crescimento ocorrido na renda da classe média e são, assim, o determinante imediato mais importante para o aumento da renda da classe média brasileira. TABELA 12 - PIB SETORIAL E TOTAL - TAXAS MÉDIAS DE CRESCIMENTO PERÍODO 1989-2001 2001-2006 2007 2008 2009 2010 2006-2010 PIB TOTAL 2.2 3.0 6.0 5.2 -0.3 7,5 4,6 PIB AGRICOLA 3.8 3.9 4.8 6.3. -3.1 6.3 3.5 PIB INDUSTRIAL 1,4 3,2 5,3 4.1 -5.6 10.4 3.4 PIB SERVIÇOS Fonte: Cano, 2012: 7 2,4 3,2 6,1, 4,9 2,1 5,5 4,6 Cano (2012) reforça o conceito de que o consumo interno foi aquecida devido a intensificação das políticas de transferência de renda e também da concessão de crédito destinado a pessoa física. (...) foram as decisões de expandir o financiamento público ao investimento (público e privado) e o terceiro decorre da grande expansão gerada pelo setor exportador, em que pese que as importações, a partir de 2005, cresceram mais que as exportações. Foram esses fatores que permitiram um avanço maior na renda e no emprego, expandindo a demanda de consumo e o investimento (Cano, 2012:6). Contudo Cano (2012), assim como Schincariol (2012), consideram que apesar da expansão do crédito, e da queda considerável na taxa SELIC, a tendência de desindustrialização foi observada em todo o período. De acordo com ambos os autores, apesar da considerável melhoria do crescimento econômico, no ganho real do salário mínimo, e expansão do mercado de trabalho, as politicas adotadas não conseguiram promover mudanças estruturais na economia brasileira. 76 Cano (2012) analisa que não adianta que o governo realize uma série de desonerações fiscais, e que incentive o crédito, sem ter “cuidados” e atenção referente a sua política macroeconômica. O autor comenta que com uma taxa de juros não competitiva, com uma política cambial valorizada, com alto nível de abertura da economia, não há política industrial que possa reverter a tendência da desindustrialização. TABELA 13 - EXPORTAÇÕES SEGUNDO FATOR AGREGADO(%) ANO BÁSICOS SEMIMANUFATURADOS MANUFATURADOS 1964 85.4 8.0 6.2 1980 42.2 11.7 44.8 1985 33.3 10.8 54,9 1990 27.8 16.2 54,2 1995 22.9 20.8 56.2 2000 23,4 15,8 60,7 2006 29,9 14,5 55,6 2007 32,8 13,9 53,5 2008 37,9 13,8 48,1 2009 41,4 13,7 45 2010 45,5 14,3 40,2 Fonte: Cano, 2012:12 Cano (2012) e Schincariol (2012) observam uma tendência verificada na economia do país, que se refere ao fato das commodities terem grande peso sua pauta de exportação, e uma perda considerável na participação dos produtos industrializados. Ou seja, os autores analisam que apesar da melhoria do crescimento econômico, políticas de expansão do crédito, aumenta da demanda interna, a estrutura da economia não melhorou, ou pior, retrocedeu no que se refere a perda do setor industrial na participação de todo o PIB nacional. 2.3. A Questão Social Segundo Fagnani (2011), em um relatório da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), foi ressaltado que jamais se viu pobreza e a desigualdade caírem tão depressa como no Brasil. Entre os 77 fatores para tal, o mesmo documento, destaca a importância do crescimento econômico e do Programa Bolsa Família. De acordo com Mercadante (2010b), “A população em condição de pobreza diminuiu em mais de 30%, passando, como proporção da população total, de 32,6%, em 2002, para 21,4%, em 2009” (Mercadante, 2010b:166). Segundo descrição do próprio Ministério do Desenvolvimento Social (MDS), o Programa Bolsa Família é um programa de transferência direta de renda que beneficia famílias em situação de pobreza e de extrema pobreza em todo o país, e está baseada na garantia de renda, inclusão produtiva e no acesso aos serviços públicos. Kerstenetzky (2009) destaca os avanços obtidos no combate da desigualdade social no Brasil. Ela afirma que ao analisar os indicadores do índice Gini, entre os anos de 2001 a 2006, o índice que girava em torno de 0,6, passou para 0,56, uma variação negativa de 6% no período. Para a autora, o motivo de redução é baseado em dois pontos: (I) numa política de valorização do salário mínimo; (II) efetivação dos programas sociais de transferência de renda, em destaque, o Bolsa Família. No que se refere a questão da criação de novos postos de trabalho, durante os dois mandatos do Governo Lula, o aumento na geração de novos postos de trabalho foi de 139%, o ganho do salário mínimo real cresceu 60% no mesmo período, conforme demonstrado no gráfico abaixo. GRÁFICO 1 - EMPREGO E SALÁRIO MÍNIMO REAL (2003-2010) 160% 140% 139% 120% 100% Emprego 80% 60% 60% 40% 20% 0% Fonte: IPEADATA Figura 1 - EMPREGO E SALÁRIO MÍNIMO (2003-2010) Salário Mínimo Real 78 Fagnani (2011) também concorda com o importante papel da geração de postos de trabalho como fator preponderante para redução da desigualdade, e comenta que, em termos reais, o salário mínimo dobrou entre os anos de 2001 a 2011. O autor confirma ainda que a sinergia entre crescimento econômico e aumento dos gastos sociais foi essencial para a redução da desigualdade social: O ciclo de crescimento aliviou os indicadores macroeconômicos. A arrecadação de impostos cresceu e a dívida pública líquida declinou (de 60% para 40% em relação ao PIB). Da mesma forma, as fontes de financiamento das políticas sociais - ancoradas na folha de salário do trabalho formal - foram impulsionadas. A Previdência Urbana voltou a ser superavitária - o que não ocorria desde 1996. Esse cenário abriu espaços para o crescimento do gasto social federal que duplicou, em termos reais, entre 2000 e 2009; em proporção do PIB, passou de 12,5% para 15,8%; o gasto per capita cresceu de R$ 1600,00 para R$ 2.800,00 (Fagnani, 2011:06). No que tange as questões relacionadas ao mercado de trabalho, Krein (2012) observa que durante os dois mandatos do Governo Lula, o que se verificou foram movimentos contraditórios: enquanto se observava alguns avanços na regulamentação do mercado de trabalho, observa-se também movimentos em favor da flexibilização do mesmo, tendência esta iniciada ainda no governo anterior. (...) há movimentos contraditórios que mostram possibilidades de algum avanço na regulação pública trabalhista, mas continua havendo um movimento que tende a aprofundar a flexibilização do trabalho. Insere-se a lógica determinada pelas mudanças mais estruturais de um capitalismo globalizado e financeirizado, tendendo a fragilizar a regulação pública e fortalecer soluções autônomas, com aumento do poder discricionário dos empregadores em determinar as condições de uso e remuneração do trabalho. A flexibilização avança com a terceirização, a subcontratação, a contratação como pessoa jurídica, a permanência de alta ilegalidade, informalidade e rotatividade (Krein, 2012:15). Para o autor, entre as medidas que indicavam tendência a flexibilização do mercado de trabalho: CRÉDITO CONSIGNADO: Autoriza a concessão de empréstimos, pelos bancos, a empregados e aposentados, mediante o desconto salarial a ser processado pelo empregador ou Previdência Social. A inovação afronta o princípio da intangibilidade salarial. 79 LEI DO PRIMEIRO EMPREGO: Concede incentivos fiscais para as empresas que contratam jovens, permitindo a contratação de jovens por prazo determinado, desde que por um período mínimo de 12 meses. Recomenda que as empresas devem evitar a substituição de trabalhadores. Limita a 20% do seu quadro de pessoal os contratados pelo programa; REFORMA PREVIDENCIÁRIA: Extingue o regime de previdência pública para os servidores públicos admitidos a partir da publicação da EC, com o fim da integralidade e da paridade, fixação do limite a ser percebido a título de proventos de aposentadoria, de acordo com o teto do regime geral do INSS, e determinação de que fossem instituídos os fundos de pensão. Também taxou os inativos, aumentou o limite de idade e fixou condições mais duras para o servidor alcançar a aposentadoria; NOVA LEI DE FALÊNCIAS E DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL: A CLT estabelece que, na falência, a totalidade dos salários e indenizações devidos aos trabalhadores seriam créditos privilegiados; mas a nova lei reduz o limite de preferência do crédito trabalhista para o valor de 150 salários mínimos. Ao contrário do que ocorria no regime anterior, com a nova lei, no caso de recuperação judicial da firma, os empregados deixam de receber seus créditos trabalhistas durante um ano e passam a discutir sua forma de pagamento com os demais credores, em Assembleia Geral; e, na venda dos ativos da sociedade falida, não há mais a sucessão trabalhista, de modo que a empresa arrematante não está obrigada nem a permanecer com os empregados nem a pagar a dívida trabalhista. SUPER SIMPLES: As micro e pequenas empresas ficam dispensadas de: fixar quadro de Trabalho em suas dependências; de anotar as férias dos empregados no livro ou ficha de registros; de matricular aprendizes nos cursos de Serviços Nacionais de Aprendizagem; da posse do Livro de Inspeção do Trabalho; de comunicar a entidade fiscalizadora quanto à concessão de férias coletivas. Perante a Justiça do Trabalho, o empregador poderá fazer-se substituir por representante legal; NOVA REGULAÇÃO PARA O TRABALHO EM ATIVIDADES DE CUNHO INTELECTUAL: Estabelece que, mesmo apresentando todos os elementos que delineiam um assalariado, a pessoa física que presta serviços 80 intelectuais pode ser materialmente concebida como uma pessoa jurídica. Passa-se, assim, do campo das regras trabalhistas para o das civis e comerciais. Tanto para o empreendimento tomador quanto para o prestador de serviços há redução dos tributos, mas o último deixa de contar com os direitos laborais. EMPREGADOS DOMÉSTICOS: Garante a estabilidade provisória à empregada grávida, férias anuais remuneradas de 30 dias e a vedação a descontos por fornecimento de alimentação, vestuário ou higiene aos empregados domésticos. Entretanto, o presidente vetou a obrigatoriedade do FGTS, a multa rescisória de 40%, o salário família e o seguro esemprego, com o argumento de que poderia contribuir para o aumento da informalidade e o desemprego. Com isso, o veto do presidente impediu a equiparação integral com os direitos dos trabalhadores amparados pela CLT. INTERVALO INTERJORNADA: Autoriza a redução do intervalo intrajornada por meio de negociação coletiva de trabalho, dando prevalência ao negociado sobre o legislado. TRABALHO DOS COMERCIÁRIOS AOS DOMINGOS: Ratifica o trabalho aos domingos para os comerciários. Mas colocou dois limites: a permissão de trabalho em feriados e domingos nas atividades do comércio passa por convenção coletiva, desde que observada a legislação municipal; e a garantia de folga de 2 domingos no mês; CONTRATO DE TRABALHADOR RURAL POR PEQUENO PRAZO: Autoriza a contratação de empregados rurais sem registro na Carteira de Trabalho, para serviços de curta duração (até 2 meses). Os direitos trabalhistas serão pagos diretamente ao trabalhador, mediante adição à remuneração acordada; Krein (2012) afirma que apesar de que o governo liderado por representante de um partido tido como “Partido dos Trabalhadores”, e promoveu uma série de políticas (resumidamente acima descritas) visando a flexibilização do mercado de trabalho. Contudo, Krein (2012) analisa que a “(...) a flexibilização, no governo Lula, não é pensada como uma medida geral, mas sim para públicos 81 específicos (pessoa jurídica, micro e pequenas empresas, jovens” (Krein, 2012:12). Entretanto, o mesmo autor comenta os avanços que o mesmo governo obteve na regulamentação do mercado de trabalho, entre elas, destaca: RETIRADA DO SENADO DO PROJETO LEI (PLC 134/01): Retirado do projeto de lei que previa a prevalência do negociado sobre o legislado. Projeto aprovado na Câmara dos deputados e estava em regime de urgência no Senado Federal. 0 projeto permitia que a legislação trabalhista pudesse ser alterada pela vontade autônoma das partes; ADOÇÃO DE UMA POLÍTICA DE SALÁRIO MÍNIMO (2005): A política de valorização do salário mínimo prevê um reajuste de acordo com o INPC do ano anterior acrescido de um aumento real correspondente à variação do PIB de 2 anos anteriores. A política está sendo aplicada, mas ainda não foi aprovada no Congresso Nacional; ESTÁGIO: Regulamentação do estágio, buscando criar algumas regras para a sua adoção, tais como o limite de jornada de 6 horas diárias e o pagamento de férias; VETO À EMENDA 3 DA SUPER RECEITA: Veto presidencial á "Emenda 3 da Super Receita, que proibia o auditor fiscal multar as empresas que estabeleciam uma relação de emprego disfarçada. Na prática estimular a propagação da contratação como PJ (Pessoa Jurídica), que burla a legislação do trabalho. SEGURO DESEMPREGO: Ampliação das parcelas de seguro desemprego para 7 meses aos setores mais atingidos pela crise econômica de 2008/2009; PAGAMENTO DA LICENÇA MATERNIDADE: Cancelamento das alterações da licença maternidade feitas em 1999, que estabeleciam o pagamento do salário maternidade diretamente pelo INSS e não mais pelo empregador; PERÍODO DE EXPERIÊNCIA: Proíbe que o período de experiência exigido seja maior de 6 meses; 82 MICROEMPREENDEDOR INDIVIDUAL (MEI): Reduz o valor da contribuição previdenciária do autônomo ou do microempreendedor individual. Já no que se refere ao programa Bolsa Família, Kerstenetzky (2009) comenta alguns condicionantes desta política pública que contribuíram para uma significativa queda na desigualdade social. Para autora, ao obrigar que o beneficiário do programa tenha que levar seu filho à escola, que tenha uma obrigatoriedade de frequência mínima a serviço de saúde pré-definidos (por exemplo, obrigatoriedade em se deixar em dia a vacinação da criança). “A ideia é que essas condicionalidades possibilitariam o acesso às portas de saída, ao menos para as gerações futuras”, comenta a autora (Kerstenetzky, 2009:3) TABELA 14 - BOLSA FAMÍLIA: CONTRIBUIÇÃO PARA A REDUÇÃO DA DESIGUALDADE E DA POBREZA QUEDA NA DESIGUALDADE (1995-2004) 21% QUEDA NA POBREZA 12% GASTOS EM ALIMENTOS, EDUCAÇÃO E VESTUÁRIO 19% INFANTIL DE FAMÍLIAS BENEFICIÁRIAS GASTOS EM SAÚDE E VESTUÁRIO DE ADULTOS Aumento FREQUÊNCIA À ESCOLA Aumento PROGRESSÃO NO FLUXO ESCOLAR Mais Lenta VACINAÇÃO INFANTIL Sem Impacto Significativo Queda apenas entre as crianças SUBNUTRIÇÃO INFANTIL CRÔNICA de 6 a 11 meses de idade. SUBNUTRIÇÃO INFANTIL AGUDA apenas entre as crianças de até 5 meses de idade. PARTICIPAÇÃO DE ADULTOS NA FORÇA DE TRABALHO Aumento Fonte: Kerstenetzky, 2009:3 De acordo com a tabela acima, ao se analisar o impacto do Programa Bolsa Família em alguns indicadores sociais, observa-se um papel significativo do programa na queda da pobreza, desigualdade social, aumento dos gastos de alimentação e produtos de higiene, dentre outros. Na área social, o governo Lula unificou os programas de proteção social, do governo anterior, em torno do programa Bolsa-Família. O novo programa foi expandido, em termos de cobertura e de valores unitários. Até o final do governo, a Bolsa Família atendia a 10 milhões de famílias e tinha um orçamento anual de R$ 8 bilhões. A magnitude do programa trouxe importante 83 contribuição para o crescimento do mercado consumidor do interior do país, principalmente na região Nordeste. De acordo com Rego (2013) um aspecto importante deve ser analisado ao se considerar os resultados do Bolsa-Família: seu papel libertador, isto é, o impacto que o acesso a recursos permitiu que populações oprimidas nos mais remotos rincões do Brasil como o Vale do Jequitinhonha (MG), o sertão alagoano, o interior do Maranhão, Piauí e Pernambuco. Rego (2013), que entre 2006 a 2010 entrevistou beneficiários dos programas, analisa que o simples fato de garantia a uma determinada renda por mês, uma regularidade de renda, permitiu aos beneficiários uma maior dignidade, segurança maior e respeitabilidade. Houve também um impacto econômico e comercial muito grande, pois esses novos consumidores são reconhecidamente bons pagadores, respeitando compromissos assumidos, além disso, o simples fato de colocar dinheiro na mão do beneficiário, permitiu que muitos aprendessem a gerir seus recursos e realizarem seu planejamento financeiro. TABELA 15 - RESULTADOS BOLSA FAMÍLIA – ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SUPERAÇÃO DA EXTREMA 36 milhões de pessoas deixaram suas condições de extrema pobreza; POBREZA EFEITOS NA EDUCAÇÃO De acordo com dados do Censo Escolar, os alunos assistidos pelo Bolsa Família apresentam uma taxa menor de abandono escolar e melhor índice de aprovação escolar. De acordo com estudos publicados na revista britânica The Lancet, MORTALIDADE observou-se uma queda de 19,4% na mortalidade infantil de beneficiários do INFANTIL programa. Houve queda de 46,3% da mortalidade infantil por diarreia e 58,2% por desnutrição. TRABALHO Segundo dados do MDS, 70% dos beneficiários do programa trabalham. VIDA DIGNA Com assistência técnica, produtores aumentaram produtividade, produção e NO CAMPO renda, permitindo sua permanência no campo. Fonte: Ministério do Desenvolvimento Social Rego (2013) comenta que, devido a complexidade e o gigantismo da desigualdade econômica no Brasil ser enorme, o programa permitiu o início de uma democratização real, da democratização da democracia brasileira. 84 CAPÍTULO III - MOEDA, CRÉDITO E DESENVOLVIMENTO NO BRASIL CONTEMPORÂNEO A importância do crédito e do mercado monetário para o desenvolvimento capitalista é algo inegável: desde a origem do capitalismo originário na Inglaterra, o papel dos bancos comerciais e do crédito foi de fundamental importância para o desenvolvimento da acumulação de capital. Oliveira (2003) cita a importância da criação do Banco da Inglaterra no século XVII, uma vez que o banco oficial subordinou o capital a juros ante as atividades capitalistas, e seu caráter oficial garantiu estabilidade ao sistema de crédito daquele país, e consequentemente, favoreceu o desenvolvimento e a inversão em novos negócios, principalmente na indústria nascente. Os bancos puderam assim mobilizar capitais do comércio e mesmo da agricultura, e fornecer à indústria os recursos de que necessitava. Dessa forma, o crédito bancário potenciava a oferta de capital dinheiro, e, apesar de os bancos operarem com empréstimos vencíveis a curto prazo, por meio de sucessivas renovações, esses empréstimos na verdade funcionavam como operações de longo prazo, garantindo não somente o capital de giro da indústria, como também o capital fixo (Oliveira, 2003:55). O autor ainda comenta a importância do papel dos bancos comerciais em concentrar capital e destiná-los a outros investimentos que eram indispensáveis para o desenvolvimento do capital industrial, como os investimentos em infraestrutura, por exemplo. Segundo Schumpeter (1982), os bancos tem um papel fundamental ao permitir a realocação dos recursos reais necessários no processo de crescimento. Studart (2003) comenta que já partir dos anos 1960, John Gurley e Edward Shaw, já haviam mostrado que o desenvolvimento financeiro permitia uma melhor alocação da poupança, permitindo assim mais recursos disponíveis para o investimento, e consequentemente, mais recursos disponíveis para financiar o crescimento econômico. 3.1. Moeda e Brasil No Brasil este processo não é diferente. De acordo com Costa (2008), a moeda faz parte da “soberania nacional” assim quanto o Estado deter o 85 “monopólio da violência”. Para o autor, a história dos bancos no Brasil se confunde com a sua própria história monetária do país. Costa (2008) divide história bancária brasileira em estágios, sendo que o primeiro vai de 1808 a 1921, que consiste na primeira fundação do Banco do Brasil ainda no período da colônia, até sua transformação efetiva em uma espécie de “semi-autoridade monetária”, já na sua segunda fundação em 1905. A economia brasileira oscilou entre a moeda mercadoria (ouro) – ou papel-moeda conversível com estritas regras de reserva aurífera – e as diversas tentativas estatais de emissão de uma moeda fiduciária, para cobrir déficits. A rigor não se pode falar nem em um subdesenvolvido sistema bancário, pois os poucos bancos existentes em praças locais emprestavam praticamente seus recursos próprios, através do padrão legal de pagamentos. Em tal economia, a quantidade de moeda, quando lastreada, era determinada fora do setor bancário por fluxos de comércio externo, investimentos estrangeiros ou mesmo a produção de ouro (Costa, 2011:137). Já o segundo estágio do desenvolvimento bancário brasileiro ocorre quando se criam condições institucionais mínimas para criação da moeda bancária e consequentemente, o descolamento da fração bancária da classe dominante. (...) os fatos que mais marcaram a história bancária brasileira, entre 1930 e 1945, foram: a socialização das perdas bancárias, devido à crise de 1929; a imposição da reserva de mercado, no varejo bancário, em favor dos bancos brasileiros; a legislação liberal propícia a fundações de bancos; e o início do uso de bancos públicos (federais e estaduais) para uma atuação desenvolvimentista (Costa, 2011:138). Contudo, o mesmo autor destaca que foi entre os anos de 1945 e 1964 que ocorreu a consolidação do mercado bancário no país, o que denomina como terceiro estágio. Foi neste período que foi introduzida a exigência de reservas bancárias fracionárias sobre os depósitos, o uso das ordens de transferências de depósitos passaram a ser um meio mais comum de troca, e os cheques começaram a ter maior aceitação pela rede comercial; assim a rede bancária foi se expandindo em nível nacional. Em 1952 foi criado o BNDE – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico com o objetivo de permitir condições favoráveis ao financiamento de longo prazo destinado a produção. 86 Maria da Conceição Tavares (1972) comenta que a rápida transformação da estrutura da economia brasileira a partir de 1930 criou necessidades de financiamento na economia urbano-industrial que não podiam ser atendidas pelo sistema financeiro nacional existente então. Studart (2005) afirma que até os anos de 1940 o crédito no setor era predominantemente agrícola, voltado à exportação de commodities. Costa (2008) observa que até a inauguração do BNDE as empresas apenas tinham a sua disposição duas alternativas de financiamento de longo prazo: o autofinanciamento via capitalização interna das empresas e o financiamento externo, seja pelo uso de recursos públicos. A reforma do Sistema Financeiro Nacional que entre os anos de 1945 e 1964 também teve como objetivo desenvolver o sistema financeiro nacional e adequar as necessidades de financiamento da economia brasileira, após a consolidação do setor de bens de consumo duráveis. Problemas como a Lei da Usura, que desestimulavam a poupança, por exemplo, somado ainda com o fato que a Fazenda Pública apresentava perdas reais de ganho, uma vez que a elevada da inflação corroía sua arrecadação e por consequência, lhe impedia retomar o financiamento dos investimentos para retomar o crescimento, exigia por parte dos governantes do país uma Reforma Monetária abrangente e rápida. Acreditava-se que com um sistema financeiro moderno e consolidado, permitiria destinação dos lucros dos setores mais desenvolvidos, uma vez que os setores com capacidade ociosa, mas superavitários, poderiam transferir capitais para os setores com potencial de expansão, mas deficitários. A reforma do sistema financeiro nacional baseou-se em quatro medidas: 1. Instituição da correção monetária e criação da ORTN (Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional) Devido a uma inflação constante, era necessário encontrar meios institucionais para conviver com ela e diminuir assim seus impactos negativos sobre a estrutura econômica do país. Um dos mecanismos institucionais encontrados pelas autoridades foi a criação da Correção Monetária, mecanismo que corrigia determinado valor monetário em relação a perda do seu poder de compra real, corroído pela inflação de determinado período. 87 Com a introdução da Correção Monetária, a Lei da Usura tornou-se sem sentido, e permitiu a existência de juros reais positivos que ampliava a capacidade de poupança dos agentes e consequentemente, ampliava a capacidade doméstica de financiar novos investimentos. Foram criados também as ORTN’s, um mecanismo de financiamento do Estado, uma vez que este título público garantia ao seu comprador a manutenção real do valor investido. A variação das ORTN indicava o índice oficial de correção monetária. Com isso, permitia ao Estado “arrecadar” recursos para conter seu elevado déficit e criava um novo mecanismo para conter a emissão monetária. As ORTN’s foi um novo instrumento eficiente da política monetária brasileira para se auto-financiar e controlar a emissão de moeda. 2. Criação do Conselho Monetário Nacional (CMN) e do Banco Central do Brasil (BACEN). A criação da CMN tinha como objetivo primordial que a execução das Políticas Monetárias do país fossem conduzidas de maneira técnica e independente. A CMN tinha como meta principal ser um órgão normativo da política monetária e estabelecer e regulamentar regras a serem atingidas e executadas. O BACEN fez passou a ser o agente executor da Política Monetária Brasileira, e sua criação fez com que se tornasse um agente fiscalizador e controlador do Sistema Financeiro Nacional. Segundo Vasconcellos (2002), a execução de uma política monetária “técnica e independente” era prejudicada, uma vez que a subordinação do BACEN ao CMN permitia uma ingerência política na atuação do órgão. A permanência de certos “instrumentos monetários” na mão do Banco do Brasil permitiiu que este banco não perdesse sua autoridade monetária, podendo sem maiores problemas expandir seus limites de operação de crédito, pois possuía uma linha direta de financiamento junto ao BACEN. O autor também chama atenção para o fato de que o Orçamento Monetário, que deveria ser uma peça para juntar as autoridades monetárias (BACEN e Banco do Brasil) passou a receber vários gastos de origem fiscal, como a criação de vários fundos e programas, como PROAGRO, PROEX, FUNRURAL e etc. 88 O BACEN, (...) que deveria ser o órgão de controle monetário transformava-se também em banco de fomento, criando-se um entrelaçamento entre as contas monetárias e fiscais, de tal modo que o Orçamento Fiscal poderia parecer equilibrado, enquanto todo o rombo se colocava no Orçamento Monetário (VASCONCELLOS, 2002:381). 3. Criação do SFH (Sistema Financeiro da Habitação) e do BNH (Banco Nacional de Habitação) A criação do SFH tinha como objetivo de encontrar medidas que acabassem com o problema crônico de déficit habitacional no país, déficit este causado pela dificuldade de encontrar mecanismos eficazes para o financiamento e para construção civil de moradias para baixa renda. O papel do BNH neste caso era de atuar como “banco dos bancos” do Sistema Habitacional, com função de fiscalizar e regulamentar a atuação de agentes do sistema e dar liquidez aos mesmos. Os recursos utilizados para financiar o Sistema Habitacional eram os fundos recém criados, como o FGTS, PIS e Letras Imobiliárias. 4. Reforma no Mercado de Capitais Inspirada no Mercado de Capitais Americano, estas reforma consistia na “segmentação” e da definição clara dos papéis que cada agente assumiria no Mercado de Capitais Brasileiro. A reforma consistia nas seguintes definições: A. Bancos Comerciais: responsáveis pela captação dos depósitos à vista, tinham como tarefa atuar no mercado de crédito de curto prazo, com base na captação dos depósitos à vista. B. Financeiras: atuariam no financiamento de crédito ao consumidor, por meio da venda de Letras de Câmbio (LTN). C. Bancos de Investimento: sua função seria ofertar de médio e longo prazo, mediante a captação de recursos de depósitos a prazo e repasses de Recursos Externos. D. Bancos de Desenvolvimento: exclusivamente estatais, deveriam financiar operações especiais de fomento pelo repasse de fundos fiscais e de recursos captados no exterior. 89 No que se refere a avaliação da reforma financeira realizada, Studart (2003) analisa que ela foi importante, contudo, seus resultados ficaram muito aquém do que foi planejado. Entre os problemas, autor destaca: Concentração do mercado bancário: apesar da reforma ter buscado um modelo mais competitivo, o que se verificou foi um elevado grau de concentração do setor financeiro, sob hegemonia dos bancos comerciais. Dada a pouca diferenciação dos mercados e nichos de cada modalidade de instituição financeira, os bancos comerciais pressionaram uma maior flexibilização do mercado financeiro brasileiro, fazendo assim com que o setor bancário nacional fosse fortemente concentrado. Captação dos Recursos: fonte básica de captação dos bancos de investimento seria a emissão de títulos de prazo superior a um ano, com correção monetária, no mercado interno e também junto aos bancos estrangeiros. Contudo, devido a pressões do mercado interno, os recursos que deveriam ser destinados ao crédito de longo prazo, foi destinado ao crédito de curto prazo; O mercado de capitais: a reforma promovida não foi suficiente devido à falta de investidores institucionais e a insistência do governo em basear este mercado de capitais em “pequenos poupadores”. Sendo assim, devido a incapacidade do mercado para captar recursos e destina-los ao crédito de longo prazo, fez com que o governo retomasse seu papel no fornecimento de crédito, criando no período de 1968 a 1974 oito bancos de investimento. “Era o Estado sendo novamente chamado como financiador direto do desenvolvimento doméstico”31. Saes (2001) ao analisar os resultados obtidos na reforma financeira, afirma que: A reforma bancária de 1964 e a do mercado de capitais em 1965 procuraram responder a esses diagnósticos [de um sistema financeiro inadequado ao momento do desenvolvimento econômico]. A supressão da lei da usura e a instituição da correção monetária permitiriam remunerar as aplicações com juros reais positivos (estimulando a “poupança” ou, mais propriamente, viabilizando a mobilização da poupança financeira). A definição de segmentos especializados no sistema financeiro (bancos comerciais, bancos de investimento, financeiras, sociedades de crédito imobiliário, 31 Studart (2003):341. 90 seguradoras, corretoras e distribuidoras, além do Banco Central e dos bancos de desenvolvimento) daria condições adequadas para atender às diferentes necessidades de financiamento (desde o crédito comercial de curto prazo até os financiamentos para infraestrutura com longos prazos de maturação). É inegável que a correção monetária criou instrumentos financeiros que atraíram aplicadores, principalmente em direção a títulos do governo (como as ORTNs) e do sistema financeiro da habitação (como as cadernetas de poupança), que viabilizaram o financiamento do governo e de certos segmentos da construção civil (SAES, 2001:68). 3.2 .A Crise da Dívida da Década Perdida a Liberalização dos Anos 1990 Segundo Vasconcellos (2002), a década de 1980 não apresentava um cenário econômico favorável: havia dificuldades de captar recursos externos provocado por dois choques de petróleo e pelo aumento dos juros do governo americano entre os anos de 1979-82 (ver capítulo I). Studart (2003) analisa que a administração macroeconômica do período passou a ser um contínuo desafio para as autoridades monetárias e politicas, uma vez que o governo obrigou a União e as empresas estatais a absorver a dívida privada. “Dado o crescimento acelerado da dívida pública, e como a crise leva a uma perda significativa de receitas fiscais, terminou-se por acentuar a deterioração financeira do setor público”32. Saes (2001) ao analisar o período comenta que a década de 1980 foi caracterizada pelo aumento do que denomina como “ciranda financeira”: o crescimento da dívida pública com o pagamento de taxas de juros elevadas numa década marcada pela recessão. TABELA 16 - TABELA VARIAÇÃO DO PIB E OPERAÇÕES DE CRÉDITO ANO 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 32 Studart (2003: )342. VAR. REAL ANUAL PIB -0,06% 3,16% 4,35% 1,03% -0,54% 4,92% 5,85% 4,22% 2,66% 3,27% CRÉDITO/PIB 31,84% 24,12% 24,12% 24,09% 28,56% 29,00% 36,60% 32,06% 28,83% 26,81% 91 1998 1999 Fonte: BACEN 0,13% 0,79% 27,94% 24,87% No que se refere ao crédito voltado para financiar a produção, Studart (2003) comenta que no período as operações de crédito de longo prazo foram drasticamente afetadas, devido principalmente a um ambiente altamente inflacionário e às políticas econômicas do período visando sua correção. Já na década de 1990, Saes (2001) afirma que no período o setor financeiro passou por profundas reformas e transformações. Entre elas, a privatização de vários bancos públicos, a limitação de acesso a fundos estatais de financiamento, e a crises econômicas internacionais da década levaram muitas instituições financeiras nacionais à insolvência, e os bancos estrangeiros ganharam e expandiram sua participação em todo território nacional, conforme demonstra tabela abaixo. TABELA 17 - EVOLUÇÃO DA PARTICIPAÇÃO DOS SISTEMAS FINANCEIROS PÚBLICO E PRIVADO NAS OPERAÇÕES DE CRÉDITO DO SISTEMA FINANCEIRO ANO SETOR PÚBLICO SETOR PRIVADO 1994 58% 42% 1995 56% 44% 1996 56% 44% 1997 56% 44% 1998 53% 47% 1999 52% 48% 2000 49% 51% 2001 38% 62% 2002 37% 63% FONTE: COSTA, 2011:56 Studart (2003) afirma que a década foi marcada pelo aumento da liquidez dos mercados financeiros internacionais e dos fluxos de capital. Um novo modelo foi adotado, pautado por uma maior abertura de capital, liberalização doméstica e profundas transformações nos aparelhos de Estado, visando uma menor participação estatal na seara econômica (ver capítulo I). Camargo (2009) comenta que a partir da década de 1990, as autoridades monetárias se basearam nos princípios defendidos pelo “Consenso de Washington”, ou seja, um conjunto de políticas que visam uma maior 92 abertura comercial e financeira, com uma menor participação do Estado na economia. Um exemplo dessa influência foi a Resolução do Conselho Monetário Nacional no 1.832, de 31 de maio de 1991, que regulamentou os investimentos estrangeiros em títulos e valores mobiliários nas companhias abertas brasileiras, aumentando consideravelmente o ingresso de recursos externos. Devido a estas reformas “liberalizantes”, foi autorizado na reforma bancária de 1998, que as instituições financeiras realizassem entre si uma pessoa jurídica única, formando um banco múltiplo, e também as regras para formação e criação de novos bancos foi flexibilizada. Camargo (2009) afirma que uma maior presença de bancos estrangeiros foi fundamental para trazer mais solidez para o sistema financeiro brasileiro. Contudo, sua presença foi decepcionante no que se referem questões de eficiência, gerenciamento, capacidade de emprestar, diversificação e sistemas de controles de riscos. A expectativa de redução dos spreads e dos juros ativos, com consequente ampliação do crédito, também não foi observada. Os bancos estrangeiros têm atuado de forma semelhante aos bancos nacionais, com relação à intermediação financeira e à preferência por operações de tesouraria, sendo ainda mais dependentes das aplicações financeiras e em títulos da dívida pública – principalmente a indexada ao câmbio, da qual são os principais compradores ( Camargo, 2009:49) Studart (2003) avalia que as reformas liberalizantes foram importantes, porém, seus resultados foram muito aquém: nem a oferta privada de crédito se ampliou, nem as condições de crédito (no que tange aos prazos e seus custos) melhoraram como esperado. Costa (2008) é mais incisivo ao comentar a oferta de crédito no período, e observa que: Em todo o Governo FHC, a evolução real do crédito foi medíocre. O crédito permanecia praticamente estagnado, desde dezembro de 2000. Com a reestruturação patrimonial dos bancos públicos federais, em maio de 2001, o saldo de empréstimos caiu em termos nominais. Não recuperaram suas participações no mercado de crédito até o final do governo. Parte dos recursos direcionados a setores prioritários foi assumida pelo Tesouro Nacional como composta de “esqueletos” (Costa, 2011:146). Zerbini e Rocha (2004) comentam que durante o mandato do governo FHC os recursos dos bancos foram direcionados principalmente para a aquisição de títulos públicos federais, devido à boa lucratividade e o baixo 93 risco, além do alto índice de inadimplência verificado nos primeiros anos do Plano Real causado por uma política monetária muito restritiva. “Dada a pouca experiência com concessão de crédito, diante do aumento da inadimplência, os bancos preferiram comprar títulos públicos que apresentavam uma relação risco-retorno mais atraente” 33. Costa (2008) ainda alerta para o crédito destinado ao setor habitacional se encontrava estagnado, desde a restruturação patrimonial da Caixa Econômica Federal, e o crédito agrícola disponibilizado pelo Banco do Brasil apresentava um desempenho muito sofrível. TABELA 18 - OPERAÇÕES DE CRÉDITO DO SISTEMA FINANCEIRA - % DO PIB INDUS TRIAL DEZ/95 (A) TOTAL AO SETOR PÚBLICO 4,8 7,6 6,4 3,1 4,2 2,2 DEZ/96 5,1 6,8 5,5 2,2 3,2 DEZ/97 6,1 6,8 5,2 2,3 DEZ/98 2,1 7,3 5,4 DEZ/99 1,5 7,2 DEZ/00 1,3 DEZ/01 DEZ/02 DATA (B) SETOR PRIVADO TOT AL TOTAL CRÉDITO (A) +(B) 3,8 27,3 32,1 2,7 3,3 23,7 28,8 3,0 3,7 3,2 24,1 30,2 2,5 2,6 3,7 4,4 25,8 27,9 4,6 2,2 2,5 3,6 3,3 23,4 24,9 6,9 4,5 2,3 2,6 5,1 3,7 25,1 26,4 0,7 7,2 1,8 2,0 2,7 5,9 4,4 23,9 24,6 0,7 6,6 1,4 2,0 2,3 5,1 3,9 21,3 22,0 HABITA SETOR CIONAIS RURAL SETOR PESSO SER COMERCIA AS VIÇ L FÍSICAS OS FONTE: BACEN Conforme demonstra a tabela acima, a diminuição do crédito em relação a sua participação no PIB foi sofrível durante todo mandato do presidente FHC. O crédito total da economia passa de 32,1% no ano de 1995 para 22% em 2002, com destaque para a queda no crédito disponível para habitação (passou de 6,4% para 1,4% do PIB). 1.3. Evolução do Crédito durante o Governo Lula Paula et al (2013) informam que a relação crédito / PIB caiu vertiginosamente durante 1995 e 2002: de 35% em junho de 1994 para 22% 33 Zerbini e Rocha, 2004:88. 94 em outubro de 2002. “Observou-se no período supracitado uma involução do desenvolvimento financeiro da economia brasileira, em parte associada também à instabilidade macroeconômica do período”34. De acordo com dados disponibilizados por Costa (2008), o Brasil apresentava uma considerável desvantagem em relação a quantidade de crédito disponível / PIB em relação a outros países: Estados Unidos (160%), Japão (143%), Europa (130%), países asiáticos emergentes (73%), Europa emergente (51%), América Latina (39%) e Chile (60%). Camargo (2009) observa que durante os anos de 1990, os bancos públicos foram perdendo espaço para o setor privado, e algumas instituições financeiras públicas foram privatizadas, enquanto outras perderam importância ou foram reestruturadas, visando à futura privatização. Segundo Camargo (2009) os principais bancos públicos federais (Banco do Brasil – BB e Caixa Econômica Federal – CEF) concentraram suas ações na operação de títulos públicos, e as operações de crédito comercial foram deixadas em segundo plano. Camargo (2009) cita uma pesquisa publicada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) em meados de abril de 2009, observando que a redução dos bancos públicos, a partir de 1996, levou à concentração do sistema financeiro, à menor oferta de serviços bancários à população de baixa renda e à manutenção de ambiente favorável à cobrança de altos juros. Costa (2008) traz números que indicam uma considerável redução na série de recursos direcionados durante a década de 1990, isto é, aqueles recursos destinados a financiar setores específicos da economia (habitação, crédito rural e etc) com taxas mais atrativas em comparação com as praticadas pelo mercado em geral. Houve, em junho de 2001, uma queda muito significativa na série do crédito com recursos direcionados – aquele cuja taxa de juros média ponderada (pelas participações relativas do crédito habitacional, rural e de infraestrutura) – atingiu 12,5% a.a. contra os 44% a.a. do crédito com recursos livres. Em maio daquele ano, o saldo do crédito direcionado para habitação era de R$ 47,5 bilhões; um mês após, passou a ser contabilizado apenas R$ 19,5 bilhões, ou seja, retirouse da série histórica acumulada cerca de R$ 28 bilhões. No total geral, considerando também a retirada de saldo no crédito rural concedido pelo Banco do Brasil, o saldo das operações de crédito 34 Paula, 2013:474. 95 caiu R$ 37,5 bilhões, o que representava uma queda de 11% em relação ao saldo anterior de R$ 340 bilhões (Costa, 2008:152). Paula el al (2013) observa-se uma reversão da participação dos bancos públicos que a partir de 2003 passaram a ter uma presença mais relevante no total de crédito disponibilizado pelo Sistema Financeiro Nacional. Entre janeiro de 2003 e fevereiro de 2010, as operações totais de crédito do sistema financeiro público subiram 415,5% contra um aumento de 348,1% do sistema financeiro privado; quanto ao crédito ao setor industrial, houve elevação de 297,3% do crédito público contra 240,5% do privado; o volume de crédito público ao setor rural é 35% superior ao concedido pelo privado; somente no que se refere às operações às pessoas físicas e rurais, a expansão do cré- dito do setor privado supera a performance de crescimento do crédito público (Paula, 2013:475). Camargo (2008) observa que durante o mandato do Governo Lula, os bancos públicos passaram a ter um papel muito mais ativo na execução das políticas públicas de governo, tornando-os principais agentes de execução da sua política de governo. Analisa também que os bancos públicos passaram a atuar em nichos e em regiões e segmentos menos interessantes aos bancos privados. “Assim, esses bancos recuperaram seu papel de fomentar o desenvolvimento econômico e social brasileiro, ofertando crédito e serviços financeiros em melhores condições para toda a população”35. Entre os exemplos, pode-se citar a forte atuação do Banco do Brasil no crédito agrícola (setor que não traz muito atratividade ao setor bancário privado). Já para a Caixa, foi atribuída a responsabilidade de ampliar a oferta de recursos para os segmentos de habitação, saneamento básico e micro e pequenas empresas, além do mercado imobiliário, em que a Caixa já era líder, e que também não era muito atrativo para os bancos privados, devido ao alto risco e às altas taxas de inadimplência. “Como resultado, em 2008 a carteira de crédito dos bancos públicos foi a que mais cresceu. De março de 2008 a março de 2009, esse crescimento foi de 37,1%, contra uma expansão de 19,1% das instituições privadas nacionais e de 17,8% das instituições estrangeiras”36. Camargo (2009) observa que a consolidação da presença de bancos públicos no sistema financeiro se dá também pela ampliação da rede bancária, 35 36 Camargo, 2011:87. Camargo, 2011:88. 96 alcançando lugares mais distantes e economicamente inviáveis, além do o atendimento da população de menor renda e e a oferta de financiamento de longo prazo – em que o BNDES é quase exclusivo. TABELA 19 - OPERAÇÕES DE CRÉDITO DO SISTEMA FINANCEIRO - RECURSOS DIRECIONADOS (2003=100) 2003 100,00 100,00 BNDESTOTAL 100,00 2004 104,50 120,30 112,70 113,40 113,40 2005 113,20 137,10 122,00 126,70 123,60 2006 137,30 161,50 137,10 151,00 138,40 2007 169,30 194,20 155,30 183,30 156,70 2008 220,90 240,20 191,60 231,80 192,90 2009 313,50 262,90 254,90 285,00 255,70 2010 472,30 272,80 341,80 359,70 341,90 ANO HABITACIONAL RURAL P FÍSICAS 100,00 P JURÍDICAS 100,00 FONTE: BACEN Este comportamento é verificado quando se analisa o volume de crédito direcionado pelo sistema financeiro. No período de 2003 a 2010, o total de crédito direcionado disponibilizado pelo BNDES aumento aproximadamente 241%, o de crédito habitacional 372% e o de Pessoas Físicas expandiu 260%, segundo dados disponibilizados pelo BACEN. No que se refere a ampliação do crédito imobiliário, Costa (2008) destaca que durante o período ocorreram avanços institucionais, como um novo direcionamento dos recursos antes vinculados ao FCVS (Fundo de Compensação das Variações Salariais), lei do patrimônio de afetação, regra do valor incontroverso, estabelecimento de vantagens tributárias, etc. “A Caixa lançou novos produtos, reduziu taxas de juros, aumentou prazos, aperfeiçoou sistemas de risco e simplificou processos de contratação, realizando também vários “feirões da casa própria”. Tudo isso representou forte estímulo ao crédito”37, destaca Costa (2008). Como agente do governo federal, observa-se o aumento significativo da CEF como concedente de convênios realizados entre a esfera federal e municipal. De 2002 a 2010, último ano de mandato do Governo Lula, “Caixa Econômica Federal - Programas Sociais” expandiu aproximadamente 418% o 37 Costa, 2011:153. 97 volume conveniado no período, segundo dados disponibilizados pelo Portal da Transparência do Governo Federal. Esta maior oferta de crédito a partir de 2003, segundo Costa (2008). Foi influenciado tanto por mudanças institucionais quanto por fatores econômicos. Quanto às alterações institucionais, destaque-se para a Lei 10.820 de 17/12/2003 que regulamentou os empréstimos consignados em folha de pagamento, ampliando o acesso dos trabalhadores a um crédito mais “barato” e também de menor risco para o credor. Em relação aos fatores econômicos, Costa (2008) observa que a consolidação de um cenário favorável, projetando uma maior estabilidade de preços e com uma maior perspectiva de crescimento econômico. “Este quadro elevou a confiança dos agentes econômicos, fator fundamental para o aprofundamento do mercado de crédito”38, analisa Costa (2008). Já Camargo (2011) analisa que a ampliação do crédito foi possibilitado pelo bom desempenho da economia, pelas condições positivas de renda e emprego, pela redução das taxas de juros e pela ampliação dos prazos de amortização. Os bancos públicos, principalmente a CEF e o Banco do Brasil, também passaram a investir, recentemente, em segmentos em que os bancos privados eram mais atuantes, com ações visando ampliar o número de correntistas, tais como o financiamento de veículos e a parceria com importantes redes varejistas visando financiamento de eletrodomésticos. “A principal importância dos bancos públicos, hoje em dia, está na execução de políticas governamentais e na promoção da concorrência no setor”39, analisa Camargo (2009). 38 39 Costa, 2011:151. Camargo, 2011:88 98 TABELA 20 - ESTRUTURA DAS OPERAÇÕES DE CRÉDITO DAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS ANO PÚBLICO CONTROLE PRIVADO NACIONAL CONTROLE ESTRANGEIRO TOTAL 2003 37,1% 39,2% 23,8% 100,0% 2004 37,2% 39,9% 22,9% 100,0% 2005 35,9% 40,9% 23,2% 100,0% 2006 35,3% 41,7% 23,0% 100,0% 2007 34,4% 43,2% 22,3% 100,0% 2008 34,0% 44,7% 21,3% 100,0% 2009 39,5% 41,3% 19,3% 100,0% 2010 42,2% 40,2% 17,6% 100,0% Fonte: BACEN Interessante observar que até 2008 os bancos comerciais de controle privado nacional foram os que mais cresceram, tendência esta invertida a partir de 2009, quando os bancos públicos passaram a expandir suas operações, devido em grande parte, a executar políticas contra cíclica do governo. De acordo com dados disponibilizados pelo BACEN, o setor público retoma a liderança nas operações de crédito. No ano de 2003, o setor público era responsável por aproximadamente 37% do crédito disponibilizado, passando para 42% no ano de 2010, assumindo a liderança que antes estava sob controle do setor financeiro privado, conforme tabela 3.6. GRÁFICO 2 - TAXA DE JUROS SELIC (META) 30,0 % a.a. 25,0 20,0 Meta Selic 15,0 10,0 5,0 0,0 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 Figura 2 - TAXA DE JUROS SELIC (META) 99 No que se refere à evolução da taxa básica de juros, observa-se a partir de 2002 uma queda considerável na sua taxa, atingindo seu menor valor em meados de 2009. Costa (2009) elenca uma série de fatores que explicam esta queda da taxa básica de juros, entre elas uma diminuição na relação dívida pública / PIB: no final de 2002 chegou a aproximadamente a 61,7% do PIB, passando para aproximadamente 40%, segundo dados apresentados pelo mesmo autor. Para Camargo (2009), os bancos públicos tiveram um papel essencial na redução das taxas de juros e das tarifas bancárias, além de ampliar a liquidez no sistema financeiro nacional, por meio da aquisição de instituições privadas, possibilitada pela Medida Provisória 443. O custo de crédito se torna mais atrativo para todos os setores, com grande destaque para o crédito destinado à Pessoa Física (PF). O spread bancário geral da economia que em 2002 era de aproximadamente 40 p.p. cai para 28,8 p.p., sendo o do destinado a PF o mais significativo: sai de 51 p.p. para 29 p.p. no mesmo período, conforme tabela 3.7. Costa (2008) destaca a considerável queda na taxa de juros dos empréstimos no período, chegando menor valor da série histórica iniciada em junho de 2000: 33,8% a.a. em dezembro de 2007, o que representava uma queda de 15 pontos percentuais em relação a setembro de 2005. Esta queda na taxa de juros do crédito, é explicada, em grande parte, pela queda da taxa básica de juros, conforme já mencionado anteriormente. A queda de juros é verificada também quando se analisa a taxa média de juros aplicada a Pessoa Física (PF) e a Pessoa Jurídica (PJ). No ano de 2002 à taxa média aplicada a PF era de 74,8% a.a. e para PJ 29%, passando para 40,7% a.a. e 27,6% respectivamente. A taxa média de juros geral passa de aproximadamente 48% para 35% no ano de 2010, como observado na tabela 3.8. 100 TABELA 21 - TAXA MÉDIA ANUAL DAS OPERAÇÕES DE CRÉDITO COM RECURSOS LIVRES REFERENCIAIS PARA TAXA DE JUROS - % A.A. ANO GERAL PESSOA FÍSICA PESSOA JURÍDICA 2002 47,8 74,8 29 2003 53,4 77,8 35,8 2004 44,7 62,9 30,2 2005 47,1 61,4 32,9 2006 43,2 55,7 28,9 2007 36,7 47,7 24,1 2008 39,6 51,4 27,8 2009 37,3 46,8 27,7 2010 34,9 40,7 27,6 Fonte: BACEN Além disso, é observado no período também uma diminuição considerável do prazo das operações de crédito. Em dezembro de 2003, o prazo médio era de aproximadamente 170 dias para créditos tomados por PJ, passando para 78,2 dias em junho de 2008. No mesmo período, o prazo médio de crédito disponível para PF passou de 296 para 466 dias. Considerando tanto o crédito para PJ quanto para PF, o prazo médio aumentou 70%, segundo dados disponibilizados pelo BACEN. Paula (2013) define o período de 2003 a 2008 como sendo o de boom do crédito. Para o mesmo, o crescimento do crédito no período se caracterizou pela absorção do crédito pelo setor privado, a liderança do segmento de crédito com recursos livres, e, um dinamismo maior dos bancos privados nacionais em relação aos demais bancos (públicos e estrangeiros). Sendo assim, é notável que durante o governo Lula, a intervenção do setor público no mercado de crédito pós 2009 foi de suma importância para ampliação da oferta de crédito, melhoria nas condições de prazo e nos seus custos (diminuição do spread e da taxa média de juros aplicada). O governo agiu intensivamente e coordenadamente no sistema financeiro através dos bancos públicos e na concessão de recursos direcionados. “Assim, esses bancos recuperaram seu papel de fomentar o desenvolvimento econômico e social brasileiro, ofertando crédito e serviços 101 financeiros em melhores condições para toda a população”40, analisa Camargo (2011). O Estado retoma a liderança no setor financeiro de crédito, alocando os recursos de acordo com suas políticas de governo, além de fazer com o setor privado reduzisse sua a taxa de juros para poder competir com as taxas dos bancos públicos, bem como ampliar seus prazos, decorrente principalmente da concorrência dos bancos públicos. 40 Camargo, 2011:87. 102 CAPÍTULO IV – O CRÉDITO AO CONSUMIDOR NO GOVERNO LULA Após analisar as mudanças ocorridas no conceito de Estado e nas políticas públicas implementadas durante o mandato do Governo presidente Lula (ver capítulo II), e depois de observar as mudanças ocorridas nos bancos e na conjuntura financeira / bancária ocorridas nos últimos 20 anos (ver capítulo III), o objetivo desta parte do trabalho é apresentar os resultados e o comportamento do crédito destinado às a Pessoas Físicas (PF) durante o mandato do Governo Lula (2002-2010) nesse período. Para melhor compreensão e análise dos resultados, este capítulo foi dividido da seguinte mineira: primeiro, é descrito, resumidamente, a estrutura do Sistema Financeiro Nacional e as características dos tipos de modalidade de crédito destinado a PF. Em seguida, são apresentados os resultados obtidos nas distintas modalidades de crédito, bem como são analisados o comprometimento da renda familiar com as dívidas incorridas e a inadimplência do crédito obtido. Por fim, é apresentado o resultado do consumo e da produção durante o período, analisando brevemente o resultado e sua relação com a evolução do comportamento das variáveis da produção e do consumo 4.1. O Sistema Financeiro Nacional (SFN) Conforme descrito anteriormente neste trabalho, o crédito tem um importante papel na economia, atuando principalmente na alocação do capital. De acordo com Tavares (2014), o mercado de crédito tem como objetivo disponibilizar recursos aos agentes econômicos (pessoas físicas e / ou jurídicas) nas suas necessidades de consumo, operacionais e de investimentos. Para Tsuru (2012), o crédito tem como uma das suas principais funções a de potencializar a demanda agregada, financiando o consumo. Segundo Vasconcellos (2000), que apresenta a visão convencional do papel do sistema financeiro, o Sistema Financeiro Nacional (SFN), atua transferindo recursos de setores / agentes superavitários, e destinando em forma de crédito recursos para outro setor / agente que demanda recursos 103 41 De acordo com Tavares (2014), o SFN foi regulamentado pela Lei 4.595 de 31 de dezembro de 1964, conhecida como “Lei da Reforma Bancária”. Já o mercado de capitais foi regulamentado pela Lei 4.728 de 14 de julho de 1965. De acordo com Rodrigues (2011), o SFN atua nos seguintes mercados: MONETÁRIO: mercado onde são realizadas as operações de curto prazo. Inclui as instituições financeiras e as operações realizadas na Bolsa de Valores; CRÉDITO: atende as necessidades de curto, médio e longo prazo, decorrente de operações de crédito disponibilizadas para as Pessoas Físicas e Jurídicas; CAPITAIS: atende as necessidades de médio a longo prazo, principalmente de recursos destinados a investimentos. Por exemplo, operações de abertura de capital e emissão de ações pela bolsa de valores. CAMBIAL: atende a necessidades de moeda estrangeira no país, por parte de importadores / exportadores, agências de viagens e demais instituições financeiras. Tavares (2012) observa que o SFN é composto por órgãos normativos, entidades supervisoras e operadores. Os normativos são instituições que tem como função a edição de regras e normas. Já as entidades supervisoras fiscalizam as operações do sistema financeiro, e os operadores são instituições que executam as instituições de intermediação financeiros. 41 Tavares, 2014:89. 104 Figura 3 - Estrutura do SFN TABELA 22 - ESTRUTURA DO SFN CONSELHO MONETÁRIO NACIONAL (CMN) Principal órgão do SFN, ele é responsável por todas as diretrizes a serem aplicadas em todo o sistema. Formula toda a política cambial e monetária. COMITÊ DE POLÍTICA MONETÁRIA (COPOM) Órgão auxiliar do CMN na manutenção da política monetária. Define, dentre outras coisas, a taxa básica de juros (SELIC). Órgão executor público do SFN. Fiscaliza as instituições financeiras, fazendo valer as regras definidas pelo CMN, além de controlar o fluxo de capital estrangeiro no país. É responsável ainda pela execução da política monetária. BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN) COMISSÃO DE VALORES MOBILIÁRIOS (CVM) Órgão responsável pela fiscalização, normatização e controle do mercado de capitais no Brasil. BANCO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E SOCIAL (BNDES) Principal banco de desenvolvimento e incentivo à capacidade produtiva no Brasil, tem como função básica a disponibilização de linhas de crédito mais baratas do mercado, seja direcionando recursos a setores prioritários ou em programas especiais de desenvolvimento. Fonte: Tavares, 2012:38 105 4.2. Modalidades de Crédito – Pessoa Física (PF) De acordo com Tsuru (2012), as modalidades de crédito para pessoa física vão desde simples venda com anotação de caderneta até as mais complexas operações do sistema financeiro, utilizando-se das mais complexas técnicas e serviços financeiros. Tsuru (2012) e Tavares (2014) elencam as seguintes modalidades de crédito à PF: 4.2.1. Crédito Direto ao Consumidor – CDC Disponibilizada em grande parte através das lojas de varejo, que vendem suas mercadorias ao consumidor e parcelam suas compras através de prestações fixas e concessivas. Apesar de ocorrer geralmente no interior das lojas, esta modalidade de crédito é intermediada através de financeiras ou banco na modalidade de crédito ao consumidor. A garantia é o bem financiado e o risco do crédito fica por conta da financeira ou banco intermediador. A operação é sujeita ao recolhimento de IOF, e o prazo de pagamento varia entre 3 a 48 meses. 4.2.2. Cheque Especial Disponibilizado pelo banco comercial no qual o cliente PF possui sua conta corrente, é uma modalidade de crédito rotativo para necessidades temporárias, geralmente menor que um mês. O limite fixo fica à disposição do correntista, que pode utiliza-lo automaticamente e, caso o utilize, paga uma taxa pré-fixada correspondente aos dias utilizados. A garantia consiste apenas nos termos previstos na abertura da conta. 106 4.2.3. Cartão de Crédito Modalidade de crédito rotativo para financiamento de compras de bens e serviços, e para saques em caixas eletrônicos até o limite estipulado. As taxas são prefixadas, e o cliente pode parcelar o pagamento do valor devido. O cliente pode também financiar parte da fatura de compras realizada, pagando uma taxa de juros pré-fixadas em contrato. A garantia consiste apenas nos termos previstos na abertura da linha de crédito, e atualmente o BACEN exige que o cliente pague pelo menos 20% do valor da fatura mensal do cartão de crédito. 4.2.4. Crédito Imobiliário Consiste em recursos destinados geralmente para compra de residências, por meio de repasses do Governo Federal, utilizando créditos do FGTS – Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, FAT – Fundo de Amparo ao Trabalhador, PIS / PASEP – Programa de Incentivos Sociais. Garantia do crédito é o imóvel financiado, e necessita da autorização do cônjuge. 4.2.5. Leasing Entendida como uma alternativa ao CDC, utilizada mais frequentemente para financiamento de veículos, o leasing é uma operação de crédito em que as companhias de crédito adquirem o bem (automóvel, por exemplo) e alugam para uma PF. No final do contrato, a PF pode adquirir o bem através de um valor residual, que varia de acordo com cada contrato. Atualmente é possível adquirir vários equipamentos por leasing (computadores, equipamentos para saúde, etc.). 107 4.2.6. Crédito Consignado Modalidade de crédito destinado à PF, tem como característica principal o fato que o valor das parcelas devidos são descontadas automaticamente na fonte de renda do devedor (salário). Possui uma taxa de juros mais atrativa, uma vez que o risco de inadimplência é menor, e tem como uma das regras que o valor da parcela da dívida não pode ultrapassar 30% da renda do tomador do crédito. Foi regulamentado no Brasil pela Lei 10.820 de 17 de dezembro de 2003. 4.2.7. Contrato de Crédito Pessoal Modalidade de crédito destinado a PF, não possui destinação específica, podendo ser utilizado para os mais diversos fins. A análise de crédito é realizada pelas instituições financeiras, e o saldo devedor é amortizado em parcelas que incluem o valor principal e os encargos. Podem se exigir garantias, como alienação de bens de bens patrimoniais. 4.3. O Crédito ao Consumidor durante o Governo Lula (2003-2010) Conforme já mencionado anteriormente neste trabalho (ver capítulo II), observa-se durante o governo Lula um aumento significativo na quantidade de recursos destinados ao crédito, uma redução das taxas de juros praticadas, bem como uma ampliação do prazo nas operações de financiamento. Observa-se, ainda, uma considerável mudança no papel das instituições financeiras públicas, que além de fornecer crédito mais atrativo no mercado, interveriam de maneira significativa no mercado de crédito, assumido um papel importante de agentes na execução de políticas públicas definidas pelo Governo Federal. Sendo assim, o objetivo desta parte do trabalho é expor os resultados das modalidades de crédito ao consumidor no período, observando o comportamento de cada modalidade de crédito destinado á pessoa física, bem como suas consequências positivas e negativas: o seu impacto no mercado consumidor, bem como o endividamento das famílias. 108 4.3.1. O Crédito a PF De acordo com a tabela 4.2 abaixo, o total de crédito disponibilizado à PF entre 2002 a 2010 (recursos direcionados e livres) aumentou 290% no período. A relação crédito PF / PIB quase que triplicou, passando de 5,1% em 2002 para 14,7% em 2009 (último dado disponível). TABELA 23 - OPERAÇÕES DE CRÉDITO DO SISTEMA FINANCEIRO - PESSOAS FÍSICAS DEZ/ANO % DO PIB TOTAL PF PRAZO MÉDIO (DIAS) TAXA DE JUROS (%A.A.) INADIMPLÊNCIA - % 15 A 90 DIAS ACIMA DE 90 DIAS 2002 5,1 100 284,1 74,8 6,84 7,78 2003 5,7 108 257,9 77,8 6,54 7,26 2004 6,7 123 250,9 62,9 5,7 6,13 2005 8,8 142 272,5 61,4 6,19 6,74 2006 9,7 168 306,3 55,7 6,18 7,57 2007 11,2 210 373,8 47,7 5,97 7,01 2008 12,6 283 444,9 51,4 6,62 7,91 2009 14,7 321 477,2 46,8 5,52 7,71 2010 n.d. 390 526,6 40,7 5,29 5,68 Fonte: BACEN Observa-se também no período analisado que o prazo médio de empréstimos a PF aumentou aproximadamente 85%, de 284 para 526 dias, a taxa de juros aplicada para empréstimos a PF caiu quase pela metade, passando de aproximadamente 75% a.a. em 2002 para 40% em 2010, uma queda de 45,5% no período. De acordo com dados disponibilizados pelo BACEN, e apresentados na tabela 4.3, o volume de crédito pessoal disponibilizado pelas instituições financeiras entre 2002 à 2010 expandiu aproximadamente 47,7%, e a taxa média de juros desta modalidade passou de 91% a.a. em dezembro de 2002 para 44,11% em dezembro de 2010. 109 TABELA 24 - SALDO DAS OPERAÇÕES DE CRÉDITO RECURSOS LIVRES - PESSOA FÍSICA (EM MILHÕES) ANO CRÉDITO PESSOAL¹ FINANCIAMENTO VEÍCULOS BENS DIVERSOS 2002 31.616,19 100,0% 34.681,19 100,0% 5.895,89 100,0% 2003 35.925,07 113,6% 35.328,02 101,9% 6.295,66 106,8% 2004 28.764,68 91,0% 41.677,40 120,2% 7.910,53 134,2% 2005 32.880,98 104,0% 52.507,07 151,4% 10.596,96 179,7% 2006 31.883,99 100,8% 63.753,99 183,8% 10.826,66 183,6% 2007 34.848,78 110,2% 78.347,04 225,9% 11.981,43 203,2% 2008 44.528,34 140,8% 74.844,27 215,8% 10.532,79 178,6% 2009 46.698,07 147,7% 81.746,72 235,7% 8.361,99 141,8% 2010 55.166,89 174,5% 115.338,67 332,6% 8.517,98 144,5% ¹ Exclui Crédito Consignado Fonte: BACEN No que se refere aos recursos destinados ao financiamento de veículos a PF (CDC) o volume de crédito expandiu 232,6% no mesmo período, e a taxa média de juros anuais caiu de 35,05% de dezembro de 2002 para 25% a.a. em dezembro de 2010, conforme mostra tabela 4.4. Já o volume de crédito destinado ao financiamento de outros bens a PF viu sua expansão crescer aproximadamente 44% no mesmo período, e a taxa de juros média aplicada caiu de 58,8% a.a. em dezembro de 2002, para 26,5% a.a. em dezembro de 2010. TABELA 25 - TAXA MÉDIA DAS OPERAÇÕES DE CRÉDITO RECURSOS LIVRES PESSOA FÍSICA (% A.A.) FINANCIAMENTO ANO CRÉDITO PESSOAL¹ 2002 91,84 100,0% 55,53 100,0% 80,71 100,0% 2003 80,32 87,5% 36,85 66,4% 71,54 88,6% 2004 68,37 74,4% 35,63 64,2% 66,92 82,9% 2005 67,28 73,3% 34,8 62,7% 65,2 80,8% 2006 57,18 62,3% 32,32 58,2% 60,98 75,6% 2007 45,8 49,9% 28,76 51,8% 56,53 70,0% 2008 60,44 65,8% 36,51 65,7% 73,79 91,4% 2009 44,35 48,3% 25,37 45,7% 54,83 67,9% 2010 44,11 48,0% 25,19 45,4% 47,91 59,4% ¹ Exclui Crédito Consignado Fonte: BACEN VEÍCULOS BENS 110 O crescimento de crédito na modalidade leasing destinado a PF, utilizado para financiamento de bens (em grande parte de automóveis) apresentou um crescimento exponencial de aproximadamente 1899% de 2003 a 2010, conforme demonstrado pela tabela 4.5 abaixo. TABELA 26 - OPERAÇÕES DE CRÉDITO PF -LEASING (EM MILHÕES) TABELA 4.5 - OPERAÇÕES DE CRÉDITO PF -LEASING (EM MILHÕES) ANO SALDO 2003 1.956,8 100,0% 2004 4.715,7 241,0% 2005 8.730,0 446,1% 2006 13.938,4 712,3% 2007 28.976,9 1480,8% 2008 51.491,4 2631,4% 2009 55.025,8 2812,0% 2010 39.125,9 1999,5% Fonte: BACEN No que tange ao volume de crédito na modalidade Cheque Especial destinado à PF, observa-se no período de 2002 a 2010 uma expansão de aproximadamente 90,3%, e a taxa média anual de juros aplicada nesta modalidade apresentou uma tendência de queda contínua de 2002 a 2007, passando de proximamente 163% a.a. para 138%, e a partir de 2008 obsevouse a taxa de juros subir para 174% a.a. em 2008, cair para 159% em 2009, e atingir um índice mais alto em 2010, atingindo uma taxa de 170,7% a.a. TABELA 27 - VOLUME ANUAL DE CRÉDITO COM RECURSOS LIVRES CHEQUE ESPECIAL- PESSOAS FÍSICAS ANO VOLUME (EM MILHÕES) PRAZO MÉDIODIAS INADIMPLÊNCIA ACIMA DE 90 DIAS - % TAXA MÉDIA DE JUROS % A.A. 2002 8.545 100,0% 20 8,38 163,93 2003 8.919 104,4% 21 7,97 144,63 2004 9.800 114,7% 20 6,05 143,97 2005 10.974 128,4% 21 7,6 147,45 2006 11.760 137,6% 21 10,6 142,04 2007 12.985 152,0% 21 10,58 138,05 2008 16.040 187,7% 21 10,65 174,9 2009 15.787 184,8% 22 12,8 159,08 2010 16.262 190,3% 22 10,1 170,71 Fonte: BACEN 111 Na modalidade de crédito cartão de crédito destinado à PF, observa-se entre os anos de 2002 a 2010, um aumento de aproximadamente 502% no volume de crédito disponibilizado para esta modalidade, tendo a concessão de crédito expandido no período em 773%, conforme demonstra a tabela 4.6. TABELA 28 - OPERAÇÕES DE CRÉDITO - CARTÃO DE CRÉDITO - PESSOA FÍSICA VOLUME (EM MILHÕES) ANO PRAZO MÉDIO DIAS CONCESSÕES INADIMPLÊNCIA - % 15 A 90 ACIMA DE 90 DIAS DIAS 10,34 16,42 2002 4.838,6 100,0% 23.789.658 100% 30,83 2003 6.474,9 133,8% 33.059.044 139% 30,47 8,82 15,31 2004 8.207,3 169,6% 41.991.678 177% 26,03 10,64 19,73 2005 11.259,5 232,7% 66.550.599 280% 24,68 14,31 22,95 2006 13.418,4 277,3% 88.465.207 372% 33,28 12,12 24,09 2007 17.150,3 354,4% 98.254.640 413% 29,84 12,14 24,93 2008 22.088,2 456,5% 127.759.623 537% 32,34 12,68 27,34 2009 25.668,9 530,5% 158.874.883 668% 33,61 11,22 26,72 2010 29.170,3 602,9% 207.709.700 873% 33,02 12,3 24,23 FONTE: BACEN Já na modalidade disponibilizado para financiamento imobiliário, observa-se no período uma expansão no saldo de operações de crédito nesta modalidade crescer no período de 2002 a 2010, aproximadamente 388%, e a concessão de crédito viu uma expansão de 2859%! O prazo médio também aumentou consideravelmente, passando de 1.633,1 dias (4,5 anos) em 2002, para 4.298 dias (11,8 anos) em 2010, uma expansão do prazo médio em aproximadamente 163% no período analisado. TABELA 29 - CONCESSÕES DAS OPERAÇÕES DE CRÉDITO - FINANCIAMENTO IMOBILIÁRIO - PESSOA FÍSICA¹ CONCESSÕES U.M.C. (MIL) ¹ PRAZO MÉDIO (DIAS) INADIMPLÊNCIA - % 15 A 90 ACIMA DE DIAS 90 DIAS 7,99 6,71 ANO SALDO (MILHÕES) 2002 252.805,45 100,0% 157.920 100,0% 1.633,10 2003 260.728,48 103,1% 149.811 94,9% 1.525,29 5,25 5,61 2004 269.948,51 106,8% 204.870 129,7% 1.260,98 5,28 6,43 2005 290.361,56 114,9% 235.090 148,9% 1.317,46 4,21 5,84 2006 354.010,70 140,0% 605.851 383,6% 1.562,20 3,9 5,13 2007 435.078,87 172,1% 1.449.088 917,6% 2.199,34 2,78 2,87 2008 570.088,13 225,5% 1.999.902 1266,4% 2.712,03 2,88 3,28 2009 807.143,64 319,3% 2.190.291 1387,0% 3.238,56 2,95 3,04 2010 1.234.489,54 488,3% 4.674.029 2959,7% 4.298,02 2,42 2,06 ¹ O valor refere-se ao volume total de crédito do referido ano Fonte: BACEN 112 Outra característica consiste na concentração dos bancos públicos na concessão de crédito nesta modalidade, conforme verificado na tabela 4.8. Em 2002, as instituições financeiras públicas eram responsáveis por 72% do crédito imobiliário, passando para 84% em 2010, representando uma expansão de aproximadamente 472% no período, enquanto o setor privado expandiu 176% na mesma modalidade. TABELA 30 - SALDO DAS OPERAÇÕES DE CRÉDITO - SETOR HABITACIONAL (MILHÕES) ANO EVOLUÇÃO ESTRUTURA PÚBLICO PRIVADO TOTAL PÚBLICO PRIVADO TOTAL 2002 100% 100% 100% 72% 28% 100% 2003 108% 91% 103% 75% 25% 100% 2004 114% 90% 107% 76% 24% 100% 2005 125% 89% 115% 78% 22% 100% 2006 158% 95% 140% 81% 19% 100% 2007 196% 112% 172% 82% 18% 100% 2008 254% 152% 226% 81% 19% 100% 2009 368% 195% 319% 83% 17% 100% 2010 572% 276% 488% 84% 16% 100% Fonte: BACEN Na modalidade de crédito consignado, criado a partir de 2004, na qual a instituição financeira desconta o valor devido diretamente na fonte pagadora do trabalhador diminuindo assim, portanto, o risco de inadimplência, o volume de crédito nesta modalidade expandiu aproximadamente 706% de 2004 a 2010, e a taxa de juros média aplicada passou de 38,9% a.a. em 2004 para 27,7% a.a. em 2010, representando uma queda de aproximadamente 29,8% na modalidade. TABELA 31 - OPERAÇÕES DE CRÉDITO PF - CRÉDITO CONSIGNADO ANO VOLUME (EM MILHÕES) TAXA MÉDIA (%a.a.) 2004 17.151,0 100,0% 38,9 100,0% 2005 31.704,0 184,9% 36,4 93,6% 2006 48.148,5 280,7% 33,3 85,6% 2007 64.685,5 377,2% 28,1 72,2% 2008 78.889,7 460,0% 30,8 79,2% 2009 107.883,4 629,0% 27,2 69,9% 2010 138.239,6 806,0% 27,7 71,2% Fonte: BACEN 113 4.4. Comprometimento da Renda e Inadimplência De acordo com dados disponibilizados pelo BACEN, ao se analisar toda modalidade de crédito disponibilizado à PF, a inadimplência de vencimento acima de 90 dias diminuiu: em dezembro 2002 representava aproximadamente 7,78% do total destinado a PF, passando para 5,68% em dezembro de 2010. Observa-se uma queda da inadimplência no financiamento imobiliário, no mesmo período, passando de 6,71% para 2,06%, respectivamente. Contudo, esta tendência de queda não é verificada em toda modalidade de crédito. No cartão de crédito PF, em 2002 a porcentagem de contratos inadimplentes acima de 90 dias representava 16,42% do total, passando para 24,23% em dezembro de 2010. A modalidade de cartão de crédito, segundo Sbicca et al (2012), apresentou uma considerável expansão, principalmente quando se analisa o nível de renda dos usuários: Ao passo em que o percentual de usuários de cartão de crédito elevou-se de 59,9% para 64,4% na faixa de renda mais elevada (5% finais da distribuição nacional), todas as faixas até a metade da distribuição tiveram crescimento próximo de, ou superior a, 100% em percentual de usuários. O cartão de crédito foi a modalidade com maior crescimento no período, atingindo 26,8% de penetração média no Brasil (Sbicca et al , 2012:11). Esses autores comentam ainda um fenômeno conhecido como “Periferia Jovem”, caracterizado por jovens trabalhadores oriundos de classe de baixa renda, com pouca qualificação escolar, e por estudantes oriundos de escolas de periferia e famílias que recebem alguma assistência social por parte do Estado. Eles afirmam que grande parte do lucro do cartão de crédito vem justamente da receita proveniente do financiamento das faturas do cartão de crédito: “Entre 2003 e 2007, as receitas com o crédito rotativo e multa devido à inadimplência cresceram em média 19,5% ao ano, com participação 60% maior em relação ao total no último ano citado”42, comentam Sbicca et al (2012). 42 Sbicca (2012):12. 114 Os dados apresentados por Sbicca et al (2012) encontram consonância com os resultados de pesquisa realizada pela Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FECOMERCIO), intitulada “Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor - PEIC” que tem como objetivo diagnosticar o nível de endividamento e inadimplência do consumidor. De acordo com a pesquisa, em dezembro de 2010, ao se analisar as dívidas e seu comprometimento familiar, o cartão de crédito representava aproximadamente 68,9% das dívidas contraídas pelas famílias, conforme demonstra a tabela 4.11. TABELA 32 - - TIPO DE DÍVIDA POR RENDA FAMILIAR - DEZEMBRO DE 2010 TIPO DE DÍVIDA TOTAL RENDA FAMILIAR MENSAL ATÉ 10 SM MAIS DE 10 SM CARTÃO DE CRÉDITO 68,9% 68,9% 69,0% CHEQUE ESPECIAL 7,7% 7,0% 12,9% CHEQUE PRÉ-DATADO 4,5% 4,8% 2,6% CRÉDITO CONSIGNADO 2,3% 2,2% 3,4% CRÉDITO PESSOAL 9,8% 9,3% 13,8% CARNÊS 24,8% 25,8% 17,2% FINANCIAMENTO DE CARRO 8,8% 6,7% 24,1% FINANCIAMENTO DE CASA 2,6% 2,2% 6,0% OUTRAS DÍVIDAS 1,5% 1,6% 0,9% NÃO SABE 0,0% 0,0% 0,0% NÃO RESPONDEU 0,4% 0,3% 0,9% FONTE: FECOMERCIO No que se refere ao comprometimento da renda das famílias com o serviço da dívida, observa-se no período entre dezembro de 2005 a dezembro de 2010 um pequeno crescimento no comprometimento da renda, passando de 17,25% (primeiro dado disponível) em dezembro de 2005, para 19,43% em dezembro de 2010, conforme tabela 4.11. 115 TABELA 33 - COMPROMETIMENTO DE RENDA DAS FAMÍLIAS COM DÍVIDA COM O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL - COM AJUSTE SAZONAL - % DATA AMORTIZAÇ ÃO DA DÍVIDA JUROS DA DÍVIDA SERVIÇO DA DÍVIDA DEZ/05 11,83 5,42 17,25 SERVIÇO DA DÍVIDA EXCETO CRÉDITO HABITACIONAL 16,88 DEZ/06 12,28 6,06 18,34 17,91 DEZ/07 11,57 6,03 17,6 17,13 DEZ/08 11,55 7,05 18,6 18,04 DEZ/09 12,18 7,37 19,55 18,84 DEZ/10 12,31 7,12 19,43 18,54 Fonte: BACEN Os dados disponibilizados pelo BACEN vão ao encontro com os resultados publicados pela pesquisa PEIC/ FECOMERCIO, que em dezembro de 2004 (2004 foi o primeiro ano da pesquisa) o percentual de famílias endividadas era de 69,7%, com contas em atraso 22,1%, e o total de famílias que declaravam que não teriam condições para arcar com as dívidas representavam 4,5% do total entrevistado. Em 2010, as mesmas variáveis caíram para 45,7%, 13,2% e 4,3%, respectivamente (ver tabela 4.12). TABELA 34 - COMPROMETIMENTO DA RENDA FAMILIAR COM DÍVIDAS PERCENTUAL DE FAMÍLIAS ENDIVIDADAS MÊS DEZ-04 DEZ-05 DEZ-06 DEZ-07 DEZ-08 DEZ-09 DEZ-10 69,7% 60,8% 61,2% 48,4% 49,6% 47,7% 45,7% FONTE: FECOMERCIO CONTAS EM ATRASO 22,1% 26,2% 26,2% 17,4% 15,0% 19,7% 13,2% NÃO TERÃO CONDIÇÕES DE PAGAR 4,5% 4,9% 8,6% 3,8% 4,2% 6,4% 4,3% Na pesquisa “Índice de Expectativas das Famílias (IEF)” volume 1 publicado pelo IPEA (Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicada), traz que em dezembro de 2010, 45% das famílias entrevistadas afirmaram não ter dívidas, e que aproximadamente 20% das famílias possuem alguma conta atrasada. Contudo, de acordo com a pesquisa, 60% dessas famílias creem que 116 conseguirão quitar essas contas total ou parcialmente no mês seguinte. 4.5. Crédito x Atividade Econômica Conforme mencionado anteriormente neste trabalho (ver capítulo II), durante os dois mandatos do governo Lula o aumento da produtividade, transferências de renda e outras ações de estímulo a economia e programas de transferências de renda, tais como a implementação do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) e subsídios a setores considerados estratégicos, fez com que impactasse consideravelmente o setor real da economia. TABELA 35 - RENDIMENTO, PRODUÇÃO E CONSUMO DAS FAMÍLIAS (2002-2010 MERCADO DE TRABALHO FORMAL 100,0 PIB RENDIMENTO MÉDIO 2002 SALÁRIO MÍNIMO REAL 100,0 100,0 100,0 CONSUMO FINAL FAMILIAS 100,0 2003 100,7 84,7 101,1 90,8 100,7 2004 104,4 199,8 106,9 94,2 107,8 2005 111,7 164,5 110,3 96,1 111,5 2006 127,4 161,2 114,7 103,5 117,1 2007 135,1 212,1 121,7 110,5 124,8 2008 139,3 190,5 127,9 115,7 128,1 2009 149,3 130,5 127,5 114,7 137,8 2010 157,3 280,3 137,1 121,3 147,9 ANO Fonte: IPEADATA Considerando a variação real do PIB (excluindo a inflação) entre os anos de 2002 a 2010 expandiu 37,1%, o rendimento médio do pessoal ocupado 21,3%, o número de postos formais de trabalho 180,3%, conforme tabela 4.13. Ao se analisar o resultado em setores específicos, observa-se um crescimento considerável na produção de veículos que entre os anos de 2002 a 2010 expandiu aproximadamente 80%, móveis e eletrodomésticos 157%, mercados e hipermercados 49% no mesmo período (ver tabela 4.14). 117 TABELA 36 - EXPANSÃO DO CONSUMO E VENDAS (2002=100)¹ VAREJO AMPLIAD O MATERIAIS MÓVEIS E DE ELETRODOM CONSTRUÇÃ ÉSTICOS O 100,0 N.D. ANO VEÍCULOS SUPER MERCA DOS 2002 100,0 100,0 n.d. 2003 100,2 95,5 100,0 99,1 100,0 100 2004 123,0 102,6 111,1 125,3 113,3 107,2 2005 136,3 104,8 114,5 145,4 118,2 113,66 2006 139,7 112,9 121,9 160,3 128,7 117,95 2007 165,6 120,6 138,4 185,0 147,7 128,51 2008 175,8 127,0 152,1 212,9 174,3 145,63 2009 181,5 137,2 162,5 217,4 178,3 162,77 2010 188,4 149,1 182,3 257,2 215,0 182,1 FARMÁCIA E COSMÉTICOS N.D. ¹ Obs: quando não disponível, o ano de referência passa ser o seguinte. FONTE: IPEADATA Além dos setores acima citados, observa-se também uma relação quase direta entre valor dos imóveis x crédito imobiliário. De acordo com o IVG-R (Índice de Valores de Garantia de Imóveis Residenciais Financiados), índice criado pelo BACEN com o objetivo de medir a valorização dos imóveis, entre os anos de 2002 a 2010, o valor dos imóveis expandiu aproximadamente 258%, enquanto o crédito destinado à PF para financiamento dos imóveis residenciais no mesmo período cresceu 388%43 (ver gráfico 1) GRÁFICO 4 - CRÉDITO HABITACIONAL X PREÇO DOS IMÓVEIS 600,0% 500,0% 400,0% 300,0% 200,0% 100,0% 0,0% IVG-R 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 CRÉDITO HABITACIONAL Figura 4 - CRÉDITO HABITACIONAL X PREÇO DOS IMÓVEIS Ao analisar o consumo das famílias e seu impacto no crescimento do PIB, segundo dados disponibilizados pelo IPEDATA44, no ano de 2002 o 43 44 Este índice já é deflacionado pelo IPCA, índice de inflação oficial utilizado pelo governo. Ver “Contribuição do consumo final das familias no crescimento do PIB” – IPEADATA. 118 consumo das famílias contribuiu 1,22% para o crescimento do PIB naquele ano. Em 2010, esta contribuição passa para 4,24%, confirmando assim o avanço e consumo interno ocorrido na economia brasileira neste período. Contudo, ao se comparar a evolução o crescimento do setor real da economia, com a expansão do crédito destinado a PF, observa-se que este cresceu a taxas muito mais elevadas que a expansão da economia real, conforme bem demonstra o gráfico 2. 450,0 400,0 350,0 300,0 250,0 200,0 150,0 100,0 50,0 0,0 PIB RENDIMENTO MÉDIO CONSUMO FINAL FAMILIAS CRÉDITO PF 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 CRESCIMENTO GRÁFICO 2 - CRÉDITO PF X ECONOMIA REAL Figura 5 - CRÉDITO PF X ECONOMIA REAL Enquanto se observa que a variação do PIB, Consumo Final das Famílias e o Rendimento Médio se comportam quase igualmente, com as linhas do gráfico quase sobrepostas uma sobre as outras, o crédito disponibilizado a PF se destoa deste grupo, apresentando um crescimento muito além daquele verificado no setor real da economia doméstica. 119 CONSIDERAÇÕES FINAIS Qual papel cabe ao Estado? Qual seu tamanho ideal? Quais as medidas podem ser tomadas para que o desenvolvimento aconteça e a desigualdade atinja seu menor nível possível numa economia capitalista? Acredito que estas perguntas há muito tempo vem sendo formuladas e respondidas em todo o mundo, e no Brasil não é diferente. O país, na sua curta história, seguiu diversos caminhos, que foram tomados com o intuito de que o Brasil atingisse o seu pleno desenvolvimento, e deixasse de ser o país do futuro (o “longo amanhecer” ao qual Celso Furtado tanto se referia) para ser o país do presente;esses caminhos foram seguido tanto com a presença de um Estado na condução do seu desenvolvimento quanto sem ela. Na primeira metade do século XX, após o capitalismo mundial sofrer sua principal crise, e o liberalismo auto-regulador ser colocado em xeque (ver capítulo I) foram implementadas no país um conjunto de medidas e de ações inspiradas na perspectiva desenvolvimentista. Conforme mencionado no capítulo I desta dissertação, esta corrente teórica inspirou e deu sustentação, em certo modo, para um conjunto de medidas e ações, lideradas pelo Estado, com o objetivo de reverter o subdesenvolvimento e promover o desenvolvimento econômico. O caminho do crescimento passava pela industrialização. Sendo assim, observa-se na primeira metade do século XX o surgimento de um Estado inovador e empresário O Estado Brasileiro tomou para si o papel de coordenação do desenvolvimento econômico do país, criando órgãos técnicos para deliberar e propor políticas de fomento, como o Conselho Federal do Comércio Exterior (1931) e o Conselho Técnico de Economia e Finanças (1937), por exemplo. O Estado brasileiro no período tinha um projeto a ser seguido. Várias ações no decorrer do primeiro e segundo governos de Getúlio Vargas foram se consolidando, visando a modificação da estrutura econômica do país. O país conseguiu diminuir sua dependência externa nos Bens Intermediários, com a criação da PETROBRÁS, da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) e a Cia Nacional de Álcalis, por exemplo. 120 No que se refere ao financiamento de obras de desenvolvimento, criouse o BNDE (Banco Nacional de Desenvolvimento), para financiar obras importantes na perspectiva desenvolvimentista; posteriormente, esta experiência permitiu o surgimento de outras instituições de financiamento de desenvolvimento regional (como o caso do Banco do Nordeste), além de carteiras específicas em bancos estatais para financiar certos segmentos. No caso da agricultura, já existia uma experiência prévia, a Carteira Agrícola do Banco do Brasil em 1937. Já o governo de Juscelino Kubitscheck através de seu “Plano de Metas”, definiu uma série de prioridades e medidas que deveriam ser tomadas para superar alguns pontos de estrangulamento da malha produtiva e promover uma economia nacional mais integrada, o que foi posteriormente intensificado com a implementação do II PND, que em suma, promoveu o desenvolvimento da indústria de bens de capital no Brasil, internacionalizando boa parte da base técnica de produção. Contudo, a partir dos anos de 1980, esta intervenção deliberada do Estado na economia começou a perder fôlego. Ante essa situação, e dada a crise de financiamento que fragilizava a ação estatal, a ideologia neoliberal ganhou força, e paulatinamente foi sendo aceita a crença de que a ausência de intervenção econômica era o melhor caminho para o desenvolvimento econômico. Por todo o mundo, inclusive no Brasil, o processo de privatização de empresas estatais e a desregulamentação dos investimentos externos e dos mercados de capitais foram ganhando espaço e, como denuncia Carneiro (2005), aos poucos, todo o arcabouço que permitiu estruturar o “nacionaldesenvolvimentismo” foi sendo desmontado. Diversas reformas aconteceram a partir do final da década de 1990, como o Plano Nacional de Privatização, a abertura externa, os esforços para controlar a dívida pública, e a busca incessante pelo Superávit Primário das contas públicas com o objetivo de pagar os juros da dívida. Como observa Pochmann (2009), neste período prevaleceu o “ajuste fiscal e desajuste social”, onde o rendimento proveniente do sistema produtivo é deslocado para o pagamento da dívida externa, além do considerável aumento real da carga tributária em torno de 10%: 121 A partir dos anos 1980, com toda a turbulência interna e externa, observamos um Estado desacreditado e falido, que ia perdendo sua capacidade de intervenção na economia. A eleição do Governo Lula representou um paradigma na história recente do Brasil, onde pela “primeira vez na história deste país”, um trabalhador oriundo da classe baixa, nordestino retirante, conseguiu ser eleito Presidente da República. Como comentado anteriormente neste trabalho, a eleição de Lula e do Partido dos Trabalhadores (PT) na liderança do Poder Executivo Federal, representou uma insatisfação como modelo anterior de desenvolvimento baseado no liberalismo econômico e no mercado como principal responsável por alocar recursos e por decidir o que deve ser priorizado. A frustração provocada pelos resultados econômicos e sociais insatisfatórios, fruto em grande parte das medidas mais liberalizantes, fez com que o papel do Estado como condutor do desenvolvimento econômico fosse retomado. Diante disso, volta-se a um modelo semelhante ao desenvolvimentismo implantado no século XX, contudo, mais adaptado a atual conjuntura econômica mundial e aos seus desafios.Surge assim o neodesenvolvimentismo, ou Novo Desenvolvimentismo. Para os adeptos desta corrente, o que cabe ao Estado é promover políticas e ações que busquem a garantia de preços macroeconômicos adequados, com destaque para a taxa de câmbio competitiva, permitindo boas condições para que suas economias possam participar da concorrência do capitalismo global, inspirado nas boas experiências vivenciadas pelos países asiáticos. Prevê ainda um Estado voltado mais à inclusão social e também ao respeito e promoção de práticas democráticas. O papel de destaque das empresas estatais é retomado, uma vez que empresas como Petrobrás, Infraero, Caixa Econômica, são chaves para o sucesso das políticas públicas do governo, seja agindo como agente interventor direto na economia, ou mesmo como agente executor de políticas públicas. Durante os dois mandatos do Governo Lula (2003 a 2010), ganham destaque na análise seus programas sociais, os que permitiram que uma 122 grande massa da população brasileira ingressasse na classe média. Esse resultado foi conseguido em grande parte através de uma política de valorização do salário mínimo e pela significativa ampliação da cobertura dos programas sociais de transferência de renda, em destaque, o Bolsa Família. O governou estimulou a queda da taxa básica de juros SELIC, e essa folga fiscal viabilizou uma série de investimentos. Os bancos públicos tiveram um papel essencial na redução das taxas de juros e das tarifas bancárias, além de ampliar a liquidez no sistema financeiro nacional, por meio da aquisição de instituições privadas e fusões com outros bancos públicos. Os bancos públicos foram também os principais responsáveis pela maior oferta de crédito na economia: sua participação pulou de 22% do PIB em 2002 para aproximadamente 45% do PIB em 2010. O custo de crédito tornou-se mais atrativo para todos os setores, com grande destaque para o crédito destinado à Pessoa Física (PF). O crédito disponível para esta modalidade saltou de aproximadamente 5% do PIB em 2002 para 14% em 2010. Observa-se ainda aumento dos prazos dos financiamentos, queda significativa nas taxas de juros aplicadas, aumento dos recursos direcionados para financiamento de imóveis e máquinas, tudo isso graças a uma forte atuação dos bancos públicos que diminuíram as taxas de juros através da concorrência bancária. Diante disso, é inegável que o Governo Lula reanimou instrumentos de intervenção estatal na economia. Os bancos públicos foram mais atuantes, o governo atuou na queda dos juros da economia, e promoveu ações e programas de políticas anticíclicas que deram um folego na economia enquanto o mundo capitalista vivia sua pior crise pós 1929. As características do ambiente macroeconômico nunca estiveram tão perto daquilo que é considerado desejável pelo novo desenvolvimentistas , com exceção do cambio que se manteve apreciado em grande parte dos dois períodos de governo, com exceção do início do primeiro mandato. E talvez aí esteja o grande calcanhar de Aquiles do novo desenvolvimentismo e do governo Lula: aceitar o jogo. O novo desenvolvimentismo, conforme já descrito anteriormente, aceita jogar o jogo do capitalismo mundial. Ou seja, defende políticas e programas 123 que tem como objetivo de “permitir” que a economia brasileira participe da melhor maneira do mercado global. E aí esteja o mais perverso deste jogo: a economia brasileira, como acontece desde a colônia, se insere muito bem na economia global como fornecedor de bens primários, e obteve excelentes resultados nas suas exportações principalmente durante o primeiro mandato do governo Lula., conforme mencionado por autores neste trabalho. Grande parte do câmbio apreciado durante o período do mandato se deu, em certa parte, pela entrada de moeda estrangeira decorrente da exportação de commodities. O governo Lula se propõe em realizar reformas pontuais e não estruturantes. Modifica onde foi permitido modificar, através da sua ampla e irrestrita base governista, sem, contudo, conseguir atuar em temas sensíveis como reforma agrária, política, tributária, dentre outras. O mandato do presidente Lula reformou até o limite que sua base de sustentação lhe permitiu, não mais que isto. Parou nos grandes interesses e se acovardou das grandes mudanças. Enquanto o dito velho desenvolvimentismo defendia reformas estruturantes em toda economia, principalmente no incentivo e promoção em setores dinâmicos (que na época passava pela indústria), o governo Lula apesar dos grandes e consideráveis avanços, não conseguiu que suas reformas conseguissem criar um cenário macroeconômico favorável ao crescimento sustentado e uma melhor participação da economia brasileira na economia mundial além das commodities. A culpa não é totalmente do governo, uma vez que não cabe ao Estado todas as ações e programas. O governo não pode tudo. Na democracia, as correlações de forças e o jogo de interesses atuam diretamente na alocação de recursos e eleição de prioridades, e reformas que causam significativas mudanças são muito difíceis de concretizarem. Enfim, o governo Lula representa o limite das reformas. Isto é, o limite das reformas pontuais. O desenvolvimento demanda reforma mais amplas e profundas; demanda um pacto político em favor de um projeto nacional mais vanguardista e que objetive transformações profundas na estrutura econômica e social do país. 124 BIBLIOGRAFIA ABREU, M. P. (ORG). A ordem do progresso: cem anos de política econômica republicana – 1889-1989. Ed Campus: Rio de Janeiro, 1990. ALMEIDA, P. A experiência brasileira em planejamento econômico: uma síntese histórica. Disponível em http://www.pralmeida.org/05DocsPRA/1277HistorPlanejBrasil.pdf Acessado em 17/11/2008> ALMEIDA, R. A Política econômica do Segundo Governo Vargas. In: SZMRECSÁNYI, T e GRANZIERA, R. G. (ORGS) Getúlio Vargas & a economia contemporânea. Campinas, 2ª ed.:Ed. UNICAMP, 2004. ARAUJO, José Prata. Um retrato do Brasil : balanço do governo Lula. São Paulo:Editora Fundação Perseu Abramo, 2006. BELLUZZO L. G. de M. e COUTINHO R. (orgs.) Desenvolvimento Capitalista no Brasil – Ensaios sobre a crise. São Paulo: Ed. Unicamp, 1998. BIELSCHOWSKY, R. O desenvolvimentismo: do pós-guerra até meados dos anos 1960 in: O desenvolvimento econômico brasileiro e a Caixa: palestras / Ricardo Bielschowsky [et al.] Rio de Janeiro : Centro Internacional Celso Furtado de Políticas para o Desenvolvimento : Caixa Econômica Federal, 2011. BOBBIO, NOBERTO. Dicionário de Política. Vol2. Brasília: Ed UNB, 1998. BORIS, F. História do Brasil. São Paulo: Ed. EDUSP, 2008 BOULDING. Os Princípios da Política Econômica. São Paulo: Ed. Fundo da Cultura, 1967 BRESSER PEREIRA; THEUER, Daniela. Um Estado novo-desenvolvimentista na América Latina? Economia e Sociedade, Campinas, v. 21, Número Especial, p. 811-829, dez. 2012. CAMARGO, PO. A evolução recente do setor bancário no Brasil [online]. São Paulo: Editora UNESP; São Paulo: Cultura Acadêmica, 2009 CANO, WILSON. Desconcentração Produtiva Regional do Brasil 19702005. São Paulo: Ed. UNESP, 2008. ______________. América Latina: notas sobre a crise. Econ. soc., Campinas, v. 18, n. 3, Dec. 2009 . _______________. Uma agenda nacional de desenvolvimento. Texto de Discussão 183. Campinas: Instituto de Economia, 2010 _______________. A desindustrialização do Brasil. Texto de Discussão 200. Campinas: Instituto de Economia, 2012 125 CARNEIRO, Ricardo. O Brasil Frente à Crise Global. Interesse Nacional – abrIl/junho 2009 _______________.Velhos e Novos Desenvolvimentismos. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2011 CARDOSO, F. H., A Arte da Política. São Paulo: Civilização Brasileira, 2005 CARDOSO, José Celso. A reinvenção do planejamento governamental no Brasil. Brasília : Ipea, 2011. CARDOSO DE MELLO. O Capitalismo Tardio. São Paulo, Ed. Brasiliense, 1982. CARNEIRO. A supremacia dos mercados e a política econômica do Governo Lula. Política Econômica em Foco Nº 7, Campinas, 2005. CARRARO, André e FONSECA, Pedro. O Desenvolvimento Econômico no Primeiro Governo de Vargas (1930-1945). Anais do V Congresso Brasileiro de História Econômica e 6ª Conferência Internacional de História de Empresas, Caxambu, MG - v. CDRom, 2003 CASTELO, Rodrigo. O novo desenvolvimentismo e a decadência ideológica do pensamento econômico brasileiro. Serv. Soc. Soc., São Paulo , n. 112, Dec. 2012 . CASTRO, A. B. de e SOUZA, F. A economia brasileira em marcha forçada. São Paulo, Paz e Terra, 1985 COSTA, Fernando Nogueira da. Bancos e Crédito no Brasil: 1945-2007. História e Economia. Revista Interdisciplinar 134. Vol. 4 - n. 2 - 2º semestre 2008 FAGNANI, Eduardo. Previdência Social e Desenvolvimento Econômico. Texto de Discussão 140. Campinas: Instituto de Economia, 2012 FERREIRA, P.C e CARDOSO, F. C. A redução do superávit primário é uma má política de crescimento. Disponível em:<http://www2.fgv.br/professor/ferreira/FragelliFerreira.pdf>Acessado em: 15/05/2007. FURTADO, C. Formação Econômica do Brasil. São Paulo: Saraiva, 1991 FURTADO, C. A Economia Latino-americana. 4ª Ed, São Paulo: Cia das Letras, 2007. FURTADO, M. Síntese da Economia Brasileira. Rio de Janeiro, 7ª ed. LTC, 2000. GERDESMEIER, DIETER. A Estabilidade dos Preços é importante por quê? Banco Central Europeu. Frankfurt, Alemanha: 2005 126 GIAMBIAGI, Fabio. Finanças Públicas: Teoria e Prática no Brasil. São Paulo, Elsevier, 2001. ___________. Economia Brasileira Contemporânea. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005. ___________. Economia Brasileira Contemporânea .2 Ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011. GONCALVES, Reinaldo. Novo desenvolvimentismo e liberalismo enraizado. Serv. Soc. Soc., São Paulo , n. 112, Dec. 2012 . GRAZIANO, J. Evolução da Pobreza no Brasil 1995/99. Texto para Discussão. IE/UNICAMP n. 104, nov. 2001. HARA, PHILIP. Encyclopedia of Political Economy. Cambridge University Press. New York, 1999 IPEA. Índice de Expectativas das Famílias (IEF). Secretaria de Assuntos Estratégicos. Volume 1. 30/12/2010 KERSTENETZKY, Celia Lessa. Redistribuição e desenvolvimento? A economia política do programa bolsa família. Dados, Rio de Janeiro , v. 52, n. 1, Mar. 2009 . KIRSCHEN. A Política Econômica Contemporânea. São Paulo: Ed. Atlas, 1975 KON, ANITA (org). Planejamento no Brasil II. São Paulo: Ed. Perspectiva, 1999. KREIN, José Dari. Trabalho no Governo Lula: avanços e contradições. Texto de Discussão 201. Campinas: Instituto de Economia, 2012. LAFER, C. in Lafer, B. M: Planejamento no Brasil. São Paulo: Perspectiva, 1975 LEITE, Alcides Domingues. Desenvolvimento e Mudanças no Estado Brasileiro. 2. ed. reimp. – Florianópolis : Departamento de Ciências da Administração / UFSC, 2012 LESSA, CARLOS. O conceito de política econômica: ciência e/ou ideologia? Campinas: Ed. Unicamp, 1998 LOPES, C. T. G. Planejamento, Estado e Crescimento. São Paulo: Pioneira, 1990. MARTONE, C. L. “Análise do Plano de Ação Econômica do Governo, PAEG (1964-1966)” in Lafer, B. M op. cit. MATOS, P. Análises dos Planos de Desenvolvimento elaborados no Brasil após o II PND. ESALQ/USP: Piracicaba, 2002. 127 MERCADANTE, Aloizio. O governo Lula e a construção de um Brasil mais justo. São Paulo : Editora Fundação Perseu Abramo, 2010a. ____________. As Bases do novo desenvolvimentismo: a análise do governo Lula (2003-2010). Unicamp, Instituto de Economia, Tese de Doutorado. Campinas, 2010 b. MOYO, S. e YEROS, P. The Fall and Rise of the National Question”. In: MOYO, S. e YEROS, P. (orgs), Reclaiming the Nation: The Return of the National Question in Africa, Asia and Latin America. Londres: Pluto Press, 2011. OLIVEIRA, C.A.B. Processo de industrialização. Do capitalismo originário ao atrasado. Campinas, Ed. UNESP, 2003 PAULA, Luiz Fernando de; OREIRO, José Luis; BASILIO, Flavio A. C.. Estrutura do setor bancário e o ciclo recente de expansão do crédito: o papel dos bancos públicos federais. Nova econ., Belo Horizonte , v. 23, n. 3, dez. 2013 . POCHMANN. Qual o desenvolvimento? Oportunidades contemporâneo. São Paulo: Publisher Brasil, 2009. do Brasil PEREIRA, M. J. Finanças Públicas: a política orçamentária do Brasil. São Paulo: Atlas, 1998. PINZANI, Alessandro; REGO , Walquiria Domingues Leão. Vozes do Bolsa Família. São Paulo: Ed. UNESP, 2013 PRADO, Luiz Carlos Delorme. O desenvolvimentismo autoritário de 1968 a 1980. in: O desenvolvimento econômico brasileiro e a Caixa: palestras / Ricardo Bielschowsky [et al.] Rio de Janeiro : Centro Internacional Celso Furtado de Políticas para o Desenvolvimento : Caixa Econômica Federal, 2011. REGO, J. M. e MARQUES, R. M. Economia Brasileira. 3ª. Edição. São Paulo: Saraiva, 2003. REGO, Walquiria Leão. Vozes do Bolsa Família: autonomia, dinheiro e cidadania. São Paulo: Ed. UNESP, 2013. RODRIGUES, Chrystian Marcelo. Análise de Crédito e Risco. Curitiba: Ibpex, 2011 SAES, Flávio Azevedo Marques de. A moeda, o crédito e o financiamento da produção. Estud. av., São Paulo , v. 15, n. 41, Apr. 2001 . SBICCA , Adriana; FLORIANI, Vinícius; JUK, Yohanna. Expansão do crédito no Brasil e a vulnerabilidade do consumidor. Revista Economia & Tecnologia (RET). Volume 8, Número 4, p. 05-16, Out/Dez 2012 SECRETARIA DE ASSUNTOS ESTRATÉGICOS. Vozes da Classe Média. Edição Marco Zero. Brasília, 2012. 128 SELDON, A. Dicionário de Economia. Vol. 2. Rio de Janeiro: ed. Block, 1969 SERRA, J. Ciclos e Mudanças Estruturais na Economia Brasileira do Pós Guerra, in BELLUZZO L. G. de M. e COUTINHO R. (orgs.) Desenvolvimento Capitalista no Brasil – Ensaios sobre a crise. São Paulo: Ed. Unicamp, 1998. SILVA, Giliad de Souza. O pensamento econômico brasileiro de 1930 a 1964: por uma nova formulação tipológica. A Economia em Revista. Volume 18 Número 2, Dezembro de 2010 SCHUMPETER, J. Teoria do desenvolvimento econômico. São Paulo: Abril, 1982. SCHINCARIOL, Vitor Eduardo. Crescimento Econômico no Brasil 20032010. São Paulo: Ed. LCTE, 2012. STUDART, Rogério. Financiamento do Desenvolvimento in: GIAMBIAGI, Fabio (ORG). Economia Brasileira Contemporânea (1945-2004). Rio de Janeiro: Elsevier, 2005 TAVARES, M. C. Auge e declínio do processo de substituição de importações no Brasil. In: Da substituição de importações ao capitalismo financeiro. Rio de Janeiro: Zahar, 1972. TAVARES, Rosana. Operações de Crédito: produtos e serviços bancários. Curitiba: Intersaberes, 2014 TEIXEIRA, Rodrigo Alves. A economia política dos governos FHC, Lula e Dilma: dominância financeira, bloco no poder e desenvolvimento econômico. Economia e Sociedade, Campinas, v. 21, Número Especial, p. 909-941, dez. 2012. TSURU, Sérgio Kazuo. Crédito no Varejo: para pessoas físicas e jurídicas. Curitiba: Intersaberes, 2012. VASCONCELLOS, M. A. S. (ORG). A Economia Brasileira Contemporânea. São Paulo: Atlas, 2002. ZERBINI, Maria Beatriz; ROCHA, Fabiana. Crédito ao consumidor: uma avaliação dos primeiros anos do Plano Real. Nova Economia. Belo Horizonte: maio-agosto de 2004