46101 Anais do 43º Congresso Brasileiro de Cerâmica 2 a 5 de junho de 1999 - Florianópolis – S.C. ESTUDO DAS PROPRIEDADES ELÉTRICAS DO SISTEMA VARISTOR SnO2.CoO.Ta2O5 Éder Carlos Ferreira de Souza 1, Sandra Regina Masetto Antunes 1, Paulo R. Bueno 2 Sidnei Antônio Pianaro 3, Alfredo José Zara 3, Augusto Celso Antunes 1 Laboratório de Materiais Cerâmicos Centro Interdisciplinar de Pesquisas - CIPP Universidade Estadual de Ponta Grossa - UEPG Av. Carlos Cavalcanti, 4748 Uvaranas Ponta Grossa - PR CEP 84030-000 Fone/Fax: (042) 220 - 3055 e-mail: [email protected] 1 Departamento de Química - UEPG; 2 Departamento de Química - UFSCar; 3 Depar- tamento de Engenharia de Materiais - UEPG; RESUMO Neste trabalho estudou-se o comportamento elétrico do sistema SnO2.CoO.Ta2O5 preparado por processamento convencional de mistura de óxidos e sinterizado a 1300 ºC por duas horas. As medidas de DRX mostraram que o sistema preparado é monofásico (SnO2). As medidas elétricas em corrente contínua apresentam um comportamento não-linear entre corrente-tensão com as seguintes características: coeficiente de não linearidade ( ) = 13; campo elétrico de ruptura (Er) = 2940 V/cm; corrente de fuga (If) = 1,31 x 10-6 A em 750 V/cm; tensão por barreira (vb) = 2,00 V/barreira (com tamanho médio de grão de 6,9 0,1 m). As medidas de impedância complexa mostram uma diminuição da resistividade em função do aumento da temperatura e a presença de duas constantes de tempo. Palavras-chaves: varistor, SnO2, propriedades elétricas. INTRODUÇÃO 46102 Anais do 43º Congresso Brasileiro de Cerâmica 2 a 5 de junho de 1999 - Florianópolis – S.C. O SnO2 é um semicondutor de banda larga do tipo n que apresenta condutividade elétrica devido a formação de defeitos puntuais intrínsecos (vacâncias de oxigênio ou estanho intersticial) ou extrínseco (impurezas ou dopantes). Esse óxido, quando devidamente dopado, pode apresentar características varistoras(1). Os varistores (também conhecidos como resistores variáveis ou resistores não-ôhmicos) exibem comportamento elétrico não linear (V x i) e esta propriedade pode ser descrita pela J = c x E, em que J é a densidade de corrente, c é uma equação empírica constante que depende da microestrutura do material, E é o campo elétrico aplicado e é o coeficiente de não linearidade(2). A condução elétrica destas cerâmicas pode ser considerada como emissões do tipo Schottky. Neste tipo de modelo, os elétrons são emitidos pela ação da temperatura e do campo elétrico, que distorcem o diagrama de energias próximo à interface (1, 3). Neste trabalho foram estudadas as propriedades elétricas do sistema SnO 2.CoO. Ta2O5 em corrente contínua e em corrente alternada. PROCEDIMENTO EXPERIMENTAL As cerâmicas foram preparadas a partir de SnO2 (Merk), CoO (Vetec), Ta2O5 (Riedel). Os corpos cerâmicos foram preparados através de dopagens estequiometricamente calculadas, resultando na composição: 98,90%SnO2.1,00%CoO. 0,050%Ta2O5 (% em mol). A composição foi preparada via úmida em álcool isopropílico P.A., em jarros de polipropileno com bolas de zircônia estabilizada com óxido de ítrio como agentes de moagem. O tempo de moagem foi de 18 horas. Após esta etapa, o pó resultante foi seco em estufa à 100 ºC por 4 horas e então granulado em peneira 75 m. A conformação foi feita uniaxialmente na forma de pastilhas (91 mm x 1,3 mm) com uma pressão de 75 MPa. Os corpos de prova foram sinterizados em forno tubular a 1300 ºC por 2 horas em atmosfera ambiente. Para a caracterização elétrica, as amostras foram lixadas até 1 mm de espessura, deixando suas faces paralelas, nas quais foram depositados eletrodos de prata. A caracterização elétrica foi realizada em corrente contínua numa fonte estabilizada Tectrol modelo THC 30002 e a análise das fases presentes no material foi Anais do 43º Congresso Brasileiro de Cerâmica 2 a 5 de junho de 1999 - Florianópolis – S.C. 46103 feita em um difratômetro de raios X Siemens modelo D5000. Os tamanhos médios de grãos foram determinados, usando o método dos interceptos, através de micrografias obtidas por microscopia eletrônica de varredura (MEV) em amostras polidas e tratadas termicamente. As medidas de impedância foram realizadas num analisador de resposta em função da frequência aplicada Hewlett-Packard 4194 a. RESULTADOS E DISCUSSÃO O sistema cerâmico SnO2.1%CoO.0,05%Ta2O5 manteve valores de densidade a verde em torno de 55% da densidade teórica (densidade à verde = 3,82 g/cm 3 0,01). Após a sinterização a 1300 ºC, o referido sistema formou corpos cerâmicos com densificação superior a 97% da densidade teórica. O tamanho médio de grão obtido foi de 6,9 0,1 m. A elevada densificação pode ser explicada pela substituição de íons Sn +4 por íons Co+2 e/ou Co+3 no retículo do SnO2. Esta solução sólida substitucional introduz defeitos dados pelas reações: CoO Co2O3 SnO2 CoSn + VO.. + ½ O2 (A) 2 CoSn + VO·· + 3/2 O2 (B) SnO2 Através destes defeitos são produzidas vacâncias de oxigênio que facilitam a difusão de matéria e, consequentemente, promovem a densificação da cerâmica (4). O sistema cerâmico preparado apresentou comportamento varistor devido à formação da barreira de potencial no contorno de grão. A barreira de potencial é formada pelo acúmulo de defeitos estruturais vindos de reações em estado sólido entre dopantes e a matriz de SnO2 no contorno de grão da cerâmica. A formação de defeitos é representada pelas equações: 2 Ta2O5 VSn + 2 VO·· 2 OOx + VSnx SnO2 4 TaSn· + VSn + 5 O2 VSnx + 2 Vox O2 (g) + 2 VO·· + VSn (C) (D) (E) 46104 Anais do 43º Congresso Brasileiro de Cerâmica 2 a 5 de junho de 1999 - Florianópolis – S.C. Como observado na equação (C), o íon Ta +5 substitui o íon Sn+4 produzindo vacâncias de estanho. Estas vacâncias reagem com as vacâncias de oxigênio intrínsecas do SnO2 anulando estes defeitos, como visto na equação (D). O oxigênio da rede de SnO2 reage de acordo com a equação (E), restaurando as vacâncias de oxigênio e produzindo vacâncias de estanho(3, 4). O oxigênio também pode ser responsável pela formação da barreira do tipo Schottky, se considerarmos que o oxigênio adsorvido reage com defeitos negativos de acordo com as equações(5): ½ O2 VSn + 2 Oadx CoSn + Oadx 2 CoSn + Oadx Oadx (F) 2 Oad" + VSnx (G) Oad" + CoSnx (H) Oad" + 2 CoSnx (I) Na Figura 1 é apresentado o difratograma de raios X do sistema preparado. I 2 Figura 1 - Difratograma de raios X do sistema SnO2.1%CoO.0,05%Ta2O5 sinterizado a 1300 ºC por 2 horas. Pela análise do difratograma de raios X (Figura 1) não foi identificado o aparecimento de fases secundárias, sendo então o sistema caracterizado como monofásico. Anais do 43º Congresso Brasileiro de Cerâmica 2 a 5 de junho de 1999 - Florianópolis – S.C. 46105 A micrografia obtida por MEV do sistema preparado está ilustrada na Figura 2. As curvas de ln E em função de ln J aparecem na Figura 3. Figura 2 - Micrografia obtida por MEV do sistema SnO2.1%CoO.0,05%Ta2O5. 25oC 8 50oC 75oC 100oC 125oC 7 150oC ln E 175oC 6 5 -16 -14 -12 -10 -8 -6 ln J Figura 3 - Curvas características ln E x ln J para o sistema SnO2.1%CoO. 0,05%Ta2O5 à várias temperaturas. As curvas características ln E x ln J para o sistema estudado (Figura 3) mostra que para baixos valores de campo elétrico aplicado, há uma forte influência da temperatura sobre a condução elétrica, ou seja, a condutividade elétrica aumenta em função do aumento da temperatura. Entretanto, a medida que o campo elétrico é aumentado esta dependência diminui, sugerindo um outro mecanismo de condução elétrica. Os valores dos coeficientes de não linearidade (), tensão de ruptura (Er), corrente de fuga (If) e tensão por barreira (vb) são apresentados na Tabela I. 46106 Anais do 43º Congresso Brasileiro de Cerâmica 2 a 5 de junho de 1999 - Florianópolis – S.C. Tabela I - Coeficiente de não linearidade (), tensão de ruptura (Er), corrente de fuga (If) e tensão por barreira (vb) à temperatura ambiente do sistema SnO2.1%CoO.0,05%Ta2O5. Sistema Er (V/cm) If (A) (em 750 V/cm) vb (V/barreira) SnO2.1%CoO.0,05%Ta2O5 13,0 2940 1,31x10-6 2,00 O coeficiente de não linearidade () foi calculado por regressão linear de ln J x ln E para valores de densidade de corrente acima de 1 mA/cm2 e a tensão de ruptura foi estabelecida nesta densidade de corrente. O valor da corrente de fuga foi tomado para um valor constante do campo elétrico aplicado (750 V/cm) na região linear da curva característica da Figura 3. A tensão por barreira (vb) foi calculada com base na equação(1): Er = n .vb sendo (J) n=D/ d então: Er = D / d . vb onde (K) n é o número médio de barreiras elétricas formadas entre os eletrodos do material, vb é o valor da tensão por barreira, D é a espessura do varistor, d é o tamanho médio do grão e Er é o campo elétrico de ruptura. A Figura 4 mostra a caracterização do sistema SnO 2.1%CoO.0,05%Ta2O5 por impedância complexa a várias temperaturas. 46107 Anais do 43º Congresso Brasileiro de Cerâmica 2 a 5 de junho de 1999 - Florianópolis – S.C. 3,0x106 2,5x106 2,0x106 Z'' 1,5x106 1,0x106 5,0x105 0,0 0,0 5,0x104 1,0x105 1,5x105 2,0x105 2,5x105 3,0x105 Z' Figura 4.a: Diagrama de Nyquist para o sistema SnO2.1%CoO. 0,05%Ta2O5 numa temperatura de 25 ºC. 3,0x10 5 2,5x10 5 Z'' 2,0x10 5 1,5x10 5 1,0x10 5 5,0x10 4 0,0 0 1x105 2x105 3x105 4x105 5x105 6x105 Z' Figura 4.b: Diagrama de Nyquist para o sistema SnO2.1%CoO. 0,05%Ta2O5 numa temperatura de 200 ºC. 46108 Anais do 43º Congresso Brasileiro de Cerâmica 2 a 5 de junho de 1999 - Florianópolis – S.C. 0 200 400 200 200 100 100 Z '' 0 0 0 400 400 200 Z' Figura 4.c - Diagrama de Nyquist para o sistema SnO2.1%CoO.0,05%Ta2O5 na temperatura de 400º C, () resultado experimental e (O) modelo teórico de duas constantes de tempo. Podemos observar, pelos diagramas de Nyquist para o sistema preparado, que a resistividade diminui em função do aumento da temperatura. Na Figura 4.c, dois semicírculos parcialmente convoluídos são observados, o que indica a presença de duas constantes de tempo para o sistema. A resposta elétrica pode ser simulada, resultando em um modelo de circuito equivalente para o sistema SnO2.1%CoO.0,05%Ta2O5. No trabalho de Bueno et al(6) explica-se o aparecimento destas duas constantes de tempo com fenômenos superficiais e processos de relaxação do grão e do contorno de grão. Na Figura 5 é mostrado o circuito equivalente modelado para o sistema SnO2.1%CoO.0,05%Ta2O5 e na Tabela II os parâmetros elétricos do circuito equivalente para o sistema na temperatura de 400º C. 46109 Anais do 43º Congresso Brasileiro de Cerâmica 2 a 5 de junho de 1999 - Florianópolis – S.C. R2 R3 R1 C2 C3 Figura 5: Modelo de circuito equivalente para o sistema SnO 2.1%CoO.0,05%Ta2O5, obtido pelo programa EQUIVCRT. Tabela II: Parâmetros elétricos obtidos pelo programa EQUIVCRT para o circuito equivalente ao sistema SnO2.1%CoO.0,05%Ta2O5 a 400 ºC. Parâmetros R1 R2 C2 R3 C3 Chi squared Valor 74,5 243,7 2,95 x 10-10 F 160,6 3,99 x 10-09 F 10-04 A simulação descrita acima mostra que o circuito equivalente é composto por um resistor em série com dois circuitos de resistor e capacitância em paralelo (Figura 5), onde o valor de R1, abaixo de 100 , pode ser considerado como resistência do grão. CONCLUSÕES Os resultados obtidos SnO2.1%CoO.0,05%Ta2O5 nos das caracterizações permitem concluir que elétricas o do sistema sistema apresenta comportamento não-ôhmico (=13), e possui grande potencial para uso como varistor cerâmico, principalmente devido a baixa corrente de fuga apresentada por este sistema. As medidas de impedância complexa mostram uma diminuição da resistividade em função do aumento da temperatura e a presença de duas constantes de tempo. O comportamento elétrico do sistema preparado pode ser resultante da formação de defeitos microestruturais formados durante a sinterização e/ou da adsorção de espécies O2- e O- que se acumulam na região de interface grão-grão otimizando o tamanho da barreira de potencial, responsável pelo comportamento varistor. Anais do 43º Congresso Brasileiro de Cerâmica 2 a 5 de junho de 1999 - Florianópolis – S.C. 46110 AGRADECIMENTOS Laboratório de Materiais Cerâmicos/CIP-UEPG,CNPq/PIBIC, FINEP, UNESP/ Araraquara, LIEC/UFSCar. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. PIANARO, S.A. - Propriedades não ôhmicas de cerâmicas à base de SnO 2. Tese de Doutorado, Centro de Ciências Exatas e de Tecnologia, UFSCar/ São Carlos (1995). 2. MATSUOKA,M. - Non-ohmic properties of zinc oxide ceramics. Jpn. J. Phys.,10, 736 (1971). 3. ANTUNES, A. C. - Influência de dopantes nas características varistoras do SnO 2. Tese de Doutorado, Centro de Ciências Exatas e de Tecnologia, UFSCar/ São Carlos (1997). 4. ANTUNES, A.C.; ANTUNES, S.R.M.; PIANARO, S.A. - Effect of Ta2O5 doping on the electrical properties of 0.99SnO2.0.01CoO ceramic. J. Mater. Sci.. Submetido, 1999. 5. ANTUNES, A.C.; ANTUNES, S.R.M.; PIANARO, S.A., ROCHA, M.R., LONGO, E. VARELA, J.A. - Nonlinear electrical behavior of the SnO2.CoO.Ta2O5 system. J. Mater. Sci., 17 (1998), 577-579. 6. BUENO, P. R. et al. - Análise das propriedades de cerâmicas de dióxido de estanho dopadas com diferentes concentrações de TiO2. Anais do 39 º Congresso Brasileiro de Cerâmica. p. 672. Águas de Lindóia - SP (1995). STUDY OF ELECTRIC PROPERTIES OF THE SnO2.CoO.Ta2O5 VARISTOR SYSTEM ABSTRACT In this work was studied the electric behavior of the system SnO2.CoO.Ta2O5 prepared by conventional processing of oxides mixture.The samples were sintered at 1300 ºC for two hours. The XRD analisys showed that the prepared system is monophasic (SnO2). The electric measurements showed a non-linear behavior among current-tension with the following characteristics: non linear coefficient ( ) = 13; Anais do 43º Congresso Brasileiro de Cerâmica 2 a 5 de junho de 1999 - Florianópolis – S.C. 46111 breakdown electric field (Er) = 2940 V/cm; leakage current in 750 V/cm (If) = 1,31 x 10 -6 A; tension for barrier (vb) = 2,00 V/barrier (with a grain size of 6,9 1 m). The measures of complex impedance show a decrease of the resistivity in function of the increase of the temperature and two time constant are presente.. Key-words: varistor, SnO2, impedancy.