Anais do 47º Congresso Brasileiro de Cerâmica Proceedings of the 47th Annual Meeting of the Brazilian Ceramic Society 1742 15-18/junho/2003 – João Pessoa - PB - Brasil MECANISMO DE DEGRADAÇÃO DO SISTEMA VARISTOR SnO2.CoO.Ta2O5.Cr2O3 G. F. Menegotto, S. A. Pianaro, A. J. Zara, S. R. Masetto Antunes, A. C. Antunes Universidade Estadual de Ponta Grossa - UEPG Laboratório Interdisciplinar de Materiais Cerâmicos - LIMAC - CIPP Av. Carlos Cavalcanti, 4748 - Uvaranas Ponta Grossa - PR CEP 84030-000 Fone: (0 * * 42) 220-3055 [email protected] RESUMO Varistores cerâmicos são materiais que apresentam comportamento elétrico não linear entre a tensão aplicada e a corrente. Estes materiais são usados como protetores de equipamentos elétricos contra transientes de tensão, que são absorvidos pelo varistor. Esta energia excedente pode levar à degradação de suas propriedades elétricas, prejudicando sua vida útil e comprometendo seu desempenho. Neste trabalho estudou-se a degradação do sistema varistor SnO2.1%CoO.0,05%Ta2O5.0,05%Cr2O3 (% molar), preparado convencionalmente e sinterizado à 1350ºC por duas horas. O mecanismo de degradação deste sistema foi investigado submetendo-se as pastilhas cerâmicas a tensão e temperatura constante, verificando-se a variação da corrente com o tempo. O coeficiente de difusão obtido foi da ordem de 10 -17cm2/s, em temperaturas próximas de 150ºC. Este resultado pode ser associado ao processo de degradação via difusão iônica intersticial, no qual íons migram para o contorno de grão, aniquilando defeitos, provocando destruição de barreiras de potencial e conduzindo à degradação. PALAVRAS-CHAVES: Varistor, SnO2, Degradação Anais do 47º Congresso Brasileiro de Cerâmica 1743 Proceedings of the 47th Annual Meeting of the Brazilian Ceramic Society 15-18/junho/2003 – João Pessoa - PB - Brasil INTRODUÇÃO Os varistores, ou resistores não lineares, são materiais caracterizados por apresentarem comportamento elétrico não linear cerâmicos entre a corrente (I) e a tensão (V). Sua principal característica é a diminuição da resistência quando ocorre um aumento de intensidade do campo elétrico aplicado [1]. Estes materiais são utilizados como elementos protetores de circuitos elétricos e eletrônicos, como em sistemas de telefonia, aparelhos eletrônicos, equipamentos industriais, linhas de distribuição e transmissão de energia contra picos de tensão gerados por exemplo, por raios e descargas eletrostáticas acumuladas [2]. Os picos de tensão ocorridos no circuito são absorvidos pelo varistor, sendo que esta energia excedente pode levar a degradação do varistor, prejudicando sua vida útil e comprometendo sua performance. O estudo do acréscimo e decréscimo de IR tem levado a concluir que a migração de íons é a causa da degradação. A dependência do acréscimo na corrente pelo tempo é demonstrado pela equação (A): I Rt I R0 KT .t n (A) onde IR t é a corrente resistiva para um tempo t, IR0 é a corrente resistiva para um tempo t = 0, n está entre 0,3 e 0,9 [3] e KT é a taxa constante de acréscimo da corrente com o tempo. Para a IR t >> IR 0: I Rt KT .t n (B) A curva de decréscimo da corrente apresenta uma dependência exponencial, como demonstra a equação (C): I Rt I R ( I Ri I R ) exp( t / ) n (C) Anais do 47º Congresso Brasileiro de Cerâmica Proceedings of the 47th Annual Meeting of the Brazilian Ceramic Society 1744 15-18/junho/2003 – João Pessoa - PB - Brasil sendo I R a corrente quando o varistor retorna ao valor inicial IR0, é a constante de tempo, IR i e n são constantes determinadas experimentalmente. Para um grande número de varistores, o valor de n, é 0,5 [3,9]. Para se determinar o coeficiente de difusão através da migração iônica assume-se que o decréscimo da corrente é devido a este mecanismo e que o sentido da difusão de íons é perpendicular a barreira de potencial; a corrente devido ao processo de migração de íons na barreira de potencial pode ser expressa pela seguinte equação (D): I Rt I R ( I Ri I R ). exp( D. 2 / d 2 ) (D) quando as equações (3) e (4) são comparadas com n = 0,5 obtemos a equação (E): D ( d / 2 ).(1 / t.)1 / 2 (E) O maior efeito da degradação ocorre na região de pré-ruptura, indicando que a degradação é um fenômeno que surge no contorno de grão. Alguns estudos relacionam o mecanismo de degradação a polarização da barreira de potencial, migração de íons, ionização de defeitos entre outros [3,4,5,6] . Destas teorias, a migração de íons tem sido associada a degradação de varistores de ZnO [7]. O principal mecanismo da migração iônica é a difusão intersticial ao longo da barreira de potencial. O objetivo deste trabalho foi o estudo do fenômeno da degradação do sistema varistor à base de SnO2, visando a obtenção de parâmetros para estabelecer a vida útil deste novo material cerâmico. MATERIAIS E MÉTODOS O sistema varistor estudado foi SnO2.1%CoO.0,05%Ta2O5.0,05%Cr2O3 (% em mol), obtido através de mistura convencional de óxidos [7,8] e sinterizado à 1350ºC por duas horas. Anais do 47º Congresso Brasileiro de Cerâmica Proceedings of the 47th Annual Meeting of the Brazilian Ceramic Society 1745 15-18/junho/2003 – João Pessoa - PB - Brasil Para realizar o estudo do mecanismo de degradação, o varistor é inicialmente submetido a uma tensão fixa e sua corrente é medida em tempos determinados, verificando assim a variação da corrente com o tempo. Em seguida desliga-se a fonte de tensão estabilizada e mede-se a corrente em intervalos de tempo, verificando o decréscimo da corrente com o tempo. No estudo da vida útil do varistor aplicou-se uma tensão constante, sendo esta 80% da tensão de ruptura, por um período de tempo de uma hora. A corrente foi medida em intervalos de cinco minutos, obtendo-se a taxa de acréscimo, KT [5,9]. Para realização deste estudo foi necessária a utilização de um porta amostra adaptável a um forno comercial, similar a um descrito na literatura [7],o que permitiu um controle preciso da temperatura próximo da amostra. RESULTADOS E DISCUSSÃO Antes do estudo da degradação do varistor de SnO 2, realizou-se a caracterização elétrica V x I. Os valores da tensão de ruptura (ER), da corrente de fuga (If) e do coeficiente de não-linearidade () obtidos foram respectivamente, 1960V/cm, 7,95.-5A e 27,8. Os coeficientes de não linearidade foram obtidos através de regressão linear dos dados de ln J (densidade de corrente) em função de ln E (campo elétrico aplicado) a partir de 1mA/cm2 e a tensão de ruptura foi estabelecida nesta densidade de corrente. Os valores das correntes de fuga foram tomados num valor constante do campo elétrico aplicado na região linear da curva característica do comportamento varistor, mostrados na Figura 1. Anais do 47º Congresso Brasileiro de Cerâmica Proceedings of the 47th Annual Meeting of the Brazilian Ceramic Society 1746 15-18/junho/2003 – João Pessoa - PB - Brasil 8,0 7,5 7,0 ln E 6,5 6,0 5,5 5,0 4,5 -18 -16 -14 -12 -10 -8 -6 -4 -2 ln J Figura 1 - Curva característica de ln E em função de ln J do sistema SnO2.1%CoO.0,05%Ta2O5.0,05%Cr2O3. A influência do tempo na variação da corrente para os sistemas estudados, a tensão e temperatura constante, é demonstrado na Figura 2. 5,0 4,5 4,0 I (mA) 3,5 3,0 2,5 2,0 1,5 0 50 100 150 200 250 tempo (minutos) Figura 2. Curva de acréscimo de IRt quando um varistor é energizado e desenergizado do sistema SnO2.1%CoO.0,05%Ta2O5.0,05%Cr2O3 sinterizado a 1350ºC por 2h. Anais do 47º Congresso Brasileiro de Cerâmica 1747 Proceedings of the 47th Annual Meeting of the Brazilian Ceramic Society 15-18/junho/2003 – João Pessoa - PB - Brasil As regiões que apresentam um acréscimo na corrente com o tempo, podem ser descritas através da equação (A). Foi obtido valor de n = 0,53 para o sistema em estudo. Nos varistores de ZnO este valor está entre 0,5 e 0,6 [3,4]. Esta diferença indica que os varistores de SnO2 apresentam uma variação na condutividade ao longo do tempo comparável os varistores de ZnO, para esta fração de tensão de ruptura (0,8Er). Os valores de n obtidos serão usados nas equações (C) e (D). A curva de decaimento da corrente é apresentada na Figura 3. Esta curva de decaimento é análoga a TSC (corrente termicamente estimulada) [4], pois também está associada a movimentação de íons após cessado o esforço elétrico em que o varistor foi submetido. 3,9 3,8 3,7 It (mA) 3,6 D=10 -17 2 cm /s 3,5 3,4 Data: Data1_J Model: ExpDec1 3,3 Chi^2 R^2 = 0.01498 = 0.86091 y0 A1 t1 -38.56886 43.36665 3320.2807 3,2 ±3367.35532 ±3366.05749 ±265152.19451 3,1 60 70 80 90 100 110 120 tempo (minutos) Figura 3. - Análise da curva de decaimento da Figura 2, do sistema SnO2.1%CoO.0,05%Ta2O5.0,05%Cr2O3, sinterizado a 1350ºC por 2h. Através da análise desta curva determinaram-se o valor de para o sistema em estudo. Admitindo-se que a largura da barreira de potencial (d) é de 100nm e fazendo-se uma aproximação para os tempos na magnitude de (t = ), obteve-se um coeficiente de difusão da ordem de 10 -17 cm2/s para o sistema SnO2.1%CoO.0,05%Ta2O5.0,05%Cr2O3 em temperaturas da ordem de 150ºC. Anais do 47º Congresso Brasileiro de Cerâmica 1748 Proceedings of the 47th Annual Meeting of the Brazilian Ceramic Society 15-18/junho/2003 – João Pessoa - PB - Brasil Comparando-se o valor obtido com os valores de ZnO ( 1012 a 1013 cm2 / s ) [3] verifica-se que o coeficiente de difusão do estanho intersticial está próximo do coeficiente de difusão intersticial do Zn i, indicando que o processo de difusão intersticial pode ser um mecanismo de degradação dos varistores de SnO 2. Sabendo-se que os raios iônicos do Sn+4 e do Zn+2 são semelhantes, 0,74 e 0,71, respectivamente, e que o coeficiente de difusão varia com a natureza dos átomos, com o tipo de estrutura e com a temperatura, provavelmente a diferença de estrutura (tetragonal do SnO2 e wurtzita do ZnO) pode ser responsável pelo menor coeficientes de difusão do SnO2. Os aspectos mais importantes para a predição da vida útil de um varistor são, o aspecto de dimensionamento do varistor, e os aspectos do material (Er, IR 0 e KT). A taxa constante KT, a qual é determinada através de um gráfico de IR t x t ½ na temperatura de 150ºC, é mostrada na Figura 4, para uma tensão de 0,8.Er. 3,0 2,5 2,0 It-I0 1,5 1,0 0,5 KT=0,35 0,0 -1 0 1 2 3 4 5 6 7 8 1/2 t Figura 4. Determinação de KT para 0,8.Er, para o sistema SnO2.1%CoO.0,05%Ta2O5.0,05%Cr2O3 sinterizado a 1350ºC por 2h. Verifica-se que a taxa constante de variação da corrente com o tempo foi pequena, indicando um pequeno acréscimo da corrente com o tempo, da ordem de mA, aquecendo menos e desperdiçando menos energia. Anais do 47º Congresso Brasileiro de Cerâmica 1749 Proceedings of the 47th Annual Meeting of the Brazilian Ceramic Society 15-18/junho/2003 – João Pessoa - PB - Brasil Como pode ser visto na Tabela I e na Figura 5, após a degradação ocorreu uma diminuição no coeficiente de não linearidade, aumento da corrente de fuga e diminuição da tensão de ruptura da cerâmica varistora. Tabela I . Comparação entre os valores de tensão de ruptura, corrente de fuga e coeficiente de não linearidade para a cerâmica varistora antes e após a degradação. ER (V/cm) If (A) 0,8 Er Antes da degradação 1960 7,95.10-5 27,8 Após a degradação 1830 3,91,10-4 18,51 8,0 7,5 7,0 ln E 6,5 6,0 5,5 antes da degradação após degradação 5,0 4,5 -18 -16 -14 -12 -10 -8 -6 -4 -2 ln J Figura 5. Gráfico ln E versus ln J, antes e após degradação, para o sistema SnO2.1%CoO.0,05%Ta2O5.0,05%Cr2O3 sinterizado a 1350ºC por 2h. Observou-se também que a degradação é um fenômeno que ocorre principalmente na barreira de potencial formada no contorno de grão, pois para altos campos elétricos aplicados (2500 V/cm), onde quem controla a resistência do varistor é o interior do grão cerâmico, não observa-se o fenômeno da degradação. CONCLUSÕES Anais do 47º Congresso Brasileiro de Cerâmica Proceedings of the 47th Annual Meeting of the Brazilian Ceramic Society 1750 15-18/junho/2003 – João Pessoa - PB - Brasil O mecanismo de degradação dos varistores de SnO 2 é governado, provavelmente, por difusão intersticial, como pode ser verificado pelo coeficiente de difusão, 10 17 cm 2 / s , sendo este valor muito próximo, porém inferior ao valor do coeficiente de difusão intersticial de zinco nos varistores de ZnO ( 1012 a 1013 cm2 / s) , indicando uma degradação mais lenta nos varistores de SnO 2. Os parâmetros obtidos para avaliação da vida útil dos varistores de SnO 2 indicam que, como nos varistores de ZnO, a variação da corrente com o tempo é muito pequena, sabendo que a taxa constante KT é da ordem de 10-3A. Observou-se também que a degradação é um fenômeno que ocorre principalmente na barreira de potencial formada no contorno de grão e provoca diminuição na não linearidade e aumento da corrente de fuga da cerâmica varistora. AGRADECIMENTOS: CNPq/PIBIC e Fundação Araucária. REFERÊNCIAS [1] MATSUOKA, M. Non-ohmic properties of zinc oxide ceramics. Jpn. J. Phys.,10, 736 (1971). [2] LAGRANGE, A. Present and Future of Zinc Oxide Varistors. Ceramics Eletronics. p. 1-21 [3] GUPTA, T.K. Application of zinc oxide varistors, J. Am. Ceram. Soc., 73 (7), 1817 (1900). [4] GUPTA, T.K. e W. G, CARLSON. Defect-induced Degradation of Barrier in ZnO Varistor, p. 30. [5] GUPTA, T.K. Effect of Material and Design Parameters on Life and Operating Voltage of a ZnO Varistor. J. Mater. Res., vol. 2, no. 2, p. 231, Mar/Apr (1986) [6] PHILLP, H.R. e LEVINSON, L.M. Degradation Phenomena in Zinc Oxide Varistors. A Review, p. 1-21. [7] PIANARO, S.A. Tese de Doutorado, UFSCar São Carlos, 1995. [8] PIANARO, S.A.; BUENO, P.R.; LONGO, E.; VARELA, J.A. J. Mater. Sci., 14,692(1995) [9] CARLSON, W.G.; GUPTA, T.K. e SWEETANA, A. A Procedure for Estimating the Lifetime of Gapless Metal Oxide Surge Arresters for AC Application. IEEE Anais do 47º Congresso Brasileiro de Cerâmica Proceedings of the 47th Annual Meeting of the Brazilian Ceramic Society 1751 15-18/junho/2003 – João Pessoa - PB - Brasil Transations on Power Apparatus and Systems, 65, Vol. PWRD - 1 , no.2, April (1986) DEGRADATION MECHANISM OF THE SYSTEM VARISTOR SnO2.CoO.Ta2O5.Cr2O3 ABSTRACT Varistores potters are material that not present an electric behavior lineal between the applied tension and the current. These materials are used as protectors of electric equipment against tension transients that are absorbed by the varistor. This energy surplus can take to the degradation of its electric properties, harming its useful life and committing its acting. In this work it was studied the degradation of the systems varistors to the base of SnO2 with composition: SnO2.1%CoO.0,05%Ta2O5.0,05%Cr2O3 (% in mol), conventionally prepared and sintered at 1350ºC for two hours. The degradation mechanism was investigated submitting ceramic tablets the tension and temperature constants, being verified the variation of the current with the time. The obtained diffusion coefficients went of to order of 10-17 cm2/s for this system, in close temperatures for 150ºC. These results can be associated to the degradation process through migration of interstitial ions for the grain boundaries. KEY-WORDS: Varistor, SnO2, Degradation