Generated by Foxit PDF Creator © Foxit Software http://www.foxitsoftware.com For evaluation only. CLONAGEM TERAPÊUTICA: ATÉ ONDE AVANÇAR SEM AGREDIR1 RESUMO Um dos temas bastante polêmicos na atualidade é a clonagem terapêutica. Isso se deve ao fato dessas experiências envolverem embriões humanos como fontes de obtenção de células-tronco e, já que é a vida do embrião que está em questão, a clonagem terapêutica, além de ser objeto das Ciências Biológicas, diz respeito ainda à Bioética, ao Biodireito etc. Neste sentido, o presente trabalho teve por objetivo o levantamento e o debate acerca dos pontos controversos referentes à clonagem terapêutica e, a partir daí, propôs medidas que conciliem o desenvolvimento dessa técnica com o bemestar das gerações presentes e futuras, tendo sempre como pressupostos os direitos e princípios fundamentais, consubstanciados em nossa Lei Maior. Palavras-chave: clonagem terapêutica, células-tronco embrionárias, bioética, direitos fundamentais. ABSTRACT One of the most controversial themes at the present time is the therapeutic cloning. That is due to the fact of those experiences involve humans embryos as sources of cell-log obtaining and, how is the embryo’s life that is in question, the therapeutic cloning, besides being object of the biological sciences, it tells also about Bioethics, Bioright etc. In this sense, the present work had for objective the rising and the debate of the controversial points concerned about therapeutic cloning and, from that, propose measures that reconcile the development of this technique with the well-being of the present and future generations, having always as pressupositions the rights and fundamental beginnings established in our Federal Constitution. 1 Trabalho realizado por Carla Fontenele Cabral Ribeiro ([email protected]), aluna do Curso de Direito da Universidade de Fortaleza (UNIFOR), sob a orientação de Ana Maria D’Ávila Lopes ([email protected]), possui pós-doutorado e é professora dos Cursos de Gradução, Mestrado e Doutorado da UNIFOR. 1 Generated by Foxit PDF Creator © Foxit Software http://www.foxitsoftware.com For evaluation only. Key-words: therapeutic cloning, embryonic cells-log, bioethics, fundamental rights. INTRODUÇÃO A clonagem terapêutica é um procedimento laboratorial extremamente revolucionário que visa a obtenção de tecidos e órgãos para a realização de transplantes, através de reprodução assexuada. Como a própria nomenclatura já induz, a clonagem terapêutica tem como escopo a cura ou, pelo menos, a melhoria na saúde e qualidade de vida de pessoas portadoras de alguma anomalia. Para atingir o fim pretendido por essa técnica, os cientistas utilizam o procedimento denominado transferência nuclear, que consiste na transferência de núcleo de uma célula somática, originada, em regra, de um embrião, para um óvulo previamente enucleado, e, nos últimos anos, buscam incessantemente a produção de células-tronco2. Estas têm a capacidade de originar qualquer tecido, mesmo nos casos delas já terem sofrido o processo de diferenciação, pois foi descoberto, através da experiência que produziu a ovelha Dolly, que uma célula-somática poderá ser reprogramada ao estágio inicial e voltar a ser totipotente quando submetida ao procedimento de transferência nuclear. Isso, provavelmente, ocorre porque o óvulo possui mecanismos, ainda desconhecidos, para reprogramar o DNA de modo a tornar todos os seus genes novamente ativos, o que ocorre no processo normal de fertilização. Os embriões utilizados nessas experimentações constituem o cerne das discussões acerca da clonagem terapêutica nos diversos campos do conhecimento. 2 Para entender melhor o processo de diferenciação das células-tronco, consulte: ZATS, Mayana. Clonagem e Células-tronco. Estudos Avançados, v.18, n.51, p. 247-248, mai./ago. 2004. 2 Generated by Foxit PDF Creator © Foxit Software http://www.foxitsoftware.com For evaluation only. Neste panorama, o presente trabalho teve por objetivo analisar os impactos que essas experiências causaram, bem como os posicionamentos ético-jurídicos acerca da matéria. Para tanto, foi necessária uma exaustiva consulta na legislação pátria referente ao tema, principalmente na Constituição Federal de 1988 e na Lei 11.105/05 (Lei de Biossegurança), bem como analisamos, de forma crítica, os posicionamentos da doutrina nacional e internacional nas áreas do Direito e da Bioética. REFERENCIAL TEÓRICO Neste trabalho, trataremos da clonagem terapêutica, que, segundo Maria Helena Diniz3, é: [...] realizada para fins terapêuticos, com o escopo de produzir o cultivo de tecidos ou órgãos, partindo de embriões ou das células stem, que são células imaturas com capacidade de auto-regeneração e diferenciação, para reparação de tecidos e órgãos danificados. Roger Abdelmassih4 aponta três técnicas bem descritas para a preparação de células-tronco, como sendo: [...] a substituição do núcleo de um óvulo pelo núcleo de uma célula adulta de um determinando sujeito, seguindo-se a evolução do embrião até a fase de blastocisto e a utilização da massa celular interna para se obter as células-tronco e, a partir destas, as desejadas células diferenciadas; a transferência de um núcleo de uma célula de um determinado sujeito para um óvulo de um animal e, caso fosse bem sucedida, a operação deveria permitir, supõe-se, o desenvolvimento de um embrião humano, que seria utilizado como no caso anterior; a reprogramação do núcleo da célula de um determinado sujeito pela fusão do citoplasma da célula-tronco com o carioplasma de uma célula somática. Diferentemente da clonagem reprodutiva, que visa a obtenção de um indivíduo geneticamente idêntico ao doador do material genético, ou seja, visa 3 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. 2ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 442-443. ABDELMASSIH, Roger. Clonagem reprodutiva versus clonagem terapêutica: avanços e limites. São Paulo: Mesa Redonda, 2002. Disponível em: <http://www.cjf.gov.br>. Acesso em: 5 de dez. 2003. 4 3 Generated by Foxit PDF Creator © Foxit Software http://www.foxitsoftware.com For evaluation only. a produção de clones, a clonagem terapêutica é um procedimento admitido, de forma pacífica, pelos cientistas, juristas e sociedade em geral. Dráuzio Varella5, médico cancerologista, justifica a admissibilidade da clonagem terapêutica, explicando que: A clonagem terapêutica oferece a possibilidade de repor tecidos perdido por acidente ou pelo passar dos anos e de tratar doenças neuromusculares, infartos, derrames cerebrais, Alzheimer e outras demências, cegueira, câncer e muitas outras. No entanto, a clonagem terapêutica sofre entraves éticos, morais e jurídicos quando as fontes para obtenção de células-tronco são os embriões descartados em clínicas de reprodução assistida. Isso porque surgem divergências quanto ao momento em que se inicia a vida e, conseqüentemente, quando o respeito à vida e à integridade passam a ser direitos. O professor Marco Segre6 afirma que a caracterização do momento de início da vida no instante da fecundação, principalmente em países onde o aborto é crime, dificulta e impede o desenvolvimento de novas técnicas de reprodução assistida e, com isso, a produção de embriões excedentes para a reprodução assistida e propõe que: [...] se altere o conceito de momento de início da vida, visando aos referidos objetivos absolutamente pragmáticos, ou que se abram exceções legais que permitam a inutilização de embriões – ou, de sua utilização para outros fins [...]. A Bioética, fundamentada em princípios basilares, alega que nos tecidos adultos e no sangue do cordão umbilical e da placenta também existem células-tronco capazes de substituir aquelas obtidas através de células embrionárias e, ainda, que os fins terapêuticos não justificam a eliminação de vidas humanas, mesmo que estas se encontrem no estágio inicial do desenvolvimento. 5 VARELLA, Dráuzio. Clonagem Humana. Estudos Avançados, v. 18, n. 51, mai./ago. 2004. p. 264. 6 SEGRE, Marco. A propósito da utilização de células-tronco embrionárias. Estudos Avançados, v. 18, n. 51, mai./ago. 2004. p. 257-258. 4 Generated by Foxit PDF Creator © Foxit Software http://www.foxitsoftware.com For evaluation only. De acordo com Regina Fiúza Sauwen e Severo Hryniewicz7, bem como a doutrina majoritária, quer seja brasileira, quer seja estrangeira, a Ética é: [...] o conjunto de princípios ou regras avaliados com rigor e consciência crítica; [...] procura desenvolver uma rigorosa avaliação sobre o que é o bem e o que é o mal, preocupando-se em indicar quais os caminhos realizam o homem enquanto agente do bem. O autor Christian de Paul de Barchifontaine8, por sua vez, ensina que: O conceito de Bioética será entendido como um grito pelo resgate da dignidade da pessoa humana em face aos progressos técnicocientíficos na área da saúde, bem como em face às condições de vida sócio-econômico-políticas, através de um diálogo multiprofissional, multidisciplinar e pluralista. Acerca dessas divergências quanto à utilização ou não de células-tronco embrionárias nas técnicas de clonagem terapêutica é que discorreremos e, posteriormente, traçaremos nossas conclusões e medidas que conciliem o progresso da Ciência com os direitos e princípios fundamentais, positivados em nossa Carta Fundamental da República. RESULTADOS 1. Embriões como fontes de obtenção de células-tronco Os embriões utilizados nas experiências de clonagem terapêutica são, em regra, aqueles descartados por clínicas de fertilização in vitro, por não terem qualidade de implantação ou por terem permanecido muito tempo congelados. Como o Conselho Federal de Medicina proíbe a destruição deles, esses embriões permanecem congelados, os quais, ainda que implantados no útero, dificilmente resultariam em uma gestação, sendo improvável seu desenvolvimento. 7 SAUWEN, Regina Fiúza; HRYNIEWICZ, Severo. O Direito “in vitro”: da bioética ao biodireito. 2ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris; 2000. 8 BARCHIFONTAINE, Christian de Paul de. Bioética e reprodução medicamente assistida. In: PESSINI, Léo; BARCHIFONTAINE, Christian de Paul de (Orgs.). Fundamentos da Bioética. São Paulo: Paulus; 1996. p. 164. 5 Generated by Foxit PDF Creator © Foxit Software http://www.foxitsoftware.com For evaluation only. De acordo com o pesquisador Hernan Chaimovich9, do Instituto de Química da USP, estamos falando da recuperação de embriões cujo destino inexorável é o lixo. Afirma o cientista David Baltimore10 que se enquadramos o uso de células-tronco como assassinato, vamos desperdiçar uma oportunidade enorme. Esse procedimento é comparado pela maioria dos cientistas à retirada de órgãos de uma pessoa com morte cerebral (mas que poderia permanecer em vida vegetativa). Para esse tipo de pesquisa, o embrião é considerado tão-somente um aglomerado com aproximadamente 100 células (blastocisto) que ainda não possui forma definida. Nessa fase, aparecem estruturas que possuem a capacidade de serem transformadas em qualquer tecido. Os cientistas alegam que a utilização de células-tronco embrionárias representa uma verdadeira transposição das barreiras do autotransplante e da compatibilidade entre doador e receptor. Não obstante, essa fonte de obtenção de células-tronco acarreta sérios questionamentos nos campos da Bioética e do Direito e o principal deles gira em torno dos diferentes conceitos referentes ao momento em que a vida humana passa a ter existência. Segundo os cientistas, só há vida após o instante em que o embrião se fixa ao útero, ou seja, em torno do sétimo dia de gestação. 9 CHAIMOVICH, Hernan. A ciência precisa prevalecer. O Estado de São Paulo, São Paulo, 01 jun. 2004. Notas e informações. Caderno A, p. 3. 10 BALTIMORE, citado por: SEGATTO, Chistiane. Clonagem Terapêutica. Escola Vésper, 10 jun. 2002. Disponível em: <http://www.escolavesper.com.br/clonagem_terapeutica.htm>. Acesso em: 2 maio 2008. 6 Generated by Foxit PDF Creator © Foxit Software http://www.foxitsoftware.com For evaluation only. Todavia, conforme José Afonso da Silva11, a vida é: [...] mais um processo (processo vital), que se instaura com a concepção (ou germinação vegetal), transforma-se, progride, mantendo sua identidade, até que muda de qualidade, deixando, então, de ser vida para ser morte. Tudo que interfere em prejuízo deste fluir espontâneo e incessante contraria a vida. Os opositores ao uso dessas células embrionárias para fins terapêuticos argumentam que haveria destruição de embriões humanos e não é ético destruir uma vida para salvar outra, sendo desrespeitados o direito à vida e à integridade do patrimônio genético, consubstanciados nos arts. 5º, caput e 225, §1ª, II da Constituição Federal de 1988, respectivamente. Tratando-se de embriões com vida, sejam ou não viáveis, como ser humanos devem ser respeitados, assim sendo, a produção de embriões humanos destinados à exploração é imoral. A clonagem terapêutica, nesse caso, se assemelha ao fato de uma mulher interromper uma gestação indesejada (aborto), contrariando a dignidade humana própria do embrião. Mesmo o congelamento, na Reprodução Assistida, ofende o respeito devido ao ser humano. Kant12, em sua obra Metafísica dos Costumes, dispõe que: [...] eles não podem destruir seu filho como se fosse seu artefato (porque nenhum ser dotado de liberdade pode ser classificado assim) ou como sua propriedade nem deixá-lo por conta do acaso, porque com ele se introduziu no mundo não apenas um componente do mundo, mas também um cidadão do mundo num Estado que não lhes pode mais ser indiferente, inclusive legalmente. Sob essa perspectiva, justificar a utilização de embriões descartados nos procedimentos de fertilização artificial, ainda sob a autorização dos doadores do material genético, para a obtenção de células-tronco, sob o pretexto de evitar que o destino daqueles seja o lixo, é um erro ou uma conduta antiética. 11 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 27ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 197. 12 KANT, citado por: SCHOCKENHOFF, Eberhard. Quem é um embrião? Cadernos Adenauer: Bioética, ano III, nº 01, p. 35-44, nov. 2001, p. 36. 7 Generated by Foxit PDF Creator © Foxit Software http://www.foxitsoftware.com For evaluation only. Destino menos cruel para esses embriões seria a criação de bancos de adoção de embriões. Cogita-se essa idéia em países desenvolvidos, mais especificamente nos Estados Unidos. 2. Outras fontes de células-tronco No que concerne a produção de células-tronco, há ainda outras fontes menos polêmicas que as embrionárias, dentre elas, destacam-se as célulastronco provenientes de indivíduos adultos e as do sangue do cordão umbilical e da placenta. As células-tronco adultas, que são encontradas em vários tecidos, como medula óssea, sangue e fígado, possuem duas limitações à sua utilização: a) a pouca quantidade delas e b) o autotransplante, pois, em doenças genéticas, não serviria. Já as células-tronco provenientes do sangue do cordão umbilical e da placenta, configuram a grande promessa e esperança para o futuro, pois foi descoberto que o sangue do cordão umbilical e da placenta é rico em célulastronco e pesquisas estão sendo realizadas com a finalidade de descobrir o potencial de diferenciação dessas células-tronco em diferentes tecidos. Se esses estudos corresponderem ao que se espera, ou seja, se estas células forem realmente capazes de regenerar tecidos ou órgãos, a Ciência poderá caminhar plenamente, pois não envolveria questões éticas. Além disso, a compatibilidade entre células-tronco do cordão do doador e do receptor seria uma limitação facilmente transposta, pois bastaria a criação de bancos de cordão públicos, à semelhança dos bancos de sangue. Isto porque quanto maior o número de amostras de cordão em um banco, maior a chance de se encontrar um compatível. Vale ressaltar que essa alternativa já está sendo aplicada na China. 8 Generated by Foxit PDF Creator © Foxit Software http://www.foxitsoftware.com For evaluation only. 3. Perspectivas na clonagem terapêutica Essas investigações com células-tronco apontam novas direções para o tratamento de muitas doenças e lesões nos tecidos, por exemplo: na pele, queimaduras; nos olhos, doenças na córnea e no cristalino; nos ossos, Osteoporose e Artrite; no pâncreas, Diabetes; no fígado, Hepatite e Cirrose; no cérebro, Mal de Alzheimer, Parkinson, Esclerose Múltipla; nos rins, na medula óssea e no pulmão, Câncer; no sangue, Hemorragia e Imunodeficiência e no coração, enfarte. Dessa forma, milhões de pessoas serão beneficiadas com a aplicação terapêutica de células-tronco. Além disso, a clonagem terapêutica teria a vantagem de evitar a rejeição se o doador fosse o próprio receptor. Por exemplo: um indivíduo que se tornou paraplégico após um acidente, ele mesmo seria o doador, sem se sujeitar ao risco de uma rejeição. 4. Incertezas e restrições na clonagem terapêutica A clonagem terapêutica possui limitações. O doador de células-tronco não poderia ser o próprio receptor quando se tratar de uma doença genética, pois o defeito genético estaria presente em todas as células. Ter-se-ia, assim, o problema da compatibilidade entre doador e receptor. Além disso, não sabemos se, no caso de células clonadas de uma pessoa idosa, teriam a mesma idade do doador ou seriam jovens. Segundo Christine Hauskeller13, existem quatro razões pelas quais os estudos com células-tronco embrionárias humanas envolvem várias questões problemáticas: 1) Ainda não se sabe se as promessas de cura esperadas com essa pesquisa poderão ser concretizadas. 13 HAUSKELLER, citada por: BÖHMER, Maria. Pesquisa em células-tronco humanas com responsabilidade política. Cadernos Adenauer: Bioética, ano III, nº 01, p. 71-85, nov. 2001, p. 84. 9 Generated by Foxit PDF Creator © Foxit Software http://www.foxitsoftware.com For evaluation only. 2) Essa pesquisa está essencialmente ligada à eliminação de embriões. Ainda não se sabe se os embriões excedentes e as linhagens de células-tronco existentes serão “suficientes”, e, caso sejam, pra quê? 3) Nos últimos meses, diversas alternativas ficaram mais concretas, prometendo mais êxito. Para a política de incentivo à pesquisa, a correspondente área de atuação é mais rica e livre de problemas éticos. 4) Até agora, ainda não houve suficiente reflexão sobre a influência que cada uma dessas decisões teria sobre o nosso entendimento dos valores fundamentais. É possível que não exista outra área da tecnologia, onde melhor se aplique a seguinte reflexão: “A experiência das últimas décadas nos mostra que os desenvolvimentos tecnológicos nos trazem somente as melhorias pretendidas para a vida do homem, será que tanto”. Em resumo, a clonagem terapêutica trata-se de uma tecnologia que necessita de muita pesquisa antes de ser aplicada no tratamento clínico. Por esse motivo, a grande esperança está na utilização de células-tronco não embrionárias. 5. Legislação brasileira A Lei 11.105 (Lei de Biossegurança) entrou em vigor no dia 24 de março de 2005 em nosso País e criou uma legislação específica para as questões atuais, como a manipulação de embriões e a clonagem. Entretanto, no dia 20 de junho de 2005, o ex-Procurador-Geral da República, Cláudio Fonteles, propôs uma Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADIN Nº 3526 – junto ao Supremo Tribunal Federal (STF), contestando mais de 20 dispositivos da referida Lei, dentre eles, o artigo 5º, que permite, para fins de pesquisa, a utilização de células-tronco embrionárias obtidas de embriões humanos descartados em clínicas de fertilização in vitro. Para justificar o pedido de declaração de inconstitucionalidade, Cláudio Fonteles argüiu que os embriões são considerados vidas humanas, já que para ele a vida inicia-se com a concepção e, portanto, lhes é assegurada a inviolabilidade do direito à vida, prevista no artigo 5º, caput da Constituição Federal. 10 Generated by Foxit PDF Creator © Foxit Software http://www.foxitsoftware.com For evaluation only. Em contraposição à essa tese, milhares de pessoas que podem vir a ser beneficiadas com as pesquisas e os próprios cientistas asseguram que esses embriões descartados, mesmo que fossem implantados no útero, não seriam viáveis e que, por isso, não há que se falar em vida e em direitos. O julgamento do dia 5 de março de 2008, que decidiria sobre a liberação ou não das pesquisas com células-tronco embrionária em nosso País, foi interrompido com o pedido de vista do ministro Carlos Alberto Menezes Direito. Antes do pedido de vista, o relator da matéria, ministro Carlos Ayres Britto, já havia dado seu voto. Ele é favorável às pesquisas e, em sua sustentação oral, argumentou que a vida começa na fecundação, porém não há pessoa humana embrionária, pois a pessoa humana não se antecipa à metamorfose do embrião. A presidente do STF, ministra Ellen Gracie, adiantou seu voto, antes mesmo de conceder o pedido de vista, se declarando, também, a favor das pesquisas. Ela alegou que a Corte já está sobrecarregada de processos e é preciso adiantar o julgamento deste, que há três anos requer uma solução. Por outro lado, o atual Procurador-Geral da República, Antonio Fernando de Souza, defendeu a inconstitucionalidade da Lei de Biossegurança, afirmando que o artigo 5º da Constituição Federal prevê a inviolabilidade da vida humana. O direito à vida se dá a partir do momento da concepção e retirar células de um ser humano estaria em descompasso com as normas constitucionais. Na mesma linha de argumentação se posicionou o advogado da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Já o advogado do Congresso Nacional, Leonardo Mundim, se posicionou a favor da Lei de Biossegurança e, como argumento, expôs que os 11 Generated by Foxit PDF Creator © Foxit Software http://www.foxitsoftware.com For evaluation only. que têm problemas genéticos ou físicos não podem mais aguardar e que fecundação não é o início da vida. O advogado-geral da União, José Antonio Dias Toffoli, tentou convencer os 11 ministros a permitir as pesquisas, argumentando que o direito do nascituro somente vale se ele nasce com vida. Antes disso, ele não tem direito, ele tem expectativa de direito. Toffoli comparou as diferenças entre as penas impostas a um assassino e a uma mulher que aborta um feto, questionando que, se estamos falando da mesma vida, por que um assassino pode pegar de seis a 20 anos de prisão e a mulher que aborta, de um a quatro de reclusão? Finalmente, citou o fato de que já existe tratamento com células-tronco embrionárias no exterior. Para ele, o cidadão poderá recorrer à Justiça brasileira para que o Sistema Único de Saúde (SUS) pague seu tratamento em outros países e indagou: está correto um brasileiro pobre não ter acesso ao tratamento, enquanto um rico o consegue no exterior? O então julgamento foi suspenso e ainda não há previsão de quando a Suprema Corte voltará a se reunir para decidir o futuro das pesquisas que envolvem células-tronco embrionárias. CONCLUSÃO Este trabalho teve como objetivo principal o levantamento dos diversos posicionamentos no que tange à utilização de células-tronco embrionárias nas experiências que envolvem a clonagem terapêutica e, a partir disso, obtivemos algumas conclusões. De fato, a obtenção de células-tronco através de embriões descartados em clínicas de fertilização acarreta divergências no campo da Bioética, pois, 12 Generated by Foxit PDF Creator © Foxit Software http://www.foxitsoftware.com For evaluation only. para esta, a vida se inicia com a fecundação e, portanto, os embriões são vidas, não sendo justo salvar uma vida em detrimento de outra. Este é o posicionamento por nós adotado. Além disso, a Constituição Federal, ao assegurar à inviolabilidade do direito à vida, não dispôs quando começa e termina a vida nem, muito menos, quando esta é viável ou não. Propomos, então, à essa técnica os direitos e princípios fundamentais como limites, afim de assegurar o bem-estar das gerações presentes e futuras. Para tanto, não nos esquecemos das milhares de pessoas que podem ser beneficiadas com a clonagem terapêutica tampouco pretendemos violar a liberdade científica prevista no art. 5º, XXIX de nossa Carta Magna e, por isso, propomos a utilização de outras fontes de obtenção de células-tronco, como as provenientes do sangue do cordão umbilical ou da placenta, bem como a criação de bancos dessas células. Tudo isso em observância aos princípios e direitos fundamentais, aos princípios bioéticos e às necessidades da sociedade brasileira. BIBLIOGRAFIA ABDELMASSIH, Roger. Clonagem reprodutiva versus clonagem terapêutica: avanços e limites. São Paulo: Mesa Redonda, 2002. Disponível em: <http://www.cjf.gov.br>. Acesso em: 5 de dez. 2003. DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. 2ed. São Paulo: Saraiva, 2002. BÖHMER, Maria. Pesquisa em células-tronco humanas com responsabilidade política. Cadernos Adenauer: Bioética, ano III, nº 01, p. 71-85, nov. 2001. CHAIMOVICH, Hernan. A ciência precisa prevalecer. O Estado de São Paulo, São Paulo, 01 jun. 2004. Notas e informações. Caderno A, p. 3. 13 Generated by Foxit PDF Creator © Foxit Software http://www.foxitsoftware.com For evaluation only. PESSINI, Léo; BARCHIFONTAINE, Christian de Paul de (Orgs.). Fundamentos da Bioética. São Paulo: Paulus; 1996. SCHOCKENHOFF, Eberhard. Quem é um embrião? Cadernos Adenauer: Bioética, ano III, nº 01, p. 35-44, nov. 2001. SAUWEN, Regina Fiúza; HRYNIEWICZ, Severo. O Direito “in vitro”: da bioética ao biodireito. 2ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris; 2000. SEGATTO, Chistiane. Clonagem Terapêutica. Escola Vésper, 10 jun. 2002. Disponível em: <http://www.escolavesper.com.br/clonagem_terapeutica.htm>. Acesso em: 2 maio 2008. SEGRE, Marco. A propósito da utilização de células-tronco embrionárias. Estudos Avançados, v. 18, n. 51, mai./ago. 2004. p. 257-262. SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 27ed. São Paulo: Malheiros, 2006. VARELLA, Dráuzio. 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