Prof. Ms. Edvaldo Higino de Lima Junior MÉTODO AFFAC ASSISTÊNCIA FARMACÊUTICA EM FARMÁCIA CLÍNICA Semiologia Farmacêutica aplicada à detecção e resolução de Problemas Relacionados aos Medicamentos: Manual prático de prevenção de Erros de Medicação Primeira Edição Rio de Janeiro 2014 Todos os direitos reservados e protegidos pela Lei 9.610, de 19/02/1998. Nenhuma parte deste livro, sem autorização prévia por escrito da editora, poderá ser reproduzida ou transmitida sejam quais forem os mecanismos empregados: eletrônicos, mecânicos, fotográficos, gravação ou quaisquer outros meios. AGRADECIMENTOS A Deus, por tudo que tem feito em nossas vidas. Aos meus pais, falecidos durante a trajetória deste trabalho, um deles por erro de medicação. À minha família, pelo incentivo e compreensão, principalmente a minha esposa Yaciara de Morais Nunes. Ao Cliciano pela contribuição para a semiologia farmacêutica. Aos ex-membros da gerência de risco do Hospital Estadual Pedro II, Eduardo Corsino, Fátima Cristina Alves de Araújo, Heverton Alemand, Eliézio Higino, Rafael Carneiro, Yaciara de Morais Nunes, Jorgete de Deos, Messias Sant”Ana, José Carlos Pierre de Araújo e Ana Carolina Pace. Ao Diretor Marco Aurélio, a administradora Eliziane, ao Dr. Alencar Nascimento Pinto, às equipes Médica e de Enfermagem da Clínica Médica Masculina e Feminina, CTI adulto, UTI neonatal e CTQ do Hospital Estadual Pedro II sem os quais nada teria sido feito. Ao NVH / CCIH pelo acolhimento da Gerência de Risco. Aos estagiários da Faculdade Bezerra de Araújo (FABA) e do Centro Universitário Augusto Motta (UNISUAM) que colaboraram ativamente na execução das atividades da Gerência de Risco do HEPII. A todos que, direta ou indiretamente, colaboraram para a realização deste trabalho. SUMÁRIO SUMÁRIO .......................................................................4 PREFÁCIO.......................................................................6 CONTEXTUALIZAÇÃO TEMÁTICA ........................ 11 Discussão de conceitos para dar sentido ao tema Farmácia Clínica e Atenção Farmacêutica .................11 A Farmácia Clínica e a Atenção Farmacêutica no contexto da Saúde Pública Brasileira .....................11 A Farmácia Clínica no Brasil .................................27 Otimização da farmacoterapia pela Farmácia Clínica: Detecção e Resolução de Problemas Relacionados aos Medicamentos e de Reações Adversas aos Medicamentos ..................................31 Farmacovigilância no Brasil...................................34 Farmacovigilância no Estado do Rio de Janeiro ....37 APRESENTAÇÃO DO MÉTODO AFFAC..................42 AMPLIAÇÃO DA PERSPECTIVA DE VISÃO DO FARMACÊUTICO CLÍNICO ...................................58 Histórico da Criação do Método AFFAC ...................... 63 Caracterização do Hospital Estadual Pedro II (lócus de estudo) ........................................................................63 PROCEDIMENTOS ESSÊNCIAIS PARA APLICAÇÃO DO MÉTODO AFFAC ...................... 79 Apresentação: ......................................................... 79 Coleta de dados: .....................................................79 Instrumento de entrevista: Ficha de Atenção Farmacêutica .......................................................... 80 Técnicas de entrevista: Semiologia e Semiotécnica aplicadas à Farmácia ..............................................81 Anamnese Farmacêutica ........................................89 Atenção Farmacêutica durante o Método AFFAC .99 Interação com a Equipe Multiprofissional ...........101 RESULTADOS DA APLICAÇÃO DO MÉTODO AFFAC .........................................................................103 TESTE DO MÉTODO AFFAC EM AMBIENTE AMBULATORIAL ...................................................... 107 Utilização do Método AFFAC em um estudo sobre a Adesão à Terapia Antirretroviral.............................. 109 PARTICIPAÇÃO DA EQUIPE MULTIPROFISSIONAL NA UTILIZAÇÃO DO MÉTODO AFFAC NA PREVENÇÃO DOS ERROS DE MEDICAÇÃO .............................................................. 132 Definição e Classificação dos Resultados dos Erros de Medicação ................................................................ 134 CONSIDERAÇÕES FINAIS: ......................................142 REFERÊNCIAS CONSULTADAS ............................. 144 INFORMAÇÕES SOBRE O AUTOR DESTE LIVRO E CO-AUTORES DO MÉTODO AFFAC: ..................... 158 PREFÁCIO Em 2004 foi realizado um projeto de pesquisa, com vistas à implantação de um modelo de Assistência Farmacêutica em Farmácia Clínica, para unidades de pacientes internados, denominado como Método AFFAC. Este projeto foi desenvolvido nas enfermarias destinadas à cardiologia, dos setores das clínicas médica masculina e feminina, do Hospital Estadual Pedro II (HEPII), situado na cidade do Rio de Janeiro e era baseado na detecção e resolução dos Problemas Relacionados aos Medicamentos (PRM). Os resultados desse projeto foram descritos no trabalho de conclusão do curso de graduação em farmácia por Eduardo Corsino Freire, na Universidade do Grande Rio Prof. José de Souza Herdy, na cidade do Rio de Janeiro, sob orientação do Professor Ms Edvaldo Higino de Lima Junior. Esta primeira etapa de trabalho criou condições para a posterior implantação de um Serviço de Farmácia Clínica no HEPII em 2006. Neste ano, Cliciano de Souza da Faculdade Bezerra de Araújo, na cidade do Rio de Janeiro, desenvolveu as bases da semiologia farmacêutica em seu trabalho de conclusão de curso de graduação em farmácia, dando forma a um importante instrumento de detecção e resolução de problemas relacionados aos medicamentos (PRM), também sob orientação do Professor Ms Edvaldo Higino de Lima Junior. Com o intuito de compilar estas experiências e divulgá-las aos profissionais de saúde, inclusive farmacêuticos que desejam atuar em Farmácia Clínica, mas ainda não sabem que atividades devem realizar na prática, decidimos publicar um livro que sirva como um norteador para os que querem abraçar este ramo da farmácia, sem demagogias e com consistência. Neste livro, apresentamos nossa experiência em Farmácia Clínica sistematizada em um novo método de detecção e resolução de PRM. Este método propõe uma nova classificação para os PRMs baseada na origem dos problemas relacionados aos medicamentos. Em nossa classificação quanto à origem, os PRMs podem ser: Tipo P (de origem na prescrição), Tipo D (de origem na dispensação), Tipo A (de origem na administração) e Tipo U (de origem no usuário). Os PRMs podem ser reais, quando os problemas se apresentam ou potenciais quando ainda não se apresentaram. O método foi testado no HEPII do Rio de Janeiro nos setores de cardiologia, clínica médica e unidade materno-infantil. Nossos resultados sugerem que o Método AFFAC aumentou a qualidade da assistência multiprofissional, integrando-a, reduzindo o tempo de internação e, consequentemente, os custos. Este método propõe uma investigação lógica, organizada no tempo, e eficaz na detecção dos PRMs potenciais, reduzindo a frequência dos PRMs reais, identificando com clareza qual foi a atividade de origem do PRM e facilitando, assim, a resolução. O Método AFFAC mostrou-se de utilização universal, passível de ser aplicado pelos profissionais de saúde em diversas clínicas, pois resolver PRM é uma das responsabilidades da equipe multiprofissional. Paralelamente ao desenvolvimento do Método AFFAC em ambiente hospitalar, decidimos testar o Método AFFAC em sua modalidade ambulatorial. Através de uma parceria entre a Gerência de Risco do HEPII e o Ambulatório da Providência (São Cristóvão, Rio de Janeiro – Brasil), foram avaliadas a dispensação de medicamentos antirretrovirais pelo Serviço de Farmácia e a adesão dos usuários ao tratamento, durante o período entre novembro de 2006 e novembro de 2007. Todos os pacientes eram adultos, com faixa etária predominante entre 41-50 anos, sendo 68% do sexo masculino e 32% do sexo feminino. A pesquisa foi realizada em dois momentos, onde o primeiro se caracterizou por dispensação de medicamentos, acompanhadas de acordo com o método Assistência Farmacêutica em Farmácia Clínica (AFFAC), e o segundo por dispensação sem a metodologia citada. Os dados obtidos mostraram uma maior regularidade nos pacientes abrangidos pelo AFFAC, sugerindo 91,7 + 1,4 % de adesão, enquanto os não abrangidos ficaram em torno de 68 + 3 %, aumentando a adesão ao tratamento em, aproximadamente, 23%. Estes resultados sugerem que o método utilizado neste trabalho foi de grande influência na aderência dos pacientes ao esquema terapêutico. A metodologia de Atenção Farmacêutica utilizada mostrou-se bastante satisfatória, pois o custo de sua implantação não foi elevado e proporcionou a oportunidade de um maior contato com o paciente por parte do farmacêutico. Esperamos que este método seja útil para os profissionais de saúde, inclusive farmacêuticos que desejem realizar atividades de Farmácia Clínica, mas não possuem direcionamentos claros sobre o que exatamente executar junto ao paciente e à equipe multidisciplinar. Nós nos dispomos a propor uma metodologia clara e de fácil execução. Este método, apesar de descrito sob um olhar farmacêutico, também pode ser aplicado pelos demais profissionais de saúde que realizam assistência ambulatorial ou à beira do leito, pois qualquer profissional de nível superior devidamente capacitado pode detectar e solucionar PRM, colaborando para o sucesso da assistência farmacológica recebida pelo paciente. Prof. Ms. Edvaldo Higino de Lima Junior CONTEXTUALIZAÇÃO TEMÁTICA Discussão de conceitos para dar sentido ao tema Farmácia Clínica e Atenção Farmacêutica A Farmácia Clínica e a Atenção Farmacêutica no contexto da Saúde Pública Brasileira Um dos grandes avanços na saúde pública brasileira foi conseguido pela Constituição Brasileira de 1988. O artigo 196 desta Constituição definiu a saúde como direito de todos e dever do Estado, devendo existir políticas sociais e econômicas que garantam à população o acesso universal e equitativo às ações e serviços de saúde (BRASIL, 1988). A instituição da saúde como direito social modificou profundamente a ótica sobre a saúde pública brasileira. Diversas modificações se fizeram necessárias para se iniciar o processo de tornar este direito uma realidade. Uma das modificações foi a criação do Sistema Único de Saúde (SUS) pela mesma Constituição (BRASIL, 1988). Os objetivos do SUS são a promoção, proteção e recuperação da saúde da população. Para tal, o SUS precisou ser regulamentado em suas ações e serviços de 11 saúde quanto a direção e gestão, competência e atribuições de cada esfera do governo. Esta regulamentação foi conseguida através da Lei n° 8080 de 1990, conhecida como lei orgânica da saúde (BRASIL, 1990a). A lei orgânica da saúde definiu os princípios que deveriam nortear as ações do SUS: universalidade, equidade, participação social, controle social e atendimento integral. Os princípios da universalidade e da igualdade, respectivamente, definem que o SUS deve atender a todos gratuitamente, de acordo com suas necessidades, independente se o indivíduo paga ou não a previdência social, e que este atendimento deve ser realizado e pautado na igualdade da assistência à saúde sem discriminação, preconceitos ou privilégios (BRASIL, 1990a). O princípio da equidade postula que o SUS deve respeitar as desigualdades priorizando os mais vulneráveis e necessitados (BRASIL, 1990a). O controle social prevê a participação da comunidade nos Conselhos e Conferências de Saúde com objetivo de fiscalizar e participar da gestão (BRASIL, 1990a) (BRASIL, 1990b) 12 O princípio da integralidade postula que as ações do SUS devem garantir a população um atendimento integral a saúde, assegurando seu acesso a todas as ações e serviços nos três níveis de atenção, envolvendo promoção, prevenção, cura e reabilitação. Deve existir um conjunto articulado e contínuo das ações e serviços preventivos, individuais e coletivos exigidos para cada caso em todos os níveis de complexidade. Ainda segundo a lei orgânica da saúde, deve ser assegurado ao indivíduo dentro do contexto da assistência integral, a assistência farmacêutica. Esta garantia promoveu um processo de reorganização dos serviços de saúde no Brasil envolvidos no ciclo de produção e utilização dos medicamentos. Para orientar este processo de reorganização da assistência farmacêutica no serviço publico de saúde, a portaria MS/GM n° 3916 de 1998 definiu a Política Nacional de Medicamentos. A lei orgânica da saúde prevê, dentro do campo de atuação do SUS, a formulação de uma política de medicamentos de interesse para a saúde (BRASIL, 1998). Dentro deste contexto, a Política Nacional de Medicamentos buscou observar e fortalecer os princípios 13 e as diretrizes constitucionais legalmente estabelecidos explicitando, em suas diretrizes básicas, as prioridades a serem conferidas em sua implementação para a concretização do SUS. A Política Nacional de Medicamentos tem como propósito garantir a necessária segurança, eficácia e qualidade destes produtos, a promoção do uso racional e o acesso da população àqueles considerados essenciais, buscando promover ações direcionadas a uma efetiva implementação de ações capazes de promover a melhoria das condições de assistência à saúde da população. Para tal, a Política Nacional de Medicamentos exige, para a sua implementação, a continua definição ou redefinição de planos, programas e atividades específicas nas esferas federal, estadual e municipal. Dentre as principais diretrizes desta política estão o estabelecimento da relação de medicamentos essenciais e a reorientação do modelo da assistência farmacêutica no Brasil. A adoção da Relação Nacional de Medicamentos Essenciais (RENAME) tem como objetivo definir o elenco de medicamentos essenciais considerados básicos e indispensáveis para atender a maioria dos problemas de 14 saúde da população, ficando a cargo do Ministério da Saúde o estabelecimento de mecanismos que permitam sua continua atualização. A Política Nacional de Medicamentos postula que o modelo de assistência farmacêutica seja reorientado de modo a que não se restrinja à aquisição e à distribuição de medicamentos no âmbito das três esferas do SUS. A assistência farmacêutica no SUS deverá, portanto, englobar as atividades de seleção, programação, aquisição, armazenamento e distribuição, controle da qualidade e utilização. Na atividade de utilização do medicamento, estão compreendidas sua prescrição e dispensação que devem ser realizadas de modo a promover o uso racional de medicamentos, garantindo o acesso da população a medicamentos seguros, eficazes e de qualidade. Esta política ainda postula que a farmacoepidemiologia e farmacovigilância devem ser utilizadas como ferramentas para a concretização do uso racional de medicamentos. As ações de farmacovigilância, além de tratar dos efeitos adversos, devem ser utilizadas, também, para assegurar o uso racional dos medicamentos. Para tanto, deverão ser 15