Necessidade da práxis humana do lazer Kátia de Sá

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NECESSIDADE DA PRÁXIS HUMANA DO LAZER E SUA REALIDADE
ONTOLÓGICA NA LUTA DE CLASSES
Kátia Oliver de Sá
LEPEL/FACED/UFBA ∗
O estudo apresenta a práxis humana do lazer enquanto uma necessidade humana,
concebido nas relações históricas e contraditórias da realidade ontológica dos
trabalhadores, a partir da luta de classes da sociedade capitalista. Objetiva reconhecer
em que necessidades e interesses o lazer está subsumido nas relações trabalho-capital.
Para colocar o lazer enquanto uma necessidade humana determinado por relações
histórias contraditórias apresentamos a seguinte pergunta investigativa: Em que
condição, coloca-se o lazer na construção ontológica do ser humano, na luta de classes,
em seus modos de existência? Para responder a essa indagação, tomamos o lazer
enquanto categoria de análise objetiva, a ser investigada em uma dada realidade
histórica cujo interesse é engendrado nas relações materiais da sociedade capitalista que
se estabelece a partir das formas de produção. Nas considerações finais apontamos que a
realidade ontológica do lazer para a classe trabalhadora naturaliza-se enquanto
fenômeno da práxis social, sem que os trabalhadores reconheçam o desenvolvimento
das suas determinações históricas de produção e reprodução, a partir das relações do
modo de produção capitalista, que o aprisionou, o tornou mercadoria e instrumento de
disseminação e propagação de sua hegemonia. O que os estudos realizados,
considerando a ontologia do ser humano demonstram é que com a alteração do modo de
produção da existência sustentado pelo capitalismo e a conseqüente quebra dos padrões
atuais de organização da vida, desaparecerá o trabalho alienado e com ele o lazer na
forma como o concebemos na atualidade.
Palavras-chave: Lazer; práxis social; realidade ontológica; sociedade capitalista; luta de
classes.
* Mestre em educação e doutoranda em educação pela FACED/UFBA, docente da ESEF/UCSal, membro
pesquisadora do Linha de Estudos e Pesquisa em Educação Física, Esporte & Lazer FACED/UFBA e
membro das linhas: Marxismo na História, Educação e Educação Física; Produção do conhecimento
referente aos estudos do Lazer no Brasil – CEFE/UEL. E-mail: [email protected]
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[...] Na produção social da própria existência, os homens entram em
relações determinadas, necessárias, independentes de sua vontade;
estas relações de produção correspondem a um grau determinado
de desenvolvimento de suas forças produtivas materiais. A
totalidade dessas relações de produção constitui a estrutura
econômica da sociedade, a base real sobre a qual se eleva uma
superestrutura jurídica e política e à qual correspondem formas
sociais determinadas de consciência. O modo de produção da vida
material condiciona o processo de vida social, política e intelectual.
Não é a consciência dos homens que determina o seu ser, ao
contrário, é o seu ser social que determina a sua consciência
(KARL MARX, s/d, p. 301-3002).
Neste estudo apresentamos dados que colocam o lazer enquanto uma
necessidade humana, concebido nas relações históricas e contraditórias da realidade
ontológica dos trabalhadores, a partir da luta de classes da sociedade capitalista 1 .
O desafio do estudo está localizado na necessidade de investigar o lazer
enquanto um fenômeno 2 da práxis social, advindo das relações do trabalho que produz
os meios de vida, ou seja, a base da existência do ser humano, que ao criar a si mesmo
não apenas como um ser dotado de condições para pensar, qualitativamente distinto dos
animais de espécies superiores, mas, sobretudo como o único ser no universo
reconhecido por ser capaz de criar a realidade, ou seja, gerar a sua própria vida material
(MARX e ENGELS, 1999, p. 27).
Considerando, portanto, este fato da produção da existência 3 , é possível
reconhecer que as necessidades humanas de primeira e segunda ordem surgem de
acordo com dadas relações de produção e de acordo com o grau de desenvolvimento das
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Tomamos a categoria “luta de classes” a partir de Marx (s/d, p. 253-254): Carta de Weydemeyer, 8 de
março de 1985. Nessa carta Marx ressalta que não lhe cabe o mérito de haver descoberto nem a existência
das classes, nem a luta entre elas. O que destaca de novo em seus estudos: “1. demonstrar que a existência
das classes está ligada somente à determinadas fases de desenvolvimento da produção; 2. que a luta de
classes conduz, necessariamente, à ditadura do proletariado; 3. que essa própria ditadura nada mais é do
que a transição à abolição de todas as classes e a uma sociedade sem classes.[...]” (grifos do autor).
2
Segundo Kosik (1995, p.16-17), no mundo capitalista da pseudoconcreticidade, há um complexo de
fenômenos que povoam o ambiente cotidiano e a atmosfera comum da vida humana. Considerar o lazer
enquanto um fenômeno da práxis social significa a necessidade de reconhecer a sua essência no cotidiano
das relações capitalistas, pois o fenômeno indica a essência e ao mesmo tempo, a esconde. Segundo esse
filósofo, “a manifestação da essência é precisamente a atividade do fenômeno”.
3
Em texto de qualificação de doutorado realizado por Peixoto (2006, p. 19) sobre “Estudos do Lazer no
Brasil: apropriação da obra de Marx e Engels” encontramos referências à categoria “produção da
existência” em que ¨a compreensão das possibilidades do lazer na perspectiva da revolução do modo
moderno de vida passa pela compreensão da análise marxista sobre a atividade humana (trabalho), no
modo capitalista de produção da existência¨. O estudo busca teorizar sobre as possibilidades que a obra de
Marx e Engels, apresenta para a problemática do lazer. A categoria modo de produção da existência,
segundo bases da compreensão em Marx e Engels, na obra Ideologia Alemã (1999), diz respeito à forma
como se dá à vida real que parte do desenvolvimento histórico dos homens.
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forças produtivas. Em sendo assim, o lazer, enquanto uma necessidade de segunda
ordem surge ao longo do processo de hominização. Nos interessa investigar: 1. em que
realidade – modo de produção da existência - surge o lazer enquanto uma necessidade e
a que interesses ele está subsumido nas relações trabalho-capital? 2. Tem o lazer na
forma de suas manifestações históricas um caráter ontológico? 3. Qual é seu conteúdo
alienador e ou emancipador considerando o modo de produção da existência? 4.
Considerando as formas em que se apresentam as atividades produtivas do homem e da
mulher, a saber: “trabalho em sua acepção geral - como ‘atividade produtiva’: a
determinação ontológica fundamental da ‘humanidade’[...]; e em sua acepção
particular, na forma de ‘divisão do trabalho’ capitalista...” (MÉSZÁROS, 2006, p.78)
(grifos do autor) e em vista que é nesta última forma que o ‘trabalho’ assume a base de
toda a alienação e, considerando ainda, que esta forma é hegemônica, é possível
conceber o lazer a partir do trabalho em sua acepção geral? Quais seriam as
contradições que permitem reconhecer este processo?
Partimos inicialmente da compreensão de que nas mediações históricas o
homem se aliena do próprio trabalho, de sua própria atividade teleologicamente guiada,
em que a matéria se aplica ao trabalho; ocorre, portanto uma ‘mediação da mediação’,
uma mediação historicamente específica no modo de produção do capital e a mediação
de segunda ordem - forma específica, alienada, da mediação de primeira ordem, da
automediação ontologicamente fundamental do homem com a natureza que é a
mediação de primeira ordem (MÉSZÁROS, 2006, p.78).
Para colocar o lazer enquanto uma necessidade humana determinado por
relações histórias contraditórias, propomos nesse estudo a seguinte pergunta
investigativa: Em que condição, portanto, coloca-se o lazer na construção ontológica do
ser humano, na luta de classes, em seus modos de existência?
Para responder a essa indagação e as demais apresentadas, tomamos o lazer
enquanto categoria de análise objetiva 4 , a ser investigada em uma dada realidade
histórica, cujo interesse é engendrado nas relações materiais da sociedade capitalista que
se estabelece a partir das formas de produção. O lazer, assim como todos os fenômenos
da práxis, criados para responder as necessidades humanas, atende na sociedade
4
“Todas as categorias da filosofia marxista têm conteúdo objetivo [...] elas são reflexo das leis do mundo
objetivo. Sem esse conteúdo objetivo elas perderiam os seus significados e deixariam de ser categorias
filosóficas”. [...] São de conteúdo objetivo até os diversos procedimentos lógicos do estudo do objeto e de
ver que estes também são um análogo da realidade e dos processos que nela se desenrolam. (KOPNIN,
1978, p. 106).
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capitalista a determinados objetivos e interesses de classe, cuja relação específica vem
sendo engendrada historicamente para responder ao domínio imposto pelo capital. Esse
domínio tem raízes na realidade humano-social, da própria existência humana, a partir
do embate central capital/trabalho. Portanto, nesse estudo, partimos do pressuposto de
que o mundo que o ser humano cria como realidade humano-social tem suas raízes em
condições 5 independentes de si mesmo, que sem determinadas condições objetivas
materiais advindos da natureza, o mundo não seria essa realidade que conhecemos.
Sobre as leis e categorias que permitem que o ser social estabeleça sentido, ou
seja, subjetividade no pensamento, Kosik (1995, p. 29), coloca a essência do homem e
da mulher como uma unidade da objetividade e da subjetividade 6 , que se estabelece
pela práxis humana, onde opera a metamorfose do objeto no subjetivo e do subjetivo no
objetivo, a partir da realidade; ou seja, é na práxis que se opera o centro ativo onde se
realizam os intentos humanos e onde se desvendam as leis da natureza.
Considerando a capacidade de criar a realidade do mundo pela mediação do
trabalho na natureza, o ser humano cria a realidade objetiva do capitalismo que não é
apenas uma realidade econômica, mas acima de tudo uma complexa realidade
sociocultural, em cuja formação de processos de evoluções históricas concorreu
também, vários fatores extra-econômicos (FERNANDES, 1989, p. 156-157). Dentre os
fatores que concorrem para alimentar as relações capitalistas no mundo, encontra-se o
lazer, cujas leis gerais do movimento na sociedade precisam ser reveladas para a
obtenção da verdade objetiva, que favorece aos interesses da classe burguesa,
proprietária dos meios de produção.
Portanto, as propriedades objetivas do lazer na atual realidade precisam ser
reveladas a partir da gênese histórica tal como elas são, reais e concretas, independentes
do pensamento que se movimenta no seu próprio conteúdo objetivo, impregnado de
interesses de consumo, manipulado pelo mercado. A seguir, expomos argumentos sobre
5
Segundo Kosik (1976, p. 125-126), “o homem não existe sem ´condições` e só é criatura social através
das ‘condições’. “[...]O antinomismo das ´condições` e da consciência é uma das formas históricas
transitórias da dialética de sujeito e objeto, que é o fator fundamental da dialética social¨. Partindo da base
teórica marxista Kosik afirma que na produção e reprodução da vida, isto é, na criação de si mesmo como
ser histórico-social, o homem produz: 1. os bens materiais, o mundo materialmente sensível, cujo
fundamento é o trabalho; 2. as relações e as instituições sociais, o complexo das condições sociais; 3. e,
sobre a base disto, as idéias, as concepções, as emoções, as qualidades humanas e os sentidos humanos
correspondentes.
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Kopnin (1978, p. 126 - 127), coloca inicialmente, ¨que não existe pensamento objetivo que não esteja
relacionado com a atividade do sujeito – o homem¨.
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o lazer enquanto necessidade humana e suas contradições históricas na realidade
ontológica.
Bases ontológicas da produção do conhecimento lazer
O nódulo essencial de toda ontologia, segundo Lessa (2002, p. 50) é a categoria
da substância, que na ontologia de Lukács apresenta o ser sendo histórico porque sua
essência, em vez de ser dada a priori, se substancia ao longo do próprio processo de
desenvolvimento ontológico. Sobre a substância, Lukács (s/d, apud Lessa, 2002, p 51),
afirma:
a substância é aquilo que, no perene mudar das coisas, mudando a si
mesma, é capaz de se conservar em sua continuidade. Esse se conservar
dinâmico não é, todavia, necessariamente conexo com a ´eternidade`:
as substâncias podem surgir e perecer, sem por isso deixar de ser
substância, já que dinamicamente se mantiveram no período de tempo
de sua existência. [...] a substancialidade [...] não é uma relação
estático-estacionária de autoconservação que se contraponha em termos
rígidos e excludentes ao processo do devir, ela ao invés se conserva em
sua essência, mas processualmente, se transformando no processo, se
renovando, participando do processo.
Para esse estudioso da ontologia, em outras palavras, a essência é o locus da
continuidade 7 . A relação entre essência e continuidade não é, em Lukács, necessidade.
Partindo desse princípio, e considerando a possibilidade de avançarmos nas reflexões
propostas, indagamos: 1. O lazer na sociedade capitalista, enquanto um fenômeno da
práxis social humana é um produto que se institui e se desenvolve de maneira natural a
partir da essência do ser social ou é gerado e fortalecido pela luta de classes que se
consolida nas relações de trabalho da sociedade capitalista? 2. Considerando a
reprodução das determinações mais genérico-essenciais do ser social a cada momento
histórico, como ocorre a essência humana e histórica do lazer na sociedade capitalista?
Para suscitar possíveis explicações é preciso compreender restrições mutilantes e
limitações avarentas que nos impõe a exploração capitalista no tempo de trabalho.
Somente colocando o autêntico pensamento crítico, poderemos conceber nas bases de
um projeto de sociedade superador ao capitalismo, a possibilidade de uma outra riqueza
produzida pelo trabalho que possa fluir da organização da reprodução social sobre a
7
A essência, na acepção lukasiana, é o “complexo de determinações que permanece ao longo do
desdobramento categorial do ser; a essência são os traços mais profundos que articulam em unidade os
heterogêneos momentos que se sucedem ao longo do tempo” (LUKÁCS s/d apud LESSA 2002, p. 51).
5
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base do tempo disponível 8 dos trabalhadores. Nessa perspectiva, Lessa (2002, p. 52)
coloca que as formas racionais que assumem o capitalismo em todo o planeta,
certamente são decisivas para o desenvolvimento global do modo de produção
capitalista e, por isso, são igualmente decisivas para o desenvolvimento da essência da
formação social; o que significa reconhecer que o lazer, assim como todos os
fenômenos advindos da sociedade capitalista, na sua essência e em suas propriedades
objetivas, são fenômenos produtos do capitalismo, enquanto um complexo-histórico.
A reivindicação do tempo disponível a partir das relações de exploração do
trabalho gerou uma determinada esfera fenomênica, cuja crise se agravou mais
fortemente no século XIX, na Europa; essa crise não ocorreu naturalmente a partir da
relação do homem e da mulher com o trabalho, nos atos cotidianos, a partir de
alternativas 9 objetivas da realidade, mas pelas contradições advindo de uma economia
que partia do fato dado e acabado da propriedade privada, cujas fórmulas gerais
abstratas, passaram a valer como leis. As leis, tendo origem na essência da propriedade
privada, não esclareciam para os trabalhadores qual o fundamento da divisão entre
trabalho e capital, entre capital e terra.
Portanto, o que denominamos de lazer, nesse estudo, compreendemos que nasce
nos primórdios das relações capitalistas, na transformação do sujeito que trabalha,
enquanto conseqüência ontológica necessária do objetivo proveniente do trabalho
alienado, em que a ação do trabalho é determinante sobre o ser social, retirando-lhe a
consciência relativa às tarefas, ao mundo, a própria condição de sujeito histórico,
alienando-o a partir da reprodução da própria existência nos espaços e tempos que
partem inicialmente do trabalho, mas que vão além de suas relações. Para Marx (2004,
p. 200) o que caracteriza a era capitalista é o aparecimento do capital, cujas contradições
históricas de existência não se concretizam apenas pela existência da circulação de
mercadoria e dinheiro, mas quando os possuidores dos meios de produção encontram o
trabalhador livre no mercado vendendo sua força de trabalho 10 .
8
O tempo disponível do trabalhador nas relações de trabalho capitalista, segundo Marx (2002, p. 271) é
um tempo que o trabalhador ¨furta o capitalista¨, pois este se apóia na lei da troca de mercadorias. Como
qualquer outro comprador, o capitalista procura extrair o maior proveito possível do valor-de-uso de sua
mercadoria¨. Nas contradições em que se apresenta hoje o tempo disponível dos trabalhadores,
apresentamos a possibilidade de discutir um tempo que coloca o lazer situado em um projeto de sociedade
socialista, em que as bases de relações do tempo de não trabalho não têm valor determinado a partir do
trabalho enquanto mercadoria.
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Conforme Lukács (s/d, p. 24), a alternativa é um ato de consciência, pois é a categoria mediadora por
meio da qual o reflexo da realidade se torna veículo do ato de por um existente.
10
Para Marx (2004, p. 200 - 2001), nessas circunstâncias históricas, “o valor da força de trabalho é
determinado, como qualquer outra mercadoria, pelo tempo de trabalho necessário à sua produção, e por
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7
A consciência de classe dos trabalhadores 11 mediante o lazer não pode ser uma
consciência empírica da realidade, embora a classe trabalhadora possa partir dela; essa
consciência de classe de si deve ser objetiva e racional; é preciso partir da sua própria
posição de classe frente à sua vocação histórica para assumir perante o conhecimento da
práxis social, o sentido do processo histórico como imanente a este mesmo processo,
deixando de reconhecer o lazer como um fenômeno que contribui para uma conquista
de liberdade, enquanto uma necessidade nas relações estabelecidas pelo capital. Essa
realidade só poderá ocorrer na medida em que os trabalhadores deixarem de
compartilhar de todas as reificações de vida com a burguesia que alimenta a lógica do
capital.
Portanto, somente a tarefa de uma análise histórica meticulosa sobre o estado do
lazer na sociedade capitalista pode nos apontar objetivamente, em que situação de pode
desmascarar a ilusão do lazer, enquanto reino da liberdade para a classe trabalhadora.
Possibilidades explicativas conclusivas
Apresentando o lazer enquanto categoria de análise, em que realidade objetiva se
efetiva, buscamos apontar elementos que contribuem para desmascarar a sua
manipulação na sociedade capitalista e na luta de classes, o que nos permite reconhecer
a sua totalidade – que em dadas relações históricas de produção da existência, como por
exemplo, no modo onde o trabalho humano hegemônico é o trabalho alienado, torna-se
necessário romper com esta forma. Isto traz conseqüências e exigências para a ação
prática no âmbito do lazer e para a produção do conhecimento sobre o lazer. Isto nos
coloca frente a desafios que exigem de construirmos relações de produção da existência
que permitam outra internalização e construção de outra subjetividade humana que não
as próprias do modo de existência capitalista; o que significa colocar também, o desafio
do real em sua totalidade.
sua conseqüência, a sua reprodução. [...] O capital anuncia, desde o início, uma nova época no processo
de produção social, que segundo Marx, significa adquirir a força de trabalho, para o trabalhador, a forma
de mercadoria que lhe pertence, tomando seu trabalho a forma de trabalho assalariado”.
11
A questão da consciência de classe dos trabalhadores sobre o lazer só pode ser entendida no contexto
da própria luta de classes. Não é apenas uma tomada de consciência de uma realidade em que se coloca o
lazer nas relações capitalistas, que podem ser simplesmente descritíveis e explicáveis, que estes possam
ter a partir da situação de vida, mas uma consciência que parta da necessidade de reconhecer o lazer, a
partir de uma posição de interesses colocados pelo capital.
7
8
Para Kosik (1995, p. 61), a totalidade concreta da realidade, numa concepção
dialética-materialista do conhecimento do real, tem dependência da problemática
ontológica da realidade, o que significa um processo indivisível, cujos momentos são:
1. A destruição da pseudoconcreticidade, isto é, da fetichista e aparente objetividade
do fenômeno, para alcançar o reconhecimento do conhecimento da sua autêntica
objetividade;
2. Em segundo lugar, do conhecimento do caráter histórico do fenômeno, no qual se
manifesta de modo característico a dialética do individual e do humano em geral;
3. E enfim, do conhecimento do conteúdo objetivo e do significado do fenômeno, da
sua função objetiva e do lugar histórico que ocupa no seio do corpo social.
Portanto, a realidade ontológica em que o lazer vem se colocando para a classe
trabalhadora, naturaliza-se enquanto fenômeno da práxis social sem reconhecer que o
desenvolvimento das suas determinações históricas de produção e reprodução, a partir
das relações do modo de produção capitalista, o aprisionou, o tornou mercadoria e
instrumento de disseminação e propagação de sua hegemonia.
No século XXI, a experiência acumulada pela humanidade, principalmente
considerando os últimos quatro séculos, onde foi hegemônico o modo de existência
alienado, impõe a ruptura com a subsunção do trabalho aos interesses do capital. As
forças produtivas que atualmente estão em franca decomposição e degeneração não
necessitarão sequer deste lazer alienado criado enquanto necessidade de segunda ordem
pelo capital que subsume o trabalho humano. O que os estudos realizados, considerando
a ontologia do ser humano demonstram é que com a alteração do modo de produção da
existência sustentado pelo capitalismo e a conseqüente quebra dos padrões atuais de
organização da vida, desaparecerá o trabalho alienado e com ele o lazer na forma como
o concebemos na atualidade. Restará a humanidade o reino da liberdade a partir de um
projeto de sociedade socialista.
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8
9
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480 f.
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