Segunda-feira, 06 de abril de 2015 / Broadcast Agência Estado BC deflagra debate sobre repasse cambial à inflação Ricardo Leopoldo Um debate econômico surge sobre o nível de repasse da variação do câmbio à inflação. O Banco Central apontou no relatório de inflação de março que há fatores que podem mitigar o impacto da depreciação do real sobre os preços ao consumidor. Destaque para a redução dos preços de commodities e a desaceleração da economia. O presidente do BC, Alexandre Tombini, afirmou recentemente no Senado que o repasse cambial ao IPCA pode estar entre 5% e 10%, mas pode ser ainda menor devido a estes elementos. O conceito de repasse cambial à inflação no Brasil ficou caracterizado por algumas condições. Uma delas é a oscilação do câmbio nominal de 10% em 12 meses. Por exemplo: caso a cotação do real varie de R$ 3,00 para R$ 3,30 e fique constante desta forma por um ano, isso agregaria ao IPCA 0,5 ponto porcentual ao final do período, na hipótese de um repasse cambial de 5%. Se for considerado um coeficiente de 10%, portanto seria adicionado à inflação 1 ponto porcentual nesse horizonte de tempo. Depois da divulgação do relatório de inflação de março, que trouxe o box "Repasse Cambial para Preços", o BC não deixou claro se passou a trabalhar com um novo nível de repasse do câmbio à inflação. Mas este texto técnico dá algumas indicações. Ele aponta que a instituição estimou uma curva de Philips com medida do hiato do produto como variável de threshold, que na prática permite indicar qual foi o repasse do câmbio aos preços em períodos diferentes, com o ritmo de atividade ora em alta e ora em baixa. Segundo o trabalho, os resultados sugerem que, quando a economia está desaquecida, o repasse cambial de curto prazo é 3 pontos porcentuais menor do que quando o País cresce a taxas elevadas. Neste contexto, Braulio Borges, economista-chefe da consultoria LCA, aponta que é plausível avaliar que o BC passou a considerar que o repasse do câmbio ao IPCA caiu e está entre 2% e 7%. E, para um grupo de especialistas, a recessão que o País enfrentará neste ano deverá ser o principal fator que diminuirá o repasse da depreciação do câmbio à inflação. Priscilla Buriti, economista do banco Brasil Plural, estima que o repasse, hoje ao redor de 5%, deve cair até o fim do ano sobretudo devido a uma retração da economia de 1,2% em 2015, depois de ter subido 0,1% em 2014 - um biênio cujo crescimento deve ficar abaixo do PIB potencial. A conjuntura desfavorável neste ano engloba a piora do mercado de trabalho, formação de estoques indesejados por empresas e continuidade do recuo dos investimentos já apurada em 2014, com deterioração dos índices de confiança. De acordo com a FGV, em março os indicadores de confiança de Serviços (82,4 pontos), Comércio www.funcex.org.br [email protected] Tel.: (55.21) 2509.7000, 2509-2662 Página: 1/3 (92,0 pontos) e Construção (76,3 pontos) apresentaram o menor nível das respectivas séries históricas. Em relação à Indústria, o índice de confiança atingiu 75,4 pontos no mês passado, o mais baixo desde janeiro de 2009, quando registrou 74,1 pontos. O fato de que a recessão neste ano será maior do que a registrada em 2009, quando ocorreu um recuo do PIB de 0,2% motivado pela Grande Recessão mundial, deve conter a alta da inflação e reduzir o repasse do câmbio ao IPCA para um número entre 2% e 3%, ressalta Borges. Ele destaca que, em julho de 2008, o IPCA estava muito alto, correndo a uma velocidade próxima a 8% no acumulado em 12 meses. Contudo, a crise internacional deflagrada em setembro daquele ano levou o Brasil a sofrer um recuo do Produto Interno Bruto em 2009, o que foi decisivo para que a inflação desacelerasse e fechasse o ano em 4,3% - a última vez em que ficou abaixo da meta de 4,5%. Um elemento semelhante entre a crise de 2008/2009 e o cenário de agora é a intensa queda dos preços de commodities. Apesar da cotação nominal do real ante o dólar ter se depreciado 38,4% de agosto do ano passado até março (de R$ 2,268 para R$ 3,1394), há o contraponto de uma queda expressiva daquelas mercadorias globais. O valor geral das importações brasileiras nesse período baixou de US$ 19,3 bilhões para US$ 16,52 bilhões, um recuo de 14,30%, relata Daiane Santos, economista da Funcex. E boa parte dessa redução foi gerada pela queda de combustíveis, entre eles gasolina. Opiniões A perspectiva de queda do repasse cambial para o IPCA, contudo, não é uma avaliação uníssona entre os especialistas. Para alguns deles, deverá haver um equilíbrio entre a redução do ímpeto da inflação devido à recessão e uma pressão de alta dos preços que deve ser gerada pela desvalorização do real ante o dólar, movimento que deverá continuar ao longo de 2015. A combinação destes dois fatores deverá manter estável o repasse em 4% neste ano, ressalta Carlos Kawall, economista-chefe do banco Safra. Kawall estima uma retração do PIB de 1,3%, o que deve gerar na economia resistências para uma alta excessiva da inflação. Mas, por outro lado, ele avalia que o câmbio deverá continuar se desvalorizando no decorrer do ano, a ponto de chegar a dezembro em R$ 3,50. Alguns elementos externos deverão contribuir para esse movimento, como a normalização da política monetária dos EUA e a menor atratividade de investidores para aplicar em países emergentes. Também terão influência o elevado déficit de transações correntes do Brasil, próximo a 4,1% do PIB, a queda dos termos de troca do País e as dificuldades de financiamento de companhias no exterior, causadas em grande medida pela situação da Petrobras e pelos desdobramentos da Operação Lava Jato. Mas a realidade de um IPCA bem elevado em 2015 - em torno de 8% no ano - leva um segmento de especialistas a ponderar que o repasse da variação do real ante o dólar à inflação deve ficar estável em relação aos parâmetros anteriores ou até subir um pouco no curto prazo. www.funcex.org.br [email protected] Tel.: (55.21) 2509.7000, 2509-2662 Página: 2/3 Solange Srour, economista-chefe da ARX Investimentos, estima que o repasse está em 4% e admite que ele pode avançar ligeiramente até o fim do ano por causa de alguns fatores: um deles é que o IPCA ficou superior à meta nos últimos quatro anos, o que estimula mecanismos de indexação formais e informais na economia. Além disso, a magnitude da desvalorização do real ante o dólar pode aumentar os custos da produção de mercadorias e da prestação de serviços, o que incrementaria preços livres e administrados, como gasolina e diesel. O perigo de uma depreciação muito forte do câmbio, mesmo que numa economia fraca, pode levar agentes econômicos a avaliarem que seus impactos sobre a inflação serão permanentes e não temporários, destaca Rodrigo Melo, economista-chefe da Icatu Vanguarda, que estima em 5% o repasse do câmbio à inflação. Todos estes elementos descritos levam também Alberto Ramos diretor de Pesquisas para a América Latina da Goldman Sachs, a avaliar que o repasse está em 6% e pode subir num horizonte de 4 trimestres. O debate sobre o nível de repasse cambial aos preços ressalta que o Banco Central precisará continuar bastante vigilante na administração da política monetária para concretizar a ancoragem de expectativas de inflação, o que é essencial para viabilizar que o IPCA fique bem próximo da meta de 4,5% em 2016. Ricardo Leopoldo é jornalista do Broadcast Fonte: http://institucional.ae.com.br/ www.funcex.org.br [email protected] Tel.: (55.21) 2509.7000, 2509-2662 Página: 3/3