1 CULPA: O FIO CONDUTOR NA RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO Vivian Lacerda Arruda 1 RESUMO O presente artigo tem como objetivo a análise jurisprudencial da responsabilidade civil do médico, verificando quando a obrigação é de meio ou de resultado, quando esses profissionais incorrem em uma das modalidades de culpa, quais sejam, negligência, imprudência e imperícia e, os danos decorrentes da atividade médica. Para atingir este propósito, foi realizada pesquisa jurisprudencial, de diferentes Tribunais, e, posteriormente cada julgado foi apreciado individualmente, buscando identificar o posicionamento dos magistrados. O artigo tem como principais referenciais teóricos: CROCE e CROCE JÚNIOR, BARROS JÚNIOR, CAVALIERI FILHO, GONÇALVES, KFOURI NETO, GIOSTRI, LOPEZ e AGUIAR JÚNIOR. PALAVRAS-CHAVE: responsabilidade civil; culpa; obrigação de meio e de resultado; dano; medicina. INTRODUÇÃO O presente artigo tem como objetivo verificar a culpa na responsabilidade civil do médico, por meio de análise jurisprudencial de diferentes Tribunais. Nesse contexto, o objetivo fundamental desse estudo é o de propiciar uma resposta para a seguinte questão: quando que o profissional da medicina pode vir a ser responsabilizado pelos seus atos no exercício da sua profissão? 1 Vivian Lacerda Arruda, aluna do 10º período do Curso de Graduação em Direito, Escola de Direito e Relações Internacionais, das Faculdades Integradas do Brasil – Unibrasil, orientada pelo Prof. Ms. Marcelo Miguel Conrado. 2 Essa pergunta é de grande discussão tanto na doutrina quanto na jurisprudência, tendo em vista que várias são as situações em que esse profissional se encontra. Isto, em razão dos diagnósticos e da variedade de tratamentos que o médico desempenha. Entretanto, a partir do momento em que não se atinge o resultado pré-determinado, ou seja, não se atende às necessidades do paciente, e ainda gera danos ao mesmo, por um ato de descuido, falta de técnica, ou ainda, por imprevisão do médico, presume-se que o contratado agiu com culpa. Será abordado qual o tipo de obrigação do médico, isto é, se a obrigação é de meio ou de resultado. E este é um ponto controverso na doutrina, no que tange, mais especificamente, na obrigação do cirurgião plástico nos casos de cirurgia plástica com finalidade estética, pois para alguns autores trata-se de uma obrigação de meio, assim como as obrigações dos demais médicos, enquanto que para outros autores há uma obrigação de resultado. Entretanto, a partir de análise jurisprudencial, apesar de ainda existir posicionamentos contrários, foi possível verificar o entendimento predominante dos tribunais sobre o tema. Serão analisados os tipos de danos decorrentes do erro médico, em que pode ser dano patrimonial ou dano moral. E, ainda, há o dano estético, o qual é considerado uma espécie desse. O presente trabalho foi realizado com base em estudos jurisprudencial, relacionado à responsabilidade civil do médico, buscando constatar quando é possível responsabilizar esse profissional, frente às situações de atos de negligência, imprudência e imperícia, que atualmente estão cada vez mais freqüentes. 1 MODALIDADES DA CULPA EM SENTIDO ESTRITO NA ATIVIDADE MÉDICA As modalidades de culpa presentes no ordenamento jurídico brasileiro são: negligência imprudência e imperícia. A negligência é a falta de observância dos deveres e cuidados necessários para determinada situação, expressando, 3 assim, uma omissão. 2 A imprudência é todo ato executado de forma não justificada, precipitada ou sem cautela na prática de certos atos perigosos, determinando uma conduta comissiva. 3 E, a imperícia é conceituada como a falta de habilidade ou falta de capacidade técnica, teórica ou prática na realização de uma atividade profissional. 4 Essas modalidades estão presentes na atividade médica nos casos de esquecimento de corpo estranho durante ato cirúrgico, ao realizar exame clínico superficial, omitir instruções necessárias no atendimento de casos clínicos, médico que avalia um diagnóstico a distância e receita produto farmacológico por telefone, médico cirurgião que acarreta resultado danoso ao paciente por utilizar outro tipo de técnica operatória que não a consagrada nos meios científicos. Nesse sentido, encontram-se as seguintes jurisprudências: APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ERRO MÉDICO. ESCLEROTERAPIA. NEGLIGÊNCIA. PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA. REJEIÇÃO. A contrariedade da decisão aos interesses da parte não caracteriza vício a configurar a sua nulidade. MÉRITO. Caso em que, consoante perícia técnica, do procedimento de escleroterapia efetuado pela ré resultou úlcera isquêmica na perna da autora. Cicatriz permanente. Prova nos autos suficiente a demonstrar o agir negligente da ré, especialmente no tocante ao consentimento informado, que não foi observado. DANOS MATERIAIS E MORAIS. Possibilidade de reparação. PRELIMINAR REJEITADA À UNANIMIDADE. APELO PROVIDO EM PARTE, POR MAIORIA, VENCIDO O 5 PRESIDENTE, QUE NEGAVA PROVIMENTO. No caso acima a paciente submeteu-se a uma sessão de escleroterapia do membro inferior esquerdo em 26/11/1999. Como as dores sentidas não diminuíram com a medicação, no dia seguinte e no subseqüente, contatou a médica, que lhe prescreveu nova medicação. Em 02/12/1999 a demandante compareceu ao consultório da demandada para retirar os curativos. Por não haver melhora, a requerente procurou outro médico, que lhe receitou o mesmo medicamento antes prescrito pela médica – Fibrase – e açúcar cristal. Como as 2 CROCE, Delton; CROCE JÚNIOR, Delton. Erro Médico e o Direito. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 23. 3 Ibidem, p. 25. 4 BARROS JÚNIOR, Edmilson de Almeida. A Responsabilidade Civil do Médico: Uma abordagem constitucional. São Paulo: Atlas S.A., 2007. p. 106. 5 Apelação Cível Nº. 70018951905, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Antônio Corrêa Palmeiro da Fontoura, Julgado em 31/07/2008. 4 dores persistiram, a autora procurou um cirurgião plástico, que lhe recomendou cirurgia para debridamento e enxerto, o que foi feito. Sentindo-se lesada, a demandante requereu a condenação da demandada ao pagamento de indenização por danos materiais e morais. Segundo o entendimento dos julgadores, com base na perícia médica, houve a comprovação do nexo causal entre a lesão produzida na perna da paciente e o procedimento efetuado pela médica, e a negligência desta, principalmente, no que diz respeito à violação do dever de informar a paciente acerca dos riscos do procedimento a que estava se submetendo. APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO. PROCEDIMENTO CIRÚRGICO EM QUE FOI ESQUECIDA COMPRESSA NO CORPO DA PACIENTE. COMPLICAÇÕES POSTERIORES. NEGLIGÊNCIA EVIDENCIADA. DANOS MORAIS. OCORRÊNCIA. RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO. A responsabilidade do médico é, efetivamente, subjetiva, conforme artigo 14, §4º, CDC, uma vez que sua obrigação, de regra, não é de resultado, mas de meio. Então, além da prova do dano e do nexo de causalidade, é necessário que reste demonstrado que o serviço foi culposamente mal prestado. CASO CONCRETO. Hipótese em que a autora sofreu complicações oriundas de uma gaze deixada em seu organismo, durante a realização de uma cirurgia. DANO MORAL CONFIGURADO. Nexo causal e culpa, obrigando a realização de cirurgia de urgência para correção do erro, gerando na autora uma cicatriz abdominal, configurando dano moral indenizável. NEGARAM PROVIMENTO AO 6 APELO. UNÂNIME. No presente caso a paciente ingressou com a presente ação de indenização por danos morais em virtude de erro médico. Sustenta que, em 09/03/2004, sofreu uma intervenção cirúrgica (histerectomia). Após ter transcorrido com êxito a cirurgia, executada sob os cuidados do médico, teve alta em 12/03/2004. Afirma que, meses após este procedimento, foi internada com fortes dores abdominais, vômitos e febres, sendo submetida a uma cirurgia de emergência, realizada pelo cirurgião geral do hospital. Assevera que, durante tal procedimento, o cirurgião encontrou dentro do organismo da paciente um corpo estranho – uma gaze cirúrgica – o que caracteriza a existência de erro médico. Afirma que a segunda cirurgia causou-lhe dano estético e moral. 6 Apelação Cível Nº. 70022799316, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Odone Sanguiné, Julgado em 16/04/2008. 5 Não há dúvidas quanto o ato negligente do médico, que por um ato de descuido deixou um corpo estranho, isto é, uma gaze cirúrgica no organismo da paciente, trazendo graves conseqüências, tendo que se submeter a uma outra cirurgia, caracterizando o dano moral. APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ERRO MÉDICO. DANO MORAL. ERRO DE DIAGNÓSTICO. MORTE DO PACIENTE EM DECORRÊNCIA DE INFARTO. RESPONSABILIDADE DO MÉDICO E DA UNIMED. Erro de diagnóstico. Alta precoce. Erro de avaliação médica, com concessão de alta. Morte do paciente. Negligência e imprudência configuradas. Responsabilidade dos médicos e do hospital. O dano moral, no caso, conforme entende farta jurisprudência, prescinde de prova pela dificuldade de produzi-la em Juízo, constituindo-se em dano “in re ipsa”, inerente ao próprio fato ocorrido. Precedentes desta Corte e do STJ. Na fixação do montante indenizatório por gravames morais, deve-se atender à duplicidade de fins a que a indenização se presta, atentando para a condição econômica da vítima, bem como para a capacidade do agente causador do dano, amoldando-se a condenação de modo que as finalidades de reparar o ofendido e punir o infrator sejam alcançadas. Sucumbência. Em caso de indenização por danos morais, fixada em patamar inferior ao pretendido pelos autores, não há que se falar em sucumbência recíproca, devendo os réus arcar com a totalidade 7 das verbas sucumbenciais. Apelos dos réus e recurso adesivo da autora desprovidos. No caso acima, o paciente na manhã do dia 13/06/2003, por volta das 9h15min, se dirigiu ao posto de atendimento médico da SAMEISA, com quem tem convênio de saúde. O paciente apresentava dores no peito e braços, suor frio e dor de cabeça. Na SAMEISA foram informados que só haveria atendimento médico por volta das 11:00 hrs, motivo pelo qual se dirigiu à UNIMED, a qual possui parceria com os associados da SAMEISA. O paciente Antônio foi atendido pelo médico Simon, que solicitou um eletrocardiograma, o qual, segundo o citado médico, não mostrava nada anormal. O médico solicitou, também, um exame de sangue. Relata o paciente que ele e sua esposa ficaram aguardando na UNIMED o resultado do exame de sangue, período em que ocorreu a troca de médicos, passando a assumir o caso o médico Miguel Castro. Aduz o paciente que por volta das 12h40min, o médico Miguel chamou-os informando o resultado do exame de sangue e analisou o eletrocardiograma que havia sido feito, afirmando estar tudo normal, recomendando que fossem para casa. Menciona que tal médico solicitou 7 Apelação Cível Nº. 70022201024, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Umberto Guaspari Sudbrack, Julgado em 19/03/2008. 6 que retornassem às 18:00 hrs, para uma reavaliação e receitou o medicamento “Lexotan” 3 mg. No entanto, quando retornavam para casa, o paciente Antônio, que continuava reclamando de dores no peito, teve um mau súbito, fazendo com que retornassem à UNIMED, onde foi determinada a remoção para o Hospital de Cardiologia da Santa Casa, de ambulância. Ao chegar no hospital, o médico Roberto Loureiro informou que não poderia ser tomada nenhuma providência, pois Antônio já estava falecido a mais de vinte minutos. A partir da análise das provas, os julgadores entenderam que houve responsabilidade tanto da UNIMED quanto do médico Simon. Foi negligente a alta concedida ao paciente, em que pese o quadro que apresentava, tanto que foi acometido de infarto agudo poucos momentos após a saída do hospital, e veio a falecer em decorrência de tal fato. A conclusão é de que houve culpa da UNIMED e do médico Simon pela morte do paciente, que não poderia ter sido liberado do hospital sem a realização de uma análise mais atenta, visto que seu estado era sintomático. Mas, por negligência e imprudência, foi concedida alta sem a definição do quadro e sem a realização de novos exames investigativos. A decisão tomada pelo médico Simon foi afoita, negligente e imprudente, pois não tomou as cautelas necessárias. Chegou a um diagnóstico de forma apressada e precoce, sem se socorrer de exames auxiliares. A vítima foi medicada com “Lexotan”, conhecido medicamento com propriedade calmante, e liberada, vindo a falecer pouco tempo depois em decorrência de infarto agudo do miocárdio, que provavelmente já a acometia quando da liberação. Assim, devem o médico e a UNIMED responder pela sua conduta. APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ERRO MÉDICO. CIRURGIA DE REDUÇÃO DE ESTOMÂGO. MORTE DO PACIENTE. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA DO MÉDICO. CONDUTA CULPOSA DO PROFISSIONAL. DEVER DE INDENIZAR CONFIGURADO. SENTENÇA MANTIDA. I. PRELIMINARES (...) 1. RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO. A responsabilidade do médico é, efetivamente, subjetiva, conforme artigo 14, §4º, CDC, avaliada de acordo com o artigo 159 do CCB/1916 e seus princípios tradicionais, uma vez que sua obrigação, de regra, não é de resultado, mas de meio. Então, além da prova do dano e do nexo de causalidade, é necessário que reste demonstrado que o serviço foi culposamente mal prestado. Convém salientar, no entanto, que a obrigação contratual assumida pelo médico não é de resultado, mas de meios ou de prudência e diligência. Frisa-se, por outro lado, que o magistrado não está obrigado a seguir ao pé da letra o laudo pericial, caso haja elementos científicos idôneos para desconsiderá-lo, dado o princípio do livre 7 convencimento do juiz. Todavia, para afastar-se das conclusões estampadas na perícia, deve encontrar apoio em razões sérias, ou seja, em fundamentos induvidosos de que a opinião do perito colide contra princípios lógicos, científicos ou máximas de experiência e que existem no processo elementos probatórios com grau de verossimilhança superior, em relação aos fatos controvertidos. 2. CASO CONCRETO. No caso, consoante a prova pericial produzida, os procedimentos adotados antes e após o ato cirúrgico foram permeados pela imprudência, consistente na realização de cirurgia bariátrica, procedimento cirúrgico, para cuja realização não se encontra autorizado o Hospital Centenário por parte Ministério da Saúde, e pela negligência, geradora de um quadro infeccioso que evoluiu para sepse e culminou com o falecimento do paciente após um mês da realização do procedimento. 3. NEXO DE CAUSALIDADE. O nexo de causalidade está centrado no fato de ter o réu sujeitado o paciente a tratamento não adequado ao ambiente hospitalar, bem como pelo não-esclarecimento sobre a técnica que seria empregada, conforme se observa nos dados cadastrais de sua internação hospitalar de fls. 214/219. Uma cirurgia de enorme risco como a vertente deve ser empregada em estabelecimento adequado e preparado, caso contrário abre-se espaço para septicemia e demais complicações, às quais, na hipótese, não resistiu o paciente (...) DESPROVERAM O AGRAVO RETIDO. REJEITARAM A PRELIMINAR E 8 DESPROVERAM O RECURSO DE APELAÇÃO. UNÂNIME. Acima encontra-se o caso de esposa e filhos do de cujus Sergio Faria que ingressaram com ação indenizatória contra Alexandre Rubio Roso, médico responsável pela internação e realização de cirurgia bariátrica, ou de redução de estômago, no paciente, em 24/06/2002, no Hospital Centenário em São Leopoldo. Alegam a imprudência do médico no período anterior ao procedimento cirúrgico, dado que operou o falecido em nosocômio não credenciado pelo Ministério da Saúde para a efetivação de tal cirurgia, adulterando o código do procedimento para o SUS autorizar a sua realização, e no período pós-operatório, tendo em vista as complicações médicas que culminaram com a morte do esposo e genitor dos autores aproximadamente um mês após a sua realização, em 23/07/2002. O entendimento dos julgadores foi o de que a imprudência foi comprova pelo ato do médico em realizar uma cirurgia desautorizada no estabelecimento hospitalar, e a negligência pela evolução das complicações do quadro clínico do paciente, qual seja, um quadro infeccioso que evoluiu para sepse e culminou com o falecimento do paciente após um mês da realização do procedimento, caracterizando em dano moral e material. 8 Apelação Cível Nº. 70017133174, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Odone Sanguiné, Julgado em 11/04/2007. 8 APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. ERRO MÉDICO. CIRURGIA PARA CORREÇÃO DE MIOPIA E ASTIGMATISMO. CERATOTOMIA RADIAL E ASTIGMÁTICA. ADOÇÃO DE PROCEDIMENTO INADEQUADO À TÉCNICA ELEITA PELO MÉDICO. NEGLIGÊNCIA E IMPERÍCIA CARACTERIZADAS. 1. A questão de fundo versa sobre o pleito de indenização por danos morais e materiais em virtude de erro médico em cirurgia de correção de miopia e astigmatismo, não atingindo o resultado pretendido pela autora (abandono do uso de óculos), causando-lhe seqüelas que importaram na diminuição da acuidade visual (nitidez da visão). 2. RESPONSABILIDADE CIVIL POR ERRO MÉDICO. A responsabilidade do médico é, efetivamente, subjetiva, conforme art. 14, § 4º, CDC, avaliada de acordo com o art. 159 do CC/1916 (art. 186 do CC/2002) e seus princípios tradicionais, uma vez que sua obrigação, de regra, não é de resultado, mas de meio. Então, além da prova do dano e do nexo de causalidade, em tal espécie de responsabilidade é necessário que reste demonstrado que o serviço foi culposamente mal prestado. 3. CONDUTA ILÍCITA E CULPA. PRESSUPOSTOS CONFIGURADOS. No caso, a partir da análise do Laudo Oftalmológico elaborado pelo perito, conclui-se que o procedimento de ceratotomia radial e astigmática utilizado pelo réu era adequado ao fim pretendido, é dizer, correção de miopia e astigmatismo. No entanto, o demandado realizou incisões em desacordo com a técnica. 4. Logo, mostra-se configurada a negligência e imperícia do réu ao realizar incisões em desacordo com a técnica adequada, o que causou seqüelas na paciente, que desenvolveu um quadro clínico de hipermetropia e glaucoma secundário, minimizados por meio de novo procedimento cirúrgico realizado por outro profissional (...). DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO 9 APELO. UNÂNIME. A paciente que era portadora de miopia e procurou o réu Jairo Airton Guarienti, médico oftalmologista, a fim de corrigir o problema e livrar-se do uso de óculos. Relata que o referido médico apresentou-lhe a cirurgia reparadora como método fácil e de recuperação imediata, motivo pelo qual optou por realizar o procedimento. Afirma que, após a cirurgia, o problema apenas diminuiu, não tendo sido resolvido, conforme promessa do médico. Refere que continua utilizando os óculos como complemento. Alega que, considerando que o resultado da cirurgia foi insatisfatório, procurou o médico e este informou-lhe que deveria submeter-se a uma nova cirurgia. Além disso, indicou a utilização de um colírio, que contrai a pupila “obrigando o olho a enxergar”. Entretanto, recusou-se a utilizá-lo, porquanto medida paliativa e não-satisfativa, podendo causar danos a longo prazo. Aduz que, sem confiança no médico, procurou outro oftalmologista, que diagnosticou hipermetropia como seqüela da cirurgia realizada pelo demandado, advertindo-a sobre outras conseqüências que poderiam advir em razão do método ultrapassado utilizado no ato cirúrgico. 9 Apelação Cível Nº. 70019764521, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Odone Sanguiné, Julgado em 11/07/2007. 9 O entendimento dos julgadores no presente caso foi o de que o procedimento de “ceratotomia radial e astigmática” utilizado pelo médico era adequado ao fim pretendido, é dizer, correção de miopia e astigmatismo. No entanto, o demandado realizou incisões em desacordo com a técnica. Logo, mostra-se configurada a negligência e imperícia do médico ao realizar incisões em desacordo com a técnica adequada, o que causou seqüelas na paciente, que desenvolveu um quadro clínico de hipermetropia e glaucoma secundário, minimizados por meio de novo procedimento cirúrgico realizado por outro profissional utilizando “Eximer Laser” com técnica “Lasik”, ocorrendo o dano moral e material. APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ERRO MÉDICO. NEGLIGÊNCIA E IMPERÍCIA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. Considerando que o conjunto probatório autoriza creditar ao réu a série de infortúnios suportados pelos autores, genitores da vítima que, submetida a seus cuidados, apenas lhe ministrava injeções calmantes, sem avançar no diagnóstico e exames, impunha-se a procedência da demanda. Prova testemunhal abundante no sentido de atestar a negligência, imperícia e omissão do profissional médico ao qual foi encaminhado o filho dos autores após queda na prática de educação física, com fortes dores na região dos rins. Imperito porque, ainda que verificando que a vítima não apresentava fraturas evidentes, mas continuava a alegar dores fortes, não providenciou auxílio de especialista em medicina interna, sequer se preocupou preencher ficha de evolução clínica do paciente. Foram os exames exigidos por outro profissional que, uma vez realizados, confirmaram infecção aguda, insuficiência renal aguda, derrame pleural bilateral, cálculos na vesícula biliar e condensações pulmonares, que vieram a ocasionar a morte do paciente. SENTENÇA 10 CONFIRMADA. APELAÇÃO DESPROVIDA. O paciente sofreu uma queda, caindo com o lado esquerdo das costas em cima de uma bola de futebol de salão. No mesmo dia, em casa, começou a se queixar de dores nas costas que, em 17/11/97, segunda-feira, se agravaram. Na terça-feira, telefonou para o médico Édio, relatando o ocorrido. Este marcou consulta para o dia seguinte, dia 19/11/97. Devido às fortes dores, o médico determinou a “baixa hospitalar” da vítima na mesma manhã. Embora ao examinar as radiografias feitas no Hospital Municipal, afirmou que o paciente não apresentava qualquer caso grave de saúde. O paciente, baixado no hospital, em 19/11/97, continuava a reclamar de fortes dores e vomitava muito. O pai do 10 Apelação Cível Nº. 70012488748, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ana Maria Nedel Scalzilli, Julgado em 27/10/2006. 10 paciente procurou novamente o médico, solicitando seu comparecimento ao hospital, porque segundo sua ótica, a situação clínica de seu filho estava, visivelmente, se agravando. Aduziram que o médico, por telefone, inteirou-se com o hospital sobre o resultado do exame de sangue e, ato contínuo, disse ao pai do paciente que seu filho nada tinha; não foi ao hospital, porém, aproximadamente uma hora após, uma enfermeira compareceu no quarto e aplicou no paciente, três injeções (duas intramusculares e uma intravenosa) – todas calmantes para a dor. No dia seguinte, 20/11/97, a vítima passou sentindo fortes dores, recebendo apenas calmantes. Em 21/11/97, o médico relatou que iria aumentar as doses de calmantes diante da situação, embora constatara que a vítima nada tinha. Apesar das queixas da mãe, que percebera o desespero do filho, o médico Édio respondia que o paciente não apresentava qualquer sintoma de doença, apenas dores musculares. No dia seguinte, o médico Júlio Feijó, ao chegar no quarto, imediatamente verificou o péssimo estado em que se encontrava o paciente e determinou procedimentos de emergência, constatando um quadro de infecção aguda, insuficiência renal aguda, choque séptico e foco infeccioso sem origem. O paciente veio a falecer em 22/11/97. Predominou o entendimento da presença da culpa do médico, nas modalidades de imprudência e negligência, ao atendimento do paciente. Negligente, porque constatando que o paciente não possuía fratura, mas continuava a reclamar de dores insuportáveis, não requereu auxílio de especialista em medicina interna, ou a imediata remoção para hospital de maior porte e melhores recursos. Imprudente, porque desconhecendo os constantes apelos da vítima e familiares, inconformados com as insuportáveis dores, limitou-se apenas a ministrar analgésico. Ainda mais, por intermédio de enfermeira, portanto, sem ter contato com o paciente. A omissão do réu também é incontestável. Afinal, o paciente ficou três dias internado, com quadro clínico agravado a cada momento, sem que novos exames (motivo da internação) fossem solicitados; sem que se buscasse o auxílio de especialista em medicina interna e sem que houvesse a remoção para estabelecimento hospitalar maior e com melhores condições. 11 APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. ERRO MÉDICO. LESÃO DE PLEXO BRAQUIAL PÓSPARTO. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDOS. FORMAL INCONFORMISMO. APLICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO CONSUMERISTA. IMPERTINÊNCIA. PARTO REALIZADO PELO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE. SERVIÇO PÚBLICO PRÓPRIO FINANCIADO DIRETAMENTE PELO ESTADO. AUSÊNCIA DE RELAÇÃO DE CONSUMO. MÉRITO. ARGÜIÇÃO DE EQUÍVOCO NA FUNDAMENTAÇÃO DA SENTENÇA. ACOLHIMENTO. PARTO REALIZADO POR AUXILIAR DE ENFERMAGEM E NÃO POR ENFERMEIRO. AUSÊNCIA DE SUPERVISÃO DE PROFISSIONAL HABILITADO. OFENSA À LEI 7.498/86. NEGLIGÊNCIA DO MÉDICO QUE, APESAR DE COMUNICADO COM ANTECEDÊNCIA SOBRE O INTERNAMENTO DA PACIENTE, SOMENTE COMPARECE AO HOSPITAL APÓS O PARTO. ARGÜIÇÃO DE CARÊNCIA DE RECURSOS HUMANOS NA ÁREA MÉDICA QUE NÃO JUSTIFICA O PROCEDIMENTO ADOTADO DE PLANTÃO À DISTÂNCIA E DE ATENDIMENTO POR PROFISSIONAL SEM HABILITAÇÃO. RESPONSABILIDADE DO NOSOCÔMIO DECORRENTE DO PREVISTO NO ART. 37, §6º DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. DANO E NEXO DE CAUSALIDADE DEVIDAMENTE DEMONSTRADOS. PERITA, QUE EM JUÍZO, AFIRMA QUE A LESÃO É DECORRENTE DO PARTO. DANO MORAL DEVIDO. CONDENAÇÃO SOLIDÁRIA DOS REQUERIDOS. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DOS DANOS 11 MATERIAIS. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. A paciente ao ser internada para realizar o parto do seu filho não foi assistida por um profissional habilitado para tal, mas sim por uma auxiliar de enfermagem que não apresenta a mesma qualificação técnica de um enfermeiro ou médico. Alega que ficou comprovado pelo laudo de exame de lesões corporais que houve ofensa à integridade física do filho da paciente, provocada por instrumento contundente. Ficando comprovado, assim, presença do nexo de causalidade, sob o fundamento de que amplamente demonstrada que a lesão do plexo braquial foi resultante do parto realizado por auxiliar de enfermagem, sem nenhum tipo de assistência de profissional habilitado em medicina ou enfermagem. A criança apresenta lesão braquial obstétrica à direita - tronco superior, ressaltando que possui lesões e limitações, que somente poderão ser minimizadas com tratamento fisioterápico permanente. Assim, em decorrência da negligência do médico, a criança ficou sujeita a inúmeras sessões de fisioterapia nos primeiros anos de vida. O entendimento pelos julgadores foi o de que restou comprovada a negligência do médico Lotário Miguel Scherer, que, apesar de ter sido informado acerca da internação de sua paciente, somente compareceu ao hospital após a 11 Apelação Cível Nº 0415353-7, Tribunal de Justiça do PR, Relator: Guimarães da Costa, Julgado em 08/07/2008. 12 realização do parto levado a termo por auxiliar de enfermagem, decorrendo, assim em danos morais. APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - ERRO MÉDICO - AGRAVO RETIDO - INÉPCIA DA INICIAL - INOCORRÊNCIA ILEGITIMIDADE PASSIVA DO HOSPITAL - AFASTADA - INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA - POSSIBILIDADE - EXIBIÇÃO DOS PRONTUÁRIOS MÉDICOS RESPONSABILIDADE DO HOSPITAL E DOS MÉDICOS - AGRAVO RETIDO DESPROVIDO - RESPONSABILIDADE CIVIL -- PACIENTE QUE FOI A ÓBITO EM VIRTUDE DE “SÍNDROME COMPARTIMENTAL" DECORRENTE DA FRATURA NO BRAÇO ESQUERDO - NEGLIGÊNCIA MÉDICA - OCORRÊNCIA - DEVER DE INDENIZAR - SOLIDARIEDADE HOSPITAL E MÉDICOS - DANOS MORAIS DEVIDOS AGRAVO RETIDO DESPROVIDO E RECURSO DE APELAÇÃO PROVIDO. 12 Trata-se da situação em que o paciente Eliamar foi levado ao hospital e atendido pelo médico Heraldo, que constatou a ocorrência de infecção e ordenou as enfermeiras que preparassem o menino para cirurgia, mas ao tomar conhecimento de que a criança já havia sido atendida pelo médico Décio, mandou a atendente enfaixar o braço, e determinou que o paciente aguardasse a chegada do médico que primeiro lhe atendeu. Às 18:00 hrs o médico Décio chegou ao hospital e o examinou, e, constando que o menor estava com muita dor, "colocou o braço no lugar", segundo as enfermeiras. No dia 05/04/94 o menor Eliamar amanheceu inchado e com vômito, e como o médico Décio não compareceu ao hospital, foi atendido pelo médico Heraldo que diagnosticou síndrome compartimental, mas nada fez para resolver o problema. O médico Décio compareceu no dia 05/04/94, por volta das 19h40min, mas não deu nenhuma explicação, não tomando qualquer atitude. Na manhã do dia 06/04/94, sem receberem respostas satisfatórias contataram um terceiro médico, Massaro, que visitou o menor, e juntamente com o médico Décio, determinou a internação de Eliomar no Hospital São Vicente de Paula, porque nas dependências do Hospital Nossa Senhora de Belém não havia Unidade de Terapia Intensiva, mas antes que se pudesse realizar a transferência, o paciente veio a óbito por volta das 15h30min da tarde. 12 Apelação Cível Nº 0460635-9, Tribunal de Justiça do PR, Relator: José Augusto Gomes Aniceto, Julgado em 05/06/2008. 13 A posição dos julgadores foi a de que os médicos agiram negligentemente em relação ao menor, que chegou ao hospital com uma fratura no braço e acabou em óbito em menos de quatro dias. Nessa situação os médicos atuaram com culpa ao verificarem que o menor estava com o braço infeccionado, apresentando vômito e febre e nada fizeram para solucionar o problema, permanecendo inertes, enquanto o menor vinha a óbito. O nexo causal encontra-se configurado pela negligência dos apelados nos cuidados dispensados ao paciente e sua morte. Os médicos se tivessem empregado todos os seus esforços e cuidados ao paciente, provável que o desfecho do caso fosse outro. A culpa se configura justamente pela negligência no tratamento dispensado e o nexo causal se apresenta inexorável, caracterizando, assim, a indenização por danos morais aos familiares. APELAÇÃO CÍVEL - INDENIZAÇÃO - ERRO MÉDICO - AÇÃO MOVIDA CONTRA O HOSPITAL E O PROFISSIONAL LIBERAL - MORTE DE GESTANTE E DO NASCITURO EM TRABALHO DE PARTO - PARTURIENTE COM HIPERTENSÃO ARTERIAL QUE É INTERNADA COM DIAGNÓSTICO DE INSUFICIÊNCIA CARDIORESPIRATÓRIA - AUSÊNCIA DAS CAUTELAS NECESSÁRIAS ANTE O QUADRO CLÍNICO DA GESTANTE - MÉDICO QUE INICIA O TRATAMENTO, TRANSFERINDO O SEU ENCARGO A PESSOA NÃO HABILITADA, SEM A SUA SUPERVISÃO NEGLIGÊNCIA CONFIGURADA - PUNIÇÃO ADMINISTRATIVA APLICADA PELO ÓRGÃO DE CLASSE - DEVER DE INDENIZAR - EVENTO OCORRIDO NAS DEPENDÊNCIAS DO HOSPITAL - SOLIDARIEDADE CARACTERIZADA INDEFERIMENTO DA PROVA PERICIAL - DECISÃO IRRECORRIDA - PRECLUSÃO TEMPORAL - ELEMENTOS PROBATÓRIOS, ADEMAIS, SUFICIENTES PARA A FORMAÇÃO DA CONVICÇÃO DO JULGADOR - DANO MORAL - QUANTIFICAÇÃO EXCESSIVA - REDUÇÃO - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - MANUTENÇÃO DIREITO DE ACRESCER INCENSURÁVEL - JUROS DE MORA INCIDENTES SOBRE A PENSÃO ALIMENTÍCIA - TERMO INICIAL - EXCLUSÃO DA INCIDÊNCIA DE 13º SALÁRIO - INEXISTÊNCIA DE VÍNCULO EMPREGATÍCIO - VALOR DA VERBA ATRIBUÍDA À CONSTITUIÇÃO DE CAPITAL - MANUTENÇÃO - PARCELAMENTO DAS PENSÕES VENCIDAS - IMPOSSIBILIDADE. RECURSOS PARCIALMENTE PROVIDOS. 1 - Restando demonstrada a culpa do médico requerido, na modalidade negligência, no tocante ao tratamento dispensado à gestante, internada no hospital com hipertensão arterial e quadro de insuficiência cardio-respiratória, moléstias não tratadas com a utilização dos meios suficientes e disponíveis pelo profissional, e que foram a causa eficiente do óbito da parturiente e, conseqüentemente, do nascituro, evidente a prática de ato ilícito, ensejador do dever de indenizar. 2 - A indenização por dano moral deve ser fixada de acordo com as peculiaridades do caso concreto e os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, comportando redução quando fixada em 13 montante excessivo (...). 13 Apelação Cível Nº 0446904-7, Tribunal de Justiça do PR, Relator: Luiz Lopes, Julgado em 03/04/2008. 14 No dia 11/11/1998, a paciente deu entrada no Hospital da Providência de Apucarana em trabalho de parto e, em decorrência da conduta negligente dos requeridos, no que concerne à assistência médico-hospitalar oferecida, sua filha veio a falecer. A paciente apresentava peculiaridades em seu quadro clínico: 39 anos, quarto filho, no 9º mês de gestação, apresentando um histórico de hipertensão arterial, e ganho de 10 kg nas últimas semanas. Portanto, era necessário o acompanhamento contínuo do médico, o qual, mesmo ciente das condições de saúde da parturiente, deixou-a aos cuidados da auxiliar de enfermagem, até o momento em que já houvesse dilatação suficiente para a realização do parto normal, atribuindo a estes fatores, a morte da gestante e do nascituro. A paciente realizou uma consulta com o médico, em 10/11/98, com fortes dores abdominais, ocasião em que a paciente apresentava 3 cm de dilatação do colo uterino, e pressão arterial de 180X80 (dezoito por oito), sendo que, mesmo diante do quadro clínico da parturiente, o médico determinou que ela aguardasse em casa. No dia seguinte, permanecendo as fortes dores, se dirigiu ao hospital, por volta das 14:00 hrs, quando ficou aos cuidados dos funcionários do hospital, sendo atendida pelo médico em torno das 18:00 hrs, o qual aduziu em contestação que, naquele momento, constatou a elevação da pressão arterial da paciente, medicando-a, e aconselhando-a a permanecer em observação por duas horas e meia, até que seu estado geral voltasse ao normal. A par disso, verifica-se que, naquele momento, o médico determinou a internação da paciente, efetuando a seguinte descrição: "trabalho de parto + insuficiência cardio-respiratória + tratamento clínico". Foi mantida a conduta expectante, até que por volta das 03h30min da manhã, do dia 12/11/98, houve o rompimento espontâneo da "bolsa", sendo que às 04h20min foi encaminhada para a sala de parto e, em seguida, às 04h30min, quando o médico chegou ao hospital, teve complicações em seu quadro clínico, iniciando-se uma série de procedimentos, inclusive pelo médico cardiologista, que se revelaram insuficientes para manter a parturiente com vida, e de evitar o óbito intra uterino do nascituro. 15 A partir disso, para os julgadores foi certo que o profissional não teve uma conduta diligente, prudente e hábil, não tomando as precauções que poderiam ter evitado o evento lesivo, principalmente, com o acompanhamento da evolução do estado de saúde da parturiente, deixado ao encargo de profissionais não habilitados, por cerca de 10 horas, sem sequer verificar a evolução do quadro clínico da sua paciente, mesmo permanecendo no nosocômio, aproximadamente, até às 23h30min, bem ainda, tratando adequadamente o quadro de insuficiência cardio-respiratória constatado no momento da internação, contribuindo, pois, de forma preponderante, para o evento morte da paciente e do nascituro. Aliás, tanto agiu com negligência, que o próprio Conselho Federal de Medicina, manteve, por unanimidade de votos, a decisão do Conselho Regional, que considerou culpado o apelante, por descumprimento dos artigos 29 e 57 do Código de Ética Médica. Diante deste fato, o médico foi condenado a pagar indenização por danos morais aos familiares da paciente. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO - NEGLIGÊNCIA MÉDICA - CONTRATO DE MEIO - PROVA A CARGO DO AUTOR - CULPA E NEXO DE CAUSALIDADE ENTRE A ATUAÇÃO DO MÉDICO E O DANO COMPROVADOS - DEVER INDENIZATÓRIO - CONDUTA DO HOSPITAL -RESPONSABILIDADE CIVIL DESTE - VALOR INDENIZATÓRIO CRITÉRIOS. Sendo o contrato de prestação de serviços médicos de meio, e não de resultado, e estando provado que o evento danoso se deu em razão de negligência médica, impõe-se a responsabilização do culpado pelo seu insucesso. A responsabilidade do estabelecimento hospitalar é objetiva, prescindindo da comprovação da culpa, sendo certo que uma vez comprovado nos autos a existência de falha na prestação dos serviços médicos, através do seu corpo clínico, o dano suportado pelo paciente e o nexo de causalidade, evidencia-se a sua obrigação de reparação civil. A fixação do quantum devido a título de danos morais, à falta de critério objetivo, há de se obedecer prudente critério que ofereça compensação pela dor sofrida, 14 sem que se torne causa de indevido enriquecimento por parte do ofendido. A paciente deu entrada no hospital no dia 09/04/2001 por volta das 08h30min da manhã, com encaminhamento médico para realização de cesariana, uma vez que em seu parto anterior sofreu hipertensão arterial no final da gravidez. Apesar disso, não foram tomadas as providências para a cirurgia, mas adotado o procedimento para induzir o parto normal. Às 12:00 hrs, o casal procurou o médico responsável pela equipe de plantão e indagou o porquê da 14 Apelação Cível Nº 1.0024.04.312715-8/001, Tribunal de Justiça de MG, Relatora: Selma Marques, Julgado em 09/01/2008. 16 demora, já que a bolsa aminiótica já havia rompido e a paciente padecia de préeclâmpsia. Contudo, o médico apenas visitou a mulher, não a examinou e insistiu em adotar a espera pelo parto normal. Às 16h15min, uma enfermeira constatou sinal de sofrimento fetal, informando o fato ao médico. Assim, não sendo mais possível a realização do parto normal, o médico realizou a cesariana às 16h46min. A criança nasceu com sérios problemas de saúde, permanecendo no hospital por 60 dias, vindo a falecer em 09/06/01. O entendimento dos julgadores foi que, no caso em apreço, tem-se como suposto causador dos danos cuja indenização se busca nesta ação, em primeiro lugar, um médico. A ele é atribuída culpa, por negligência, na medida em que optou pela realização de parto normal, a despeito de laudo médico atestar pela necessidade de realização de cesariana. Assim sendo, o médico foi condenado ao pagamento de indenização pelos danos morais sofridos pelos pais da criança falecida. RESPONSABILIDADE CIVIL. OBSTETRA E HOSPITAL MUNICIPAL. PARTO CESÁREO. HIGIENIZAÇÃO PÓS-PARTO INADEQUADA. PERMANÊNCIA DE RESTOS PLACENTÁRIOS NA CAVIDADE UTERINA. INFECÇÃO PUERPERAL, FEBRE, SANGRAMENTO VAGINAL INTENSO E SECREÇÃO FÉTIDA. MÉDICO QUE DESCONSIDERA OS SINTOMAS RELATADOS PELA PARTURIENTE. NEGLIGÊNCIA E IMPERÍCIA. CURETAGEM UTERINA, POR OUTRO PROFISSIONAL, MAIS DE UM MÊS DEPOIS. CULPA DO MÉDICO E RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO MUNICÍPIO CORRETAMENTE CARACTERIZADAS. DANO MORAL. REDUÇÃO DO "QUANTUM", PARA R$12.000,00 (DOZE MIL REAIS). APELAÇÃO E REEXAME 15 NECESSÁRIO PARCIALMENTE PROVIDOS. Maria de Lourdes teve parto cesário, no Hospital Municipal, sob os cuidados do Dr. Edvaldo, e deu à luz saudável ao José Matheus. Todavia, após o parto, por negligência do obstetra, permaneceram restos placentários no útero da paciente, o que ocasionou sangramento vaginal intenso e odores fétidos, por mais de um mês, até Maria de Lourdes se submeter à curetagem uterina, por outro profissional. Reconhecida a culpa do requerido e a responsabilidade objetiva do Município, o Juiz condenou os réus, solidariamente, ao pagamento da quantia de R$465,48 (quatrocentos e sessenta e cinco reais e quarenta e oito centavos) a 15 Apelação Cível e Reexame Necessário Nº 323224-4, Tribunal de Justiça do PR, Relator: Miguel Kfouri Neto, Julgado em 18/01/2007. 17 título de danos materiais e ao montante correspondente a cem salários-mínimos, como compensação pelos danos morais. O requerido apresentou recurso, afirmando que a obrigação contraída pelo médico é de meio, e não de resultado; e que não há prova da culpa do mesmo, ao contrário, houve um trauma cirúrgico normal nessa modalidade de intervenção. E, ainda, que os danos materiais não resultaram comprovados. O entendimento do Tribunal foi o de que, a culpa do apelante, bem como a responsabilidade objetiva do Município, encontram-se corretamente reconhecidas na sentença proferida pelo juízo de primeiro grau. O exame de ultra-sonografia e a curagem uterina constataram a presença de restos placentários na cavidade uterina da paciente. Devido a isto, o útero não regride, o que provoca sangramento, infecção puerperal e, ainda, pode levar a parturiente à morte. Responsável por esses cuidados é o cirurgião, no caso, o obstetra, e não o auxiliar. Inquestionável, pois, que a higienização cuidadosa do útero e a remoção completa da placenta não foram realizadas pelo obstetra, o Dr. Edvaldo. A incúria e negligência do apelante acarretaram sangramento e processo infeccioso. Por isso, a responsabilidade objetiva do Município não acendeu controvérsia e a negligência e imperícia do apelante, resultam satisfatoriamente provadas. Nesse sentido, o Tribunal reduziu para R$12.000,00 (doze mil reais) o montante da compensação dos danos extrapatrimoniais, mas aos danos materiais, a sentença não sofreu nenhuma alteração. 2 OBRIGAÇÃO DE MEIO OU DE RESULTADO NA CIRURGIA PLÁSTICA COM FINALIDADE ESTÉTICA A cirurgia plástica é tanto uma obrigação de meio quanto de resultado, na qual vai depender da finalidade pela qual ela se destina, seja estética ou reparadora. A cirurgia plástica estética é aquela que busca pela melhoria na aparência física externa do paciente. Esta cirurgia tem um fim determinado, concreto e perfeitamente definido em seus caracteres, exceto na situação de caso 18 fortuito ou força maior, o médico está voltado ao resultado e presume-se a culpa se advir dano ao paciente. 16 Assim afirma Sergio CAVALIERI FILHO: Não se pode negar o óbvio, que decorre das regras da experiência comum; ninguém se submete aos riscos de uma cirurgia, nem se dispõe a fazer elevados gastos, para ficar com a mesma aparência, ou ainda pior. O resultado que se quer é claro e preciso, de sorte que, se não for possível alcança-lo, caberá ao médico provar que o insucesso – 17 total ou parcial da cirurgia – deveu-se a fatores imponderáveis. A partir disso, no que diz respeito aos cirurgiões plásticos, no caso de trabalho estético, a sua obrigação é de resultado, pois trata-se de situações em que interessa ao paciente, apenas, o resultado. Assim sendo, caso o resultado desejado não seja alcançado ao paciente é assegurado o direito à indenização. Esta abrange, via de regra, todas as despesas efetuadas, danos morais em virtude do prejuízo estético, assim como, os gastos para tratamentos e novas cirurgias. 18 Da mesma forma afirma Miguel KFOURI NETO que para os tribunais, independentemente se a culpa do cirurgião foi comprovada ou não, em qualquer das suas formas, é suficiente o resultado insatisfatório para que se caracterize a obrigação de indenizar. Complementa, ainda, que neste tipo de cirurgia, o médico não pode intervir no corpo humano senão para curar, ou seja, defendê-lo da morte e do sofrimento. Por isso diz que: “os cirurgiões plásticos prometem corrigir, os médicos não prometem curar (...) Para os demais médicos, o resultado é uma incógnita. Para os cirurgiões plásticos, na cirurgia embelezadora, deve ser uma certeza”. 19 16 MATIELO,Fabrício Zamprogna. Responsabilidade Civil do Médico. Porto Alegre: Sagra Luzzatto, 1998. p. 59-60. 17 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 403. 18 GONÇALVES, Carlos Roberto. Comentários ao Código Civil. In: AZEVEDO, Antônio Junqueira. (Org). Parte Especial do Direito das Obrigações. São Paulo: Saraiva, 2003. v. 11. p. 201-202. 19 KFOURI NETO, Miguel. Culpa Médica e Ônus da Prova: Presunções, perda de uma chance, cargas probatórios dinâmicas, inversão do ônus probatório e consentimento informado. Responsabilidade civil em pediatria e Responsabilidade civil em gineco-obstetrícia. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 243-249. 19 Contudo, para o autor Ruy Rosado de AGUIAR JUNIOR, afirma que na cirurgia plástica estética, a obrigação é, também, de meios. Por mais que o médico prometa corrigir, assumindo a obrigação de atingir o resultado prometido, podem ocorrer situações imprevisíveis pela reação do organismo do paciente que não permitam que o resultado seja alcançado. 20 E, ainda, nesse mesmo sentido Hildegard GIOSTRI entende que a responsabilidade do cirurgião plástico estético é de meios, pois: “... o fato do médico estar trabalhando com um organismo hígido, se lhe aumenta a responsabilidade, nem por isso justifica transformar sua obrigação: ela sempre será de meios, porque ele está a labutar em uma seara plena do fator álea, o que equivale dizer que a própria incerteza do resultado desautoriza aquela denominação”. 21 Apesar das divergências doutrinárias no que tange a obrigação de meio ou de resultado na cirurgia plástica com finalidade estética, a jurisprudência é dominante em afirmar que neste tipo de cirurgia a obrigação é de resultado, nesse sentido: APELAÇÃO CÍVEL. 1) CIRURGIA PLÁSTICA ESTÉTICA. OBRIGAÇÃO DE RESULTADO. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. 2) DANO MORAL. PACIENTE. GRAVE LESÃO ESTÉTICA. PERDA DE SENSIBILIDADE. 3) DANOS MORAIS. CIRURGIA PLÁSTICA REPARADORA. CUSTEIO DE DESPESAS. INEXEQÜIBILIDADE. 22 No presente caso devido a uma cirurgia plástica com finalidade estética sem sucesso, a qual resultou em grave lesão ao paciente, a obrigação passou a ser de resultado com a inversão do ônus da prova, isto é, cabia ao médico provar que não agiu com culpa. CIVIL E PROCESSUAL - CIRURGIA ESTÉTICA OU PLÁSTICA - OBRIGAÇÃO DE RESULTADO (RESPONSABILIDADE CONTRATUAL OU OBJETIVA) - INDENIZAÇÃO INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. I - Contratada a realização da cirurgia estética embelezadora, o cirurgião assume obrigação de resultado (Responsabilidade contratual 20 AGUIAR JUNIOR, Ruy Rosado de. Responsabilidade Civil do Médico. In: TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo. (Org.). Direito e Medicina: Aspectos jurídicos da medicina. Belo Horizonte: DelRey, 2000. p. 150. 21 GIOSTRI, Hildegard Taggesell. Erro Médico à Luz da Jurisprudência Comentada. Curitiba: Juruá, 2004. p. 121. 22 Recurso Especial Nº. 618.630, Superior Tribunal de Justiça, Relator: Ministro Humberto Gomes de Barros, Julgado em 18/03/2005. 20 ou objetiva), devendo indenizar pelo não cumprimento da mesma, decorrente de eventual deformidade ou de alguma irregularidade. II - Cabível a inversão do ônus da prova. III 23 Recurso conhecido e provido. O caso acima exposto trata-se de cirurgia plástica com finalidade estética, a qual o cirurgião assumiu a obrigação de resultado e por não alcançá-lo houve a responsabilização do mesmo. APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. CIRURGIA PLÁSTICA. OBRIGAÇÃO DE RESULTADO. DEVER ÉTICO DE INFORMAÇÃO SOBRE POSSÍVEIS RISCOS. DANOS MORAIS. QUANTUM DA INDENIZAÇÃO ARBITRADO COM RAZOABILIDADE. SENTENÇA MANTIDA. 1. A responsabilidade civil decorre do contrato de prestação de serviços pactuado entre as partes, onde restou avençado procedimento cirúrgico de ordem estética, sendo uníssono na jurisprudência que, nesta situação, a responsabilidade do médico é de resultado. A obrigação de resultado encerra outra acessória consistente no dever de informar (artigos 30 e 31 do CDC), tendo por fundamento o princípio da boa-fé, que se traduz na honestidade e lealdade da relação jurídica. O paciente deve ter exata compreensão das vantagens e desvantagens que a intervenção cirúrgica estética envolve, para poder decidir-se sobre a submissão ao tratamento. O descumprimento desse dever dá lugar à indenização. 2. No caso, o médico faltou com o seu dever de informação, seja no período prévio à cirurgia, seja no posterior ao procedimento, quanto à precaução por ele não observada, no sentido de alertar para eventuais conseqüências indesejadas do procedimento, como, por exemplo, a coleção líquida que pode ocorrer quando realizada uma lipoaspiração abdominal, e para a necessidade de repouso durante a convalescença. 3. A indenização por dano moral deve representar para a vítima uma satisfação capaz de amenizar de alguma forma o sofrimento impingido. A eficácia da contrapartida pecuniária está na aptidão de proporcionar tal satisfação em justa medida, de modo que não signifique um enriquecimento sem causa para a vítima e produza impacto bastante ao causador do mal a fim de dissuadi-lo de novo atentado. Ponderação que recomenda a manutenção do montante indenizatório fixado no Juízo a quo. NEGARAM PROVIMENTO À APELAÇÃO 24 COM EXPLICITAÇÃO DA SENTENÇA. UNÂNIME. Na situação acima, além da obrigação de resultado do médico na cirurgia plástica, foi observado o dever de informação que deveria ser prestado ao paciente pelo cirurgião e que na situação concreta não o foi, acarretando danos àquele. Apelação Cível. Ação condenatória. Responsabilidade civil decorrente de cirurgia plástica de lipoaspiração. Agravo retido. Pedido de realização de nova prova pericial. Desnecessidade, ante o laudo do perito assistente juntado pela autora. Apelos. Contratada a realização de cirurgia plástica estética, o cirurgião assume obrigação de 23 Recurso Especial Nº. 1995/0063170-9, Superior Tribunal de Justiça, Relator: Ministro Waldemar Zveiter, Julgado em 13/04/1999. 24 Apelação Cível Nº. 70016948077, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Odone Sanguiné, Julgado em 14/02/2007. 21 resultado, sendo obrigado a indenizar pelo não cumprimento da obrigação, nos termos avençados. No caso concreto, evidenciou-se a extração excessiva de gordura, gerando resultado estético indesejado. Cabível indenização pelo dano moral decorrente do mau resultado do serviço. Pedido de patrocínio de nova cirurgia prejudicado, ante a sua impossibilidade fática. A clínica ou sua sócia-gerente não tem responsabilidade porque não há nexo causal entre o serviço prestado pela primeira, quando ao fato do serviço. 25 Agravo retido desprovido. Unânime. Apelos providos em parte. Por maioria. A partir do caso exposto, pode-se observar a responsabilização do cirurgião pelo insucesso da cirurgia plástica de lipoaspiração, devido ao ato de culpa do mesmo. REPARAÇÃO DE DANOS. CIRURGIA PLÁSTICA PARA CORREÇÃO DAS MAMAS. Em se tratando de cirurgia plástica de cunho exclusivamente estético, a obrigação assumida pelo profissional médico é de resultado. Inversão do ônus probatório, cumprindo àquele que realizou o procedimento a demonstração de que não agiu com culpa. Prova dos autos que demonstra, à evidência, o mau resultado da cirurgia, diferentemente daquilo que havia sido prometido pelo executor. Direito à composição dos danos, inclusive os de ordem moral. Sentença confirmada. Negaram provimento ao 26 recurso. No caso concreto acima, o cirurgião foi condenado a pagar uma indenização a paciente pelo fato de ter assumido uma obrigação de resultado, qual seja, a correção das mamas e o resultado prometido não foi alcançado. APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - ERRO MÉDICO - CIRURGIA PLÁSTICA - PRELIMINAR - PRESCRIÇÃO QÜINQÜENAL INOCORRÊNCIA - MÉRITO - CIRURGIA ESTÉTICA - NARIZ - OBRIGAÇÃO DE RESULTADO - DEFORMIDADE OCASIONADA PELA INTERVENÇÃO CIRÚRGICA DANO MATERIAL E MORAL - NEXO DE CAUSALIDADE PRESENTE - OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR - VALORAÇÃO DOS DANOS MORAIS - CORREÇÃO MONETÁRIA - A PARTIR DA SENTENÇA - SENTENÇA - REFORMA - RECURSOS - APELAÇÃO PROVIMENTO PARCIAL - ADESIVO - PROVIMENTO. Nas cirurgias plásticas estéticas, de forma geral, se presume a culpa do cirurgião pelo não atingimento do resultado esperado, pois esta intervenção objetiva a mudança de padrão estético da pessoa, ao embelezamento puro e simples, constituindo por tanto obrigação de resultado, devendo indenizar pelo não cumprimento da mesma, decorrente de eventual deformidade ou de 27 alguma irregularidade. 25 Apelação Cível Nº. 70012679718, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ney Wiedemann Neto, Julgado em 15/12/2006. 26 Recurso Cível Nº. 71000947267, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Eduardo Kraemer, Julgado em 07/06/2006. 27 Apelação Cível Nº. 0241611-3, Tribunal de Justiça do PR, Relator: Sérgio Luiz Patitucci, Julgado em 07/11/2007. 22 Na presente situação, por se tratar de cirurgia plástica com finalidade estética no nariz, a obrigação do cirurgião torna-se de resultado e, pelo não alcance do mesmo, houve a indenização por danos morais e materiais à vítima. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA - CIRURGIA PLÁSTICA EMBELEZADORA OBRIGAÇÃO DE RESULTADO - DEVER DE INDENIZAR - DANOS MORAIS CONFIGURADOS - RECURSO DESPROVIDO. I - No caso de cirurgia estética, que visa aprimorar a aparência física da paciente, o médico assume obrigação de resultado, vinculando-se à melhora esperada. II - Frustrada a cirurgia, pela não obtenção do resultado esperado, o médico é obrigado a indenizar a paciente pelo não cumprimento 28 da avença. No caso acima houve o dever do cirurgião de indenizar a vítima, em razão da não obtenção do resultado esperado pela mesma na cirurgia plástica com finalidade estética. De acordo com os casos expostos, afirma Miguel KFOURI NETO: “O Tribunal de Justiça leva em consideração a frustração do paciente em relação a cirurgia plástica”. 29 3 O DANO ESTÉTICO NA ATIVIDADE MÉDICA O dano pelo qual o médico é responsabilizado decorre diretamente de sua ação, excluindo todas as alterações que forem um meio necessário para a realização do ato médico. 30 O dano pode ser material, moral ou estético. O dano médico material é a perda patrimonial, como gastos médicos hospitalares, lucro cessantes, medicamentos, viagens, pensão aos dependentes do paciente morto, etc. 28 31 O dano moral é caracterizado por toda ação que gere Apelação Cível Nº. 0353642-1, Tribunal de Justiça do PR, Relator: Luiz Lopes, Julgado em 31/08/2006. 29 KFOURI NETO, Miguel. A Classe Médica e a Responsabilidade Civil. Palestra proferida no Centro de Eventos da Associação Médica do Paraná, Curitiba, 27 maio 2008. 30 NEMETZ Luiz Carlos; ANTUNES, Patrícia Ribeiro Peret. Estudos e Pareceres de Direito Médico e da Saúde. São José: Conceito, 2008. p. 199-200. 31 BARROS JÚNIOR, Edmilson de Almeida. Op. Cit., p. 53. 23 dor, sofrimento, angústia, aflição, etc. Em se tratando de erro médico, o dano à vida pode servir como mais um elemento para a quantificação da indenização, uma vez que por se tratar de um bem tão valioso o quantum indenizatório poderá ser aumentado, desde que fique comprovado que a vítima perdeu algo mais simples do que o bem-estar psicofísico. 32 E, o dano estético é todo aquele que afeta a auto-estima da pessoa, em que esta acaba denegrindo a imagem que tem de si mesma. É caracterizado por trazer sofrimento interno e psicológico, causando-lhe constrangimento devido a uma deformidade. 33 Esse dano é considerado uma espécie do dano moral, o que cria uma discussão na possível cumulação entre dano moral e estético. No entendimento da autora Tereza Ancona LOPEZ, apesar do dano estético ser um dano moral é possível a cumulação entre eles, pois haverá situações em que num mesmo fato danoso dois ou mais bens jurídicos diferentes sejam feridos, devendo, portanto, haver o ressarcimento de todos os prejuízos cumulativamente. Todavia, a cumulação só poderá ocorrer em casos graves, isto é, nas situações de deformações ou desfigurações que acarretem em vergonha para a vítima e sua rejeição no meio social. 34 Nesse sentido encontram-se as jurisprudências: RESPONSABILIDADE CIVIL. HOSPITAL. INTERNAMENTO DE PACIENTE COM CERCA DE QUATRO MESES DE GRAVIDEZ, QUE PERMANECEU, EM ESTADO DE RISCO DE VIDA, ONZE DIAS EM PROCEDIMENTO DE INDUÇÃO MEDICAMENTOSA DE ESVAZIAMENTO UTERINO EM FACE DE INTERRUPÇÃO DE GESTAÇÃO PELA MORTE DO FETO. CURETAGEM UTERINA SÓ ENTÃO REALIZADA. PROCEDIMENTO DE ALTO RISCO, CUJA ADEQUAÇÃO DE SUA EXECUÇÃO NÃO PÔDE SER ATESTADA PELA PROVA PERICIAL. LAPAROTOMIA EXPLORADORA COM HISTERECTOMIA TOTAL, ANEXECTOMIA E AUTOTRANSPLANTE RENAL, DEVIDO À LESÃO DO URETER DECORRENTE DE IMPERÍCIA NA EXECUÇÃO DA CURETAGEM. INFECÇÃO HOSPITALAR PÓS PROCEDIMENTO CIRÚRGICO. LESÕES DO ÚTERO E DO URETER DIREITO. PACIENTE QUE TEVE O CÓLO DO ÚTERO E O OVÁRIO DIREITO EXTIRPADOS. CICATRIZ ATINGINDO TODA A PARTE ABDOMINAL LONGITUDINALMENTE. Procedimentos hospitalares, um a um, que podem até ser justificados pela literatura médica, mas que evidenciam, no contexto dos fatos, negligência no trato do caso, assim como erro de avaliação, marcado pela imperícia na curetagem e pela infecção hospitalar posterior. Embora o risco que envolvia a situação da paciente e mesmo não sendo a medicina profissão de resultados, patente 32 Ibidem, p. 55-56. SOUZA, Neri Tadeu Câmara. Responsabilidade Civil e Penal do Médico. Campinas: LZN, 2003. p. 79-80. 34 LOPEZ, Tereza Ancona. O Dano Estético: Responsabilidade civil. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. p. 126. 33 24 o dever de indenizar. A responsabilidade civil do médico exige a prova da culpa. À do hospital, quanto à sua relação com a paciente, em face da incidência do CDC, incide a teoria do risco. Dever de indenizar caracterizado. Dano moral e estético caracterizados. Seqüelas concretas e permanentes na vida da paciente. Indenização fixada em valor aproximado a 100 salários mínimos - R$ 38.000,00, atendendo às circunstâncias do caso 35 concreto. APELO DA AUTORA PROVIDO. DESPROVIDO O DO RÉU. No presente caso pode-se observar a caracterização do dano moral e estético causados a vítima, havendo a cumulação dos mesmos, em razão da negligência e imperícia praticadas. APELAÇÕES CÍVEIS. RESPONSABILIDADE CIVIL. ERRO MÉDICO. CESARIANA. INFECÇÃO PUERPERAL. RESTOS DE PLACENTA NO INTERIOR DO ÚTERO. APLICAÇÃO DO CDC. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. OMISSÃO DE CUIDADOS PELO HOSPITAL. RESPONSABILIDADE DA INSTITUIÇÃO. DANOS MORAL E ESTÉTICO. VERBAS AUTÔNOMAS. DOBRA DA INDENIZAÇÃO. INVIABILIDADE. Aplicável, in casu, o princípio da carga dinâmica da prova, além de possível, também, a inversão do ônus da prova, cujas hipóteses não se resumem à questão da hipossuficiência econômica, podendo ser deferida a inversão, também, com fundamento na inferioridade técnica ou na verossimilhança das alegações do consumidor, ex vi do art. 6º, VIII, do CDC, situações essas, todas, presentes no caso em comento, possibilitando a aplicação da regra, inclusive, ex officio. Precedentes do STJ. Não havendo demonstração pelo nosocômio acerca das excludentes de culpabilidade, atinentes à inexistência do defeito ou à culpa exclusiva da paciente (art. 14, § 3º, do CDC), patente sua responsabilidade, que no caso é objetiva. As reparações por danos estético e moral, mesmo entendido aquele como corolário deste, podem ser cumuladas, ainda quando derivados de um mesmo fato, se inconfundíveis suas causas e passíveis de apuração em separado. Arbitramento de verba autônoma para o dano estético comprovado, levando em consideração tanto o caráter compensatório como o caráter inibitório-punitivo da indenização. A regra contida no art. 1.538, § 1º, do CCB/1916 não abrange todas as parcelas previstas no caput, mas apenas a multa criminal, acaso devida, o que não é a hipótese vertente. Danos moral e estético fixados em 100 e 80 salários mínimos nacionais, respectivamente, atendendo às circunstâncias concretas da causa e a critérios de razoabilidade. APELO DO RÉU DESPROVIDO. RECURSO DA 36 AUTORA PROVIDO EM PARTE”. No caso exposto ficou evidente a possibilidade de cumulação de dano moral e estético, tendo em vista que, por mais que este seja uma espécie daquele, quando provenientes do mesmo fato, sendo inconfundíveis e passíveis de apuração em separado, haverá a indenização moral e estética. 35 Apelação Cível Nº. 70016873747, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Aquino Flores de Camargo, Julgado em 29/11/2007. 36 Apelação Cível Nº. 70007619281, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Adão Sérgio do Nascimento Cassiano, Julgado em 22/03/2006. 25 CIVIL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO - ACIDENTE DE TRANSITO - DANO MORAL - DANO ESTETICO - CUMULABILIDADE. I - ADMISSIVEL A INDENIZAÇÃO, POR DANO MORAL E DANO ESTETICO, CUMULATIVAMENTE, AINDA QUE DERIVADOS DO MESMO FATO, QUANDO ESTE, EMBORA DE REGRA SUBSUMINDO-SE NAQUELE, COMPORTE REPARAÇÃO MATERIAL. II - INCIDENCIA DA SUMULA N. 37, DO STJ. III 37 - RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. No mesmo sentido, a presente jurisprudência, também, afirma a possibilidade de cumulação de dano moral e estético, mesmo que decorrentes do mesmo fato. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. MENOR IMPÚBERE. AMPUTAÇÃO DE BRAÇO. DANOS MORAL E ESTÉTICO. POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO. AGRAVO 38 PROVIDO PARA DETERMINAR A SUBIDA DOS AUTOS PRINCIPAIS. No caso exposto acima, devido à necessidade de amputação do braço da vítima, foi possível a cumulação de indenização por dano moral e estético. Para André Gustavo de ANDRADE, a experiência tem demonstrado que os julgadores, ao realizarem uma análise separada de dano estético e dano moral, não deixam de avaliar a soma total desses dois valores, que é ajustada para se chegar a uma importância que mantenha proporcionalidade com o resultado danoso. 39 CONCLUSÃO Este artigo tem início com a seguinte problemática: “quando o profissional da medicina pode vir a ser responsabilizado pelos seus atos no exercício da sua profissão?”. Após a apresentação dos julgados e suas respectivas análises, podese verificar que o médico será responsabilizado a partir do momento em que 37 Recurso Especial Nº. 1995/0031286-7, Superior Tribunal de Justiça, Relator: Ministro Waldemar Zveiter, Julgado Em 16/02/1996. 38 Agravo de Instrumento Nº. 758.114, Superior Tribunal de Justiça, Relatora: Ministra Denise Arruda, Julgado Em 04/09/2006. 39 ANDRADE, André Gustavo C. de. A Evolução do Conceito de Dano Moral. In: COUTO, Antonio; SLAIBI FILHO, Nagib; ALVES, Geraldo Magela. (Org.). A Responsabilidade Civil e o Fato Social no Século XXI. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 103. 26 praticar um ato de negligência, imprudência ou imperícia e que decorra em um dano ao paciente. Mais especificamente, no caso da cirurgia plástica com finalidade estética, pode-se observar que o entendimento predominante é o da obrigação de resultado. Portanto, demonstrada a insatisfação do paciente caberá ao cirurgião ser responsabilizado, pois não cumpriu com sua obrigação. Outro ponto importante que foi abordado é o dano médico, mais especificamente o dano estético. Este se caracteriza por causar uma deformidade na pessoa, denegrindo, assim, sua imagem. Esse dano é uma espécie de dano moral, mas entende-se que é possível a cumulação de ambos, pois há situações em que pessoa tem dois ou mais bens jurídicos afetados, conforme posição adotada pela autora Tereza Ancona LOPEZ e pelos tribunais, conforme jurisprudência apresentadas. Com a finalidade de verificar a presença do erro médico na realidade, foram pesquisadas jurisprudências de tribunais distintos, com o intuito de identificar a causa do dano gerado ao paciente e em qual modalidade de culpa o médico encontrava-se. Infelizmente há vários casos de erro médico, principalmente por negligência. Dentre os casos analisados foi identificado que a maior parte dos erros médicos são causados devido a descuidos, desleixos, inércia, ou seja, a falta do dever médico de estar atento aos devidos cuidados necessários, pois está em causa a vida de uma pessoa. E esses atos vêm crescendo a cada dia, o que faz com que cheguem cada vez mais demandas ao judiciário. Entretanto, nota-se que em muitos casos a justiça foi colocada em prática, condenando os médicos a indenizarem os pacientes que sofreram danos, em virtude de seus erros. REFERÊNCIAS AGUIAR JUNIOR, Ruy Rosado de. Responsabilidade Civil do Médico. In: TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo. (Org.). Direito e Medicina: Aspectos jurídicos da medicina. Belo Horizonte: DelRey, 2000. ANDRADE, André Gustavo C. de. A Evolução do Conceito de Dano Moral. In: COUTO, Antonio; SLAIBI FILHO, Nagib; ALVES, Geraldo Magela. (Org.). A 27 Responsabilidade Civil e o Fato Social no Século XXI. Rio de Janeiro: Forense, 2004. BARROS JÚNIOR, Edmilson de Almeida. A Responsabilidade Civil do Médico: Uma abordagem constitucional. São Paulo: Atlas S.A., 2007. CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2005. CROCE, Delton; CROCE JÚNIOR, Delton. Erro Médico e o Direito. São Paulo: Saraiva, 2002. GIOSTRI, Hildegard Taggesell. Erro Médico à Luz da Jurisprudência Comentada. 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