Relato de Caso Nefrectomia Parcial Ex Vivo e Autotransplante Parcial de Rim para Carcinoma de Pelve Renal em Rim Único: Relato de Caso Tsutomu Nishiyama,1* Masahiro Terunuma,1 Toshiki Tanikawa2 e Kota Takahashi2 Departamentos de Urologia, 1Hospital Koseiren Nagaoka Chuo, Nagaoka, Japão, e 2Faculdade de Medicina da Universidade de Niigata, Niigata, Japão Um paciente japonês de 46 anos foi diagnosticado com um carcinoma de pelve renal e um rim hipoplásico contralateral. O tumor estava adjacente à pelve renal, tornando difícil a remoção cirúrgica completa in situ. O paciente foi submetido a nefrectomia parcial ex vivo do rim esquerdo, seguida de autotransplante do segmento renal restante. Uma avaliação patológica revelou um carcinoma de células transicionais, G2, pT3. A função do enxerto foi recuperada de maneira satisfatória após o autotransplante e nenhuma complicação significativa foi observada durante o período pós-operatório. O paciente está vivo e passa bem 12 meses após a operação e não apresenta evidências de recorrência do tumor. Int J Urol 1997;4:425-427 Palavras-chave: carcinoma de pelve renal, cirurgia ex vivo, nefrectomia parcial, autotransplante parcial de rim INTRODUÇÃO A nefroureterectomia total é o tratamento mais usado para o carcinoma de pelve renal com um rim normal contralateral.l Entretanto, pacientes com carcinoma de pelve renal em rim único funcional são considerados grandes candidatos para cirurgias conservadoras de néfrons.2 Relatamos o caso de um carcinoma de pelve renal esquerdo encontrado em um paciente com rim hipoplásico contralateral e submetido a nefrectomia parcial ex vivo e autotransplante. HISTÓRICO Um paciente japonês de 46 anos deu entrada no Departamento de Urologia do Hospital Koseiren Nagaoka Chuo reclamando de dores no flanco esquerdo e hematúria macroscópica. Uma urografia intravenosa revelou um rim direito hipoplásico e um defeito de enchimento (10 mm de diâmetro) no cálice inferior do rim esquerdo (Fig. 1). Não foi possível localizar o tumor por ecografia abdominal nem tomografia computadorizada, e uma ureterorenoscopia não pôde ser realizada devido a uma torção do ureter no ponto de cruzamento com a artéria ilíaca. Embora a citologia urinária tenha sido negativa para células malignas, a citologia da urina obtida por via transuretral da pelve renal esquerda revelou um carcinoma de células tranRecebido em 16 de out. de 1996; aceito para publicação em forma revisada em 27 de jan. de 1997. *Correspondência e solicitações para reimpressão para: Departamento de Urologia, Hospital Koseiren Nagaoka Chuo, Fukuzumi 2-1-5, Nagaoka, Niigata 940, Japão. sicionais. Uma cintilografia renal com ácido dimercaptosuccínico marcado com 99mTc revelou que a captação do radioisótopo no rim esquerdo era de 16,5% e 3,9% no direito, indicando que a função renal do rim direito estava bastante comprometida. O neoplasma estava adjacente à pelve renal, tornando difícil a remoção cirúrgica completa in situ. Depois de obter consentimento do paciente, decidiu-se por realizar uma nefrectomia parcial ex vivo do rim esquerdo, seguida de autotransplante do segmento renal. Procedimento Cirúrgico O paciente foi colocado em decúbito lateral direito sob anestesia geral. Foi feita uma incisão oblíqua na região lombar esquerda estendendo-se da décima segunda costela até a sínfise púbica. A cavidade retroperitonial foi acessada e o rim esquerdo exposto. A artéria e a veia renal foram identificadas, clampeadas e seccionadas. O rim esquerdo, pesando 380 g, foi removido do retroperitônio, completamente resfriado e perfundido com solução de Collins. A incisão vertical da cápsula renal no polo inferior foi feita com um bisturi e a cápsula dissecada a cerca de 1 cm abaixo da incisão no parênquima localizada no terço inferior do rim. O tecido removido pesava 140 g. Foi encontrado um tumor papilar (10 mm de diâmetro) no cálice do polo inferior do tecido removido (Fig. 2). O exame microscópico de uma amostra congelada não demonstrou a extensão do neoplasma para a margem cirúrgica do tecido removido. Foi feita ligadura dupla dos vasos sanguíneos seccionados com uma sutura de polipropileno 5-0 (Prolene; Ethicon, NJ, EUA). O cálice renal e a pelve foram fechados Fig. 2. Um tumor papilar é detectado no cálice do tecido removido (indicado pela seta). Fig. 1. Urograma intravenoso mostrando um rim direito hipoplásico pequeno e um defeito de enchimento (10 mm de diâmetro) no cálice inferior do rim esquerdo (indicado pela seta). com uma sutura contínua de poliglactina 3-0 (Vicryl revestido, Ethicon). Uma solução de vermelho de fenol foi injetada pelo ureter para garantir um fechamento impermeável. Em seguida, uma solução diluída de índigo carmim foi injetada na artéria renal para garantir a ausência de vazamentos dos vasos sanguíneos no coto parenquimal. As regiões com sangramento foram suturadas com polipropileno 5-0 e foi realizada uma sutura de colchoeiro com catgut 3-0 em toda a área seccionada. Foi utilizada tela de ácido poliglicólico absorvível (Neoveil; Gunze, Kyoto, Japão) em todas as regiões em que o catgut entrou no parênquima de modo que uma fissura não fosse criada ao resumir a perfusão (Fig. 3). Cola de fibrina (Beriplast P; Hoechst, Alemanha) foi aplicada sobre a superfície da incisão a fim de evitar hemorragia, e a cápsula renal foi usada para cobrir a região operada. Uma anastomose completa da veia renal e da veia ilíaca comum esquerda foi realizada inicialmente, seguida de uma anastomose completa da artéria ilíaca interna e da renal. Uma ureteroneocistostomia foi realizada. A cor do rim e o fluxo sanguíneo estavam satisfatórios quando a perfusão foi retomada. A isquemia quente e total duraram aproximadamente 5 minutos e 200 minutos, respectivamente. A cirurgia Fig. 3. A aparência do segmento renal remanescente seccionado antes do autotransplante. Foi utilizada tela de ácido poliglicólico absorvível em todas as regiões em que o catgut entrou no parênquima. durou 7 horas e 30 minutos e o tempo total de anestesia foi de 8 horas e 45 minutos. Pós-operatório A amostra patológica revelou um carcinoma de células transicionais, G2, INF α, pT3, pR0, pL0, pV0. Nenhuma complicação significativa se desenvolveu durante o período pós-operatório. O nível de creatinina no soro era de 6,9 mg/dl no primeiro dia do pósoperatório, mas a hemodiálise não foi necessária. A função do enxerto melhorou lentamente, e o nível de creatinina no soro caiu para 3,1 mg/dl com um clearance de creatinina de 23,9 ml/min no dia 14 do pósoperatório. Cinco meses após a cirurgia, a creatinina no soro era de 1,4 mg/dl e o clearance de creatinina era de 47,6 ml/min (Fig. 4). O paciente passa bem 12 meses após a cirurgia e não apresenta evidências de recorrência da doença. Fig. 4. Urograma intravenoso 5 meses após a cirurgia revela o rim esquerdo autotransplantado com boa excreção (indicado pela seta). DISCUSSÃO Em pacientes sem metástase e com função renal contralateral normal, a nefroureterectomia radical com remoção de um cuff de tecido da bexiga permanece a regra de ouro do tratamento para carcinoma de células transicionais do trato urinário superior. 1 Atualmente, a cirurgia conservadora de néfrons é amplamente aceita em pacientes com neoplasmas bilaterais, função renal comprometida ou com rim único a fim de evitar a necessidade de diálises crônicas. 3 O conceito da cirurgia conservadora do rim para o gerenciamento de neoplasias uroteliais do trato superior permanece controverso.2 Embora muitas modalidades estejam disponíveis para o diagnóstico de tumores uroteliais do trato superior, a capacidade de definir o estágio corretamente e classificar essas lesões antes da intervenção cirúrgica é limitada.4 Sendo assim, atualmente a cirurgia conservadora do rim realizada para carcinomas de células transicionais no trato superior deve ser apoiada por indicações convincentes, como insuficiência renal, presença de tumores bilaterais ou presença de rim único. Vários relatos documentaram o sucesso de procedimentos conservadores do rim, particularmente o gerenciamento nefroscópico, que tem sido usado com sucesso para o tratamen- to de carcinoma de células transicionais do trato superior.4,5 A nefroscopia percutânea tem sido usada com eficiência para tratar de tumores de pelve renal devido ao acesso relativamente fácil do trato urinário superior e à capacidade de usar uma variedade de instrumentos em uma entrada maior para o tratamento. Uma desvantagem é a possibilidade de resultar em ruptura do tumor e contaminação neoplásica do retroperitônio e do trato para nefrostomia. Esse procedimento deve ser restrito ao tratamento de carcinomas com células transicionais de baixo grau e em estágio inicial. No paciente em questão, a função renal do rim direito era irrelevante. O tumor estava adjacente à pelve renal, e a preocupação era se a lesão poderia ser completamente retirada com uma cirurgia realizada in situ. Consequentemente, o paciente foi tratado com uma nefrectomia parcial ex vivo, seguida de autotransplante renal. A patologia revelou um carcinoma de células transicionais, G2, pT3. Uma vez que neoplasmas do trato urinário superior com alto grau/estágio avançado têm alta taxa de recorrência, é necessário seguir os protocolos de acompanhamento rigorosamente.2 A cirurgia conservadora de néfrons in situ para um paciente com rim único funcional deve ser considerada inicialmente. Entretanto, a nefrectomia parcial ex vivo e transplante renal são indicados em casos selecionados de tumor no trato urinário superior com rim único funcional quando for difícil realizar a remoção completa do tumor com cirurgia conservadora de néfrons in situ. REFERÊNCIAS 1. Catalona WJ. Urothelial tumors of the urinary tract (“Tumores uroteliais do trato urinário”). In: Walsh PC, Retik AB, Stamey TA, Vaugham ED Jr (eds) Campbell's urology. 6ª ed. Filadélfia: WB Saunders 1992;1094-1158. 2. Zincke H, Nevees RJ. 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Percutaneous management of renal pelvic tumors: a treatment option in selected cases (“Gerenciamento percutâneo de tumores de pelve renal: uma opção de tratamento em casos selecionados”). J Urol 1987;137:852-856.