7 INTRODUÇÃO A idéia de fazer uma pesquisa sobre a produção e o consumo do forró em Salvador, iniciase em 2001, impulsionada pelo trabalho como consultora de marketing na única casa de shows de forró da cidade, o Coliseu. As atividades desempenhadas incluem planejamento e execução das estratégias de comunicação, seleção de bandas, idealização da formatação dos eventos, treinamento dos funcionários, busca de patrocínio e parceiros, entre outras. Enquanto realizava atividades na referida casa de eventos, a empresa administradora do Coliseu do Forró, crescia, expandia-se para outros setores no mercado soteropolitano, relacionados com eventos de Axé Music e Pagode. Esta experiência profissional apresentou uma nova realidade, extremamente rica, possibilitando visualizar a dimensão e a complexidade do mercado de eventos juvenis. O forró em si desperta maior atenção, por vários motivos. Primeiramente, pela necessidade em entender o funcionamento e o público do Coliseu, a fim de fazê-lo prosperar, concretizando, pois, forte relação entre o objeto e a pesquisadora. Outro, tão importante quanto o primeiro, constitui-se a partir da percepção da capacidade do ritmo em agregar indivíduos e solidificar relações interpessoais. Isto se deve a alta freqüência dos jovens nos eventos no Coliseu, na capital baiana, onde a Axé Music reina, mesmo nos dois finais de semana anteriores ao carnaval. Além disto, o amor com que os músicos soteropolitanos, na maioria bem jovens, falam do trabalho e de ídolos, como Luiz Gonzaga, Jackson do Pandeiro e Dominguinhos, solidificam a hipótese da força do forró em Salvador. Assim como: a adoração do público em shows assistidos, a exemplo de Dominguinhos, em 2005 e em 2008, no Coliseu; bem como shows de bandas soteropolitanas, como a Estakazero; e a descoberta de termos derivantes do etmo forró, como forrozeiro, identificando quem canta, toca ou aprecia. A busca possibilita perceber que a suposta adoração do Forró Eletrônico e do Universitário aumenta a admiração pelo Forró Pé-de-Serra. E mais, que a eclosão destes novos formatos se inicia ainda por Luiz Gonzaga, em 1970, na incorporação de novos instrumentos ao Forró. Quanto ao Forró de Luiz Gonzaga, adota-se a nomenclatura Pé-de-Serra, terminação influenciada por artistas e empresários locais entrevistados. O termo ―Tradicional‖ e ainda outros como ―Autêntico‖ são rejeitados, em função de questionamentos da pesquisadora, acerca do que seja realmente tradicional ou autêntico nesta música. 8 Os novos forrós propostos e estudados são o Universitário e o Eletrônico, por serem os mais presentes em Salvador. Mas, não é ignorada a existência de outras variações, como o vanerão, surgido em 1997 (CORDEIRO, 2002: 37). Esta variante é uma tentativa de unir o vanerão gaúcho com o forró, cujo trabalho emblemático é da banda cearense, Brasas do Forró. O estilo é ainda mais acelerado que o Forró Eletrônico, sendo citado pelas bandas, apenas, como referência ao que elas denominaram ser ―mais para frente‖. Em conversas informais com jovens do interior do estado e de sergipanos, descobre-se que o Forró Eletrônico e o vanerão são muito mais presentes do que o Forró Universitário nestas cidades. No entanto, como o foco da pesquisa são as bandas de Salvador, o vanerão é apenas citado. A busca por obras afins demonstra a dificuldade em definir, rotular e qualificar os novos forrós, já que cada região do país adota uma postura diferente perante tais formatos. Citando o músico Léo Macedo, vocalista da banda Estakazero: Jovens do Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais valorizam o forró pé-deserra, o mais tradicional. De Sergipe pra cima, o forró estilizado (comercial), mais mecânico, é muito valorizado. Já na Bahia, a galera é dividida, ouve-se dos dois estilos [...] (CARVALHO, 2008). Além do que, em uma mesma região, a compreensão do que seja forró, também é difusa: ―A dubiedade do termo, cujo entendimento se modifica com o passar dos anos, e que pode ter significados distintos, mesmo entre indivíduos contemporâneos, torna extremamente difícil qualquer tentativa taxionômica‖ (CORDEIRO, 2002:108). Assim, o trabalho almeja descrever os novos forrós, claramente predominantes na cidade, a convivência destes com o Forró Pé-de-Serra, e não rotulações e definições estáticas do que seria cada um. Os três estilos, assim como em Raimundo Cordeiro (2002) e Márcio Madeira (2002), são, em determinados trechos da dissertação, apresentados por siglas com suas iniciais: FU para Forró Universitário, FE para Forró Eletrônico e FPS para Forró Péde-Serra. Além da pesquisa realizada em diversas obras sobre o assunto, vários dados e informações são coletados no decorrer dos sete anos de atividade profissional. As entrevistas com os músicos, dentre eles Dominguinhos, Alcymar Monteiro, Coroneto (Trio Nordestino) e Cicicnho de Assis, são essenciais para entender o universo forrozeiro em Salvador, por 9 forneceram dados valiosos, além do que, pelo fato de muitas terem sido realizadas em locais e momentos de descontração, rendem comentários complementares, como escutar o mestre Dominguinhos aconselhando Cicinho de Assis a seguir carreira solo. Apesar da observação constante, fez-se necessário a obtenção de, ao menos, alguns dados quantitativos a fim de mensurar o perfil do público do forró em Salvador. Para tanto, foram aplicados 28 questionários com freqüentadores da única casa de forró na cidade, que tem o gênero presente em todos os meses do ano, como atração principal. No primeiro capítulo, é apresentado o surgimento da palavra forró e as acepções do termo enquanto baile e ritmo. Percorre-se o caminho a partir do Baião para chegar ao Forró. Ainda neste capítulo, são sucintamente descritos a vida e o trabalho de Luiz Gonzaga. Em seguida, comenta-se a década de 1970, por ser fundamental para solidificação do ritmo. No segundo capítulo, a atenção volta-se para os novos forrós: o eletrônico e o universitário, as histórias e os posicionamentos da década de 1990 ao ano de 2008. O terceiro capítulo foca a chegada dos novos formatos a Salvador, a caracterização dos músicos e das bandas, assim como a evolução do Forró, a partir da década de 1990 na cidade; a sua comercialização e também descrição das 16 bandas e artistas pesquisados na cidade. O quarto capítulo aborda a casa de forró Coliseu, buscando esmiuçar detalhes de funcionamento a fim de explicar onde é que os jovens dançam forró na cidade, além de apresentar dados de uma pequena amostra do público do Coliseu, obtida através de questionários (em anexo). Nas considerações finais e complementares, comentários, a partir das entrevistas, da relação entre o Forró Eletrônico e a Axé-Music e por último, a descrição da temporada de forró 2008, em Salvador. 10 1 DA ORIGEM DO TERMO À DÉCADA DE 1970 1.1 O TERMO Há duas vertentes que explicam a origem do forró. A primeira – adotada pela Enciclopédia da Música Brasileira (1998: 301) – entende o termo como derivação do etmo africano, forrobodó que, de acordo com o Dicionário Aurélio, significa ―arrasta-pé (1), 2. farra, troça, 3. confusão, desordem, v. rolo (16). [F. red: forró.] (FERREIRA, 1999: 932)‖. Já a segunda vertente defende forró como resultante de for all, expressão introduzida no Brasil no início do século XX, época em que – devido à construção da ferrovia Great Western – engenheiros britânicos instalados em Pernambuco promovem bailes ao som da sanfona e da zabumba e afixam placas indicativas de ‗acesso para todos‘ (for all). De acordo com Alberto Ikeda (1990: 10), há registro na imprensa pernambucana do uso de forrobodó, pelo menos desde 1882. Na Enciclopédia da Música Brasileira (1998: 301) encontra-se a idéia da origem pelo forrobodó, pois consta que o uso do termo data da metade do século XIX, antecedente a for all. Ao que parece, a idéia do for all reflete a forte influência européia sobre o modelo musical brasileiro até os anos 20 do século passado: ―O grupo rural, os ‗coronéis‘ (como eram chamados os senhores das grandes propriedades rurais, os latifúndios), moradores no campo ou nas grandes casas das cidades – fruto do ciclo do café ou da borracha-, elegem a música européia como de sua preferência (SUZIGAN, 1990: 16)‖. 1.2 UM BAILE A primeira vertente etimológica do termo forró designa local apropriado para se dançar (RAMALHO, 2000: 132). Sobre esta acepção, Alberto Ikeda (1990: 10) afirma: ―Da mesma forma que o samba e o maxixe, o forró inicialmente designava a reunião dançante (baile, festa) e o local da dança, passando posteriormente a caracterizar a dança e um gênero musical específico‖. Antecedente às migrações nordestinas da década de 1940, o uso do termo forró restringiase apenas ao Nordeste; com o deslocamento de nordestinos, passa, então, a disseminar-se para o Centro-sul brasileiro. Segundo José Tinhorão (2005: 215): 11 Surgidos durante a segunda metade da década de 1950, quando a migração de nordestinos para o Rio de Janeiro, São Paulo e Brasília tinham chegado ao seu auge, na esteira da eufórica construção da nova capital e da correria imobiliária paralela à explosão industrial na região Centro-Sul, os forrós constituíram um curioso exemplo de acomodação de interesses e expectativas culturais no âmbito das camadas mais humildes daquelas três cidades. Os nordestinos oriundos da zona rural, migrantes em São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília, em sua maioria, trabalhadores da construção civil, juntamente com ―[...] tiradores de coco da zona litorânea [...], com negros vindos da área do batuque rural [...]‖, goianos violeiros e de mineiros com diferentes características culturais, são os primeiros responsáveis pela urbanização de ritmos nordestinos e também pelo início dos forrós no sudeste (TINHORÃO, 2005: 218). Com o aumento da população de migrantes nestas cidades, fazse necessário a criação de espaços que comportem este tipo de baile. Assim, em diversas letras de músicas das décadas de 1940 e 1950 é possível identificar o uso do termo forró como designativo de baile, festa de entretenimento (IKEDA, 1990: 11): Forró em Limoeiro1 Edgar Ferreira. Intérprete: Jackson do Pandeiro Copacabana 5.155, outubro de 1953 Eu fui pra Limoeiro E gostei do forró de lá. Eu vi um caboclo brejeiro Tocando a sanfona, entrei no fuá. No meio do forró houve um tereré Disse o Mano Zé, agüenta o pagode Todo mundo pode, gritou o Teixeira Quem não tem peixeira briga no pé. Foi quando eu vi a Dona Zezé A mulher que é, diz que topa parada De saia amarrada fazer cocó E dizer: eu brigo com cabra canalha Puxou da navalha e entrou no forró. Eu que sou do morro, não choro, não corro, Não peço socorro quando há chuá Gosto de sambar na ponta da faca Sou nego de raça e não quero apanhar. 1 Letra extraída de: Raimundo Cordeiro (2002: 11). 12 O primeiro local caracterizado como um forró nordestino, no Sudeste, Forró do Xavier –, data da segunda metade da década de 1950 e ocorre em Botafogo, no Rio de Janeiro. Em São Paulo, por sua vez, a pioneira é a casa do sanfoneiro Pedro Sertanejo, criada em 1962 (CORDEIRO, 2002: 29). A partir daí, no eixo Rio-São Paulo, multiplicam-se os forrós. Em 1974, apenas na capital paulista, existem mais de cinqüenta casas específicas (TINHORÃO, 2005: 219 - 221). Em 1980, o sucesso dos forrós alcança a classe média como exótica novidade e opção de lazer (Ibid.: 222). 1.3 O RITMO: DO BAIÃO AO FORRÓ A palavra forró é utilizada com acepção musical, aproximadamente entre o final da década de 1960 e o início da seguinte. De acordo com o músico José Domingos de Moraes – o Dominguinhos2 – naquele período, Luiz Gonzaga, principal disseminador do forró, altera a batida da zabumba, produzindo um ritmo mais suingado do que o Baião. Além das alterações no âmbito do texto musical, Gonzagão introduz o termo forró em suas letras. Segundo Alberto Ikeda (1990: 11): O forró como gênero musical somente começa a aparecer nos discos pela década de 60, sendo que na década seguinte aparece em grande número, naturalmente em função da consagração do termo a nível nacional a partir daquela época, via profusão dos forrós nas grandes cidades do Sudeste. 1.3.1 BAIÃO Sílvio Romero apud Maria Giffoni (1964: 66) afirma que o Baião é resultante da mistura do ―[...] Maracatu africano, das danças selvagens e do Fado Português‖. Para José Tinhorão (1991: 219), o ritmo origina-se a partir de formas diferenciadas de tocar lundus na zona rural nordestina. O Baião possui duas fases. A primeira ocorre de 1842 a 1946, sendo presente da Bahia ao Maranhão (GIFFONI, 1964: 65). A segunda, denominada de ―Baião Moderno‖, inicia-se a partir da parceria Humberto Teixeira e Luiz Gonzaga. De acordo com José Tinhorão 2 José Domingos de Moraes nasceu em Garanhuns, Pernambuco, em 1941. (http://www.dominguinhos.art.br/release.php) acesso em 27/02/2008. Dominguinhos é considerado o principal sucessor de Luiz Gonzaga. Entrevista realizada no dia 08 de março de 2008, na casa de shows Coliseu, devidamente apresentada no capítulo IV. 13 (1991: 219), por volta de 1945, Humberto Teixeira e Luiz Gonzaga transformam o Baião, até então um gênero rural, em música popular urbana: Embora durante um século ou mais o Baião existisse no Nordeste, foram estas duas figuras que o fizeram atravessar fronteiras, atingindo a Europa, sendo exibido nos Estados Unidos e invadindo o Brasil. Nas boates paulistanas em 1950, tocava-se à proporção de 10 baiões para qualquer outro gênero musical (GIFFONI, 1964: 66). Esta segunda fase, cujo marco é a composição Baião, inicia-se em outubro de 1946: ―A composição [Baião] de Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira lançou um novo ritmo na praça, que logo viraria mania nacional, dos bailes das periferias aos salões mais grã-finos (GIFFONI, 1964: 82)‖. O conjunto Quatro Ases e um Coringa realiza a primeira gravação da música Baião. Na década de 1940 ocorrem 19 gravações do ritmo. As letras trazem, com freqüência, representações da natureza, como ―[...] beija-flor, bem-te-vi, boi, burrinho, sapo, canarinho, rouxinol e sabiá [...]‖, além de sentimentos como a saudade ―[...] o amor, a vingança, a despedida, o abandono, a fé, o sofrimento, o sonho, o lamento, a alegria e a felicidade (VIEIRA, 2000: 44-46). O sucesso obtido por Luiz Gonzaga resulta não apenas da qualidade musical, este elemento se coaduna à conjuntura existente quando surge o Baião. Durval Albuquerque (2003: 157) acredita que isto se deva a dois fatores principais: ―[...] por um lado, de um código de gosto que valorizava as músicas dançantes, as de natureza lúdica e, por outro, atendia ao consumo crescente de signos nordestinos e regionais como signos da nacionalidade‖. O autor também credita o sucesso do Baião às migrações nordestinas para o Rio de Janeiro, São Paulo e Brasília: Mas seu maior sucesso se dá entre os migrantes nordestinos, pois se conecta com a saudade do lugar de origem, com o medo da cidade grande e, ao mesmo tempo, com o orgulho de estar enfrentando-a, com seus valores de origem rural como a religiosidade e a importância dos laços familiares. O Baião teve 1.057 gravações, no período de 1950 a 1955 (VIEIRA, 2000, 44) e expandese para o circuito internacional. José Tinhorão (1991: 223) atribui tal expansão, sobretudo, 14 à falta de complexidade para execução. Em comparação ao samba, isto simplifica a atividade de músicos estrangeiros3. 1.3.2 O FORRÓ O Forró é um desdobramento do Baião. Márcio Madeira (2002: 3) e diversos músicos entrevistados, como Cicinho de Assis4 e Dominguinhos, afirmam ser este menos acelerado que o primeiro. Raimundo Cordeiro (2002: 14) sinaliza: ―Entre os músicos, forró pode também significar um padrão rítmico específico, com mais ‗molho‘, usado principalmente pelos zambubeiros, parece traduzir a maior liberdade rítmica presente no forró em relação ao Baião‖. A zabumba é o principal instrumento dos músicos forrozeiros, sendo responsável pela batida nas canções; no Baião, esta responsabilidade recai sobre o acordeon. O Baião entra em declínio em 1957 (CORDEIRO, 2002: 25), devido às influências musicais estrangeiras, da Bossa Nova, da Jovem Guarda e de outros ritmos introduzidos no Brasil. Sulamita Vieira (2000: 44-45) complementa: Se, ao longo da segunda metade da década de 40, a música do Nordeste, personificada por Gonzaga e seus parceiros, conseguira se estabelecer no cenário fonográfico nacional, no final da década de 50, ela entraria em declínio, devido, em parte, ao frenesi causado na juventude brasileira pelo advento do rock in roll (CORDEIRO, 2002: 26). Após o declínio do Baião, Luiz Gonzaga cria o Forró na tentativa de permanecer em evidência.. De acordo com Márcio Madeira (2002: 22): ―O que Luiz Gonzaga fez, apenas, 3 Luiz Gonzaga, em entrevista fornecida ao jornal Pasquim, de número 111, também afirma que o Baião é um ritmo fácil, assim o considera o ritmo brasileiro de maior destaque internacional. (―O Pasquim foi o primeiro e mais influente jornal de oposição à ditadura militar no Brasil.[...] De uma tiragem inicial de 20 mil exemplares, que a princípio parecia exagerada, o semanário atingiu a marca de mais de 200 mil em seu auge, em meados dos anos 70, se tornando um dos maiores fenômenos do mercado editorial brasileiro‖). Disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/O_Pasquim, acesso em 19 de abr de 2008. 4 De acordo com o release oficial do músico: ―Hoje em dia, Cicinho de Assis, como é conhecido no cenário musical, adquiriu uma bagagem profissional muito extensa e respeitada. No seu currículo constam grandes nomes da música brasileira com quem já trabalhou, dividindo palco e gravando discos, tais como: Milton Nascimento, Daniela Mercury, Maria Bethânia, Ivete Sangalo, Arnaldo Antunes, Elba Ramalho, Jorge Mautner, Oswaldinho do Acordeom, Leonardo, Dominguinhos, seu padrinho, o Ministro da Cultura, Gilberto Gil, com quem participou da gravação dos CDs ―Gilberto Gil e as Canções de ‖Eu, Tu, Eles― (2000), ―Esperando na Janela‖ (2000), ―Gil e Milton‖ (2000), ―São João Vivo‖ (2001), ―Kaya N‘Gan Daya‖ (2002), ―Kaya N‘Gan Daya – Ao Vivo‖ (2003)‖. A entrevista com Cicinho de Assis foi realizada no dia 08 de março, no restaurante Grande Sertão, em Salvador. 15 mas, muito inteligentemente, foi propor à mídia uma nova música, ou um novo nome, na tentativa de manter-se em evidência na época (já na segunda metade do século passado). Assim, criou um ritmo novo, o forró, derivado do Baião‖. O Forró engloba o Baião e ―em nossos dias, o termo abrange a versão atualizada dos vários estilos de danças do sertão nordestino (RAMALHO, 2000: 132)‖. Alberto Ikeda (1990: 10) afirma: [...] no começo do século (passado) falava-se nas ―canções nortistas‖ referindose aos vários gêneros musicais nordestinos; posteriormente tudo passou a ser ―Baião‖, na fase áurea desse gênero; chegando-se aos últimos vinte anos onde tudo era ―forró‖, seja na realidade xote, Baião, xaxado, coco, embolada e o próprio forró, naturalmente. Apesar da recorrente generalização, musicalmente não se pode afirmar que o Forró substitui o Baião. Ambos continuam sendo gêneros musicais diferenciados. Sobre a aproximação destes gêneros e utilização do nome forró em relação a baião, Márcio Madeira (2002: 29) afirma: O que se deve entender é que não se pretende substituir o baião pelo forró, nem poderia. Ou afirmar, que baião é forró e vice-versa. Mas deve-se ter em mente que tanto os instrumentos, como as letras das músicas, o contexto em que era pensada e desenvolvida essa música por Luiz Gonzaga, entre outras coisas, era muito similar. [...] Na verdade a expressão Forró Pé-de-Serra parece dar nome não apenas a um estilo de forró, mas uma maneira de tocar Baião, xote, xaxado, marcha. 1.4 O PRINCIPAL DISSEMINADOR DO FORRÓ PÉ-DE-SERRA (FPS) O pernambucano Luiz Gonzaga, principal disseminador do forró, nasce em Exu, aos 13 de dezembro de 1912. Com apenas treze anos, Luiz Gonzaga já anima festas em companhia de seu pai, Januário, ainda em Exu. Foi um adolescente apaixonado por Lampião, o Capitão Virgulino Ferreira (1898 – 1938), quem lhe inspira as indumentárias com as quais se apresenta anos depois em público. Chega ao Rio de Janeiro em maio de 1939, egresso do serviço militar. Suas primeiras tentativas musicais na cidade são em bares da região do Mangue, quando ainda não cantava gêneros relacionados com o Nordeste (ECHEVERRIA 2006: 23, 28, 40, 46). 16 A primeira apresentação em rádios ocorre em 1940, num programa de calouros – atrações muito populares à época – na Rádio Tupi. Neste, como numa série deles, não obtém êxito tocando polcas, valsas e outros sucessos do período. Assim, muda de trajetória artística ao ser desafiado e estimulado por estudantes universitários a tocar algo nordestino: Luiz Gonzaga aceita o desafio e obtém grande sucesso. Já com esta característica, apresenta-se com a canção Vira e Mexe no programa radiofônico de Ari Barroso, atingindo nota máxima (ECHEVERRIA 2006: 46 - 50). Aos 05 de março de 1941, registra a primeira participação em disco como sanfoneiro, na faixa A viagem de Ginésio, pela RCA Victor (Ibid.: 50). No mesmo ano, consegue o primeiro trabalho efetivo como músico, na Samba Dancing (casa de shows). Em 1945, começa a gravar como vocalista já é seu 25º disco (Ibid.: 56). Diversos artistas fazem sucesso com o forró disseminado por Gonzagão. Entre eles: Jackson do Pandeiro, Carmélia Alves, Marinês, Abdias, Anastácia, Dominguinhos, Osvaldinho do Acordeon, Pedro Sertanejo, Clemilda, Cézar do Acordeon, Trio Nordestino, Trio Juazeiro, Os Três do Nordeste, Zé Calixto e Sivuca (SILVA, 2003: 90). Estes artistas têm em comum, em especial, o fato de que: ―Suas músicas trazem linguagem tipicamente rural e enfoque a um universo saudosista, nostálgico [...] refaz o ambiente social e familiar deixado pelo migrante nordestino que veio tentar uma nova vida nas terras do Sul e do Sudeste (SILVA, 2003: 90-91)‖. Assim, além das mazelas sertanejas há, nas canções interpretadas, o cultivo do saudosismo pela terra, por amores, além da participação em eventos locais, dentre os quais se destaca as festas juninas. Segundo Expedito Silva (2003: 91): As canções desse gênero forró, que chamamos de tradicional, não retratam apenas a seca e o sofrimento do povo do Nordeste, mas também falam de coisas positivas relacionadas ao povo nordestino, como a alegria, as festas e a criatividade artística e cultural. A linguagem rítmica expressa o corpo e a alma do artista que cresceu ouvindo os gemidos dos aboios, o improviso dos repentistas, sem esquecer a sensualidade, o gingado e a coreografia que a música popular nordestina tem. O forró, disseminado por Luiz Gonzaga e seus seguidores, torna-se conhecido como pé-deserra, por sua vez, considerado original, portanto, representativo de uma tradição. Márcio Madeira (2002: 28) aventa a possibilidade da origem do termo – pé-de-serra – dever-se ao 17 xote composto por Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira, denominado ―No Meu Pé-deserra‖, em 1946. Sobre a utilização do termo, Madeira complementa: A expressão Forró Pé-de-Serra representa atualmente, além de tudo, status. Para o grupo musical que se denomina adepto dessa ―linha‖, é como se se apresentasse como um seguidor do trabalho de Luiz Gonzaga, e que respeita a cultura do nordeste e do seu país, ―rejeita‖ portanto, as influências internacionais e adere ao que trataremos mais adiante de cultura nacional [...] Mesmo sendo resultado de fusões com a música do meio urbano, o Forró Pé-de-Serra (FPS) torna-se sinônimo de música tradicional e genuína do meio rural nordestino [...] (MADEIRA: 2002) O Forró Pé-de-Serra, a base para novos estilos de forró, no que tange à inserção na indústria fonográfica: ―[...] já se tratava de uma reformulação que pôs em novos padrões, principalmente para se adequar à indústria fonográfica, suas fontes originárias de criação, ou seja, a música ouvida nas festas do sertão, para as quais não havia nem autoria, nem letra fixada (ALFONSI, 2007: 35)‖. Para Adriana Fernandes (2004: 2) a inserção da música de Gonzaga na indústria cultural, inicia-se ainda com o Baião: ―Influenciado pelos padrões estéticos estabelecidos e amplamente aceitos na música da época através da mídia, Gonzaga irá ‗criar‘ o Baião, como uma novidade no cenário nacional em termos de música dançante‖. Ressalta ainda: ―Hoje entre nós, podemos perceber que Luiz Gonzaga e Jackson do Pandeiro fizeram um tipo de música na sua época que embora propagada e reverenciada como ―de raiz‖ já estava ligada à indústria cultural (Ibid.:5)‖. Apesar destas ressalvas, diversos autores, pesquisadores e artistas nomeiam o Forró Pé-deSerra promovido por Luiz Gonzaga, como ―original‖ ou ―tradicional‖. Os instrumentos – caracterizadores do FPS e responsáveis pela performance musical de Luiz Gonzaga e seus seguidores – são: sanfona, zabumba e triângulo. Em função destes três instrumentos, o forró, inicialmente, é tocado por um trio de músicos. Assim se origina a expressão trio de forró, que remete aos primórdios do gênero musical: ―O trio de forró parece atender às necessidades de uma época, na tentativa de satisfazer, como foi dito, as demandas sociais (MADEIRA, 2002: 60)‖. Cicinho de Assis e Dominguinhos5 afirmam que sem sanfona, zabumba e triângulo não há forró. 5 Entrevistas realizadas com os artistas no dia 08 de março de 2008, na casa de shows Coliseu. 18 Alguns outros instrumentos – como flauta – podem ser incorporados ao trio (CORDEIRO, 2002: 56). No decorrer da carreira, o próprio Luiz Gonzaga incorpora novos instrumentos às apresentações em palcos, modernizando o Forró. No entanto, mesmo já sendo gravado em estúdio com outros instrumentos, o forró continua apresentado nos palcos em trio. A evolução do gênero de acordo com as novidades rítmicas não é restrita ao Forró, visto que também ocorre com o samba e outros ritmos. Em Augusto Campos (1968: 53) encontra-se a seguinte declaração de Caetano Veloso6: Só a retomada da linha evolutiva pode nos dar uma organicidade para selecionar e ter um julgamento de criação. Dizer que samba só se faz com frigideira, tamborim e um violão sem sétimas e nonas não resolve o problema. Paulinho da Viola me falou há alguns dias da sua necessidade de incluir contrabaixo e bateria em seus discos. Tenho certeza de que, se puder levar essa necessidade de fato, ele terá contrabaixo e terá samba, assim como João Gilberto tem contrabaixo, violino, trompa, sétimas, nonas e tem samba. Aliás João Gilberto para mim é exatamente o momento em que isto aconteceu: a informação da modernidade musical utilizada na recriação, na renovação, no dar-um-passo-àfrente, da música popular brasileira [...]. Márcio Madeira (2002: 41) menciona que incorporações ao Forró ocorrem: ―[...] a partir do show [de Luiz Gonzaga] feito no Tereza Rachel, no Rio de Janeiro, em 1972, influenciado pelos líderes do movimento Tropicália. Nessa retomada o Forró sofre modificações, principalmente na instrumentação utilizada nas apresentações ao vivo‖. De acordo com o autor, desde então, passam a ser utilizados instrumentos elétricos, como guitarra, baixo e teclado, por Luiz Gonzaga. Mas, zabumba, sanfona e triângulo continuam em preponderante destaque. Luiz Gonzaga falece em 02 de agosto de 1989, ―[...] em conseqüência de um Câncer da próstata, osteoporose avançada e problemas respiratórios‖ (ECHEVERRIA, 2006: 19). Apesar de sua morte, o forró permanece vivo. Não apenas as canções de Gonzaga continuam sendo exaustivamente tocadas pelo Brasil, como nasceram novos e brilhantes seguidores. Para o músico Cicinho de Assis, a banda de Forró Pé-de-Serra atual conta fundamentalmente com: zabumba, triângulo, sanfona, baixo, guitarra, bateria e pandeiro. Cicinho afirma que as incorporações ocorrem para atender exigências do público atual, acostumado com modernas tecnologias instrumentais. Em entrevista sobre as necessidades 6 R.C.B., nº 7 – maio de 66. 19 atuais do gênero, Cicinho afirma: ―Porque chega num palco pra tocar, por exemplo, tem uma banda Calcinha Preta, um Magníficos, sei lá, entra com aquele som grande, pesado, você entra com a zabumba, o triângulo e a sanfona, seu som vai ficar miudinho‖. Outro artista entrevistado7, Coroneto, integrante do cinqüentenário grupo Trio Nordestino8 (atualmente o Trio Nordestino é composto por descentes dos primeiros formadores do conjunto: Luiz Mário, Beto Sousa e Coroneto) afirmou que o grupo se apresenta nos dias atuais com sanfona, triângulo, contrabaixo, bateria, guitarra, percussão, e duas backing vocals. O Trio compartilha da mesma opinião exposta por Cicinho de Assis sobre a inclusão de novos instrumentos nas suas apresentações: Porque você vai fazer um show, aí tem Calcinha Preta, por exemplo, com um milhão de instrumentos. Aí você vai tocar só os três. Pô! Você tocar para poucas pessoas é uma coisa, para milhares é outra. Tudo na vida evolui. O carro de trinta anos atrás não tem nada a ver com o carro de hoje em dia. O forró é remodelado; não se estagna e continua fazendo sucesso e garantindo uma faixa do público, a cada geração, a partir das reformulações que incorpora ao longo da história. Também como o samba, influencia músicos notórios, a exemplo de Chico Sciense e Raul Seixas. O gênero tem intenso prestígio no universo da música brasileira. Portanto, alguns grupos se apoderarem do termo como símbolo de qualidade, de brasilidade, mesmo não possuindo consideráveis semelhanças com o original, como o caso de novas músicas e de novas bandas de Forró Eletrônico. O Forró Pé-de-Serra evolui nos passos da música brasileira. Atualmente é reconhecido por apresentar como integrante preferencial o vocalista, que, muitas vezes, toca sanfona, acompanhado por mais dois artistas em destaque: um com triângulo e outro com zabumba. Este trio forma a linha de frente da banda. Os músicos com outros instrumentos ficam atrás, em segundo plano. É composto predominantemente por homens; nestas formações a presença feminina é basante incomum. O figurino é composto por elementos que 7 Entrevista realizada no dia 10 de maio de 2008, no restaurante soteropolitano Grande Sertão. O Trio Nordestino formado, originalmente, pelos baianos Evaldo dos Santos (Coroné), Lindolfo Mendes arbosa (Lindú) e José Pedro Cerqueira (Cobrinha), em 1958, tendo participado de trabalhos de Luiz Gonzaga, Elba Ramalho, Dominguinhos e Alceu Valença, entre outros. O Trio chega ao Rio de Janeiro, onde consolida carreira, em 1962. No início de 1970, surge o primeiro sucesso: Procurando Tú que ―ficou 90 dias nas paradas de sucesso vendendo mais de 1.000.000 de discos, ficando atrás apenas do Rei Roberto Carlos‖ 8. Em função do sucesso obtido pelo Trio, diversos outros grupos adotam a nomenclatura Trio, como Trio Pé Quente, Trio Araripe e Trio Forró Lunar. Disponível em www.trionordestino.com.br 8 20 caricaturam o imaginário sobre o nordestino, como sandálias de couro e blusas quadriculadas. Umas das canções mais famosas de Luiz Gonzaga, Asa Branca (assinada por Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira), de 1947, ―[...] adquiriu status de canção nacional pela popularidade adquirida através das apresentações de Luiz Gonzaga, e também em razão das contínuas reinterpretações, por novas gerações de artistas (RAMALHO, 2000: 73)‖. No texto da canção é possível identificar temáticas comuns ao Forró Pé-de-Serra: a seca, a alegria da festa junina, o uso de um linguajar próprio do homem interiorano. Tais temas são cantados por novos grupos forrozeiros, apesar de muitos estarem distantes da realidade descrita: Asa Branca Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira Intérprete: Luiz Gonzaga RCA Victor - 1947 Quando oiei a terra ardendo Qua fogueira de São João Eu perguntei a Deus do céu, uai Por que tamanha judiação. Que braseiro, que fornaia Nem um pé de prantação Por farta d'água perdi meu gado Morreu de sede meu alazão. Até mesmo a asa branca Bateu asas do sertão Então eu disse adeus Rosinha Guarda contigo meu coração. Hoje longe muitas léguas Numa triste solidão Espero a chuva cair de novo Para eu voltar pro meu sertão. Quando o verde dos teus oio Se espalhar na prantação Eu te asseguro não chore não, viu Que eu voltarei, viu Meu coração. Alguns artistas que podem ser classificados atualmente como forrozeiros pé-de-serra de sucesso nacional são: Flávio José, Alcymar Monteiro, Zelito Miranda, Targino Godim e 21 Dominguinhos. Este, juntamente com o Trio Nordestino, são os artistas mais antigos do Forró Pé-de-Serra e permanecem nas paradas de sucesso, fazendo turnês nacionais e internacionais. Segue a letra da canção ―Lhe esperando na janela‖, integrante no filme ―Eu, Tu, Eles‖9, que também contribuiu para destacar o Forró Pé-de-Serra já em 2000. Esperando Na Janela Composição: Targino Gondim, Manuca, Raimundinho Do Acordeon Intérprete: Targino Gondim Ainda me lembro do seu caminhar Seu jeito de olhar eu me lembro bem Fico querendo sentir o seu cheiro É da daquele jeito que ela tem O tempo todo eu fico feito tonto Sempre procurando mais ela não vem E esse aperto no fundo do peito Desses que o sujeito não pode agüentar E esse aperto aumenta o meu desejo E eu nao vejo a hora de poder lhe falar Por isso eu vou na casa dela Falar do meu amor pra ela vai Tá me esperando na janela Não sei se vou me segurar Por isso eu vou na casa dela Falar do meu amor pra ela vai Tá me esperando na janela Não sei se vou me segurar 1.4 O FORRÓ E A DÉCADA DE 1970 O forró sofre as primeiras alterações, incorporando novos instrumentos, a partir de 1972. Regina Echeverria (2006: 87) diz que Gilberto Gil e Caetano Veloso ―ressuscitaram‖ o forró no tropicalismo, movimento musical surgido na cidade de São Paulo, no fim da década de 1960, ―[...] por iniciativa de compositores baianos herdeiros da repercussão da bossa nova carioca nos meios universitários de Salvador [...] (TINHORÃO, 1991: 248)‖. 9 Direção de Andrucha Waddington, roteiro de Elena Soarez. Música de Gilberto Gil. 22 Tais acontecimentos permitem a alguns pesquisadores e artistas datarem a década de 1970 como o marco do Forró Universitário. No entanto, o estilo ganha repercussão apenas duas décadas depois, em 1990. Sobre esta periodização, Elba Braga Ramalho (2004), por exemplo, afirma: ―Citem-se, por exemplo, na década de 1970, a vertente universitária com Alceu Valença, Gonzaguinha, Elba Ramalho, Fagner, Geraldo Azevedo, Zé Ramalho, entre outros que, impregnados de matrizes oriundas do forró tradicional, introduzem padrões da música urbana‖. O músico Alcymar Monteiro10 também considera que no período acontece a primeira versão universitária, conferindo a Gilberto Gil grande responsabilidade por esta renovação do forró: ―Gilberto Gil já deu um ar de tropicália no forró, de modernidade na interpretação, usou aquelas gírias, que creio eu que ele levou dos terreiros daqui de candomblé. Coisas dos negros, das lavadeiras‖. O pesquisador Expedito Silva (2003: 103) apresenta a mesma opinião: ―O Forró Universitário surgiu a partir de 1975 (primeira fase) [...]‖. Já o artista Dominguinhos11, considerado o sucessor de Luiz Gonzaga, não concorda com a nomenclatura ―universitário‖ para o forró de 1970: ―O público do Gil e da Gal, naquela época de Caetano, que eram universitários, mas era o mesmo forró de antes. Não tinha forró. Ninguém ligava pra isso não, a música nordestina era muito sofrida. Era Gonzaga na proa e a gente seguindo ele, os trios‖. De acordo com esta segunda proposta, os músicos que tocam forró na capital baiana também não concordam com o fato, a exemplo dos artistas Verlando Gomes (banda Flor Serena) e Léo Macêdo (banda Estakazero). Todavia, haja vista as discordâncias, inconteste é que a década de 1970 marca o renascimento do prestígio conferido à música de Luiz Gonzaga. Sobre o período, Alberto Ikeda (1990: 10) considera: Ao mesmo tempo, foi moda a presença da música de forró (até como reação à invasão das discothèques) nos ambientes mais intelectualizados, como se viu nas promoções de noites de forró até nos centros das universidades. Também programas de TV surgiram como ―Sua Majestade o Forró‖ na TV Rio (Rio de Janeiro, 1975) ou os programas levados ao ar pela TV Gazeta de S. Paulo. Expedito Silva traz (2003: 96) o seguinte sobre a época: 10 11 Entrevista realizada no dia 16 de março de 2007, na casa de shows Coliseu. Entrevista realizada com o artista no dia 08 de março de 2008, na casa de shows Coliseu. 23 Além desses artistas [Jackson do Pandeiro (que cantava coco e rojão), Ludujero, Claudete Soares (“Princesinha do Baião”), Jair Alves (“Barão do Baião”) e Zé Gonzaga (Príncipe do Baião)], que ajudaram Luiz Gonzaga a reerguer o Baião em ritmo de forró, Gilberto Gil e Gal Costa – que eram do Movimento Tropicalista, e faziam grande sucesso naquela época – foram responsáveis pela volta de Luiz Gonzaga, convidando-o para participar de shows e programas de rádio e televisão. Ao receber o apoio desses artistas, Gonzaga começou a adaptar o Baião, foi mudando a batida do zabumba e utilizando uma linguagem e um ritmo que passou a se chamar forró. 24 CAPÍTULO II 2 OS NOVOS FORRÓS 2.1 FORRÓ ELETRÔNICO – FE O Forró Eletrônico materializa a extrema modernização e remodelagem do ritmo para as novas exigências do mercado fonográfico. O formato une o Forró Pé-de-Serra com modernos recursos tecnológicos disponíveis e sofre influência, sobremodo, da Axé-music e da Lambada. Elba Braga Ramalho (2004) afirma que o Forró Eletrônico (FE) apresenta alterações instrumentais inovadoras, incluindo sintetizadores e características eletrônicas, além da: ―[...] inclusão de dançarinos que, sob um ritmo mais acelerado, desenvolvem, de modo eletrizante, uma rica coreografia revestida de muita sensualidade‖. De acordo com Daniela Alfonsi (2007: 106), no Forró Eletrônico, o trio – sanfona, triângulo e zabumba – pode ser substituído pelo teclado. Outros instrumentos utilizados pelo FE, segundo a autora são: ―[...] baixo e guitarra elétricos, bateria, percussão e metais, tais como o saxofone e o trompete‖. Ana Cláudia Peres apud Raimundo Cordeiro (2002: 94) traz: O velho forró dos tempos do Rei do Baião ganha cara nova e troca os três moços de chapéu com camisa estampada por bandas; a zabumba, pela bateria; o triângulo, pela guitarra. Para alguns, é o fim do forró, já que a originalidade – característica prima – perde-se com a fusão dos ritmos. Para outros, o forró precisa de uma versão moderna. Afinal, até Luiz Gonzaga passou por isso quando abandonou o tradicional fole de oito baixos de seu pai pela sanfona de 120. Alguns artistas não consideram FE como forró. Dominguinhos, por exemplo, acredita que as bandas somente adotaram esta designação devido ao uso da sanfona nos shows. Ele afirma que12: ―O [forró] eletrônico é um tipo de música que eles não acharam um nome, que não é Forró, não é Baião, é uma coisa que eles inventaram, e pode cantar como quiser, fica meio sambado, um bocado de coisa‖. No jornal soteropolitano A Tarde, do dia 11 de abril de 2008, encontra-se opinião similar sobre o FE, proferida pelo forrozeiro baiano Adelmário Coelho: Tem bandas que fazem um bom trabalho, com boa qualidade, mas não representam a bandeira cultural do forró, é um outro formato, uma outra linguagem. Eu não vejo como forró, quando se fala da cultura tradicional, é um 12 Entrevista realizada com o artista no dia 08 de março de 2008, na casa de shows Coliseu. 25 segmento que se ancorou no forró, mas não tem nada a ver com a verdadeira cultura 2.1.1 A AXÉ-MUSIC E O FORRÓ Segundo Goli Guerreiro (2000: 133), a Axé-music nasce na Bahia na década de 1980. O estilo une ―[...] recursos do equipamento eletrônico dos estúdios de gravação‖, como o sampler, ―[...] um computador que armazena e reproduz sons por processo digital, por meio de tambores eletrônicos denominados pads‖, como também instrumentos típicos daquela década, a exemplo da guitarra, do baixo e do teclado, à base rítmica do samba-reggae, ―[...] produzindo uma espécie de samba-reggae pop/eletrônico‖, através da fusão do ritmo percussivo dos blocos afros com a música pop carnavalesca baiana. Esta fusão aproxima os jovens das classes média e alta da música dos blocos afros, antes quase ignorados por estes consumidores. É sob a inspiração da Axé-music que surge o Forró Eletrônico na década de 1990, em Fortaleza. O ritmo une um estilo musical antigo, o Forró Pé-de-Serra, a instrumentos modernos, além de incorporar diversos recursos eletrônicos. A Axé-music influencia o Forró Eletrônico não apenas na incorporação de novos recursos e instrumentos eletrônicos, como também no formato dos shows, com palcos recheados por dançarinas com vestimentas sensuais e danças com coreografias ricas e extravagantes. Assim como a Axé-music, o FE resulta na aproximação de jovens das classes médias e altas com estilos mais antigos e outrora por eles rejeitados. Desse modo, a juventude, consumidora significativa de produtos musicais, tem com o forró e o afro através destas novas misturas eletrônicas. Além disto, a Axé-music e o Forró Eletrônico fazem com que produções regionalizadas se expandam para os mercados nacionais e internacionais. No caso da Axé-music, o fenômeno influencia a procura pelos ensaios de blocos afros em Salvador, como Olodum e Ara Ketu. Já o Forró Eletrônico proporciona aos jovens o contato mais próximo com músicas de Luiz Gonzaga e seus seguidores, como Trio Nordestino e Dominguinhos. 26 Apesar de não classificar o FE como Forró, Dominguinhos considera que o estilo contribui com a divulgação do Forró Pé-de-Serra: ―Mas, é muito benéfico, eu acho, que eles fazem uma propaganda muito grande e isso ajuda a gente também‖. As críticas recebidas pelos dois estilos assemelham-se: ―O sucesso comercial da axé-music causou grande polêmica e o estilo foi inúmeras vezes acusado de ser uma arte menor, banal, vulgar, etc‖ (GUERREIRO: 2001;134). 2.1.2 A LAMBADA E O FORRÓ A Lambada é um gênero musical do estado do Pará, surgido na década de 1970, resulta de alterações ocorridas no merengue caribenho e no carimbó paraense: Transformados os antigos batuques de escravos e negros em carimbós destinados à diversão da gente humilde da periferia urbana do Pará, seria natural que neles se refletissem todas as vertentes culturais a que esse seu público tradicionalmente estivera exposto. E, entre elas, uma que durante mais de um século não deixaria de insinuar-se, por razões geo-histórico-sociais locais, seria da influência dos ritmos aparentados dos negros do Caribe (TINHORÃO, 1991: 282-283). No final da década de 1980, o ritmo obtém repercussão internacional, sendo que em 1990, a indústria cinematográfica de Hollywood lança seis filmes sobre a Lambada. Raimundo Cordeiro (2002, 87) conclui: ―Assim, é possível que a formação de um novo público dançante adepto da Lambada tenha motivado o surgimento de um forró mais acelerado do que o forró tradicional‖. Desde o período, a Lambada apresenta inclusões elétricas diversas: Transformada em mais um dos ritmos nos bailes de carimbó, a partir da década de 80 animados com o som das ―aparelhagens‖ (cerca de 300 conjuntos de caixas acústicas, amplificadores e equalizadores, apenas em Belém), a Lambada, beneficiada pela popularidade do próprio carimbo desde meados dos anos 70 no eixo Rio – São Paulo, acabaria transformando-se, ao lado da música nordestina de forró, em gênero obrigatório dos bailes de periferia por todo país (TINHORÃO: 1991, 289). A Lambada – a partir do carimbó – e o forró – a partir do Baião nordestino – têm origens em comunidades humildes, sendo muito tocados nos bailes das periferias brasileiras (TINHORÃO: 1991, 278). Os dois ritmos são trabalhados a fim de serem enquadrados na indústria cultural visando a despontarem nacionalmente: ―A história da explosão da Lambada paraense no verão europeu de 1989 como ritmo da moda em todo o mundo serve 27 para demonstrar, de maneira exemplar, o grau de manipulação que a indústria da música popular atingia na última década do século XX‖ (TINHORÃO: 1991, 278). Além da Lambada ter influência decisiva para a forma de se dançar o Forró Eletrônico, Raimundo Cordeiro (2002, 66) destaca a influência na instrumentação utilizada pelo Forró Eletrônico, especialmente pelo uso do saxofone: ―Isto talvez seja um indício da influência exercida sobre este segundo tipo de forró [o eletrônico] por estilos musicais do norte, como a Lambada e o carimbó, presentes nesta capital em épocas anteriores, período que se inicia no final da década de 1970 e se estende por toda a década de 1980‖. 2.1.3 O FORRÓ ELETRÔNICO, A EXPANSÃO DA INDÚSTRIA FONOGRÁFICA BRASILEIRA E O BREGA O Forró Eletrônico surge após expansão da indústria fonográfica brasileira, que, de acordo com Márcia Dias (2000, 55-57), deve-se a alguns fatores, como: ―[...] a consolidação da música popular brasileira e, conseqüentemente, o seu mercado‖; a ―[...] chegada definitiva do LP, no início dos 70 [...], a contribuição que as trilhas sonoras de novelas trouxeram para o setor fonográfico, sendo mesmo a elas creditado o crescimento do mercado nos anos 70‖, o que permite ―[...] restringir gastos e otimizar investimentos‖. A expansão da indústria fonográfica brasileira culmina em 1979, quando atinge o número recorde de 64.104 milhões de unidades vendidas, sendo 40.624 milhões de álbuns com canções nacionais (DIAS: 2000, 77). Estes números são especialmente alimentados pelo consumo da juventude brasileira. Assim, Raimundo Cordeiro (2002: 93) afirma que na segunda metade da década de 1980 ocorre a consolidação do mercado da música direcionado à juventude. Outro fator citado por Márcia Dias, quanto aos anos de 1970 e pertinente à compreensão do Forró Eletrônico, é a renovação do mercado de canções românticas, provocada pelo movimento da Jovem Guarda, preponderantemente influenciado pelo conjunto inglês The Beatles. A Jovem Guarda fez do artista Roberto Carlos um sucesso de vendas. De acordo com Dias: ―Esse segmento de mercado [canções românticas] explorava, igualmente, canções românticas consideradas popularescas e/ou próximas ao gênero sertanejo, que mais tarde viria a ser chamado de brega”. 28 José Tinhorão (2005: 223) comenta a influência do brega e de outros ritmos que modificam o repertório nas casas onde ocorrem bailes de forró, como pertinente à modificação no forró: [...] a ampliação do repertório da música tocados nos bailes com a progressiva substituição do trio básico de sanfona, zabumba e triângulo pela música eletroeletrônica de teclados e guitarras exigida pelo chamado estilo brega, representado ao tempo por artistas de grande popularidade como Waldick Soriano, Arnoldo Batista e Reginaldo Bessa. Diversificação de repertório logo seguida, por sinal, com o advento, na década de 1990, dos ritmos importados da dance music, do funk, do heavy metal e da techno music, que conduziriam o antigo som dos nordestinos à novidade do Forró Eletrônico, que para parecer mais moderno ganharia o nome de new-forró. Ainda segundo José Tinhorão (2005: 224), na década de 1990 ocorre também a adaptação do forró no sudeste, tanto em relação ao estilo quanto ao uso de instrumentos, ao gosto da classe média ―– inclusive com a ratificação pelo gosto internacional desde o lançamento, em 1991, do CD Forró etc., parte da série Brazil Classics, produzida pelo músico norte-americano David Byrne -, a ascensão social do forró pôde efetivar-se com toda a estridência eletroeletrônica‖. Tinhorão (2005: 224-225) considera 1995 como marcante para o forró expandir-se como recurso de entretenimento também da média; deixa de atender apenas ao restrito público amante da zabumba, sobretudo de classe baixa, mas também àquele que caracteriza como mais moderno ―[...] bandas como Mastruz com Leite, Limão com Mel e Magníficos. Todas, é claro, preocupadas em acrescentar ao som dos instrumentos regionais básicos os do saxofone, guitarra e bateria da música de consumo internacional‖. 2.1.4 A ELETRIFICAÇÃO E A JUVENTUDE O processo de modernização rítmica que culmina na inserção das nomenclaturas elétrico e eletrônico, no início da década de 1980, é proporcionado por diversas modificações tecnológicas musicais. De acordo com Richard Moore13, naquele período, a música se une à tecnologia eletrônica, alcançando, pois, ―um sucesso comercial sem precedente‖. Além disto, o autor aponta que o período se caracteriza pela proliferação de ―[...] bandas feitas inteiramente de sintetizadores e seqüênciadores [...]‖. 13 ://www.musica.ufmg.br/~gilberto/ATAM.PDF 29 Assim, a nomenclatura elétrico denomina o forró no mundo pop, em que os instrumentos baixo, bateria e guitarra são típicos (CORDEIRO, 2002: 102). No FE, a agregação destes instrumentos é preenchida em especial pelo teclado eletrônico. Márcio Madeira (2002, 31) justifica a nomenclatura Elétrico para o forró destas bandas, em função do: [...] uso de instrumentos elétricos, ou ‗plugados‘, quer dizer, a amplificação do som [...] Eletrônico porque faz uso de instrumentos como o teclado, que por possuir um banco de memória com timbres (samplers) de vários instrumentos, muitas vezes ‗substitui‘ o timbre da sanfona e de outros instrumentos. Tais recursos elétricos aproximam o gênero da juventude daquela época, além das novas bandas utilizarem no seu repertório canções nacionais e internacionais da década de 1990. Uma distância de quase 40 anos motiva transformações no forró enquanto gênero musical. A juventude de 1990 não vivencia a realidade Gonzaguiana, ao invés, afasta-se dela, não só na temática, mas também na influência de novas tecnologias musicais e novos ritmos, como a Lambada, que de acordo com Raimundo Cordeiro (2002, 84), está presente desde o final da década de 1970 na vida do jovem de Fortaleza, local onde surge o FE. Assim, o ―velho‖ para estes jovens acaba por ser algo extremamente ―novo‖, difícil de ser aceito e tecnologicamente distinto das suas expectativas auditivas. Raimundo Cordeiro (2002, 100) considera: A exposição constante do jovem de Fortaleza ao forró dos anos 90, como estamos chamando, pode levá-lo a considerar este como o único modelo aprendido e vivenciado do gênero, rejeitando, quando lhe é dada oportunidade de ouvir, o forró tradicional da década de 1940/50, seja pela qualidade técnica da gravação (no caso do material fonografado) seja pelo som característico do conjunto instrumental, seja pelo timbre dos vocais que repetem o refrão, seja porque este forró não se adapta ao seu modo de dançar [...]. É mais fácil para o jovem em 1990 aceitar um forró próximo às letras que seus ouvidos estão acostumados, como a música romântica, ou a brega e a Lambada. Nesse sentido, Theodor Adorno (1986:142) alude: ―Qualquer fórmula rítmica que esteja fora de moda, não importa quão quente ela seja em si mesma, é considerada ridícula e, por isso, categoricamente rejeitada ou apreciada com a presunçosa sensação de que as modas agora familiares ao ouvinte, são superiores‖. 2.1.5 AS BANDAS 30 Os grupos do início da década de 1990, diferente de Luiz Gonzaga, não representam o estereótipo do sertanejo. No entanto, mesmo com figurino distinto das indumentárias que caracterizam os trios de forró iniciais – gibões, chapeis, perneiras de couro utilizadas por vaqueiros – apresentam, nas letras das canções, elementos significantes do imaginário nordestino, como se observa em alguns textos interpretados pela banda Mastruz com Leite14: Aboio para Ninar Morena Luiz Fidéliz Intérprete: banda Mastruz com Leite Álbum: Em Todo Canto do Mundo tem Cearense SomZoom Studio, 1996 Morena pare de chorar Morena o que é que tu tem? Morena, pare de chorar Morena, se tu não parar Morena eu vou chorar também Morena, pare de chorar Morena, minha morena Morena, um dia eu vou voltar Morena, pare de chorar Morena, vale eu te amar Valeu o boi, valeu a pena Morena, pare de chorar Morena, pra que desespero Morena, eu vou me desquitar Morena, pare de chorar Morena, se o boi passar Passa o cavalo e o vaqueiro Baião de Dois Luiz Fidéliz Intérprete: banda Mastruz com Leite Álbum: Solando para você cantar e dançar. SomZoom Studio, 1998 A gente bem que podia Se juntar de vez Compartilharemos o nosso sertão Acordar ouvindo O chocalho da rêz A gente bem que podia 14 http://www.mastruz.com.br/, acesso em 25/02/2008 31 Se juntar de vez Tá de manhã no curral Tomar um leite mais puro Cantar varrendo o muro O nosso quintal Colher tomate, cebola Banho de açucar com sal De noite um bom baião de dois Pra que deixar pra depois Se a gente pode se amar A referida banda surge em novembro de 1990. É pioneira na modalidade forró eletrônico e, em curto período, alcança sucesso nacionalmente. A estrutura empresarial da Somzoom Gravações e Edições Musicais LTDA, em Fortaleza (CE), encarrega-se de difundir a banda e o ritmo pelo Brasil. Como aparato instrumental a banda conta com ―[...] guitarra elétrica, baixo, bateria, teclado eletrônico, sanfona e metais (saxofone, trompete e outros) (ALFONSI: 2007, 36)‖. Segundo Maria Lima (2007: 3), o objetivo da Somzoom em relação ao surgimento da banda é ―[...] apresentar uma nova estética para o forró tradicional e como evolução do próprio forró; comercial: a partir da perspectiva da música-mercadoria enquanto produto de consumo [...]‖. Com a consagração da Mastruz com Leite, o ritmo passa a ser tocado por outros grupos, consolidando o movimento do new-forró. A Somzoom funda uma rádio via satélite cujo ―carro-chefe‖ é o forró: ―Diante desse projeto comercial, o formato de filiação à rede, com conteúdo de forró, origina-se no Brasil. Assim, o ritmo forró é atrelado a uma transmissão via satélite, procedimento semelhante ao que as emissoras Jovem Pan e Transamérica efetivam com o dance music (Lima, 2007: 6-9)‖. A empresa é comandada por Emanoel Gurgel que além da Mastruz e da rádio possui também outras bandas de forró eletrônico: Cavalo de Pau, Mel com Terra, Catuaba com Amendoim e Forró Rabo de Saia. As cifras astronômicas das vendas podem ser exemplificadas com o caso de Emanoel Gurgel que recebe, a partir de 1993, cerca de US$ 150 mil com o sucesso da música ―Meu vaqueiro, meu peão‘‘, composta por Rita de Cássia, primeira faixa do segundo CD gravado pela banda Mastruz com Leite. Desde 1990 ocorre a proliferação de grupos musicais que fazem sucesso e motivam artistas e empresários a formarem novos grupos. De acordo com Ana Pessoa (1998:2), ―A decisão de 32 apostar no forró se deve a dois fenômenos. O primeiro é o sucesso do gênero no eixo Rio— São Paulo em danceterias de classe média. O segundo é a nova vitalidade do ritmo no Nordeste do país‖. Aponta ainda outro fator importante para o sucesso do forró eletrônico: a performance vocal dos grupos é acompanhada de uma performance coreográfica: a música rege ―uma coreografia sensual‖. Nesse sentido, o movimento do forró eletrônico preenche uma lacuna deixada no país desde o final da moda da Lambada. [...] existe o fato de que é um tipo de música que vem acompanhada de uma coreografia sensual, algo que está meio em falta no mercado brasileiro desde que a Lambada saiu de moda. Como se sabe, turistas em férias em Porto Seguro e outros paraísos tropicais adoram trocar umbigadas com as nativas, e estava faltando uma trilha sonora adequada para essa prática (PESSOA; 1982: 2). Os primeiros nomes de Forró Eletrônico que despontam, além de Mastruz com Leite, são: Magníficos (Paraíba), Calcinha Preta (Sergipe – venda de 100 mil cópia no primeiro disco lançado15), Limão com Mel (Ceará), Caviar com Rapadura (Ceará), Mulheres Perdidas, pertencente aos empresários da banda Calcinha Preta, e Raio da Silibrina (Sergipe). Nas apresentações de forró eletrônico, os cenários são ricos e há diversos recursos visuais: luzes cênicas, corpo de baile com mais de oito componentes com corpos esculturais, que desenvolvem coreografias teatrais e substituem, periodicamente, as indumentárias sensuais do figurino. Além disso, a banda musical é composta por diversos músicos e uma média de quatro vocalistas que tanto se revezam ao longo do espetáculo como cantam em conjunto. Andréa Pinheiro e Flávio Pávia (2007:3) afirmam que Emanuel Gurgel opta por bandas com grande número de músicos e dançarinos para manter o ritmo acelerado durante todo o espetáculo, haja vista julgar que os intervalos desanimam o público e arrefecem as festas. Para viabilizar a longa jornada adotada de quatro ou cinco horas de show, sem interrupção, Gurgel forma um grupo maior que possibilite o revezamento no decorrer do espetáculo. Outras bandas seguem o mesmo procedimento: formam equipes artísticas numerosas. A banda Caviar com Rapadura, por exemplo, possui 14 componentes e oito bailarinos16; a Limão com Mel conta com três vocalistas, duas backing vocals, sete músicos e oito bailarinos17. Por sua vez, Calcinha Preta e Magníficos possuem quatro vocalistas. 15 http://www.bandacalcinhapreta.com.br/v2/portuguese/navigation/content/homepage/, acesso em 11/01/2008. http://www.imusica.com.br/artista.aspx?id=1242&bio=1, acesso em 11/01/2008. 17 http://www.limaocommel.com.br/modules.php?name=Content&pa=showpage&pid=140, acesso em 05/02/2008. 16 33 Em geral as letras das canções interpretadas pelas bandas de FE não são de autoria dos membros dos grupos, inclusive muitos dos intérpretes responsáveis pela gravação de Cds em estúdio (com exceção dos vocalistas principais) não são os mesmos das apresentações no palco. Outra característica destas bandas é o fato de não destacar os componentes, fator que os torna facilmente substituíveis. Os encartes dos CDs, por exemplo, não apresentam fotografias ou imagens dos integrantes, pois as estratégias de marketing promovem o nome da banda e não o dos músicos, assim como são escolhidos vocalistas com vozes comuns ao FE, para facilitar eventuais substituições. No FE é significativa a presença de cantoras, em contraposição ao forró até então: a predominância do canto masculino (MADEIRA: 2002, 43-46; 53-54): Ainda sobre o FE, a presença de figuras femininas assumindo a liderança desses conjuntos musicais, é em boa parte, ou na maioria das vezes, uma tentativa de utilizar a imagem feminina para atrair a atenção de um maior público. A maneira sensual de cantar, com suspiros, gemidos e a predominância da voz grave, procuram ganhar a atenção dos ouvintes, até mesmo pelo conteúdo das letras das músicas. Quanto às principais características instrumentais, no FE, a bateria é o condutor do ritmo e não a zabumba; o saxofone é muito presente, assim como há o uso de guitarras e sintetizadores. Apesar da zabumba, da sanfona e do triângulo continuarem nas bandas, eles não são mais preponderantes. Com o passar dos anos, as letras do forró eletrônico fazem crescente uso do romantismo brega e aumentam o apelo do duplo sentido, relembrando as letras do Forró Malícia, conhecido também como Forró Escrachado, Pornoforró e Forró Sem-vergonha, estilo difundido por músicos como Sandro Becker e Genival Lacerda18, com letras de duplo sentido: O Gato Tico19 Intérprete: Genival Lacerda Tico-Tico é um gato Que a Maria quer bem Não da, não vende, nem troca 18 Cantor e compositor nascido em 1931, em Campina Grande/ Paraíba, já gravou 70 discos e participou de três filmes: http://pt.wikipedia.org/wiki/Genival_Lacerda, acesso em 10/01/2008. Sua música mais famosa foi Severina Xique-Xique, em 1975: http://cliquemusic.uol.com.br/artistas/genivallacerda.asp, acesso em 28/02/2008 19 http://letras.terra.com.br/genival-lacerda/600520/, acesso em 28/02/2008. 34 E não empresta a ninguém O tico tem um defeito Que nem da pra consertar O defeito do tico É que é danado pra miar Tico mia na sala, Tico mia no chão Tico mia na cozinha, encostado no fogão Tico mia no tapete, Tico mia no sofá Tico mia na cama, toda hora sem parar Tico mia na colo, Tico mia no chão Tico mia sentado, em frente à televisão Tico mia na cadeira, e na hora de deitar Tico mia na cama, toda hora sem parar O Forró Malícia surge entre a década 70 e 80, como tentativa forrozeira de sobrevivência em meio à forte presença da música internacional, sobretudo das músicas norte-americanas de discoteca no Brasil. Daniela Alfonsi (2007:36) complementa: O forró ganhou, em diferentes momentos, algumas denominações, tais como péde-serra, raiz, romântico, forrónerão, eletrônico, estilizado, de plástico, cearense, oxente-music, universitário, forreggae, forró malícia, lambaforró. Cada termo refere-se a uma maneira de dar sentido à prática e relacioná-la a um fazer musical específico. Assim, por exemplo, o forró malícia, também chamado de semvergonha, é caracterizado por suas letras com ―duplo sentido‖, que fazem referência velada, sobretudo, a atos sexuais: "Na hora do jantar / eu como nabo, Dinha" (Bilhete pra Comadre Dinha, de Clemilda) e também: ―Essa minha namorada é assim mesmo / Enquanto eu não dou capim canela ela não dorme" (Capim Canela, de Pintacuia) ou ainda a letra de Pagode Russo, de Luiz Gonzaga, que diz: "Vem cá cossaco / Cossaco dança agora / Na dança do cossaco / não ficá cossaco fora" (ALFONSI, 2007: 36). As bandas do Forró Eletrônico formadas a partir do final da década de 1990 resgatam o erotismo e o apelo sexual do pornoforró, utilizando expressões usais dos jovens da época. Segue trecho musical cantado pela banda Garotões do Forró, formada em 2006, no Rio Grande do Norte20: ―Toma gostosa lapada na rachada/ você pede que eu te dou lapada na rachada/ e ai tá gostoso lapada da rachada/ toma, toma, toma, toma/ Vi uma menina linda a danada enlouqueceu a macharada ficou doida quando ela apareceu‖. Assim, na década de 2000, continuam surgindo bandas de Forró Eletrônico, oriundas, em especial, do Ceará e o do Rio Grande do Norte. A Garotões conta com um anão, que se 20 Apresentou-se em 2007 como uma das atrações principais do São João de Amargosa – cidade do interior baiano, onde ocorre há mais de 10 anos o São João, recebendo neste ano cerca de 70 mil turistas, de acordo com Alexandre Liberato (empresário, sócio da maior festa particular da região: Forró do PiuPiu). 35 fantasia de bebê e dança durante a apresentação. Faz parte também destas novas bandas, a Cavaleiros do Forró, do Rio Grande do Norte, formada em novembro de 2001 e a banda Aviões do Forró, criada em agosto de 2002, no Ceará, com dois vocalistas, um homem e uma mulher. Esta, ao contrário do que é comum em bandas de Forró Eletrônico, não conta com corpo escultural. O quarto CD da Aviões vende 700.000 cópias e em maio de 2008, a banda fez turnê pelos Estados Unidos. Na década de 2000, outra banda de destaque é Saia Rodada, do Rio Grande do Norte. Formada em 2001, é empresariada pela mesma produtora da banda Calypso: a Luan Promoções e Eventos. Esta, por sua vez, surge em 1999, em Belém do Pará e fica entre o limiar do forró eletrônico e outras definições, como ritmo calipso, tecnobrega, brega paraense ou novo brega: ―Seu nome foi inspirado no ritmo tocado no sul do Caribe, que, no Pará, adquire uma cadência próxima ao Ska, mixando o iê-iê-iê da Jovem Guarda, rock, folk, country, Lambada e ritmos de raiz paraense‖ 21. Hermano Vianna (2007) traz o seguinte: ―Os músicos locais já nem chamam o que fazem de brega, dizem que é ‗calipso‘, música mais sofisticada‖. As semelhanças da Calypso com o forró eletrônico ocorrem em função da época em que foi criada, da grande equipe de trabalho, composta por 47 profissionais, sendo cinco bailarinos, uma vocalista, Joelma, um guitarrista, seu marido, Chimbinha, do figurino sensual e das letras das músicas22, que também apelam para o romantismo brega: Feito Tatuagem23 Composição: Adilson Ribeiro Intérprete: Banda Calypso Álbum: Banda Calypso Volume 1 - 1999 Tanto tempo se passou Mas você em mim ficou Como uma tatuagem Pra lembrar o que passou Mas você onde andará? Será que me esqueceu? Onde você estará? Ou será que já morreu? 21 http://www.dicionariompb.com.br/detalhe.asp?nome=Banda+Calypso&tabela=T_FORM_E&qdetalhe=his, acesso em 12/12/2007. 22 http://www.bandacalypso.com.br/, acesso em 03/03/2008. 23 http://vagalume.uol.com.br/banda-calypso/feito-tatuagem.html, acesso em 28/01/2008. 36 Ligue pra dizer Que o seu amor ainda é meu Ligue pra dizer Que é impossível me esquecer Algumas músicas são compostas pelos mesmos profissionais do forró eletrônico. Hermano Vianna (2007) sobre encontro com a banda Calypso traz: ―Os compositores estão presentes. Não compõe apenas para a Calypso, mas também para a Calcinha Preta e várias outras bandas que fazem o Brasil popular de hoje cantar e dançar‖. No site oficial da banda, há informações que revelam seu sucesso fonográfico: ―Em 8 anos de carreira já vendeu 8 milhões de cópias entre CD‘s e DVD‘s.‖ Segue notícia ilustrativa publicada na primeira página do Jornal A Tarde do dia 06 de junho de 2008, relacionando a Calypso com o forró, como normalmente acontece: ―Em ritmo de forró. Começa hoje a maratona de forró. A 16ª edição do Arraiá da Capitã reúne Calypso, Magníficos, Flávio José, Cavalo Doido e Calcinha Preta, dentre outros, no Parque de Exposições‖. O forró eletrônico é um espetáculo que explora o erotismo e leva o público a uma esfera distante da realidade cotidiana. Antonio Rubim (2005: 13) afirma que: O espetáculo remete também à esfera do sensacional, do surpreendente, do excepcional, do extraordinário. Daquilo que se contrapõe e supera o ordinário, o dia-a-dia, o naturalizado. A instalação no âmbito do extraordinário potencializa a atenção e o caráter público do ato ou evento espetacular. A ruptura da vida ordinária é produzida pelo acionamento de inúmeros expedientes, em geral, de modo intencional, mas, em alguns horizontes, até mesmo de maneira não prevista. De acordo com Rubim, nossa sociedade tem tendência ao espetacular, a chamar e disputar a atenção das audiências (RUBIM, 2005, p. 22). O show espetacular do Forró Eletrônico é inovado pelas bandas que desesperadamente tentam, cada vez mais, chamar a atenção do seu público, haja vista as apresentações serem o foco de interesse dos empresários desde que o avanço da pirataria fonográfica no Brasil, fê-los perder milhões com a venda de discos. Atualmente, o CD não é mais a principal fonte de renda da Somzoom, pois há alguns anos ganha mais dinheiro com as festas. Para Gurgel, o CD serve ―[...] basicamente de peça 37 promocional da empresa‘‘ (PINHEIRO e PAIVA, 2007: 7), pois acredita que quanto mais disseminar as músicas mais gente comparece aos espetáculos. O FE possui muitos fãs. Mas, em contrapartida, também é descriminado por ser, em comparação a outros estilos de forró, considerado musicalmente pobre. Nas entrevistas realizadas com músicos mais tradicionalistas ou do movimento universitário, são perceptíveis referências pejorativas ao gênero, como a expressão forró de plástico. Sobre esta discriminação, Hermano Vianna (2007) reflete: ―Um dia, quando um cantor chique fizer uma versão, todo mundo vai achar bacana. Mas é preciso tempo: o popular muito popular só se torna elogiável quando sua popularidade é coisa do passado, não é mesmo?‖. Teixeira Coelho (1986: 17) também trata do assunto ao se referir a passagem do jazz, de música discriminada à música consumida pela alta sociedade: A respeito, deve-se lembrar que freqüentemente, na história, a passagem de um produto cultural de uma categoria inferior para outra superior é apenas questão de tempo. É o caso do jazz, que saiu dos bordéis e favelas negras para as platéias brancas dos teatros municipais da vida. 2.2 FORRÓ UNIVERSITÁRIO – FU Na segunda metade da década de 1990, Expedito Silva (2003: 104) comenta que ocorre a explosão do Forró Universitário, agora mesclando ―[...] elementos do Forró tradicional com fórmulas-padrão de reggae, rock, jazz, salsa, entre outras (RAMALHO, 2004)‖. Diferentemente do Forró Eletrônico, o universitário apresenta alterações instrumentais menos radicais. Em geral, as bandas acrescentam apenas a bateria e/ou a percussão, o que já era realizado por artistas seguidores do forró pé-de-serra. Para Daniela Alfonsi (2007: 106), a sanfona, a zabumba e o triângulo são essências aos admiradores do Forró Universitário. De acordo com Daniela Alfonsi (2007:39), a nomenclatura universitário origina-se no fato das primeiras festas na capital paulista terem acontecido em faculdades, ou em outros locais, mas organizadas por universitários da classe média paulistana. A autora comenta ainda que: ―[...] tal público era formado, de maneira geral, por alunos da USP e PUC-SP e por um conjunto de escolas privadas conhecido como colégios do grupo, do qual fazem parte, dentre 38 outros, o Colégio Equipe, Logos, Oswald de Andrade e Vera Cruz‖. Ressalta também que os meios de comunicação ajudam a fixar a nomenclatura universitário: Os meios de comunicação de massa (jornais, televisão, revistas) ajudaram a divulgar o rótulo universitário ao noticiar ―a mais nova moda‖. Assim, além de distinguir um estilo musical diferente daquele executado pelas bandas nordestinas do forró eletrônico, o termo universitário designou também uma forma de lazer relacionada a um público jovem e de classe média, em contraposição aos bailes de forró das grandes cidades freqüentados por pessoas das camadas populares (ALFONSI, 2007: 39). Alfonsi (2007: 46) traz interessante comparação entre o FE e o FU, em consideração ao Forró Pé-de-Serra: O forró eletrônico opera a partir do que é considerado mais ou menos ―animado‖, enquanto o universitário, em ambos os esquemas apresentados, seleciona a partir do que é tido como mais ou menos ―raiz‖, isto é, fiel à origem. Desse modo, a própria origem assume significados distintos: para o primeiro é um ponto de partida para a história de evolução do forró; para o segundo é a forma a ser resgatada e seguida. O Forró Pé-de-Serra e o Forró Universitário se assemelham. Este fato se justifica por que o segundo surge como tentativa de resgatar o primeiro. Os adeptos do Forró Universitário defendem que o estilo é muito similar à música de Luiz Gonzaga e aderem ao forró apresentado na década de 1950. Todavia, apresentam elementos distintivos, sobretudo indumentárias que caracterizam os artistas – o Universitário utiliza camisas floridas e coloridas, enquanto o Pé-de-Serra usa emblemas do sertão, como o chapéu de couro e o gibão. Há também distinção na linguagem com que compõem as letras: o FPS utiliza variante linguística mais consoante com regiões rurais. Quanto a este aspecto, Cicinho de Assis24 afirma que o atual Forró Pé-de-Serra, em comparação ao Universitário, ―é mais matuto, aquele linguajar mais matuto‖. Além disso, as faixas etárias são diferenciadas, no Forró Pé-de-Serra os músicos possuem idades, predominantemente, acima de 30 anos, enquanto no Forró Universitário as idades concentram-se nos 25 anos, em média. Outra diferença se refere à apresentação das bandas: o FU não é apresentado em trio, como também o vocalista não exerce a função de sanfoneiro: Já com os adeptos do ‗movimento de forró universitário‘, percebe-se uma atitude de ‗soldados‘ na luta pela busca do ‗forró tradicional‘. Todavia, permitem-se uma 24 Entrevista realizada com o artista no dia 08 de março de 2008, na casa de shows Coliseu. 39 enxurrada de contradições, ao começar pela própria formação que não é do ‗trio de forró tradicional‘ como querem e admitem ser. A heresia de que o cantor não é o sanfoneiro também é posta de lado, deixando esse papel para um vocalista, que, geralmente, dotado de uma aparência física natural do ‗modelos de propaganda‘ ou ‗galãs de novela‘, com roupas da moda, cumprem o papel a que se propõe. É comum entre essas bandas de FU, a presença de um sanfoneiro de maior idade que os outros integrantes, e geralmente, nordestino (MADEIRA, 2002: 49). Márcio Madeira (2002: 4) classifica este forró como sudestino, pelo fato de originar-se em São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo, em contraposição ao Forró Pé-de-Serra e Eletrônico, cujo os berços é o Nordeste. Daniela Alfonsi (2007: 40) também faz referência ao termo sudestino, mas como uma resposta a visão de que universitário seria uma nomenclatura preconceituosa, por englobar apenas este público, excluindo os demais e os freqüentadores deste novo forró não são apenas universitários. Como nomes nacionais inicialmente representantes deste estilo, cita-se ―[...] a Banda Falamansa, a Banda Mafuá, o Trio Virgulino, o Trio Sabiá, o Trio Rastapé, Forróçacana, Forrozão, Mestre Ambrósio, Cascabulho, Querosene Jacaré, entre outros (SILVA, 2003: 104)‖. Outra banda que tem conseguido destaque nacional é a Circuladô de Fulô, criada também em São Paulo, em 2000, em cujo instrumental se destaca guitarra, triângulo, percussão, violão e sanfona. Expedito Silva afirma que estas bandas voltam a destacar o trio principal do forró tradicional: a sanfona, a zabumba e o triângulo. Quanto ao início do movimento em São Paulo, o autor diz: ―Esse movimento, em São Paulo, teve início nas dependências de uma ONG que leva o nome de Espaço Cultural Projeto Equilíbrio‖. Daniela Alfonsi (2007: 50) também apresenta o espaço como reconhecido por ter iniciado ―[...] o modo de se organizar festas posteriormente chamadas de forró universitário‖. Sobre este espaço, Expedito Silva (2003, 106) descreve: ―O forró universitário também deve o seu nascimento pela iniciativa de uma roqueira paulista conhecida por Lu Brandão, que é mãe de dois grandes músicos: Branco Melo, integrante do grupo de rock Titãs, e Paulinho, conhecido pelo nome de Primo Preto por defender a música black no Brasil‖. De acordo com Silva, Lu Brandão é, juntamente, com o dono da casa, professor Vagner, onde se inicia o Projeto Equilíbrio, responsável pela consolidação do forró universitário. Em Silva (2003, 106), encontra-se depoimento de Lu Brandão: ―O surgimento do forró universitário aconteceu entre 1996 ou 40 1997, sendo eu a primeira a incentivar esse segmento de forró e a expandi-lo através da mídia, desde o rádio, televisão, jornais e revistas, etc‖. Segundo José Tinhorão (2005, 225), no início do século XXI, os jovens da classe média paulistana começam a freqüentar casas de shows movimentadas pelo som do forró atualizado. Localizadas na Zona Leste, as casas Moinho Santo Antonio, Radícula São Luís, Galpão 16, KVA, Remeleixo, Gostoso Demais e o próprio Projeto Equilíbrio atraem público de áreas nobres da cidade. O artigo de Mônica Loureiro (2001), complementa: [...] a invasão do forró no Sudeste/Sul não pode mais ser encarada como modismo. Os bailes já fazem parte dos roteiros dos jornais, saindo dos subúrbios e se espalhando pela cidade. A juventude bem-nascida não só adotou o "rela-buxo" dos salões como também resolveu ocupar o palco. O número de grupos formados por forrozeiros que não ultrapassam a média dos 25 anos de idade é cada vez maior. Em São Paulo, o Falamansa tornou-se um fenômeno de vendas; no Rio, o Forróçacana é o mais requisitado para shows. O forró universitário regrava, em especial, músicas de Luiz Gonzaga, de Jackson do Pandeiro e de João Vale. Além dos tradicionais forrozeiros, o FU utiliza versões de reggae da Música Popular Brasileira (MPB), como também cria novas canções. Quanto maior o número de músicas próprias, mais respeitada é pelo público. As músicas próprias são inspiradas no forró tradicional, no samba, na música caipira e em estilos regionais. Preferem uma aproximação com o folclore e não com a música do mundo pop: A idéia de ―raiz‖, central na definição do que venha a ser forró para esse padrão estético, define também as preferências musicais desses forrozeiros. Prefere-se o som acústico ao amplificado, os instrumentos de corda (violão, viola caipira, cavaquinho) aos metais, a percussão feita com a zabumba, o pandeiro, o surdo à batida pop da bateria (ALFONSI, 2007: 125). É uma expressão muito comum entre os jovens do FU e os adeptos do reggae a gíria roots. De acordo com Daniela Alfonsi (2007:71): O uso da palavra inglesa significando raízes tornou-se uma gíria entre os forrozeiros. Dessa maneira, caracteriza-se uma festa, uma música, uma banda, uma maneira de dançar, uma forma de se vestir e até uma pessoa como ―roots‖. ―Aquele cara é muito roots‖ quer dizer, no contexto dos bailes, que ele freqüenta o forró há muito tempo, é ―das antigas‖. Já, ―aquela música é roots‖ trata-se ou de uma gravação antiga, de meados da década de 1940 ou 1950, ou que sua forma de execução remete-se a esse período. 41 Assim, para os jovens do FU, quanto mais roots melhor. Nesta intenção de voltar-se para o original, para o roots, ocorrem eventos singulares na cidade de São Paulo. O mais diferenciado é o Forró Secreto. Recebe tal nomenclatura por não ser divulgado e ser freqüentado apenas por convidados, ou indicados por quem já é freqüentador. É proibido divulgar ou comentar com pessoas que não integram este círculo fechado, onde será o próximo evento de Forró Secreto. Nas festas, escutam-se execuções de músicas das décadas de 1940 e 1950, especialmente. Quando as bandas criam novas músicas, Expedito Silva (2003, 104) apresenta o seguinte: ―Conforme afirmam os integrantes das principais bandas, as composições geralmente visam ao entretenimento, contribuindo para que as pessoas se sintam bem‖. O site da banda Falamansa25 traz ― "Segue a vida", sexto trabalho do grupo que sintetiza o projeto musical da banda: aliando as ideologias a mensagens positivas de alegria, amor e fé, conscientização social e ambiental. Como sucede com as letras do FU, em geral. Para ilustrar, segue a letra do grupo Falamansa: Rindo à Toa Álbum: MTV ao Vivo 2005 Tô numa boa Tô aqui de novo Daqui não saio Daqui não me movo Tenho certeza Esse é o meu lugar Ah Ah!... Tô numa boa Tô ficando esperto Já não pergunto Se isso tudo é certo Uso esse tempo prá recomeçar Ah Ah!... Doeu, doeu, agora não dói Não dói, não dói Chorei, chorei 25 http://www.falamansa.art.br/default1.asp, acesso em 01/03/2008. 42 Agora não choro mais... Toda mágoa que passei É motivo prá comemorar Pois se não sofresse assim Não tinha razões prá cantar... Há Há Há Há Há! Mas eu tô rindo à toa Não que a vida Esteja assim tão boa Mas um sorriso ajuda a melhorar Ah Ah!... E cantando assim Parece que o tempo voa Quanto mais triste Mais bonito soa Eu agradeço por poder cantar Lalaiá Laiá Laiá Iê!... Avisa Falamansa Quero ver quem segura essa barra Até a hora que eu voltar Vou sair pra preencher um vazio no peito Tô meio sem jeito de falar Quero ver se eu cair agora Quem é que vai me levantar Já pedi ao sol, Já pedi ao mar Já pedi à lua Às estrelas do céu já pedi Quase tudo que consegui Eu ganhei da rua Deixo na mão de quem quiser Deixo na mão de quem quiser Deixo na mão de quem quiser É que eu não sou um ator E se eu sinto dor Tenho que chorar Avisa, avisa, avisa , avisa Avisa Se o sol brilhar de novo no horizonte. Avisa E pode ter certeza que eu tô lá pra ver. Avisa Se a liberdade te trair e precisar de alguém. Avisa 43 Ou se tudo correr bem e não precisar. Avisa Parece até que o vento traz o sentimento. Avisa Ele nem faz questão de nos avisar. Avisa Pro vento que traz sofrimento Que sopre pra outro lugar. Avisa Pro vento que traz amor Não vejo a hora de você chegar. O FU também é influenciado pela Lambada. No site Forró Brasil26, o forrozeiro Dominguinhos fez a seguinte declaração a respeito das bandas universitárias: ―A maioria destes grupos se formou após a febre da Lambada e a música que eles fazem é chamada de lambaforró. A dança também se modificou, assimilando passos da Lambada (principalmente os giros)‖. O público do forró universitário dança em pares mistos com os corpos bem próximos, alternado esses momentos com pequenas coreografias de giros e rodopios. A dança é novidade. Esta é ensinada em escolas de dança, tanto no sudeste quanto no nordeste. De acordo com Daniela Alfonsi (2007: 116): O forró universitário tornou-se conhecido por ter criado um jeito específico de dançar o forró, diferente do modo com que freqüentadores das casas de forró eletrônico dançam. Assim, a maneira de dançar o forró universitário, segundo seus freqüentadores, é considerado algo novo, inventado, ao contrário da música, que teve de ter suas origens resgatadas, na concepção nativa. Os movimentos são realizados a partir dos corpos juntos, intercalando-se as pernas. O tronco acompanha o movimento dos quadris, que balançam de acordo com o ritmo da música: quanto mais lenta, mais acentuado é o movimento e mais caloroso, o ―chamego‖. A posição das mãos e braços pode variar em cada parceiro, em cada música e até mesmo em cada passo, mas em geral o homem abraça a mulher na altura da cintura; e a mulher, a nuca do parceiro. O tronco do homem inclina-se mais do que o da mulher, como se ele estivesse por cima dela. Os rostos, na maior parte do tempo, permanecem colados. Assim como no forró eletrônico, os grupos musicais são compostos predominantemente por músicos jovens. No entanto, as bandas são bem menores e não possuem corpo de baile. A formação dos grupos é quase totalmente masculina. Não se sabe ao certo onde o Forró Universitário nasceu: se em Caraíva, no extremo Sul baiano, ou em Itaúnas, no Espírito Santo. Mas é certo que o movimento ganha força no 26 http://www.forrobrasil.com/es/curiosidades_2.cfm?curiosidade=16http://www.forrobrasil.com/es/curiosidades_ 2.cfm?curiosidade=16. 44 estado de São Paulo, onde se originam as principais bandas, como a Falamansa. Banda que marca, a partir de 2000, a ascensão do forró universitário no Brasil. A Falamansa é composta por três estudantes paulistas e um sanfoneiro nordestino. No início desta década, o forró universitário destaca-se na mídia nacional, daí se solidifica como ritmo brasileiro. Daniela Alfonsi (2005:12) faz a seguinte afirmação sobre este período do forró universitário: Quando o Forró universitário atingiu uma grande exposição nos meios de comunicação de massa, principalmente na televisão, o número de bandas aumentou consideravelmente, sobretudo aquilo que se denomina ―bandas de garagem‖, formada por jovens amadores que têm prazer em tocar, fenômeno freqüente entre as bandas de rock ou conjuntos de pagode, por exemplo. Esse período (entre os anos 2000 e 2001) marcou o boom da prática, tanto em São Paulo quanto nas cidades do interior e nas outras capitais do sudeste brasileiro. Para muitos forrozeiros, o boom do forró universitário contribui com a renovação de elementos e de público do forró tradicional. Por ser o estilo de Gonzagão que os atuais jovens forrozeiros universitários utilizam, mesclado com outros ritmos – como o pop, o reggae e a Axé-music – consideram o forró universitário muito próximo do que acreditam ser tradicional, ―de raiz‖. A cidade Itaúnas continua sendo referência para os jovens forrozeiros. Trata-se de uma vila de pescadores, no Município de Conceição da Barra, no extremo Norte do Espírito Santo. É reconhecida tanto por suas dunas quanto pelo forró. Desde 2000, abriga o Festival Nacional de Forró, entre os meses de junho e julho. Este Festival é composto por pequenos festivais que ocorrem em locais distintos, como: Circuito Nacional de Forró, na Praça da Igreja, em Junho; Festival Nacional de Forró de Itaúnas, no Bar Forró, em julho, quando também acontece o Encontro Nacional de Forró, no Buraco do Tatu.27 O site Forró de Itaúnas28 explica que a tradição forrozeira na cidade começa em 1989, no Bar Forró de Itaúnas onde se apresenta o sanfoneiro Luiz Geraldino e destaca o seguinte: O forró pé-de-serra agradou o público paulista a princípio, que levou a moda como sendo o forró universitário. Os visitantes começaram a vir, atraídos pelo forró e/ou pelas belezas naturais locais. O boca-a-boca sempre foi a maior mídia do forró e o movimento cresceu muito, freqüentado por um público composto em sua grande maioria por estudantes universitários, o ―Bar do Forró‖ , como é carinhosamente conhecido, vem se destacando pelo forró tocado e dançado em suas dependências, sempre animado ao som da sanfona, zabumba e do triângulo. O que era antes sinônimo de confusão passou a ser visto como ícone de sensualidade, de forma que o jeito novo de dançar disseminado por Itaúnas vem 27 28 http://www.turismocapixaba.com.br/itaunas.htm, acesso em 25/02/2008. http://forrodeitaunas.com/Forro/, acesso em 17/03/2008. 45 fazendo cada vez mais adeptos, revelando cada vez mais novos talentos e resgatando grandes nomes da nossa música. Na sexta edição do Festival Nacional do Forró de Itaúnas, Daniela Alfonsi (2007: 103) aponta a existência de 24 bandas concorrentes. Todas com figurinos semelhantes entre si que, por sua vez, assemelham-se aos trajes utilizados por freqüentadores destes bailes nas cidades de São Paulo, Rio de Janeiro, Vitória, Belo Horizonte e Brasília; cidades originárias da maior parte dos turistas presentes no evento: ―[...] os homens com camisas de estampa colorias ou camisetas com a figura de mestres do forró, como Jackson do Pandeiro; calças largas e sandálias de couro. As mulheres com saias ou vestidos rodados e floridos, flores ornamentando os cabelos e sandálias rasteiras nos pés‖. Apesar do formato universitário contribuir significativamente para o fortalecimento do forró no cenário nacional, e ter conservado as mesmas características dos idos da década de 1990, a nomenclatura universitário não é irrestritamente aceita entre os jovens forrozeiros. As restrições devem-se, sobretudo, por acreditarem que o movimento universitário ao tornar-se produto da indústria cultural, perde sua essência. Não refletem sobre a apropriação que a indústria cultural fez do ritmo já no período de Luiz Gonzaga. De acordo com Adorno e Horkheimer (1986:115): ―Os talentos já pertencem à indústria cultural muito antes de serem apresentados por ela: de outro modo não se integrariam tão fervorosamente‖. Hermano Vianna (2006) reflete: ―[...] a sanfona, o triângulo e a zambumba - considerados a essência do forró "de raiz", ou o verdadeiro forró (mesmo tendo sido definido por Luís Gonzaga, em momento já adiantado do Século XX, e usar um instrumento como o acordeão, tão alienígena no Brasil quanto o sintetizador)‖. Os componentes das bandas universitárias assumem atitude de defesa do forró considerado como tradicional, aquele por eles considerada como herança de Luiz Gonzaga. Esta característica é citada por Daniela Alfonsi (2007) e Márcio Madeira (2008: 49) sobre, respectivamente, as bandas de FU em São Paulo (capital) e em Fortaleza. Em alguns locais, como a famosa casa paulistana Canto da Ema29, inaugurada em 2000, os jovens, paradoxalmente, dançam o que é caracterizado como Forró Universitário, em pares bem próximos, alternando pequenas coreografias de giros e rodopios, muitas vezes ao som 29 A casa funciona na Avenida Brigadeiro Faria Lima, Pinheiros, na cidade de São Paulo. É um dos emblemas nacionais do forró universitário. A visita foi realizada ao local no dia 01 de fevereiro de 2006. 46 de jovens músicos, mas se auto-afirmam tradicionais e, até mesmo, são contrários ao movimento universitário, achando-o contaminado pela mídia e longe do tradicionalismo que admiram. Paulinho Rosa, o proprietário da casa e empresário do forró há mais de uma década, afirma que bandas universitárias não são as preferidas do público, e sim, os trios de forró (inspirados no Trio Nordestino)30. Nos dias atuais, a maior referência de forró universitário é ainda a banda Falamansa. Paradoxalmente, após atingir o sucesso, é rejeitada por diversos jovens forrozeiros que acham a banda muito exposta e contaminada pela mídia, por isto acreditam que tenha perdido a identidade com o forró. Sobre isto, Daniela Alfonsi (2007: 41) reflete: A música executada pela banda que, no início de sua formação – quando eram apenas mais uma banda dentre outras – agradava aos ouvidos desses forrozeiros incomodados, passou a ser considerada de qualidade ruim, sem técnica e sem virtuosismo. Não era mais o verdadeiro forró, realizado antes de alcançar o sucesso. Outras bandas formadas no rastro do Falamansa também passaram a ser ignoradas e rebaixadas no quesito qualidade musical. A ordem do dia era voltar-se ao forró puro, sem misturas de instrumentos musicais e de outros gêneros, como o reggae e o pop rock nacional. O Forró Universitário é o caminho seguido para a aproximação de jovens do início da década de 2000 com o Forró Pé-de-Serra. O Forró Universitário apresenta a possibilidade de vivenciar o trio de forró de modo atualizada para a geração. A juventude deseja o forró original de Luiz Gonzaga, talvez ignorando as ressalvas em torno do termo tradicional à música do artista. As demandas relativas ao gênero promovem a realização de eventos em São Paulo sob o título de Forró das Antigas (ALFONSI, 2007: 71). Paradoxo, já que estes mesmos jovens não se importam muito com Luiz Gonzaga e somente passam a admirar o artista a partir de um novo modo de se fazer forró, incentivado, divulgado e consolidado pela indústria cultural e por agentes completamente diferentes daqueles que originam as cantigas sertanejas e o modo de se fazer festa no sertão brasileiro. Tais reflexões encontram-se no texto de Hugo Ribeiro (2006: 554), ao analisar a folclorização do folclore: Palavras como proteger, resgatar ou restaurar, estão quase sempre associadas aos textos folclóricos. Uma das principais preocupações desses agentes está relacionada com a perda identitária causada pela influência nociva das culturas industrializadas – baseadas em laços mercantilísticos – nas culturas ditas rurais, ou tradicionais. Todavia, essa ânsia por preservar, proteger e resgatar práticas culturais está quase sempre associada ou promovida por agentes culturais estranhos àquelas práticas, numa clara ação de cima para baixo. Ou seja, continua 30 http://www.trionordestino.com.br/historia.php, acesso em 10/01/2008. 47 havendo uma influência da ―alta cultura‖ na cultura popular, porém, se uma era velada, atuando no âmbito ideológico, a outra é assumida, e atua principalmente nos comportamentos e produtos culturais. Estas afirmações também se coadunam com Teixeira Coelho (1986: 6) ao identificar que a música de massa não é produzida por quem a consome e sim pela elite que produz e divulga estilo. 48 CAPÍTULO III 3 FORRÓ ELETRÔNICO E UNIVERSITÁRIO EM SALVADOR 3.1 FORRÓ ELETRÔNICO EM SALVADOR De acordo com entrevista realizada com o músico Verlano Gomes31, vocalista e empresário da banda Flor Serena, o Forró Eletrônico em Salvador, ―começa em 1993, com a banda Mastruz com Leite, trazida pelo empresário de Cruz das Almas, Paulo Tear‖. Segundo Gomes, a banda toca em um trio elétrico na tradicional lavagem do Senhor do Bonfim. Naquele ano, o novo formato do forró não agrada ao público: a banda é vaiada. No entanto, Paulo Tear insiste e traz outras bandas de Forró Eletrônico para Salvador, como a Cavalo de Pau, Calcinha Preta, Magníficos e a própria Mastruz com Leite. Inicialmente rejeitado pelos soteropolitanos, o FE passa a atrair crescente público, ainda na década de 1990. As festas com FE acontecem em casas de shows da época, de meado de maio até o São João. As principais casas onde ocorrem tais eventos são: Lagoa Mar (hoje em dia é o Bar do Boteco), Estação da Cerveja (onde atualmente funciona o bar Ponte Aérea), Mamagaya (no local, desde 2006, funciona a casa de shows Malagueta), Costa Verde Tennis Clube e posteriormente no Banana‘s Beer (desde o final de 2004, os proprietários modificam-lhe o nome para Coliseu). Essas casas funcionam na orla de Salvador, em Patamares, Piatã e Corsário. Além das festas citadas, acontecem, também no período junino, festas na Associação Atlética do Banco do Brasil, localizada na rua Deputado Paulo Jackson, no bairro de Piatã, com Forró Pé-de-Serra e Eletrônico, até então, organizado pela instituição com o intuito de arrecadar fundos para construção do ginásio do clube. Alguns jovens ainda procuram o Uauá, pequena, humilde e rústica casa de forró localizada no bairro de Itapoan, até então freqüentada predominantemente por pessoas da terceira idade. Ir ao Uauá era um passeio vivenciado pela juventude como algo 31 Entrevista realizada no dia 29 de janeiro de 2008. Verlano Gomes nasceu em 1972, na cidade de Ipirá, no sertão baiano. Começa a carreira com 14 anos. Mantém, desde os 16, emprego no Banco do Brasil. No edntanto, em 2000, dedica-se exclusivamente a seguir apenas a carreira musical e investir na formação da própria banda, uma das preferidas da juventude baiana. Parte significativa do repertório da Flor Serena são autorias de Verlano. 49 exótico32 e sazonal, por ocasião das festas juninas. Alberto Ikeda (1990, 11) observa: ―Embora o público dos forrós seja predominantemente de jovens e pessoas de meia idade, é comum a freqüência de indivíduos mais idosos, notadamente nas casas localizadas nos bairros mais populares‖. O empresário Ward Portela33 enfatiza que de 1993 a 2001, os blocos de carnaval realizam, a partir da segunda quinzena de maio, diversos eventos, entre os quais as festas do bloco Cheiro de Amor, Eu Vou, CocoBambú e A Barca (do mesmo grupo do Cheiro de Amor). Ocorrem em especial no Hotel Quatro Rodas (atual Hotel Sofitel Quatro Rodas) e na praça Tereza Batista, no Pelourinho. Portela ressalta que o sucesso destes eventos deve-se ao pouco número de faculdades e universidades no interior do estado, então os jovens interioranos que continuam os estudos mudam-se para Salvador, onde o forró lhes possibilita resgatar as origens rurais. Tal procedimento remete às migrações nordestinas para o sudeste na década de 1950: grandes grupos, fugidos da decadência, das poucas oportunidades de trabalho e da opressão de poderosos proprietários e políticos donos de terras na região, retiram-se da terra natal. Nesse sentido, Márcio Madeira (2002, 19) considera: ―Um baile de forró no meio urbano ‗substitui‘ o contexto rural, o ambiente geográfico do sertão, mesmo que figurativamente. Qualquer necessidade de analogia com o ambiente rural do sertão nordestino pode ser feita por meio do forró (baile)‖. Ward Portela e Verlano Gomes afirmam que na década de 1990 as bandas de forró que se formam em Salvador são influenciadas pela música country, grande sucesso da época, pela Lambada e também pela música brega. Portela e Verlano dizem que Reginaldo Rossi34 faz grande sucesso entre a juventude da classe média Segundo Portela, a organização destas festas declina quando os blocos carnavalescos perdem o que denomina de ―social‖, ou seja, suas redes de contato. De acordo com o 32 Experiências próprias da pesquisadora, que freqüentava a casa ocasionalmente, em 1996, com colegas dos Colégios particulares Sartre e Antônio Vieira, além de relato do empresário Ward Portela. 33 Empresário do entretenimento desde 1993. Sócio da produtora de eventos Coliseu Eventos e Turismo, proprietária da única casa de forró soteropolitana, desde 2000, da casa de shows Malagueta e de uma empresa de bar itinerante. Entrevista realizada em 29/11/2007. 34 Cantor e compositor, nasceu em Recife (PE), no dia 14 de fevereiro de 1944. É conhecido como o "Rei do brega". http://pt.wikipedia.org/wiki/Reginaldo_Rossi, acesso em 25 de fevereiro de 2008. 50 empresário, essas redes são desfeitas a partir da centralização da venda dos abadás pela empresa Central do Carnaval. Para a juventude, outro pólo festivo junino são as festas fechadas, realizadas no interior do estado, a partir de 1993, por produtoras de Salvador. As mais antigas acontecem em Amargosa, Cruz das Almas, Senhor do Bonfim, Ibicuí e Euclides da Cunha; cada uma possui um nome e uma campanha de marketing: Amargosa – Forró do Piu Piu; Cruz das Almas – Forró do Bosque e Forró do Lago; Senhor do Bonfim – Forró do Sfrega; Euclides da Cunha – Forró do Sapo e Ibicuí – Tico Mia. Os ingressos são vendidos em várias cidades interioranas e, principalmente, em Salvador. Os jovens da capital compram, cerca de dois meses e meio antes, uma camisa que lhes garante o direito a churrasco, a bebidas e a um dia de festa em uma fazenda. Cada ano uma cidade é ―escolhida‖ como a principal, a que recebe o maior número de jovens da classe média de Salvador. Entre os fatores que determinam a relevância anual da festa estão as atrações e o dia em que ocorre o feriado junino, propiciando viagens longas ou curtas. Em paralelo às festas, outras empresas organizam excursões a serem vendidas ao jovem soteropolitano, com transporte e acomodação, em casas previamente alugadas ou em escolas cedidas pela Prefeitura local. Além da festa particular, estes turistas vivenciam a rotina das cidades onde estão hospedados: acordam por volta das 11 horas da manhã, almoçam em restaurantes, bebem quase a tarde toda nos bares da praça, jogam dominó, conversam com os amigos e fazem novas amizades. Recolhem-se no início da noite, quando tomam e descansam até o momento principal: o show noturno na praça. Cada turista gasta em média 50 reais por dia, de acordo com Ward Portela e Alexandre Liberato35. Os shows na praça são de bandas de Forró Pé-de-Serra (geralmente abrem ou encerram a noite) Universitário ou Eletrônico. Já nas festas particulares, sempre há grandes atrações do Forró Eletrônico nacional e da Axé-music. Como exemplo, cita-se a festa de Amargosa (município localizado no Vale do Jiquiriçá, a 240 km da capital), denominada Piu Piu. Esta festa ocorre desde 1996, no Hotel Fazenda Colibri, e é uma 35 É conhecido como Alexandre Bógus. Sócio da produtora Pequena Notável, sócia de Claudinha Leite. Atualmente é a produtora de Vixe Mainha, Alexandre Peixe e vende shows de diversas bandas e artistas em Salvador, como: Nando Reis e Aviões do Forró. Realiza diversos eventos no Brasil, a exemplo do bloco UAU, criado em 2001, atuante nas principais micaretas do Brasil. 51 das preferidas dos jovens soteropolitanos. Em 200736, a festa acontece em 23 de junho, iniciando às 13 horas e a animação deve-se às presenças de Asa de Águia (Axé-music), Alexandre Peixe (Axé-music), Tio Barnabé (Forró Universitário) e Magníficos (Forró Eletrônico). A entrada custa 90 reais na pista e 180 no camarote. De acordo com Alexandre Liberato (Bógus)37, um dos sócios do evento, aproximadamente 7.000 pessoas animam o Piu Piu 2007. 3.2 FORRÓ UNIVERSITÁRIO E ELETRÔNICO O ANO INTEIRO Até a explosão nacional do Forró Universitário, em 2000, as festas forrozeiras freqüentadas por jovens em Salvador se relacionam às comemorações juninas, nos meses de maio e junho. Em abril de 2000, é realizada, pela produtora Dinamus38, a primeira grande festa de Forró Universitário na cidade, com um público formado, aproximadamente, por 60.000 pessoas, no Parque de Exposições Agropecuárias de Salvador (área do Parque: 450.000 m2), localizado na 39 Avenida Paralela . A atração da festa é a banda Falamansa. A partir deste evento na cidade, com Falamansa, da repercussão do Forró Universitário e Eletrônico na mídia nacional e do consolidado relacionamento dos jovens baianos com o São João, as empresas de entretenimento da cidade se voltam para o ritmo: percebem como podia ser rentável em outras épocas e não apenas na junina. A partir de então, o número de eventos direcionados para o forró cresce ano após ano, nos maiores espaços da capital, como no desativado parque aquático Wet‘n Wild, a casa Espetáculo, o próprio Parque de Exposições Agropecuárias de Salvador, as boates Bahia Café Hall, Satélite e Fashion (atual Club Madre). Surgem inúmeras bandas locais, formadas também por jovens, a Estakazero, Tio Barnabé e Flor Serena, que agradam ao público e incentivam outros jovens a formarem mais bandas. 36 A pesquisadora estava trabalhando na cidade, como comentarista do São João, na transmissão ao vivo da TV Educativa da Bahia. 37 Entrevista realizada no dia da festa. 38 A produtora funciona na Av. Tancredo Neves, no edifício Multiplus, em Salvador. 39 http://www.seagri.ba.gov.br/parqueexpo.asp, acesso em 08/01/2008. 52 Exemplo da importância do forró na cidade ocorre no dia 07 de outubro de 2007, no Wet‘n Wild40. Na ocasião, ocorre o lançamento do primeiro Cd de uma banda da Axémusic denominada como Voa Dois. A produtora da banda é a empresa PentaEventos. Para o lançamento deste CD, como estratégia para atrair o público, é contratada uma banda forrozeira adorada pelos soteropolitanos: Aviões do Forró (Fortaleza/CE). Estima-se que mais de 20.000 pessoas comparecem ao evento41. Atualmente a AABB aluga seu espaço para que produtoras, como a PentaEventos, realizem forró, levando grandes atrações como Flávio José e Adelmário Coelho e gerando altas cifras: receitas de 50.000 reais (aproximadamente), oriundas das vendas de ingresso, de acordo com Ward Portela. A temporada de forró da AABB é iniciada geralmente no mês de março e não mais em maio. Aos 20 de abril de 2008, ocorre jogo de futebol no estádio Antônio Barradas, entre Bahia e Vitória, os times mais tradicionais do estado. O Bahia ganha de quatro a um. Circulando após o jogo pela orla de Salvador, são encontrados três grupos de jovens comemorando a vitória em postos de gasolina onde existem lojas de conveniência. Todos os grupos escutam forró, sendo que em um a música é executada pelos jovens que possuíam zabumba e sanfona. Outra relação entre o forró e as mais tradicionais torcidas do futebol baiano, acontece também em abril de 2008. A torcida tricolor se apropria de partes da música Chupa que é de Uva, da banda Aviões do Forró, como provocação ao adversário: ao ganharem as partidas os torcedores tricolores comemoram com ―Chupa que é de uva‖42, trecho retirado do refrão da música com tal título (composição de Alexandre Avião, Richardson Maia e Marujo): ―Na sua boca eu viro fruta/ Chupa que é de uva.‖ Na maior festa baiana, o carnaval de Salvador, o forró também tem espaço. Em 2006 é realizado, pela Flor Serena, com apoio da casa de shows Coliseu, o Beco do Forró, em um privilegiado espaço do bairro de Ondina, entre dois camarotes: o da rádio Itapoan FM e do Salvador Praia Hotel. No final do beco, é montado um pequeno palco onde a 40 O parque fica localizado na Avenida Paralela. Está desativado já há alguns anos, sendo constantemente utilizado para realização de eventos. 41 http://www.blocotrazamassa.com.br/sel_noticia.php?id_not=70, acesso em 01 de dez. 2007. 42 http://letras.terra.com.br/avioes-do-forro-musicas/1186715/. Acesso em 02 de maio de 2008. 53 banda Flor Serena43 toca entre as passagens dos trios. Vale salientar que os foliões nas laterais dos camarotes, de onde era possível visualizar o palco, dançam o Forró e não as músicas tocadas no interior destes, geralmente Axé-music, ritmo emblemático da música baiana em outros estados e países. Os shows de Forró Eletrônico nacionais na cidade atraem número tão significante de pessoas que sempre são realizados nos maiores espaços para eventos da cidade: o Parque de Exposições e o Wet‘n Wild. Para grande festa anual de Forró Universitário do Brasil, em julho, na cidade de Itaúnas (Espírito Santo), são organizadas excursões com ônibus cheios de jovens soteropolitanos. A procura por este evento tem aumentado tanto que Verlando Gomes, vocalista da banda Flor Serena, está planejando organizar um evento semelhante ao de Dunas, no Litoral Norte baiano em 200844. 3.3 AS BANDAS DE FORRÓ EM SALVADOR 3.3.1 CLASSIFICAÇÕES A presença dos três estilos forrozeiros analisados, Pé-de-Serra, Universitário e Eletrônico, em Salvador, é inconteste. No entanto, a classificação das bandas não é objetiva, pois na estrutura dos espetáculos, mesclam FPS, FE e FU, em uma mesma apresentação. Citando Raimundo Cordeiro (2002: 104): ―Assim, quem quer que se proponha estudar um gênero musical, presente numa sociedade complexa, enfrentará certas dificuldades taxionômicas, decorrentes da mistura de influências aportadas no gênero musical investigado‖. Além das alternâncias de estilos em um mesmo espetáculo, as bandas de Salvador quando se apresentam no interior do estado – onde o público e, conseqüentemente, as prefeituras contratantes exigem shows mais dinâmicos e com mais recursos visuais – alteram a estrutura. De acordo com Ward Portela, Jânio Almícar, Verlano Gomes, Léo 43 A banda existe há mais de cinco anos, possui dois CD‘s com letras próprias e é uma das líderes do movimento universitário na cidade. 44 Entrevista realizada com o cantor e compositor no dia 20 de setembro de 2007. 54 Macêdo e Kiko Luz45, as bandas utilizam esta estratégia a fim de agradar os diferentes públicos e garantir os contratos. Por conta da demanda de novidades, alguns artistas baianos criam novas classificações a fim de fugirem das rotulações ou serem reconhecidos como únicos, utilizando nomenclaturas como Forró Pé-de-Serra atual, Forróxé, ou preferindo se denominarem apenas como forrozeiros. O jornalista Marcos Casé, em matéria divulgada no jornal A Tarde, em 30 de maio de 2006, comenta sobre a dinâmica das bandas de forró em Salvador: E, assim como a Axé Music, a variedade é grande. Há desde as atrações que primam pelo forró mais puro, chamado de pé-de-serra, com os trios de triângulo, sanfona e zabumba e dos seguidores de Gonzagão, até o forró tido como moderno, das grandes bandas, como Magníficos, Calcinha Preta, Mulheres Perdidas, Colher de Pau, entre outros. Existem, ainda, aqueles que preferem um forró cheio de influências ecléticas e fazem um som misturado com estilos que aparentemente não combinam como o afoxé e o reggae, a exemplo do grupo Tio Barnabé. Em exibições televisas é comum o entrevistador ou apresentador questionar integrantes sobre a classificação da banda. Um exemplo ocorre no jornal Bahia Meio Dia, de 11 de abril de 2008, da Rede Bahia de Televisão (Canal 11, transmissora da Rede Globo), no qual a repórter Patrícia Nobre faz tal questionamento à banda Acarajé com Camarão. Assim, a trivialidade da pergunta remete a uma resposta trivial e também midiática: a banda se rotula como tradicional. No entanto, canta e toca atualidades. Aparentemente, os forrozeiros de Salvador se apropriam de diferentes estilos, decorrentes da evolução do forró, utilizado-os em seus shows, tendo sempre o cuidado de explorar mais um estilo do que outro, a fim de serem reconhecidos de acordo com o preponderante. Entre as escolhas predomina quase sempre o Forró Pé-de-Serra. As bandas, durante as entrevistas demonstram muita preocupação ao se classificarem, sendo enfáticas nas rotulações. No entanto, ocorrem muitas contradições entre o rótulo proferido e a performance - ―[...] ato de interpretar, por meio da voz, do corpo, do figurino e dos instrumentos, uma peça musical em uma execução de palco, em um show‖ (ALFONSI, 2007: 104). 45 Jânio Amílcar é empresário, sócio de Ward Portela. Verlano Gomes é vocalista e proprietário da banda Flor Serena, Léo Macedo é vocalista e sócio da Estakazero. Kiko Luz é ex-integrante da Estakazero, sendo agora sócio da Sob Poeira. 55 3.3.2 COMERCIALIZAÇÃO Os forrozeiros soteropolitanos utilizam como principal veículo de divulgação dos shows o site de relacionamento Orkut46 e panfletos distribuídos, essencialmente, em portas de faculdades, bares, restaurantes, barracas de praia e próximos a grandes eventos em realização. Alguns artistas forrozeiros possuem sítios eletrônicos próprios, como Flor Serena, Estakazero, Colher de Pau, Tenison Del Rey, Del Feliz e Tio Barnabé. Segue exemplos dos comunicados feitos por alguns deles no Orkut: “FORROZEIROS E FORROZEIRAS!! Vim divulgar mais um show da ZÉ DE SAIA!! ZÉ DE SAIA CANGAIA DE JEGUE Dia 15 (terça-feira) a partir das 21hs Local: Rock It Ingressos: 8 reais com nosso pré-convite Apareça pra dançar um forró animado com a gente!!‖ “ATENÇÃO FORROZEIROS E FORROZEIRAS... A banda Zé de Saia vai tocar essa Sexta-feira no Coliseu do Forró (a melhor casa de forró da cidade) Então anote aí: Zé de Saia e Forró Massapê Onde: Coliseu Quando: Sexta (28/03) Hora: 22:30h E o melhor eu nem falei ainda, vc pega com a galera da banda um pré-convite e só paga 5 reais pra entrar...Meu amigo, 5 reais pra ver a Zé de Saia é uma BAGATELA!! APROVEITE!!‖ O lucro das bandas é proveniente dos shows e não da comercialização de CD‘s. Estes são produzidos para divulgar as bandas, como os CD‘s entregues às produtoras de eventos, às rádios soteropolitanas e também para o público em geral. Uma ferramenta bastante utilizada é comercializar os Cd‘s a preços módicos durante os shows: ―Os discos, para seus autores e produtores, são vistos apenas como meio de divulgação‖ (VIANNA, 2006). Bandas e artistas de forró de Salvador realizam, preponderantemente, gravações independentes, em estúdios próprios ou alugados, e se responsabilizam pela distribuição. Vender CD‘s a preços bem razoáveis é estratégia utilizada pela Estakazero, Flor Serena, Colher de Pau, Tio Barnabé, entre outras. Nos eventos, um CD custa entre 46 ―O Orkut (ou orkut) é uma rede social filiada ao Google, criada em 24 de Janeiro de 2004 com o objetivo de ajudar seus membros a criar novas amizades e manter relacionamentos. Seu nome é originado no projetista chefe, Orkut Büyükkokten, engenheiro turco do Google. Tais sistemas, como esse adotado pelo projetista, também são chamados de rede social. É a rede social com maior participação de brasileiros, com mais de 23 milhões de usuários‖. Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Orkut. Acesso em: 10 de fev. 2008. 56 cinco e oito reais, sendo, às vezes, vendido junto com o ingresso dos shows: na compra do ingresso a um custo variável entre 12 e 20 reais, o Cd é grátis. O processo de produção do forró em Salvador – assim como Fortaleza e em outras cidades – tem agora uma série de envolvidos, com poder e retorno financeiro semelhantes entre si. As gravadoras não exercem mais o papel preponderante na cadeia produtiva fonográfica. De acordo com Hermano Vianna (2006): [...] o dinheiro e o poder são divididos entre muitos parceiros diferentes: o músico, o produtor, os intermediários, a fábrica caseira de CDs, os distribuidores para camelôs, os camelôs, os programas de rádio, os donos das aparelhagens, os DJs. Os sucessos são produzidos pela atuação conjunta de todos esses empreendedores, quase todos eles informais. Os músicos não têm mais gravadoras nem o custo de prensar os discos, imprimir as capas ou distribuir os produtos - esse custo todo fica por conta das fábricas caseira de CDs, dos camelôs e de seus sistemas não-oficiais de indústria e comércio. E muitas vezes seus grandes sucessos são metamídia: as músicas elogiam DJs, programas de rádio (como o Mexe Pará) e de TV, aparelhagens (como são chamadas as equipes de som que animam as festas paraenses). De acordo com Márcia Dias (2000: 132), há registros antigos da produção fonográfica brasileira independente. A autora afirma que não há um consenso de quando a produção fonográfica brasileira independente se inicia, mas informa: As informações sistematizadas sobre as iniciativas de produção fonográfica que acontecem fora do circuito das majors Brasil datam do início dos anos 60. No entanto, é possível encontrar na literatura, informação histórica esparsa, fragmentada, que deixa entrever a participação das indies [independentes] desde os primórdios da produção fonográfica local. O crescimento da produção independente ocorre com o avanço tecnológico, que além de oferecer novas possibilidades também reduz os custos de produção, fazendo com que artistas com menos recursos gravem álbuns: ―Assim, observa-se a redução do preço da montagem de um estúdio, dos serviços oferecidos por este (preço da hora-estúdio e do número de horas utilizadas nas gravações; custo de materiais e insumos) e de outros custos de produção, tais como o número de músicos envolvidos (DIAS, 2000: 127)‖. O novo forró, iniciado na década de 1990, é fomentado pela produção fonográfica independente, assim como ocorre com o punk e o rock dos anos 1980 na Inglaterra (DIAS, 2000: 128). É através da produção independente que as bandas chegam aos meios de comunicação. Quando os fenômenos da pirataria e da produção independente 57 ainda não estavam consolidados, os artistas que trabalham com gravação e distribuição independentes encontram mais obstáculos para chegar às lojas oficiais e atingir o público. Hoje isto não é mais preocupação. Márcia Dias (2000: 135) relata que uma das dificuldades dos artistas iniciantes nos anos 1980 era penetrar nas majors, o que motiva a produção das indies (gravadoras independentes). Com o avanço da produção independente, as majors tentam novas alternativas para se manterem em funcionamento. As dificuldades que encontram se devem tanto a produção e a distribuição independente, como também, em razão do avanço da pirataria. As lojas de CD‘s perderam a força e muitas mal conseguem se manter. Exemplo é o novo centro de compra organizada de Salvador: o Salvador Shopping. Neste empreendimento, localizado na Avenida Tancredo Neves, inaugurado no dia 22 de maio de 2007, com 153 mil metros quadrados de área construída47, não há nenhuma loja específica para venda de CD‘s. Expedito Silva (2003: 58) afirma sobre este contexto e as bandas de forró: ―Grandes nomes surgiram através do CD independente, tais como: as bandas Mastruz com Leite, Cavalo de Pau, Limão com Mel, Magníficos (que depois assinou contrato com a Sony), e Frank Aguiar (que assinou contrato com a Abril Music‖. O forró em Salvador é um exemplo da nova comercialização musical do Brasil, comentada por Hermano Vianna (2006): Citei esses três exemplos - do tecnobrega paraense, do forró amazonense e do lambadão matogrossense - para mostrar como as músicas mais populares do Brasil contemporâneo - as que realmente colocam o povo para dançar nas festas mais animadas e que são cantadas nas ruas das grandes cidades do país - não são as mais tocadas no rádio, não aparecem em programas de televisão, não são lançadas pelas grandes gravadoras. Seus sucessos são geralmente desprezados pelos críticos que escrevem nos grandes jornais. Seus artistas não são convidados para os milhares de debates e seminários que discutem "cultura popular". É como se fossem populares demais para serem autenticamente populares. Poderia citar muitos outros gêneros musicais que sobrevivem também nessa estranha zona de penumbra (a que junta sucesso de massa com invisibilidade na mídia oficial de massa), como o funk carioca (que, apesar de seu sucesso momentâneo fora das favelas, continua ignorado pelas gravadoras e pela maioria das rádios e das TVs), o vaneirão pop gaúcho, as novas vertentes da música baiana (o arrocha e o samba duro [...] por exemplo), a maioria das duplas sertanejas de Goiás e Mato Grosso do Sul - e tantas outros. 47 http://www.salvadorshopping.com.br/shop_dados.asp. Acesso em 02 de abr de 2008. 58 3.4 OS ARTISTAS E AS BANDAS DE FORRÓ NA CAPITAL A seguir são apresentadas 16 bandas, de acordo com o destaque que possuem em Salvador48. 3.4.1 ADELMÁRIO COELHO Adelmário Coelho é o forrozeiro baiano como maior projeção nacional. Gravou 14 álbuns musicais e um DVD ao vivo. De acordo com a página eletrônica oficial49, são 600.000 cópias de discos vendidos, além de uma média de 100 shows por ano, em quase 15 anos de carreira. Segundo Tissiana Berengüer50, responsável pela empresa que realiza a comunicação de Adelmário, o músico prefere ser classificado apenas como ―forrozeiro‖, sem outras adjetivações. No jornal A Tarde, de 11 de abril de 2008, Adelmário é assim descrito: ―TRADICIONAL– [...] Adelmário Coelho, representante do autêntico estilo arrasta pé na Bahia [...]‖. No entanto, o show do músico conta com corpo de baile cujas bailarinas utilizam roupas sensuais. Além disso, de acordo com Tissiana, o espetáculo também é composto por instrumentos típicos do Forró Eletrônico, como saxofone, trompete e trombone e ainda sanfona, zabumba, triângulo, baixo, bateria, guitarra e duas backing vocals. O figurino de Adelmário também é híbrido: constantemente utiliza chapéu de couro, com roupas típicas do figurino eletrônico: blusas de malha e calças jeans bem justas ao corpo. 3.4.2 BANDA ESTAKAZERO Referente ao estilo da banda Estakazero, de acordo com Léo Macedo, vocalista e empresário da banda, trata-se de Forró Universitário. Os instrumentos utilizados são: sanfona, zabumba, triângulo, contrabaixo, violão, guitarra e efeitos metais. Léo funda a banda, a partir da experiência como vocalista da Colher de Pau: quando deixa esta banda, inicia carreira solo e logo forma nova banda forrozeira, em 2001. 48 Os dados foram coletados através de questionários respondidos por integrantes das bandas por intermédio de entrevistas realizadas com os músicos, pesquisas em sítios eletrônicos, jornais eletrônicos e impressos. 49 http://www.adelmariocoelho.com.br/ 50 Entrevista realizada com a empresária no dia 25 de março de 2008. 59 Até o início de 2008, a Estakazero já havia gravado quatro cd´s e um DVD. Segue notícia ilustrativa sobre a banda, divulgada no jornal A Tarde: ―Ainda na área do Forró Pé-de-Serra, o público do Inté Raiá poderá ver o grupo baiano Estakazero, que às sextas-feiras realiza ensaio no Bahia Café Hall, sempre com convidados especiais‖(CARVALHO, 2008). Em entrevista realizada no estúdio da banda, em uma casa no Jardim Apipema, bairro de classe média, onde também está o escritório da Estakazero, Léo afirma que a banda conta com estrutura administrativa e de marketing: além de ser contratada para festas, realiza os próprios eventos, sendo, inclusive, a primeira banda de forró em Salvador a tomar esta iniciativa, adotada posteriormente por outras, como a Colher de Pau, a Flor Serena e a Arrocha o Nó. O primeiro evento foi o Luau da Estakazero, realizado em 2002, em uma barraca na Praia do Flamengo. O público dançava, de fato, em cima da areia. Com o sucesso do evento,a festa passa a um local maior, ainda na praia. Posteriormente, o projeto é abrigado na antiga boate Satélite. Segundo Léo, a escolha do local deve-se a dois fatores: a boa estrutura externa, onde monta o palco, além da boate interna. O vocalista e empresário diz que estes eventos são estratégias para atrair o público no verão ―[...] na atmosfera em volta do Forró Universitário, que relaciona o estilo com praias‖. As músicas da Estakazero constantemente estão no contexto praieiro, com luas, menções ao litoral e amores juvenis. Segue uma das letras de maior sucesso da banda: Lua Minha51 Composição: Kuque Malino Intérprete: banda Estakazero Álbum: Lua Minha 2005 Cheguei, chovia Eu não sabia tinha alguém a esperar Olhei, sorria Sorriso doce que faz apaixonar Em menos de um segundo a minha vida mudou Até sei quem fui 51 http://www.estakazero.com.br/letras/estakazero_luaminha.doc, acesso em 27/03/2008. 60 Porem não sei mais quem sou Se ela me quiser, tenho certeza, não vou mais a lugar algum Mistura exata de anjo com mulher Um olhar que mata mais assim quem não quer A beleza nata que transforma um deus em sujeito comum Lua minha Que ilumina as noites do litoral Lua minha Te ter todinha num eclipse total Lua minha Te ver crescente, nova, cheia de amor Lua minha... Serei minguante quando você se for. 3.4.3 BANDA TIO BARNABÉ A banda Tio Barnabé é formada no verão de 2004. Nas apresentações utiliza sanfona, zabumba, triângulo, baixo e percussão. De acordo com o site oficial 52, os componentes possuem entre 22 e 27 anos. Os proprietários da banda são o vocalista, Marcos Leandro Fatel da Silva, os empresários Ivan e Paulo, da Pida Eventos, produtora que além de realizar espetáculos tem um programa sobre festas juvenis na TV Itapoan, nas manhãs de sábado. A produtora Pequena Notável também é proprietária, com 40% da banda. De acordo com Alexandre Liberatto - Bógus, a Tio Barnabé é Forró Universitário e a produtora se interessa pela banda em função da ascensão do forró em Salvador. A Tio Barnabé tem destaque no cenário baiano especialmente em função dos contatos dos empresários das duas produtoras. Ambas conseguem fechar contratos para tocar em grandes eventos, como as festas fechadas nas cidades do interior baiano, eventos no Parque de Exposições e no Parque Aquático Wet´n Wild. O repertório da Tio Barnabé utiliza diversas músicas da Axé Music, sendo por isto, denominada por muitos como ―Barnaxé‖. 3.4.4 BANDA COLHER DE PAU É criada em 1995 e reconhecida como a primeira banda de Forró Universitário de Salvador. No percurso, teve diversas formações; atualmente possui dois vocalistas, um 52 http://www.tiobarnabe.com.br/, acesso em 03 de fev. 2008. 61 sanfoneiro, um guitarrista, um contrabaixista, um baterista, um tecladista e um saxofonista. Gravou nove cd‘s, sendo o último lançado em janeiro de 2008. Sobre o início da carreira, o site53 traz: A intenção inicial era apenas se divertir, pois sendo universitários de várias áreas, a música não era uma atividade profissional para eles. [...] Com o número de propostas aumentando, a profissionalização tornou-se inevitável. Foi assim que, em 1997, resolveram gravar o seu primeiro CD. No início foi difícil encontrar apoio para a idéia de gravar um CD de forró em plena ―terra do axé‖, mas conhecendo a força do trabalho, a persistência e o talento daqueles jovens, o poderoso mercado da axé-music resolveu adotá-los como a primeira banda de forró de Salvador. Hoje o forró na Bahia é uma realidade e o pioneirismo da Colher de Pau coloca a banda em destaque no cenário musical do estado. Quanto à performance, aponta: Nos shows, a Colher de Pau tem um repertório eclético, navegando com a mesma qualidade musical por todas as vertentes do forró, desde o tradicional pé-de-serra, passeando pelo vanerão, pelo forró romântico, indo até a novidade que é a Colher Elétrica, onde o público curte o ―forróxé‖, o que torna as apresentações alegres, românticas e divertidas, agradando ao público. A referência ao forroxé se faz pertinente, pois, assim como a Tio Barnabé, o repertório da Colher de Pau é repleto de músicas da Axé Music. 3.4.5 BANDA FLOR SERENA Segundo Verlano Gomes, vocalista e empresário da banda, a Flor Serena é fundada em 2000 e trata-se de Forró Pé-de-Serra. Quando realiza shows no interior, não usa corpo de baile, mas bonecos Mamulengos e acrescenta instrumentos como bateria. Os instrumentos sempre presentes nos shows são sanfona, zabumba, triângulo, percussão, violão e baixo. Segundo o sanfoneiro da banda, Valmir Souza, ele e Verlano são os mais velhos do grupo, ambos com 34 anos, os demais possuem entre 23 e 28. Com exceção do vocalista e do sanfoneiro, os demais integrantes exercem atividades variadas, a exemplo de Adriano Reseimberg que trabalha em um cartório soteropolitano. Adriano, residente no Condomínio Costa e Silva, no bairro de Brotas, 53 http://www.bandacolherdepau.com.br/banda.htm. Acesso em 29 de fev de 2008. 62 proprietário de um carro modelo Peuget 2006, ano 2000, afirma não ser possível viver apenas de ganhos oriundos da banda. A Flor Serena faz em média 16 shows por mês, entre a capital e interior. Na época identificada pelos forrozeiros como junina – meado de maio até São João, 24 de junho – aumenta para 28. A banda realiza temporadas de eventos, em especial no verão. De novembro de 2007 a janeiro de 2008, fez temporada com shows todas as sextas em bares do bairro do Rio Vermelho, Santa Maria e Pinta, onde recebe artistas convidados. O bar fica no largo do famoso acarajé de Dinha, muito freqüentado por soteropolitanos e turistas, sobretudo no verão. Flor Serena já gravou dois Cd‘s, contendo músicas autorais e regravações. As primeiras geralmente tematizam a vida no campo e as festas juninas: Flor Serena Composição: Verlando Gomes, Sky e Marcelo Barcellar Álbum: Flor Serena Flor serena meu amor, eu colhi em Salvador É tão doce feito mel No azul de Gezebel, no bico de um beija-flor Violão de Menestrel Manhãzinha na janela, cheiro de chuva na terra Sol de final de verão No cabelo da morena, uma linda Flor Serena Meu jardim meu coração Noite clara de fogueira, no céu a mais bela estrela Flor serena quer brincar Tem viola e sanfoneiro, cantador e zabumbeiro Flor Serena namorar Manhãzinha na janela, cheiro de chuva na terra Sol de final de verão No cabelo da morena, uma linda Flor Serena Meu jardim meu coração Novo dia, nova história, Flor Serena vai embora Mil jardins pra enfeitar Quero estar sempre ao seu lado, Flor Serena do cerrado Com o sol a te regar 63 3.4.6 FORROZÃO DU KARAI Tem como sócios a Sou Praieiro Produções e Eventos e a rádio Piatã FM. A produtora é responsável pela temporada de forró 2008 na Associação Atlética do Banco do Brasil, iniciada no dia 11 de abril de 2008. Assim, apesar da criação recente, a banda apresentase em todas as noites de uma das mais tradicionais temporadas de forró de Salvador. Em função de um dos sócios ser uma rádio, também está constantemente presente na programação da rádio popular com maior audiência na cidade: ―A briga pela audiência está fervendo em Salvador, segundo os resultados obtidos pela última pesquisa do Instituto Ibope. A popular/eclética Piatã FM 94.3 continua na liderança, posto que ocupa há 12 anos, mantendo a sua marca expressiva‖54. Igor Moreno, 18 anos, nascido em Macaúbas/BA, sanfoneiro da banda, afirma que além da sanfona, a Forrozão Du Karai tem bateria, trompete, guitarra, baixo, teclado, percussão e saxofone. Na comunidade da banda, na página de relacionamentos Orkut, há foto de divulgação com quatro bailarinas vestidas com figurino sexy, caricaturadas como colegiais, em função da micro saia xadrez e da mini-blusa branca. No centro da foto estão os dois vocalistas, um homem e uma mulher. O empresário Ward Portela comenta que estratégia semelhante é utilizada por bandas de pagode fora da Bahia: colocam nos seus CD‘s números de contato de Salvador e outras cidades. Anteriormente, são feitos contatos com produtora das cidades para representar legalmente a banda. Funciona como um ―selo‖ autenticando o valor da banda com o nome da cidade que é reconhecida como produtora de Axé Music e de pagode. Assim, a Forrozão Du Karai coloca no seu CD o ―selo‖ de Fortaleza, reconhecida como uma das cidades que mais produz Forró Eletrônico de sucesso, já que na capa do CD promocional da banda há números para contatos tanto em Salvador quanto em Fortaleza, permitindo, pois, às apresentações serem vendidas em ambas as cidades. 3.4.7 FORROZÃO CAVALO DOIDO 54 http://www.tudoradio.com/modules.php?name=News&file=article&sid=829, acesso em 30 de jan. de 2008. 64 Fundada em abril de 2007, é propriedade de sócios de uma das maiores agências de publicidade de Salvador, a Propeg, e do comediante, radialista e músico Renato Fechine. A Cavalo participa de algumas edições da AABB como sócia, recebendo em contra partida, porcentagem das vendas da bilheteria e fornece chamadas televisas na TV BA (retransmissora da Globo). Em função de desentendimentos ocorridos entre a banda e a produtora Sou Praieiro, a Cavalo Doido participa de apenas um show no mês de maio, findando a parceria para realização desta temporada. De acordo com o site oficial55: [...] traz em seu repertório, além de composições próprias, os principais hits do momento, incluindo também releituras de antigos sucessos do cancioneiro popular, bem com badalada da Axé music. Graças ao apoio maciço que recebeu da mídia, o CAVALO DOIDO hoje é uma das bandas mais tocadas nas FM`s espalhadas por toda Bahia. O produtor da banda, Marcos Moura, sinaliza que é composta por bateria, percussão, trio de naipe, guitarra, baixo, teclado e sanfona. Moura prefere não enquadrar a banda em nenhum dos estilos – Forró Pé-de-Serra, Universitário ou Eletrônico – afirmando se tratar de ― [...] uma banda estilo Saia Rodada [FE], mais para frente.‖ 3.4.8 VIRGÍLIO O músico Virgílio canta há mais de vinte anos. Antes da carreira forrozeira, canta em trios elétricos no carnaval soteropolitano, como Top 69, Papaléguas e Tiete Vips. Virgílio possui penetração na mídia e constantemente aparece em jornais locais, divulgando seus shows. Apesar de ter muitos fãs em Salvador, seu maior sucesso é no interior, em cidades como Senhor do Bonfim. Vírgilo considera-se autêntico Forró Péde-Serra e também é reconhecido assim pelo público. Nas apresentações não há corpo de baile, utiliza-se de músicos que tocam sanfona, zabumba, triângulo, guitarra e baixo. 3.4.9 QUININHO DE VALENTE O músico Quininho de Valente começa carreira em 1990. A banda é composta por sanfona, zabumba, triângulo, bateria, guitarra, contrabaixo, teclados e duas backing 55 http://www.bandacavalodoido.com.br/. Acesso em 01 de maio de 2008. 65 vocals. Nos shows no interior acrescenta instrumentos de sopro e corpo de baile. Joaquim de Almeida, o Quininho, afirma que canta Forró Pé-de-Serra. Os músicos que o acompanham têm em média 28 anos, sendo graduados ou graduandos em Dança e Música, na maioria. Fazem aproximadamente quatro shows por mês, sendo que na época junina o número chega a vinte. 3.4.10 BANDA FORRÓ BOM TODO Formada em 2003. Nas apresentações a Banda conta com sanfona, zabumba, bateria, triângulo, baixo e guitarra. Os integrantes possuem entre 22 e 33 anos, sendo que dois são graduados em Música, os demais cursam Engenharia Elétrica, Enfermagem, Música e Comunicação Social. Todos possuem outras atividades profissionais. Abdon Leone, 33 anos, por exemplo, é professor de Música. Abdon afirma que a banda não possui corpo de baile, não acrescenta instrumentos em shows no interior, realiza em média quatro shows por mês e na época junina doze. Ressalta ainda que a banda toca Forró Péde-Serra. 3.4.11 20XOTE E UM GALOPE Formada no final de 2003. Sempre utiliza zabumba, triângulo, efeitos metais, sanfona, percussão, baixo e duas violas. Não se classifica como nenhum dos estilos apresentados. Os músicos afirmam que fazem forró dendê: mistura do forró com samba de roda, músicas consideradas pela banda fora do circuito pop. A banda não possui sítio eletrônico, mas conta com duas comunidades no site de relacionamento Orkut, com o total de 543 participantes. Na página criada pela banda, no Orkut,56 há a seguinte definição: ―Banda de Forró Pé-de-Serra, com influências de raízes nordestinas, um mix de forró com um toque de DENDÊ da Bahia. Uma mistura que vai desde o Reggae feito na Bahia até o Samba de Roda, criado no recôncavo baiano‖. Um dos diferenciais é que nos shows, antes de subir ao palco, a banda passeia pela platéia, jogando pipoca e cantando músicas do candomblé. Os componentes possuem entre 28 e 35 anos e são estudantes de cursos universitários: música, biologia e 56 http://www.orkut.com.br/Profile.aspx?uid=720615676941371086. Acesso em 20 de dezembro de 2007. 66 economia. Thiago Meok, integrante do grupo, afirma que a 20Xote e um Galope realiza entre 7 e 8 shows por mês, sendo que na época junina chegam a tocar em 20 eventos. 3.4.12 MEU TIO DEDO Inicia carreira em 2006. O grupo é composto por nove jovens com idades entre 20 e 22 anos. Em entrevista realizada com Ângelo Daltro, 20 anos, estudante do curso de Publicidade e Propaganda da UNIFACS, afirma que a banda é composta por guitarra, percuteria (percussão e bateria), zabumba, baixo, violão, triângulo, sanfona e efeitos. Ângelo confirma que quase todos os componentes são estudantes, assim como ele. Além disso, trabalham com outras atividades: um administra o lava jato do pai e outro trabalha em um banco. A banda gravou dois CD´s que mesclam músicas próprias e regravações e um DVD. Eles se classificam como Forró Universitário, mas lhes desagrada o principal ícone deste estilo: a banda Falamansa. Ângelo afirma que a Meu tio dedo está lançando um estilo novo na cidade, tendo como inspiração a banda Circuladô de Fulô. Questionado sobre o que seria este novo estilo, já que a Circuladô caracteriza-se como FU, Daltro diz que sua banda é mais para frente57. De acordo com Ângelo, antes da banda de forró, os jovens montaram uma banda de axé, denominada como Vira Lata. A Vira Lata começa a fazer shows forrozeiros na época de São João, há dois anos. Mas, depois do período junino, os componentes resolvem não voltar mais para o axé e continuar com o forró, por questões de identificação e também comercialização. Para Ângelo, em Salvador, o forró é mais rentável para pequenas bandas. Ward Portela concorda com o fato dizendo que o jovem soteropolitano não freqüenta apresentações de bandas de axé desconhecidas. E para ser conhecida, há a necessidade de grandes investimentos. 3.4.13 FORRÓ MASSAPÊ 57 Termo comumente utilizado pelos forrozeiros em Salvador, para identificar bandas de FU ou FPS que tocam de forma mais rápida e animada, sendo propicia à dança com coreografias. 67 A Forró Massapê, formada em outubro de 2002, apresenta-se com contrabaixo, violão, cavaquinho, zabumba, triângulo e uma interessante peculiaridade: a banda é composta também por violino, sendo a única dentre as estudadas a apresentar este instrumento. Os componentes possuem idades entre 22 e 26 anos, sendo formados em Música, Fisioterapia, Geografia, Educação Física e Administração. Todos possuem outras atividades profissionais. A banda não possui corpo de baile, mas acrescenta ―parte percussiva‖ nos shows interioranos. Alessandro Porto, conhecido como Calango, 25 anos, geógrafo, professor de Música e integrante da Massapé, afirma que a banda toca Forró Universitário e realiza em média 10 shows por mês, sendo que na época junina faz vinte. 3.4.14 JÓ MIRANDA Jó Miranda inicia carreira em 2008. Toca com sanfona, zabumba, triângulo, contrabaixo, guitarra e bateria. Os músicos da banda possuem entre 26 e 30 anos, segundo grau completo e apenas o zabumbeiro tem outra atividade profissional. Questionado sobre o estilo, responde: ―Se é que existe outro tipo de forró, sou do pé-deserra‖. Não possui corpo de baile e realiza aproximadamente cinco shows por mês. 3.4.15 BANDA SIRI COM CÂIMBRA Formada em 2005, realiza entre cinco e oito shows por mês, é composta por teclado, bateria, ―percussões diversas‖, guitarra e contrabaixo. Os músicos possuem entre 19 e 25 anos, são formados em Música e possuem outras atividades profissionais. Não apresenta corpo de baile. O integrante Dimas Queiroz afirma que a banda toca Forró Eletrônico, tendo sido a única, dentre as pesquisadas, a realizar tal afirmação. 3.4.16 ARROCHA O NÓ A banda Arrocha o Nó, dos empresários Victor e Guto Melo, é formada em 1998. Nas apresentações usam zabumba, triângulo, bateria, guitarra, baixo, sanfona e saxofone, não há alterações para shows interioranos, pois sempre utiliza corpo de baile. Os 68 integrantes possuem em média 25 anos, fazem cerca de seis shows por mês e trinta na época junina. Apesar dos instrumentos e do corpo de baile, Victor diz que a banda toca Forró Pé-de-Serra. 3.5 CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE AS BANDAS SOTEROPOLITANAS Das dezesseis bandas e artistas entrevistados, apenas um dos representantes afirma tratar-se de uma banda de Forró Eletrônico, a Siri com Câimbra, mesmo algumas outras apresentando todas as características para isto, como A Colher De Pau, a Forrozão Cavalo Doido e a Forrozão du Karai. Das pesquisadas, sete bandas se reconhecem como Forró Pé-de-Serra. Cinco preferem o rótulo de Forró Universitário. Três entrevistados não aceitam os rótulos, escolhendo outras nomenclaturas: forrozeiro (Adelmário Coelho), Forró Dendê (20Xote e um Galope) e forró para frente (Forrozão Cavalo Doido). Todas utilizam sanfona e baixo. Todavia, três não usam zabumba e quatro dispensam o triângulo. O trio sanfona, zabumba e triângulo é presente em onze bandas. A guitarra está presente na composição de onze. O teclado é usado por cinco e o saxofone por quatro delas. Estes instrumentos são característicos do Forró Eletrônico, no entanto, apenas a Siri com Câimbra utiliza o rótulo Forró Eletrônico. A bateria é utilizada por nove bandas, seis utilizam percussão e uma percuteria. 68,75 % (11 bandas) foram formadas depois de 2000. E, em todas, a faixa etária predominantemente está em volta dos 25 anos, não havendo nenhum integrante com mais de 35. 69 CAPÍTULO IV 4 A CASA DE FORRÓ EM SALVADOR Além dos eventos realizados por diversas produtoras ao longo do ano na cidade, Salvador possui uma casa de shows que apresenta forró em todos meses, sendo o ponto de encontro dos forrozeiros. O Coliseu funciona, normalmente, às sextas-feiras e sábados. A casa pertence à produtora Coliseu Eventos e Turismo, que também é proprietária da casa de shows Malagueta, e de uma empresa de bar itinerante, o Bar da Praça. Funciona no bairro Stiep, rua Doutor José Peroba, no edifício Metrópolis, onde também estão localizadas outras produtoras, como Eva (responsável pela banda e bloco Eva), a produtora de Adelmário Coelho, Dinamus Eventos, a Fábrica da música, a É o Tchan, a Maianga, entre outras. Os sócios da produtora são Ward Portela (geógrafo, 36 anos) e Jânio Amílcar (curso superior de geografia e tecnológico em gestão de eventos incompletos, 35 anos). Os sócios se conhecem em 1998, no curso de geografia na Universidade Católica do Salvador. Ambos trabalham com eventos há quase uma década e resolvem firmar uma parceria experimental. A primeira festa que organizam juntos é o Forró das Dez na casa Banana´s Beer, onde desde 2004 funciona o Coliseu. O Forró das Dez acontecia aos sábados. Segundo Ward e Jânio o primeiro evento é bem sucedido e os dois começam a lucrar desde então. Os empresários relatam que o período é de sacrifícios: conciliam a organização de excursões juvenis, o novo negócio e os estudos com os empregos que possuíam à época. A produtora de eventos cresce a partir da ascensão obtida com o Coliseu, o que permite outros investimentos empresariais. No entanto, mesmo com a abertura de mais dois empreendimentos, de acordo com Ward Portela: ―O Coliseu é o principal foco da empresa‖. A casa Malagueta está localizada no Corsário, na orla soteropolitana, tem capacidade para 1.500 pessoas. O ingresso custa 10 reais até às 22 horas, após, passa a 15 reais. Possui um camarote reservado para convidados vips e pessoas que pagam mais 10 reais além do 70 ingresso. A produtora assume a casa – que funciona toda sexta-feira com shows de pagode – em setembro de 2006. Aos sábados e domingos congrega eventos com ritmos variados, especialmente reggae, rock e, em época junina, o forró. Em 2007, as festas forrozeiras acontecem às sextas-feiras, com as bandas Filé de Mulher (FE) e 20Xotear (FPS), chamadas de ―Forró da Cinderela‖, nas quais mulheres não pagam até às 22 horas. A temporada estende-se de abril a junho. O Bar da Praça tem estrutura itinerante. Em diversos eventos na cidade é responsável por todo o serviço de bar, assim atuou nos ensaios semanais da banda Vixe Mainha nos anos de 2006 e 2007, no Alto do Andu; em 2008, no Museu do Ritmo58, nos ensaios da Vixe Mainha (quintas-feiras), da banda Voa Dois (sextas-feiras), da Timbalada (domingos), e da banda Harmonia do Samba (segundas-feiras) (realiza o bar em todos os eventos do Museu); além de explorar o bar de produções forrozeiras, como o Forró do Sapo (Euclides da Cunha – 2006), Forró do Sfrega (Bonfim -2004), e em blocos carnavalescos de Salvador nos anos de 2003, 2004, 2005 e 2007 (bloco EVA, Cheiro, Papa, Beijo, Harém, entre outros). No carnaval de 2008, o bar operou no Museu du Ritmo e no camarote Oásis, na Avenida Sete de Setembro (circuito Osmar). A casa de shows Coliseu é a principal fonte empírica deste trabalho. De acordo com o sóciogerente Ward Portela, quando sua produtora assume a casa em 2000, o nome do local é Banana‘s Beer e recebe um público composto por pessoas entre os 25 e 50 anos. O nome da casa é modificado foi alterado em 2004 como estratégia de marketing. Segundo Portela, a produtora investe muito em mídia para trabalhar uma marca que não lhe pertence. O empresário afirma que no segundo ano de funcionamento, 2003, a faixa etária dos clientes diminui: a casa é freqüentada predominantemente por pessoas da classe média, entre 20 e 30 anos. Ward atribui esta mudança ao fortalecimento do Forró Universitário e 58 A casa pertence ao artista Carlinhos Brown. Funciona no antigo Mercado do Ouro em Salvador, no bairro do Comércio, um dos mais antigos da cidade. Foi inaugurada em 2007. No carnaval daquele ano trouxe diversas atrações nacionais, como Zélia Duncan, Arnaldo Antunes, Nando Reis, Pitty, Daniela Mercury e Babado Novo. É freqüentado, predominantemente, pela classe média soteropolitana. Cada evento apresenta faixa etária diferenciada. Os ensaios do Vixe Mainha custaram 25 reais na pista e 50 reais no camarote, têm um público, na maioria, com mais de 21 anos. Os ensaios do Voa Dois custavam os mesmos preços e os freqüentadores possuíam entre 18 e 25 anos. Os ensaios da Timbalada custavam 40 reais na pista e 80 reais no camarote. Harmonia do Samba custava 20 reais na pista e 40 no camarote. Ward Portela e Alexandre Liberatto afirmam que aconteceram 41 eventos na temporada do verão de 2007, encerrada no carnaval de 2008. 71 Eletrônico na cidade. Os jovens procuram, por isso, mais eventos do gênero, ―invadindo‖ os forrós e ―expulsando‖ aqueles que não se identificavam com o público juvenil. Em entrevista realizada, o músico Virgílio59 analisa a presença de juventude no forró: ―[...] os jovens estão aderindo mais. Não conheciam, então depois que começou a tocar no rádio, modernizando, trazendo nova roupagem, o jovem aderiu‖. O jovem mantém o forró em evidência na cidade. Exemplo curioso é que, após a chegada da modernização do ritmo na cidade e da conseqüente aderência da juventude, a antiga casa Uauá é fechada. De acordo com Portela, isso ocorre aproximadamente dois anos após sua produtora ter assumido o atual Coliseu. O empresário acredita que a casa, freqüentada por pessoas com mais de 50 anos, fecha por falta de público, enquanto o Coliseu, voltada para o público jovem, continua gerando bons lucros. A casa de shows Coliseu está localizada no bairro de Patamares, na orla. Sua capacidade máxima é de 1.700 pessoas. Dispõe de uma pista de dança, em frente ao palco de altura baixa, com iluminação cênica, e de aproximadamente 75 mesas com cadeiras, servidas por cinco garçons. O espaço é todo coberto por telhado e não dispõe de área vip. Portela afirma que ao assumir o local este não possuía área vip e nunca pensou em construir uma, como fez no Malagueta, por acreditar não ser adequado à proposta forrozeira da casa. O Coliseu terceiriza o som, composto por mesa de palco, mesa de controle das caixas de som, pedestais para microfones, microfones e cabos. Além do aluguel dos equipamentos, há a contratação de dois profissionais para operá-los. Este pacote custa 300 reais por dia. Algumas bandas quando tocam na casa preferem levar seus próprios operadores de som. Isto é uma prática comum na cidade, porque há uma crença de que os operadores de som potencializam a atração principal dos shows enquanto minimizam os efeitos de bandas secundárias. A iluminação da casa é projetada pela arquiteta Liliane Lopes, contando com reguladores que são operados pelo próprio Ward Portela, que confere grande importância este elemento por acreditar que o forró precisa de iluminação mais escura do que o pagode e mais clara que o reggae. Assim, ajusta a luz, pois crê que o excesso dela intimida a maioria dos forrozeiros a dançarem. Além da iluminação cênica, realizada pelo profissional de apelido 59 Entrevista realizada no dia 20 de janeiro de 2007, no Coliseu. 72 Pastel, o palco recebe efeitos diversos de fumaça, emitidos por uma máquina específica, alugada, juntamente com o equipamento de som. O gerente do Coliseu é Sr. Carlos, 57 anos, morador do Costa Azul. Supervisiona tudo o que acontece na casa. Hierarquicamente em seguida está o jovem Alessandro, 24 anos, morador da Boca do Rio. Ele começa como barman e pouco depois, em função de sua competência, torna-se responsável pelo sistema de bar da casa, composto por dois espaços. Diferente de Carlos, que estar disponível exceto nas férias, Alessandro trabalha apenas às sextas-feiras e sábados. A casa também possui uma cozinheira, uma ajudante de cozinha, duas pessoas responsáveis pelos banheiros e pela limpeza durante os eventos, além de cinco garçons e cinco barmen que trabalham também apenas sextas e sábados. Há também o funcionário responsável pela manutenção e limpeza da casa que trabalha de segunda a sexta. No escritório da produtora Claudia Lima é a secretária e Antônio Santana, o economista, ambos trabalham de segunda a sexta. O Coliseu conta com cinco banheiros femininos e um masculino. Possui também cozinha industrial e camarim, localizado atrás do palco, composto por sala com sofá, espelho, ventilador de teto e banheiro. Há também uma área externa ao camarim, separado do resto da casa por portas com seguranças de prontidão. Esta área é muito utilizada pelos músicos enquanto aguardam o horário das apresentações; ali bebem, comem, conversam entre si ou com produtores, fãs e amigos que permanecem no local. Entre o camarim e o palco há um corredor com porta de acesso exclusiva. Em frente à casa, a partir das 21 horas, são montadas barraquinhas vendendo drinks a preços populares. Estas barraquinhas são organizadas pelo Coliseu: Portela e Amílcar reúnem-se com os barraqueiros para resolver problemas e propor melhorias. Afirmam que são solicitados pelos próprios barraqueiros, que desejam manter a ordem e terem os lugares garantidos. Entretanto, não recebem nenhum valor pelo serviço tampouco cobram taxa pelo uso do local, já que se trata de área externa. Há também um ponto de táxi, sempre com os mesmos motoristas, e ampla área dividida em três estacionamentos. Estes também são completamente independentes da casa. ―Scooby‖, o responsável por um dos estacionamentos, afirma que a grande maioria do 73 público forrozeiro do Coliseu usa carro próprio, de familiares ou amigos. O público que chega ao local em transporte coletivo é reduzido e aqueles que o fazem retornam, predominantemente, de táxi. Para a organização dos eventos semanais, os empresários trabalham todos os dias entre reuniões e seleções de bandas. Semanalmente, o escritório da produtora recebe uma média de três cd‘s de bandas forrozeiras em busca de oportunidades de trabalho. São alguns nomes de bandas que já encaminharam Cd‘s (reprodução das capas em anexo): Forró Boneca Cobiçada, Jó Miranda, Cheiro de Chuva e Animal Famito. As primeiras citadas não são facilmente classificadas (entre FU, FPS e FE). Já a última é explicitamente FE: a capa do Cd, com fundo vermelho, apresenta a fotografia dos componentes, três homens e duas mulheres em poses sensuais. Estes CD‘s possuem uma média de 15 faixas. As embalagens são envelopes de papelão, com cuidadosas resoluções gráficas. Os empresários do Coliseu montam a grade dos shows dos eventos selecionando as bandas mais conhecidas, aquelas que estão em evidência no momento e principalmente as que atraem público por intermédio de cortesias distribuídas pela banda ou pelo número de ingressos vendido na noite. Se a banda nunca tocou na casa e é pouco conhecida, encontra dificuldades em ser selecionada para apresentar-se no Coliseu. Assim, para ter espaço no Coliseu, a banda precisa ser conhecida, estar tocando nas rádios, ou ter uma boa distribuição de Cd‘s promocionais, levando seu conteúdo ao público. Em Salvador, assim como em diversas cidades brasileiras, é comum o uso do jabá nas rádios: mecanismos de troca para que as canções de determinada banda sejam executadas na programação. As permutas ocorrem mediante pagamento em espécie ou favores, por exemplo, as bandas se apresentam gratuitamente em eventos realizados pelas emissoras. Tanto os novos artistas quanto os tradicionais repudiam esse comércio ilegal, porém, às vezes, realizam permuta, ou seja, quando uma rádio realiza algum show por uma ocasião especial, ela os convida e eles se apresentam gratuitamente. Mas afirmam que não é justo as emissoras se utilizarem desse artifício, cobrando para divulgar o artista, pois tanto a rádio quanto a televisão precisam do artista, assim como este necessita da mídia e dos meios de comunicação (SILVA: 2003, 64). 74 De acordo com reportagem da jornalista Luana Rocha (2008: 4), na revista da rádio Metrópole, o preço do jabá nas rádios em Salvador varia entre 1.500 e 6.500 reais. Sobre o jabá e o forró na cidade de São Paulo, Daniela Alfonsi (2007: 59) traz: Para tocar em uma casa de show, a banda primeiro precisa tocar nas rádios, o que implica na compra de um horário, o jabá. Assim, os empresários de bandas conseguem garantir um esquema entre rádios e casas noturnas para as bandas com que trabalha. O circuito fechado significa que a atuação de uma banda em uma casa de show está condicionada à execução de suas músicas em alguma rádio, preferencialmente as especializadas em forró, que em São Paulo resumese à Rádio Imprensa, Rádio Atual, Tropical FM e Nativa FM. Salvador não possui rádios FMs especializadas em forró, mas as rádios com programação popular tocam o ritmo, como a Itapoan, Nova Salvador, Piatã, Bahia FM e rádio Itaparica. Na época do São João, o jabá pouco é utilizado, pois como o ritmo está em evidência é espontaneamente solicitado pelos ouvintes. É comum que as rádios comprem datas de shows de bandas e depois as revendam a um preço mais alto. Existe um mercado em Salvador – fomentado por produtoras locais representantes das bandas – que trabalha com compra e venda de shows de forró e também de outros ritmos. Se alguém quiser realizar um evento com Aviões do Forró, ou Tio Barnabé, por exemplo, precisa entrar em contato com a produtora Pequena Notável (a mesma de bandas Babado Novo – encerrada em fevereiro, por ocasião da saída da vocalista Claudia Leitte e Vixe Mainha). Em entrevista, Alexandre Liberatto informa que o show da Aviões no estado varia ente 80 e 120 mil reais. Para fazer uma apresentação em Salvador com Flávio José, é necessário comprar a data com o empresário Mário Paim. Para eventos com Calcinha Preta é necessário negociar com Guto, da Dinamus. Grandes artistas como Elba Ramalho, Fagner e Zé Ramalho são comercializados na cidade pelo pioneiro no trabalho empresarial com forró em Salvador, o produtor Paulo Tear. Além das atividades de vender os shows, os mesmos empresários negociam a exposição das bandas nas rádios. Por noite apresentam-se duas ou três bandas no Coliseu, sendo que estas são mescladas entre Forró Eletrônico, Pé-de-Serra ou Universitário. Antes dos shows e entre um e outro há som mecânico. Cada apresentação, em uma noite com dois shows, dura, em média, 75 uma hora e meia. Quando ocorrem três apresentações, em geral, a primeira ou a última banda é menos conhecida do público, cobra o cachê mais baixo e tem um show de aproximadamente uma hora. Portela diz que algumas bandas tocam de graça, almejando conhecimento do público forrozeiro, em função do reconhecimento conferido à casa. Este fato, bem como o reconhecimento da casa foi atestado por músicos como Virgílio, Léo Macedo, Kiko Luz, Cicinho de Assis e Verlano Gomes. As bandas mais conhecidas costumam exigir o horário das apresentações, de acordo com outras apresentações que realizam no mesmo dia, na cidade, na Região Metropolitana ou no interior do estado. Geralmente os músicos da cidade que tocam o FPS e o FU ao chegarem na casa guardam seus instrumentos no camarim e vão circular, dançando e conversando com amigos. As bandas do Forró Eletrônico são mais reservadas. Ao chegarem, dirigem-se ao camarim ou à área externa, onde ficam até o início do show. As bandas universitárias ou do Forró Pé-de-Serra locais raramente levam maquiadores. Já para o FE, bandas como Melaço de Cana, Mulheres com M e Raio da Silibrina, dispõem sempre de maquiadores e/ou produtores responsáveis pela arrumação das bandas antes de subirem ao palco. Assim, justifica-se esta diferença pelo fato do FPS e do FU serem formados predominantemente por homens enquanto que no FE há forte presença feminina. Portela afirma que entre as bandas locais e habituais na casa, o cachê mais alto é pago à banda Flor Serena, 1.200 reais. Há outras bandas mais caras na cidade, mas que tocam apenas esporadicamente no Coliseu, como a Estakazero que chega a cobrar 12.000 reais, a Tio Barnabé que cobra 6.000 na época do São João e a Filomena Bagaceira, com cachê de 3.000 reais. Com exceção desta última, as demais por diversas vezes tocaram no Coliseu. Inclusive, Léo Macedo, empresário e vocalista da Estakazero, afirma que a banda começa no Coliseu, de onde partem para carreira mais madura. O Coliseu realiza esporadicamente shows com músicos e bandas mais conhecidas e mais caras, como as citadas e ainda Alcymar Monteiro, Dominguinhos, Targino Godim, Zelito Miranda e Acarajé com Camarão. Estas festas não são garantia de lucros, mas são benéficas para casa por colocá-la em evidência e atrair um público que não é freqüentador habitual, mas que pode vir a ser, atraídos por um show maior. 76 Quando há um evento diferenciado, o Coliseu utiliza propagandas em outdoor (três a quatro, por evento, preferencialmente, localizados na Avenida Luiz Viana Filho – conhecida como Paralela60), anúncios nas Rádios Piatã, Nova Salvador e Transamérica, além de explorar a assessoria de impressa. Esta estratégia comunicacional é utilizada periodicamente pela Coliseu. Todavia, em eventos de maior porte, é reforçada. São realizadas, aproximadamente, cinco campanhas anuais em outdoor, tendo um custo médio de 5.200 reais. As propagandas nas Rádios ocorrem semanalmente, sendo um investimento, médio de 500 reais. Em eventos maiores, este custo aumenta para 700 reais. Também são distribuídos panfletos nas portas de faculdades locais, nos principais bares, como Barraquinhas do Imbuí, Sentollas, Amanda (ambos em Patamares), Caranguejo de Sergipe (Pituba), Dinha do Acarajé (Rio Vermelho) e nos eventos realizados em Salvador. A mão-de-obra da distribuição de panfletos custa 90 reais por dia e a impressão de 10.000 cópias, suficientes para uma semana, exige o investimento de 300 reais. A assessoria de imprensa, desde março de 2008, é exercida pela empresa Laboratório de Notícias, tendo um custo mensal de 1.500 reais. O ingresso de cada noite custa, normalmente, 12 reais. Quando há um show diferenciado, a casa cobra até 20 reais pela entrada. De acordo com Portela, cada freqüentador gasta, em média, R$ 10 reais por noite, além do ingresso. Até às 23 horas, o público que possuir uma ―cortesia‖ pode entrar pagando cinco reais. Estas cortesias são distribuídas entre três e quatro dias antes dos eventos, por equipe especificamente contratada para realizar o serviço. Cada cortesia é assinada por estes distribuidores e, após a contagem na urna, no final da festa, o Coliseu paga um real por cortesia. Atualmente estas cortesias são entregues a Victor Santana, 21 anos, morador de São Caetano, bairro periférico de Salvador, e para as bandas que farão shows na noite. Victor e as bandas também possuem distribuidores que os ajudam em troca de entradas gratuitas. Cada banda recebe 300 cortesias, enquanto Victor recebe 500. Uma banda coloca 60 Construída em 1971, interligando uma área praticamente desabitada da cidade. Possui 16 quilômetros de extensão e é atualmente um dos principais pontos do crescimento imobiliário em Salvador. Em 2007, a prefeitura soteropolitana autorizou 41 empreendimentos e imóveis no local. Ao longo da Paralela estão algumas grandes Faculdades como a Jorge Amado e a Faculdade de Tecnologia e Ciências (FTC). A preferência pelo local é em função do grande fluxo de veículos. Fonte: http://ibahia.globo.com/plantao/noticia/default.asp?id_noticia=170049&id_secao=151> acesso em 30 de mar. 2008. 77 em média 50 pessoas através das cortesias na casa e Victor dificilmente leva menos do que 100 pessoas. Além de Victor, outros jovens, como Solón (formado em administração com habilitação em marketing, trabalhou para o Coliseu, no período de 2003 a 2006. Atualmente gerencia uma filial da empresa Finivest em Recife) e Clarisse (formada em Relações Públicas, trabalha para a Penta Eventos) exerceram a função junto ao Coliseu. Eles pararam em função do surgimento de melhores oportunidades profissionais, sendo que além de trabalharem na casa e tinham outros trabalhos. Victor começa a freqüentar o Coliseu em 2005, devido a colaboração no trabalho de distribuir cortesias com Sólon, e solicita aos sócios Ward e Jânio oportunidade de trabalho. Aos poucos, os empresários transferem as funções de Solón, que já estava saindo, por falta de tempo para se dedicar à atividade, para Victor. Assim, passa a distribuir cortesias em lojas nos shoppings e em empresas onde o quadro funcional é preenchido por jovens, como call centers. Ele inicialmente conhece as pessoas via Web ou por meio de apresentações pessoais, depois passa a entregar as cortesias, cujas solicitações, em sua página no Orkut, são inúmeras. Victor é bem articulado, consegue, em função de estratégias de marketing e convencimento, penetração nos diversos locais evolvidos com eventos em Salvador, como Rádios e Produtoras. Também realiza eventos na casa, sob o seguinte regime: se a festa causar prejuízo, a casa arca com os custos; caso seja lucrativa, custos e lucros são rateados entre ele e a casa. Além de obter vantagem na contratação das bandas, podendo pagar um valor diferenciado do mercado, por falar em nome do Coliseu. Com estes acordos, já foram realizados cinco eventos. Victor consegue prosperar financeiramente com este trabalho. Antes de iniciá-lo, ele dormia em um colchão no chão e a casa onde mora com sua mãe, padrasto e irmão caçula, tinha poucos eletrodomésticos. Atualmente possui computador, cama nova, DVD, máquina de lavar roupas e som novos, precisando colocar grades em sua casa, temendo assaltos. Além disto, cresceu socialmente, sendo mais respeitado pelos vizinhos e por agentes do mercado de eventos em Salvador. Desde a fundação, o Coliseu trabalha com distribuição de cortesias, inicialmente estas eram gratuitas, no entanto, a partir de 2005, os empresários começam a cobrar dois reais 78 pela entrada. Em menos de seis meses, o valor aumenta 50%, três reais e, em 2007, quase duplica, cinco reais. As cortesias geram uma receita, em média, de 800 reais por noite. A principal bebida vendida no local é a cerveja. Como a casa pertence a uma produtora com outros empreendimentos, há uma dinâmica na oferta de marcas do produto no local. Em janeiro de 2008, a produtora firma contrato com a cervejaria Ambev para a casa Malagueta. Mas, não o fez para o Coliseu e cada evento do Bar da Praça que realiza vende uma cerveja diferenciada, em função dos contratos de patrocínio firmados entre os realizadores dos eventos e as distribuidoras de bebida. Assim, o Bar é obrigado a comprar de acordo com estes eventos, o que provoca sobras por festa. Para os eventos do Vixe Mainha são compradas Skol, que não podem ser vendidas nos ensaios da Harmonia do Samba, nos quais são vendidas Nova Schin, nem para os ensaios do Voa Dois, nos quais são vendidas cervejas Sol. Assim, a produtora fica com produtos e, muitas vezes, escoa-os nas festas do Coliseu. As cervejas compradas especificamente para a casa são Skol ou Nova Schin, dependendo da cotação nos períodos de eventos. Independente da marca, a cerveja custa R$ 2,50 para o público. De instrumentos próprios, a casa possui apenas uma bateria que foi comprada porque geralmente as bandas não a possuem, por ser grande e mais difícil de transportar. Assim, ou a casa comprava ou arcava com custos de aluguel e transporte, então, por vantagem, financeiramente, os empresários decidem pela compra já que a maioria das bandas usa o instrumento. Este fato atesta, também, a importância da bateria nos shows de forró em Salvador. Os meses com a menor quantidade de público são dezembro e janeiro. Períodos em que os soteropolitanos são atraídos por ensaios da axé-music e por festas de pagode, o que Ward Portela denomina como festas de verão. Os empresários comemoram oito anos à frente do local, realizando uma festa denominada como ―Oito anos do Coliseu‖, no dia oito de março de 2008, com shows de Dominguinhos, Flor Serena e Zé de Tonha. Na noite, a casa lota: são comercializados 1.630 ingressos. O empresário de Dominguinhos, João Cícero, afirma que Dominguinhos realiza show mais longo que o previsto, empolgado com a calorosa recepção do público. 79 A casa não possui músicos contratados, ao contrário do que ocorre em locais como O Canto da Ema (SP). Sobre os eventos paulistanos Alberto Ikeda (1990, 11) afirma: ―Os forrós mantém alguns músicos fixos contratados, pelo menos um trio contando ainda com os sanfoneiros avulsos, que normalmente se apresentam em várias casas em uma mesma noite [...]‖. Ward Portela afirma que nunca teve músicos fixos nas suas casas e que esta não é uma prática comum na cidade. Para Portela, o soteropolitano gosta de variedade, por isto há o investimento em contratações por fins de semana. Acredita que a repetição de bandas cansa o público da cidade. É inconteste que não se trata de um público indiferente. Ao contrário do que Alberto Ikeda (1990: 11) descreve encontrar em São Paulo: ―A exceção das ‗estrelas‘ o músico de forró (apesar de estar sobre o palco, sob as luzes, e de sempre ter seu nome destacado pelo apresentador) tem atuação eminentemente funcional de serviço à dança, inexistindo mesmo os tradicionais aplausos de entrada e saída [...]‖. No Coliseu, a maioria das bandas, ao encerrarem as apresentações são aplaudidas, ao menos por aqueles que se localizam logo à frente do palco. Se a atração é conhecida ou o show foi bom, o público vibra muito e solicita inúmeras vezes o prolongamento da atração. O vínculo afetivo do público com as bandas soteropolitanas pode ser mensurado pelo número de comunidades que possuem no site de relacionamento Orkut. Até o dia 31 de março de 2008, a banda soteropolitana A banda Estakazero possuía 45 comunidades ativas, somando 18.596 internautas. Tio Barnabé possuía 25 comunidades relacionadas, somando 7.654 participantes. A banda Flor Serena possuía quatro comunidades, com 1.269 participantes. A banda Colher de Pau possuía três comunidades, com 1.074 participantes no total. A Filé de Mulher, quatro comunidades, somando 525 internautas. A banda Acarajé com Camarão somava três comunidades, com 750 fãs. No dia 20 de abril de 2008, ocorre uma partida de futebol no estádio Antônio Barradas, entre o Bahia e o Vitória, clássicos do estado. O Bahia ganha de quatro a um. Circulando após o jogo pela orla de Salvador, foram encontrados três grupos de jovens comemorando a vitória em postos de gasolina onde existem lojas de conveniência. Todos os grupos escutavam forró, um, inclusive, executava as músicas por meios de voz, zabumba e sanfona. Outra relação entre o forró e as mais tradicionais torcidas do futebol baiano acontece em abril de 2008: a torcida do Bahia se apropria de partes da música ―Chupa que 80 é de Uva‖, da banda Aviões do Forró, como provocação ao adversário: ao ganharem as partidas os torcedores tricolores comemoram com ―Chupa que é de uva‖61, trecho retirado do refrão da música com tal título (composição de Alexandre Avião, Richardson Maia e Marujo): ―Na sua boca eu viro fruta/ Chupa que é de uva.‖ Nos espetáculos que ocorrem no Coliseu, os jovens envolvem-se no evento, dançando e interagindo com as apresentações. Deste modo, estabelecem relações sociais entre si, com a banda e também com a casa. Já que a presença destes é o que sustenta os espetáculos, estes são dependentes da aceitação dos jovens. As bandas são elos mercadológicos que instauram relações sociais entre os participantes. De acordo com Debord (1997, 14): ―O espetáculo não é um conjunto de imagens, mas uma relação social entre pessoas, mediada por imagens‖. Há distinções nítidas entre os jovens que freqüentam o Forró Universitário ou o Pé-deSerra e aquelas que costumam ir a eventos dos Forrós Eletrônicos. Uma das diferenças pode ser percebida nos trajes adotados. O primeiro público costuma ficar na frente do palco, caracteristicamente vestidos, sendo mulheres com saias rodadas, tops e sapatilhas, enquanto os homens utilizam blusas coloridas folgadas e calças jeans, e dançam o show todo. Alguns, inclusive, pertencem a grupos de dança de forró, como o Forró Online e o extinto Forrezeando, que hoje é uma banda. Eles são despojados, têm estilo alternativo e popular, utilizam roupas que facilitam a dança e se aproximam dos valores culturais nordestinos, como tops, saias rodadas soltas, sapatilhas e sandálias rasteiras. Atribuem ao movimento características ―de raiz‖, sendo um resgate ao forró ―autêntico e puro‖. Já o público do Forró Eletrônico fica boa parte da noite sentado em locais dos quais nem é possível visualizar os shows e traja roupas mais urbanas, como saltos bem altos e saias justas. Atualmente, assim como já aconteceu na cidade de São Paulo: ―O uso do pé-de-serra aos poucos se sobrepôs ao universitário nos discursos dos produtores, materiais de divulgação e apresentação das bandas. Algumas pessoas passaram a criticar ostensivamente a expressão Forró Universitário, dentre elas Magno, produtor de festas e conjuntos musicais 61 http://letras.terra.com.br/avioes-do-forro-musicas/1186715/. Acesso em 02 de maio de 2008. 81 (ALFONSI, 2007: 41)‖. Em Salvador, não apenas a expressão Forró Universitário está em desuso, como as bandas também não desejam mais serem assim identificadas. As bandas soteropolitanas não conseguem sair de Salvador. De acordo com Ward Portela, a capital baiana não vende forró e sim Axé Music. Por isto, acredita que a venda de um produto – a axé music – impeça a venda de outro produto baiano, o forró. Assim, cabe ao estados do Ceará, Pernambuco, Rio Grande do Norte e Paraíba se consolidarem como maiores vendedores de forró em âmbito nacional. É difícil uma banda da capital baiana vender shows para outros estados. Adelmário Coelho é exceção. Todas as bandas entrevistadas julgam que a casa de shows Coliseu é fundamental para existência do forró em Salvador e todos a reconhecem como o reduto do ritmo na cidade. Seguem depoimentos concedidos sobre a casa: Virgílio: ―Está aí, a casa [Coliseu] bombando, na época que é, está com o público fiel, vindo, porque o Coliseu é a casa de forró hoje da Bahia e o pessoal conhece, e vem para dançar forró‖. Coroneto (Trio Nordestino): ―A casa é reconhecida no Brasil todo como a casa de forró de Salvador‖. Abdon Leone (Forró Bomtodo): ―A casa tem uma proposta excelente e exerce um papel importante na medida que acredita no forró e nas bandas locais‖. Alessandro Porto (Forró Massapé): ―Única casa que se especializa o ano em um só estilo musical. Importante para autenticação e afirmação de um ritmo, uma cultura de raiz nordestina‖. Almir Souza (Flor Serena): ―A melhor casa de show de Salvador‖. Thiago Meoke (20xote um galope): ―Muito importante. Pioneira em divulgar novas bandas‖. 82 Joaquim de Almeida (Quininho de Valente): ―Acho que o Coliseu é muito importante para o forró. pois Salvador não tem muito espaço para os forrozeiros. Uma casa que divulga somente o forró, com público frquente, casa cheia, significa muito‖. Jó Miranda: ―Essa casa tem feito o que quase ninguém fez pelo forró aqui em Salvador, então, só tenho a agradecer aos responsáveis‖. Dimas Queiroz (Siri com Câimbra): ―Muito grande [a importância da casa], pois é uma casa de show diferenciada‖. 4.4 AMOSTRA DO PÚBLICO DO COLISEU Em diferentes eventos, são aplicados 28 questionários (em anexo) a fim de se obter uma amostra do perfil do público freqüentador do Coliseu. Dos entrevistados, apenas dois possuem menos de 21 anos (um declara possuir 17 e o outro 19). Quatro entrevistados afirmam possuir 21 anos; um, 22; três, 23; cinco, 24 anos; dois, 25 anos; dois, 27; dois 30; um, 33; dois, 35, um, 36; um, 42; um, 43 e um não declara a idade. Assim, a faixa etária predominante da amostra localiza-se entre os 20 e 30 anos. Dez pessoas afirmam possuir nível superior completo, seis cursam o terceiro grau, dez possuem o segundo grau completo, um era pós-graduado e um não respondeu à questão. Vinte e dois entrevistados nascem em Salvador. Cinco afirmam ser do interior baiano e um não responde. O estilo pé-de-serra é o preferido por 15 dos entrevistados. Quatro afirmam preferir o Forró Eletrônico, três o Universitário e seis não têm preferência definida. Vinte e quatro declaram-se freqüentadores assíduos de shows de forró e apenas quatro afirmaram freqüentar esporadicamente. 17 afirmaram já terem ido várias vezes à casa de shows, enquanto 11 entrevistados afirmaram que foram menos de três vezes ao Coliseu. 83 Questiona-se também se preferem São João ou Carnaval: 18 preferem o São João, seis afirmam gostar igualmente das duas e apenas três pessoas declaram preferir o carnaval. Assim, 57,14% da amostra possuem entre 21 e 30 anos, 7,14% menos de 22, 21,42% possui entre 33 e 43 anos. 35,71% têm nível superior, 35,71% possuem o segundo grau, apenas 21,42% é formado por universitários e 3,57% possuía pós-graduação. 78,57% nascem em Salvador, 17,85%, no interior do estado. O Forró Pé-de-Serra tem preferência de 53,57%, 14,28% afirma preferir o Forró Eletrônico e 10,71% declara preferir o universitário. 85,71% afirma ter o hábito de freqüentar shows de forró e 14,28% não o fazem. 64,28% dos entrevistados declaram preferir festas juninas ao carnaval, que foi preferência de apenas 10,71%. 21,42% afirmaram gostar igualmente de ambas. 84 CONSIDERAÇÕES FINAIS O estudo apresentado sobre o Forró em Salvador traz a trajetória do ritmo, desde a utilização do termo forró, enquanto local para dança, até os eventos atuais, também assim denominados. O enfoque especial recai sobre o Forró Pé-de-Serra, o Forró Universitário e o Forró Eletrônico, por serem os três formatos predominantes na cidade. O primeiro, inicialmente, fez-se necessário por ser a referência para os novos forrós analisados: ―O centro organizador das classificações, bem como das disputas que as envolvem, é o que se considera como a forma musical original do gênero, denominada pé-de-serra. Assim, o forró é classificado e valorizado positiva ou negativamente a partir da relação estabelecida com tal origem (ALFONSI, 2007: 129)‖. Conclui-se que o principal pólo produtor e distribuidor do Forró Eletrônico é Fortaleza, cidade pioneira no estilo, seguida pelo Rio Grande do Norte. O Forró Universitário origina-se em São Paulo, mas, a produção em âmbito nacional destes grupos é ínfima quando comparada à produção do FE. Foram percebidas semelhanças entre a evolução do Forró, a Lambada e a Axé-music, haja vista os três ritmos se originarem de ritmos periféricos que são reformulados e tornam-se presentes no mercado fonográfico brasileiro, atingindo não apenas a periferia, como também a classe média. Considera-se que a penetração na classe média, tanto em 1950, quanto em 1970 e em 1990, é fundamental para solidificação do forró no mercado fonográfico brasileiro. Citando Daniela Alfonsi (2007: 133): O forró e sua inserção em setores da classe média está ligada ao consumo particular que estes fazem das formas populares de lazer em grandes centros urbanos. A idéia lançada por T. J. Clark (2005) de que a classe média estabelece o que é o popular a partir do controle e manipulação de um material fornecido pelas classes baixas, processo tornado possível devido ao tipo de indústria de lazer surgida no desenvolvimento capitalista [...] Ao longo da pesquisa, percebe-se, de modo claro, que os Novos Forrós impulsionaram a volta do Forró Pé-de-Serra, mas este é remodelado devido a novas influências do FE e do FU. Em um movimento cíclico, percebe-se que, em Salvador, novas nomenclaturas entram 85 em declínio, apesar dos formatos estarem presentes predominantemente. Assim, o que se nota na cidade é a produção de um forró influenciado pelos novos formatos, mas que se recusa a adotar novas nomenclaturas. Percebe-se ainda que a nomenclatura Forró Pé-deSerra é mais atrativa para músicos e forrozeiros. Do forró tocado em Salvador, percebemse bandas e artistas querendo e recebendo novas nomenclaturas definitivas, especialmente o forroxé, ou forró pé-de-serra atual Salvador recebe bem os novos forrós, especialmente o FE. Assim, apesar de a cidade abrigar inúmeras bandas, poucas atingem sucesso fora do estado. Percebe-se também que o modelo de produção forrozeira da cidade é pouco atrativo para o momento atual do forró nacional, cujo destaque recai sobre o FE. É enfatizado a realidade vivenciada na capital, já que, ao longo da pesquisa, nota-se que o interior do estado tem outra dinâmica: o Forró Eletrônico é extremamente forte, contando, inclusive com bares com telões para a exposição de DVD‘s das bandas mais representativas do estilo.Um DVD de Forró Universitário raramente é utilizado nas cidades interioranas. Além do que, é comum os jovens destas localidades passarem horas bebendo em volta de carros super equipados sonoramente, no máximo volume possível, tocando Forró Eletrônico. Alguns radialistas, como Beto Barbosa, da rádio Nova Salvador, afirmam que em 2007, o Forró Eletrônico cresce muito na Bahia, sendo bastante solicitado pelos ouvintes assim também como Alexandre Liberatto diz que as produtoras de Salvador se interessam pelo produto forró, ressaltando que grandes e médias produtoras locais trabalham vendendo shows de alguma banda ou empresariando algum grupo, com raras exceções. FORRÓ ELETRÔNICO E A AXÉ-MUSIC EM 2008 Durante as entrevistas realizadas, alguns empresários, espontaneamente, expõem que o Forró Eletrônico cresce e consegue espaços antes ocupados apenas pela Axé-music. Ward Portela e Jânio Amílcar afirmam que, desde o ano passado, as bandas de Forró Eletrônico nacionais estão fechando contratos com prefeituras do interior do estado, para o São João, em conjunto com contratos de shows para Micaretas nas cidades. As Micaretas se 86 carcterizam por serem festas com trios elétricos, semelhantes ao carnaval, em épocas do ano distintas do período momesco, nos interiores baianos. A primeira e maior Micareta da Bahia ocorre na cidade de Feira de Santana: Micareta de Feira é a primeira da História, foi criada em 1937 por um grupo de feirenses inconformados pela não realização do Carnaval, impossibilitado por fortes chuvas. Com o passar do tempo, a festa se tornou uma das maiores manifestações populares do interior da Bahia e do Brasil. O nome deriva de uma festa francesa, Mi-carême, e desde os anos 90 vem se espalhando por várias capitais e cidades brasileiras, a partir do sucesso de sua realização em Feira de Santana62. Em 2008 se realiza entre os dias 17 e 20 de abril. Este ano, pela primeira vez, havia um bloco de forró: Aviões do Forró. Algumas das atrações divulgadas como principais eram também forrozeiras: Acarajé com Camarão, Saia Rodada, Cavaleiros do Forró e Karrasco do Forró63. Para Portela, Amílcar e Alexandre Liberatto, a Axé-music é um produto caro, por ser produzido em um único estado e agradar multidões, o que incentiva os empresários a cobrarem altos valores pelas contratações. De acordo com os três, os shows do estilo estão entre os mais caros nacionalmente e isto abre espaço para contratação dos Forrós Eletrônicos, mais baratos e que também agradam ao público. As bandas de FE tocam muito Axé e, quando o fazem, dificilmente é possível distinguir se tratarem de banda de Forró Eletrônico e não de Axé. Portela afirma que a diferença ocorre na percussão: ―A percussão da Axé-music é muito mais marcada do que a percussão do Forró Eletrônico. Mas esta diferença é pouco percebida, se o público está escutando e não vendo os shows. Estes sim, são bem diferentes‖. FORRÓ 2008 EM SALVADOR Ward Portela e Jânio Amílcar afirmam que 2008 é o ano com maior concorrência entre as casas de shows, desde 2001, na temporada junina. Segundo os empresários, diversas casas que nunca investiram no forró, o estão fazendo nesta temporada. 62 63 http://www.micareta.com.br/afolia.htm. Acesso em 03 de maio de 2008. http://www.feiradesantana.ba.gov.br/micareta/atracoes.htm. Acesso em 03 de maio de 2008. 87 A temporada da AABB sempre acontece às sextas-feiras. Em 2008, inicia-se a partir de 11 de abril, com shows de Flávio José, Forrozão Du Karai e Cavalo Doido. Em 18 de abril o show foi de Mulheres Perdidas, Forrozão Du Karai e Cavalo Doido. Em 25, Cavalo de Pau, Forrozão do Karai e Cavalo Doido. Como já apresentado no item anterior, as duas últimas bandas possuem uma relação especial com a organização dos eventos AABB. São atrações do mês de maio bandas com repercussão nacional: Magníficos, Adelmário Coelho e Mastruz com Leite. Os ingressos para os forrós da AABB custam 20 reais. Há também a opção de compra conjunta: pagando 50 reais a pessoa compra três dias seguidos. As bandas Arrocha o Nó e Colher de Pau realizam um projeto na casa de shows Espetáculo, nos dias 11 e 18 de abril. O espaço Espetáculo64, inaugurado em 2004, funciona no antigo Clube do Bahia e é propriedade do clube, sendo administrado por uma empresa especializada em eventos. O espaço dispõe de dois palcos e capacidade para aproximadamente seis mil pessoas. A temporada deveria se estender até o São João, mas se encerra em 25 de abril por desentendimentos entre as duas bandas. Os ingressos custavam R$ 12,00, porém devido a intensa distribuição de cortesias, a grande maioria do público pagava R$ 5,00 para entrar na festa. Para aqueles que preferem forró em ambiente mais sofisticado, os lugares juvenis mais requintados estão produzindo temporada de forró. Em 2008, o Bahia Café Hall, localizado na Avenida Luiz Viana Filho, com ambiente ao ar livre, faz temporada com a banda Estakazero e convidados. Cobra R$ 20,00 pelo ingresso feminino e R$ 25,00 pelo masculino, para quem comprar antes dos eventos, nos pontos de venda. Quem prefere ficar no camarote, paga R$ 50,00 pelo ingresso. Esta temporada está sendo realizada pela produtora Global. A antiga boate Fashion Club, administrada pela produtora de eventos Diva, é reformada e reabre em 25 de abril, com o nome de Club Madre. A casa faz temporada de forró com o músico Tenison Del Rey, a banda Tio Barnabé e convidados. O ingresso feminino custa R$ 64 http://www.esporteclubebahia.com.br/patrimonio/sededepraia.php?cod_categoria=4. Acesso em 02 de abr. de 2008. 88 25,00 e o masculino R$ 30,00. A casa também trabalha com cortesias. Quem as possuir entra pagando R$ 12,00, independente do sexo. O PÚBLICO JUVENIL SOTEROPOLITANO E O SÃO JOÃO 2008 A produção do forró soteropolitano tem seu ápice no São João. São nos dias da festa junina que bandas e empresários mais lucram. Os grupos musicais fazem sua agenda de shows, de acordo com as solicitações das prefeituras interioranas, meses antes. A banda Estakazero, por exemplo, em maio de 2008, já tem shows agendados para o São João de 2009 em cidades do interior. Os jovens da capital viajam com destino as cidades onde são realizadas, pelas produtoras de eventos soteropolitanas, as festas em espaços fechados. As propagandas das festas de forró no interior do estado iniciam-se ainda durante o carnaval. São placas de outdoor localizadas no circuito Barra/Ondina e nas principais ruas de acesso aos circuitos. A distribuição de panfletos também se intensifica. Assim como a divulgação de excursões mais prolongadas e rápidas, denominadas de Bate-Volta. Nesta modalidade, o cliente compra o ingresso da festa no interior (invariavelmente o ingresso vem acompanhado de camisa com uso obrigatório durante o evento) e um lugar no ônibus organizado por empresas de turismo que se encarregam de conduzi-lo à cidade e trazê-lo de volta, logo após o evento. No Forró do Bosque (21 e 23 de junho Cruz das Almas) tocam Trio Nordestino, Chiclete com Banana, Aviões do Forró, DJ Malboro, Forrótear, Flávio José, Zezé di Camargo e Luciano, Jammil, Cavalo Doido e Colher de Pau. No Forró do Sfrega, nos dias 22 e 23 de junho, as atrações principais são: Aviões do Forró e Jammil (banda da Axé-music de destaque nacional, muito aceita pelos paulistas). Em Amargosa há o Forró do PiuPiu 2008. Também se apresentam Asa de Águia (Axémusic), Aviões do Forró (FE), Os Cumpadi (FPS) e o Forró do Miúdo (FPS e FE). Este ano, a Pequena Notável, produtora responsável pelo evento, também organiza outra festa na mesma cidade, em parceira com a produtora de eventos Diva. Será o Forró do Harém, 89 no dia 22 de junho, tendo como atrações Alexandre Peixe, Flávio José, banda Yow e Tio Barnabé. Esse forró é uma continuação do trabalho realizado por estas produtoras em parceria no carnaval de Salvador, no bloco Harém que desfila na quinta-feira de carnaval e possui uma peculiaridade: a grande maioria das mulheres ganha o abadá. Para ganhar precisa ser indicada por alguém e ser considerada pelos organizadores, como bonita. As que não forem indicadas podem comprar na mão de terceiros, mas não no próprio bloco. Os homens compram o abadá. Este tipo de comercialização diferenciada garante à marca Harém a imagem de bloco de ―gente bonita‖. Isto faz com que os eventos com a marca sejam sempre muito disputados pela juventude da classe média e alta de Salvador. Além do Forró do PiuPiu e do Forró do Harém, a Pequena Notável fará também o Amargosa Light, com atrações a serem confirmadas. O sucesso obtido nas festas fechadas de forró no interior da Bahia aumenta o número de novos eventos: o Forró do Namoral começa em 2006, na cidade de Jequié, custando 140 reais com bebida, comida e camisa inclusas; em Itapetinga ocorre, desde 2006, o Forró da Vaca Loca, em 2008 as atrações serão a Banda Eva, Saia Roda, Falamansa, Limão com Mel; o Forró do Galo ocorre desde 2006, em São Gonçalo dos Campos. Os bailes de forró em Salvador e no interior são fonte de renda de diversos empresários e artistas soteropolitanos Além destes, os organizadores de excursões também faturam bastante com o período junino. O GOVERNO E O SÃO JOÃO 2008 O ano de 2008 também marca o início do interesse comercial do Governo do Estado no São João. No dia 30 de abril, em Salvador e no dia 06 de maio de 2008, em São Paulo é lançado o projeto São João da Bahia. De acordo com o sítio eletrônico da Secretaria de Turismo da Bahia – SETUR65, trata-se de uma ―[...] iniciativa que visa transformar os tradicionais festejos juninos em um novo produto turístico de âmbito nacional [...]‖. Ressalta ainda, na mesma página: ―[...] O investimento total do governo do Estado, incluindo infra-estrutura, na festa ficará entre R$ 8 milhões a R$ 10 milhões, dos quais R$ 3 milhões somente em publicidade e divulgação nacional do evento‖. O foco da campanha 65 http://www.setur.ba.gov.br/noticias.asp?id=799, acesso em 17 de maio de 2008. 90 são as cidades interioranas Ilhéus, Porto Seguro e a capital baiana. O site da SETUR afirma que em junho tais cidades possuem a menor taxa de ocupação da rede hoteleira. As três cidades não são atrativas para a juventude baiana passar o São João. Na página do projeto (www.saojoaodabahia.com.br) há informações também sobre mais 19 cidades, além das citadas. O projeto também será vendido em Portugal, com o slogan: ―Quem gosta do São João do Porto, vai amar o São João da Bahia‖ e na Argentina. A agência de publicidade que atende à SETUR é a Leiaute Propaganda, presente em Salvador e em Brasília. No material elaborado para apresentação do projeto, há os seguintes dados: Em 2007 foram movimentados mais de R$ 500 milhões em atividades juninas, no interior baiano. São envolvidos 417 municípios que realizam 1.600 shows, contabilizando 2.499 horas de forró na noite de São João (considerando apenas as bandas). No período, ocorrem 1.700 viagens intermunicipais de ônibus por dia. 300.000 carros cruzam o estado. A campanha para o projeto será divulgada em rede nacional, através de anúncios em sete jornais, incluindo encarte especial com oito páginas; seis revistas (Veja, Época, Isto É, Carta Capital, Viagem e Turismo, Caros Amigos); divulgação nos portais Hi-Mídia, Terra e Uol; 138 inserções de trinta segundos na Rede Globo de Televisão e 156 na Music Television do Brasil (MTV), além de 266 inserções em TVs fechadas. Na Bahia, a campanha conta com divulgação de 982 inserções radiofônicas na capital e 12.899 no interior; comerciais em seis emissoras de televisão; anúncios nos jornais A Tarde, Correio da Bahia e Tribuna da Bahia; 30 placas de outdoor na capital e 172 no interior e divulgação nos sites A Tarde Online e Ibahia. O tema do projeto é os 50 anos do Trio Nordestino, com a música ―Vem cair na Brincadeira‖. Estão programados shows na Praça Castro Alves, em Salvador, no período de 13 a 29 de junho. 91 Este projeto é o primeiro grande investimento governamental no São João baiano. Traz a possibilidade de mudança para o São João da capital, que até o ano de 2007, pouco recebia turistas, ao invés, era período de intensa evasão dos moradores locais. Exemplo disto é que os projetos realizados por produtoras e casas de eventos na capital, incluindo o Coliseu, ocorrem até o último final de semana antes do São João. Ao fim da pesquisa, considera-se que o forró está em crescimento na cidade, em função da alta concorrência entre as casas de shows, a partir de abril, além do projeto elaborado pelo governo Estadual. A pesquisa Produção e Consumo de Novos Forrós pretende trazer dados para dar continuidade ao debate sobre a importância do Forró em Salvador, demonstrando que não apenas a Axé-music atrai a juventude da capital. 92 ANEXOS 93 QUADRO COMPARATIVO 1 FORRÓ PÉ-DE-SERRA FORRÓ UNIVERSITÁRIO Emblemas do sertão Camisas floridas e coloridas Linguajar rural, matuto Linguajar urbano e praieiro Músicos acima dos 30 anos Músicos com 25 anos Apresentações em Trio com instrumentos na frente Apresentações sem o trio de instrumentos em destaque Vocalista é o sanfoneiro Vocalista não é o sanfoneiro 94 PLANTA BAIXA COLISEU 95 REGISTRO FOTOGRÁFICO Entrevista com Alcymar Monteiro Entrevista com o Trio Nordestino 96 Dominguinhos no Coliseu Entrevista com Dominguinhos 97 Ward Portela, Targino Gondim, Dominguinhos e Jânio Amílcar Entrevista com Verlando Gomes 98 Show da Flor Serena no Coliseu Colher de Pau no Coliseu 99 Coliseu Coliseu 100 Coliseu 101 REFERÊNCIAS ADORNO, Theodor W. O Fetichismo na Música e a Regressão da Audição. In Os Pensadores 67-108. São Paulo: Nova Cultural, 1999. ADORNO, Theodor W. HORKHEIMER, Max. Dialética do esclarecimento: fragmentos filosóficos . Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1985. ADORNO, Theodor W. e SIMPSON, G. 1986. Sobre a música popular. In: COHN, Gabriel. Theodor W. Adorno: Sociologia. São Paulo: Ática. (Coleção Grandes Cientistas Sociais). ALBUQUERQUE, Durval Muniz. A invenção do Nordeste e outras artes. São Paulo: Cortez, 2003. ALFONSI, Daniela do A. O Forró Universitário em São Paulo. In: Magnani, José G. & Mantese, Bruna (orgs.). Jovens na Metrópole. (no prelo) ALFONSI, Daniela do A. Para todos os gostos: um estudo sobre classificações, bailes e circuitos de produção do forró. Dissertação (Mestrado em Antropologia Social). Universidade de São Paulo. 2007. BAUDRILLARD, J. Para uma Crítica da Economia Política do Signo, Rio de Janeiro: Elfos: Lisboa: Edições 70, 1995. CAMPOS, Augusto de. Balanço da bossa: antologia crítica da moderna música popular brasileira. São Paulo: Perspectiva, 1968. CARVALHO, Eduardo. Festa do Forró. A Tarde, Salvador, 11 abr. 2008. Caderno 2. CASTRO, Ruy. Chega de saudade: a história e as histórias da bossa nova. São Paulo: Companhia das Letras, (1991). COELHO NETO, J. Teixeira. O que é indústria cultural. São Paulo: Brasiliense, 1986. CORDEIRO, Raimundo Nonato. Forró em Fortaleza na década de 1990: algumas modificações ocorridas. Dissertação (Mestrado Institucional em Música-MINTER) Universidade Federal da Bahia e Universidade Estadual do Ceará. Fortaleza, Ceará, 2002. DEBORD, Guy. A sociedade do espetáculo. Rio de Janeiro: Contraponto, 1997. DIAS, Márcia Tosta. Os donos da voz: indústria fonográfica brasileira e mundialização da cultura. São Paulo: Bomempo Editorial, 2000. ECHEVERRIA, Regina. Gonzaguinha e Gonzagão: uma história brasileira. São Paulo: Ediouro, 2006. ENCICLOPEDIA da música brasileira: erudita, folclórica, popular. . 2 ed. Sao Paulo: Art Editora, 1998. 102 FERNANDES, Adriana. Forró: música e dança ―de raiz‖? Anais do V Congresso Latinoamericano da Associação Internacional para o Estudo da Música Popular. Disponível em: <http://www.hist.puc.cl/historia/iaspm/rio/Anais2004%20(PDF)/AdrianaFernandes.pdf>;. Acesso em 28 dez. 2005. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Aurélio século XXI: o dicionário da língua portuguesa. 3 ed. Rev. Amp. Rio de Janeiro: Nova Fronteira; 1999. GUERREIRO, Goli. A Trama dos Tambores: a música afro-pop de Salvador. São Paulo: Ed. 34, 2000. GIFFANI, Maria Amália Corrêa. Danças folclóricas brasileiras. São Paulo: Melhoramentos, 1964. HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. 10. ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2005. IKEDA, Alberto. Forró: dança e música do povo. D.O. Leitura, São Paulo, 9 out. 1990. LIMA, Maria Érica de Oliveira. Regionalização da mídia: estratégias do grupo cearense Somzoom Sat. Trabalho apresentado ao XXX INTERCOM – Congresso Brasileiro de Comunicação, Santos/ SP, 2007. LOUREIRO, Mônica. Overdose de zabumba e triângulo. Cliquemusic. 2001. Disponível em http://cliquemusic.uol.com.br/br/Servicos/ParaImprimir.asp?Nu_Materia=2655>. Acesso em 26 fev. 2008. LUANA, Rocha. Pagando pra tocar uma. In.: Revista Metrópole, nº 9, 2008. MADEIRA, Márcio Mattos Aragão. Forró Glocal: a transculturação e desterritorialização de um gênero músico-dançante. Dissertação (Mestrado Institucional em Música– MINTER)Universidade Federal da Bahia e Universidade Estadual do Ceará. Fortaleza, Ceará, 2002. MAMEDE, Maria Amélia B. A Construção do Nordeste pela Mídia. Fortaleza, IOCE (Coleção Teses cearenses), 1996. MOORE, F. Richard. Uma abordagem tecnológica da música. University of California, San Diego. Disponível em http://www.musica.ufmg.br/~gilberto/ATAM.PDF> . Acesso em: 26 fev.2008. OLIVEIRA, Francisco Maria C. . Nordeste: a invenção pela música. In: CAVALCANTE, Berenice; STARLING, Heloisa; EISENBERG, José. (Org.). Decantando a República: inventário histórico e político da canção popular moderna brasileira.. 3 ed. São Paulo e Rio de Janeiro: Fundação Perseu Abramo;e Nova Fronteira; FAPERJ., 2004. PESSOA, Ana. A vez da umbigada. Veja, São Paulo, nº 1543, 22 de abril de 1998. Disponível em: http://veja.abril.com.br/220498/p_122.html. Acesso em 01 fev. 2008. 103 PENNA, Maura. O que faz ser nordestino: identidades sociais, interesses e o ―escândalo‖ Erundina. São Paulo: Cortez, 1992. PINHEIRO, Andréa; PAIVA, Flávio. Somzoom: música para fazer a festa. Trabalho apresentado ao XXX INTERCOM – Congresso Brasileiro de Comunicação, Santos/ SP, 2007. RAMALHO, Elba Ramalho. Luiz Gonzaga revisitado. 2004. Disponível em: http://www.hist.puc.cl/iaspm/rio/Anais2004%20(PDF)/ElbaRamalho.pdf. Acesso em 03 out. 2006. ________________. Luiz Gonzaga: a síntese poética e musical do sertão. São Paulo: Terceira Margem. 2000. RIBEIRO, Hugo Leonardo. A Folclorização do Folclore ou A Folclorização como Folclore. In.: Universos da Música. III Encontro Internacional da Associação Brasileira de Etnomusicologia. 2006. Disponível em: http://www.pesquisamusicaufpb.com.br/Masters/anais_abet2006.pdf. Acesso em 01 de março de 2008. RUBIM, Antonio Albino Canelas. Espetáculo In. RUBIM, Antonio Albino Canelas Cultura e atualidade. Salvador: EDUFBA, 2005. SILVA, Expedito Leandro. Forró no Asfalto: mercado e identidade sociocultural. São Paulo: Annablume, 2003. SUZIGAN, Geraldo. O que é música brasileira? São Paulo: Brasiliense, 1990. TINHORÃO, José Ramos. Os Sons que Vêem da Rua. 2. ed. São Paulo, 2005. TINHORÃO, José Ramos. Pequena história da música popular: da modinha a Lambada. 6.ed. São Paulo: Art Editora LTDA, 1991. VIEIRA, Sulamita. O sertão em movimento: a dinâmica da produção cultural. São Paulo: Annablume, 2000. VIANNA, Hermano. Isso é Calypso – ou A Lua Não Me Traiu. 2007. Disponível em: http://www.overmundo.com.br/overblog/isso-e-calypso-ou-a-lua-nao-me-traiu. Acesso em 03 de março de 2008. VIANNA, Hermano. Paradas do Sucesso Periférico. In.: Revista Sexta-feira, nº 8, 2006, Editora 34. Disponível em: http://www.overmundo.com.br/banco/paradas-do-sucessoperiferico. Acesso em: 01 de dezembro de 2007. VILELA, Ivan. Capítulo X: o caipira e a viola brasileira. In.: PAIS, José Machado, BRITO, Joaquim Pais de, CARVALHO, Mário Vieira de, orgs.(2004), SONORIDADES