(Panthera onca, Linnaeus 1758) em Boa Vista, Roraim

Propaganda
Nota sobre técnicas de Enriquecimento Ambiental Alimentar com Onça-pintada
(Panthera onca, Linnaeus 1758) em Boa Vista, Roraima: uma forma de minimizar
o estresse do cativeiro.
Raimundo Erasmo Souza Farias¹, Nathália Coelho Vargas²
¹ Mestrando pelo Programa de Pós-Graduação em Biologia de Água doce e Pesca Interior (PPG BADPI) Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia; convênio com a Universidade Estadual de Roraima
(UERR). Endereço: Rua Coronel Pinto, nº 315, Centro. CEP 69301-970, Boa Vista, Roraima. E-mail.
[email protected].
²Bióloga, Mestre em Biologia Animal, pela Universidade Federal de Viçosa, Minas Gerais. Professora do
Curso
de
Ciências
Biológicas
da
Faculdade
Cathedral,
Boa
Vista,
Roraima.
[email protected].
Resumo
Estudos sobre o comportamento de animais e técnicas de enriquecimento
ambiental funcionam muito bem na minimização do estresse provocado pelo cativeiro.
Este trabalho tem como objetivo apresentar quatro técnicas que utilizadas e aprovadas,
com onças-pintadas mantidas em cativeiro no Mantenedouro de Fauna Silvestre do 7º
Batalhão de Infantaria de Selva em Boa Vista, Roraima. Verificamos que as técnicas
realizadas demonstraram-se eficazes na minimização do estresse provocado pelo
cativeiro. Após os enriquecimentos os animais apresentaram comportamento menos
agressivos,
a
frequência
de
pacing
observada
pelos
tratadores
diminuiu
significativamente.
Palavras-Chave: cativo, agressivo, pacing, minimização.
Abstract
Studies on the behavior of animals and techniques of environmental enrichment
work very well in the minimization of the stress provoked by the captivity. In this work
I have as objective presents four techniques that worked very well with ounce-painted
maintained in captivity in Mantenedouro of Fauna Silvestre of the 7th Battalion of
Infantry of Jungle in Boa Vista, Roraima. We verified that the accomplished techniques
were demonstrated very effective in the minimization of the stress provoked by the
captivity. After the enrichments the animals presented less aggressive behavior, the
pacing frequency observed by the handlers it decreased significantly.
Key-Words: captive, aggressive, pacing, minimization.
Introdução
O Brasil está entre os países de maior riqueza de fauna, ocupando o 1º lugar em
número de espécies de mamíferos do mundo (RENCATS, 2001). Também é o país com
a maior biodiversidade do planeta, possuindo cerca de 14% da biota mundial,
considerado um país de megadiversidade biológica (BASTOS et al., 2008). No entanto,
um grande número de espécimes desta fauna são traficados diariamente, sendo
apreendidos pelas mais diversas atividades de fiscalização ambiental (FARIAS, 2013;
RENCTAS, 2001).
O Comando de Fronteira Roraima/ 7º Batalhão de Infantaria de Selva, Batalhão
Forte São Joaquim, localizado na cidade de Boa Vista - Roraima mantém há mais de 15
anos, em suas dependências físicas, animais silvestres provenientes de situações ilegais
apreendidos. No ano de 2005 foi implantado como Criadouro Conservacionista de
Espécies da Fauna Ameaçadas de Extinção e Vulneráveis, registrado sob o nº
02025.001.507/05-33 IBAMA/RR (FARIAS, 2013), atualmente locado na categoria de
Mantenedor de Fauna Silvestre (MFS), por apresentar atividades de educação
ambiental.
Antigamente os zoológicos eram locais que objetivavam exclusivamente a
exposição dos animais silvestres, sendo que os recintos eram feitos apenas com cimento
visando a facilitar a limpeza, mas sem nenhuma preocupação com o bem-estar dos
animais. Somente a partir do século XX os zoológicos foram transformados em centros
de conservação (ALMEIDA, 2006) e na década de 1920 surge uma prática simples e
eficaz realizada pelo pesquisador pioneiro em comportamento de primatas, Robert
Yerkes, denominada enriquecimento ambiental.
Segundo Almeida 2006, o enriquecimento ambiental é um manejo que procura
ampliar a qualidade de vida dos animais em cativeiro através da identificação e
fornecimento de estímulos ambientais necessários para alcançar o bem-estar psíquico e
fisiológico, estimulando comportamentos típicos da espécie, reduzindo estresse e
tornando o ambiente cativo mais complexo e diverso. Sabemos que o enriquecimento
ambiental funciona como uma prática importante para melhorar as condições dos
animais em cativeiro, atuando como uma ferramenta essencial para a diminuição do
nível de estresse provocado pela exclusão do fator liberdade (BOERE, 2001).
Estudos demonstram que quando é dada aos animais a oportunidade de escolha,
entre “trabalhar” para conseguir recursos alimentares ou acessá-los facilmente, muitos
deles escolhem a primeira opção. Isso sugeria que os animais pudessem ter a
necessidade biológica da procura pelo alimento, entre outros tipos de comportamento, e
quem a negação dessa oportunidade poderia ser uma fonte de frustação e estresse
(Hughes& Duncan, 1988).
Os animais dependem de algumas características e habilidades que permitirão
sua adaptação (DARWIN, 1860). Desta forma, quando privados ao cativeiro, cabe aos
administradores da instituição que os mantém fornecerem tais condições essenciais para
sua adaptação. Sabemos que agressividade excessiva, estereotipias ou inatividade são
comportamentos estimulados pelo cativeiro (MORATO et al., 2001).
O Mini-Zoo, como é conhecido o MFS localmente, desenvolve atividades
rotineiras de conservação, ensino e pesquisas, coordenando e organizando, em parceria
com outras instituições ou mesmo individualmente, uma série de atividades para
informar o público local e geral acerca da fauna regional e trabalhos que melhorem as
condições de sobrevivência dos animais cativos (FARIAS, 2013).
Este trabalho tem como objetivo apresentar técnicas de enriquecimento
ambiental alimentar utilizadas no MFS que favoreceram o bem estar dos animais
cativos Onça-pintada (Panthera onca, Linnaeus 1758), diminuindo o estresse.
Materiais e métodos
Foram realizadas técnicas de enriquecimentos ambientais alimentares com três
onças-pintadas cativas no MFS, animais que devido explicações diversas são
impossíveis de se adaptarem novamente ao ambiente natural. A família Felidae é um
dos grupos com maior riqueza de carnívoros, incluindo espécies que variam desde 1Kg
até mais de 230Kg (MOREIRA, 2001). A onça-pintada, Panthera onca (Linnaeus, 1758)
é o maior felídeo das Américas e o predador do topo da cadeia alimentar nos
ecossistemas em que habita, exercendo função importante na manutenção da estrutura e
no funcionamento destes ambientes (RAMALHO, 2006).
Foram testadas para os três espécimes, de 7, 9 e 13 anos, técnicas que minimizassem o
estresse observado nos recintos, como Pacing e o estreese ofensivo contínuo, no qual o
animal sempre exerce posturas de ataques durante todo o tempo.
Foram realizadas quatro técnicas de enriquecimentos; saco pendurado com
carne, alimento mergulhado, trilha de cheiro e carne envolvida em caixas.
Para a técnica do saco pendurado (Figura 1 e 2), são utilizados dois sacos de
fibras novos, colocada a quantidade de alimentação do animal dentro do recipiente e
amarrado com cordas novas, “bem forte”, em alguma estrutura do recinto que o permita
saltar e ficar pendurado para rasgar o saco e retirar a recompensa (alimentação). Vale
ressaltar que esta técnica deve ser realizada de maneira correta, o saco deve estar bem
preso à haste, pois, quando mau amarrado o animal pode cair e obter algum trauma,
lembrando que estamos trabalhando com um felino de grande porte. Observamos que
quando o animal (onça) consegue retirar o alimento, sempre cai em sua posição normal
de locomoção, pois já está esperando o momento com a retirada da alimentação.
Normalmente são realizadas várias investidas para que o animal obtenha êxito, o qual é
o objetivo desta técnica.
Figura 1: Técnica de pendurar o saco com carne no recinto. Animal exercitando
todos os músculos corporais.
Fonte: Autor (2012).
Figura 2: Animal saltando para buscar a recompensa. Note a estrutura de ataque e a morfologia
apresentada.
Fonte: Patrícia Velho (2010).
O alimento mergulhado (Figura 3 e 4) é uma técnica fácil e demonstrou muita
eficácia. Para isto, basta que o alimento seja apresentado ao animal, o qual deve estar
contido no cambiamento, deixar que ele sinta o cheiro por um minuto. Neste momento
deve-se ter cuidado, pois o espécime irá fazer de tudo para puxar a carne para dentro do
cambiamento. A idéia é somente estimular o desejo do animal. Logo após, deixando
cair alguns pingos de sangue no chão, a carne deve ser imediatamente submergida na
piscina, a qual deve estar completamente cheia. Em seguida o animal deve ser solto.
Figura 3: Animal procurando a carne mergulhada. Neste exemplo a onça está tateando o fundo da piscina
procurando tocar no alimento para exercer o mergulho.
Fonte: Patrícia Velho (2010).
Figura 4: Animal mergulhado a procura do alimento.
Fonte: Autor (2012).
A trilha de cheiro é feita escondendo-se a recompensa no recinto, sob folhas,
galhos, capim, entre outros objetos, desde que sejam “naturais”. Logo depois é
espalhado sangue em forma de trilha desde a porta do cambiamento até o esconderijo.
Para melhorar a técnica são realizados vários esconderijos similares ao verdadeiro para
que estimule a dúvida e curiosidade do animal, assim ele utiliza a trilha de sangue como
a fonte principal de orientação.
Para a técnica de carne envolvida em caixas (Figura 5) basta ter em mãos duas
caixas de tamanhos diferentes. O alimento deve ser colocado no interior dos dois
recipientes e então lacrados com fitas adesivas. Em seguida o animal deve ser solto do
cambiamento. Verificamos nesta técnica que este tipo de enriquecimento estimula o
instinto agressivo dos animais. Vale relembrar que este instinto faz parte da “ética”
comportamental dos grandes felinos, e que este termo agressivo é de elaboração
humana.
Figura 5: Técnica do alimento envolto em caixas. Note a ferocidade no movimento do animal
demonstrado pela disposição muscular.
Fonte: Autor (2012).
Resultados e conclusões
De início das conclusões obtidas, é importante deixar claro que este trabalho foi
elaborado apenas por observações visuais, não sendo realizado nenhum experimento
laboratorial para a obtenção dos resultados e conclusões aqui ditas. Um fator importante
a se levar é conta em trabalhos desta natureza diz respeito a experiência dos tratadores
no manejo dos animais, onde a partir daí, as demais informações são obtidas. Muitas
vezes, apenas a observação de um tratador experiente é mais eficiente que exames de
rotina no plantel, onde este consegue observar comportamentos e patologias que apenas
exames laboratoriais não são capazes de captar.
Verificamos que as técnicas realizadas no MFS demonstraram-se muito eficazes
na minimização do estresse provocado pelo cativeiro. Após os enriquecimentos os
animais
apresentaram
comportamento
de
comportamento
pacing
diminuiu
menos
agressivos,
significativamente,
a
frequência
sendo
do
verificado
comportamento de brincadeiras em um animal extremamente estressado (Cimba, onçapreta).
Enfatizamos que as técnicas apresentadas devem ser ministradas em intervalos
de tempo que não as tornem mais uma fonte de estresse. Elas devem ser tidas pelos
animais cativos como uma atividade desejável, e nunca como algo estressante. Podemos
verificar tal afirmação caso os animais não se determinem a realizá-las, não mostrando
interesse em praticar. Estas técnicas, especialmente a de alimento submerso, é indicada
principalmente para animais obesos, onde a natação atua de uma forma satisfatória
como uma estratégia de gasto energético.
A técnica de alimento suspenso no saco é indicado para animais com uma
estrutura física não muito obesa e que apresentam-se muito estressados ou
com
estereotipias. Verificamos no MFS que esta técnica funciona muito bem.
De acordo com CHEIDA et al. (2006), além do hábito terrestre, onças pintadas
escalam árvores e nadam muito bem. Sendo assim, soluções simples como a colocação
de troncos e tanques de tamanho suficiente para que o animal consiga nadar, podem
contribuir significativamente para o melhoramento das condições de indivíduos dessas
espécies que vivem em cativeiros.
A trilha de cheiro estimulou o olfato dos animais de forma interessante, onde
verificamos ao abrir os cabeamentos, uma certa dúvida ao visualizarem os vários pontos
surpresas, e para qual deles deveriam se dirigir. Em todas as réplicas realizadas os
espécimes sempre utilizaram o olfato como forma de forrageio. Enriquecimentos deste
tipo são enfatizados por Silva (2011) por enquadrar-se em mais de uma categoria, além
de alimentar enquadra-se como cognitivo, por apresentar um problema a ser
solucionado. A justificativa de que o categoriza como enriquecimento alimentar é que é
modificada a maneira de oferecer a ração (SILVA, 2011).
Encerrando, enfatizamos que estas técnicas funcionaram satisfatoriamente no
MFS em Boa Vista, Roraima. Elas foram feitas exclusivamente com animais
sedentários e que não tinham mais condições de serem reintroduzidos na natureza. Não
tivemos como objetivos medir estatisticamente a variabilidade das diferenças com a
introdução das técnicas, apenas apresentá-las como uma forma de contribuir com
mantenedores de animais silvestres cativos. Esperamos que possa servir de auxílio para
órgãos de manutenção de animais silvestres em cativeiro que estejam preocupados com
o bem estar dos animais.
Referencias Bibliográficas
ALMEIDA, A. M. R. Influência do enriquecimento ambiental no comportamento
de primatas do gênero Ateles em diferentes condições de cativeiro no
departamento de zoológico de Curitiba, PR. Monografia para obtenção do grau de
bacharel em Ciências Biológicas pela Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2006.
BASTOS, L. F.; LUZ, V. L. F.; REIS, I. J.; SOUZA, V. L. Apreensão da Fauna
Silvestre em Goiás - Situação e Destinação. Rev. Biol. Neotrop., v. 5, n. 2, p. 51-63.
2008.
BOERE, V. Environmental enrichment for neotropical primates in captivity.
Ciência rural. 31(3): 543 - 551, 2001.
CHEIDA, C. C. Ordem Carnivora. Mamíferos do Brasil. Editado por: Nélio R.
Rodrigues; Adriano L. Peracchi; Wagner A. Pedro e Isaac P. de Lima. Londrina, 2006,
DARWIN, C. (2004). A origem das espécies. Rio de Janeiro: Ediouro. (Trabalho
original publicado em 1860).
FARIAS, R. E. S. Levantamento dos animais silvestres depositados no
Mantenedouro de Fauna Silvestre do 7º BIS (Batalhão de Infantaria de Selva) e
sua história: uma amostra do tráfico de animais silvestres no Estado de Roraima.
Diálogos & Ciência, nº 33, março de 2013.
HUGHES, B. O., and DUNCAN, I.J.H. The notion of ethological “need”, models of
motivation, and animal welfare. Anim. Behav. 36:1696. 1988.
Morato R. G. et al. (2001). Comparative analyses of semen and endocrine
characteristics of free-living versus captive jaguars (Panthera onca). Reproduction,
122, 745-751.
MOREIRA, N. Aspectos reprodutivos e respostas adrenocortical em fêmeas de
felídeos do gênero Leopardus. Dissertação (Doutorado em Zoologia) – Universidade
Federal do Paraná, Curitiba, 2001.
RAMALHO, E. E. Uso do Habitat e dieta da onça pintada (Panthera onca) em uma
várzea, reserva de desenvolvimento sustentável Mamiruá, Amazônia central,
Brasil.
Dissertação de mestrado. Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, 2006.
RENCTAS. Primeiro relatório Nacional sobre o Tráfico de Animais Silvestres.
Brasília.
Renctas,
2001.
Disponível
em:
www.renctas.org.br/files/REL_RENCTAS_pt_final .pdf.
SILVA, R. O. Enriquecimento ambiental cognitive e sensorial para onças-pintadas
(Panthera onca) sedentárias em cativeiro induzindo redução de níveis de cortisol
promovendo bem estar. Dissertação de Mestrado - Programa de Pós-Graduação em
Ciências do Comportamento/Departamento de Processos Psicológicos Básicos –
PPB/Instituto de Psicologia – IP/Universidade de Brasília- Unb, 2011.
Download