O conceito de guerra na filosofia de Heráclito de Éfeso Felipe Luiz, Pedro Novelli, Marília, Faculdade de Filosofia e Ciências, Filosofia, [email protected], BAAE I Palavras Chave: filosofia da guerra; ontologia; Heráclito de Éfeso Introdução Há certo consenso quando se trata de interpretar determinados pensadores, tanto mais acentuado no caso dos filósofos que precederam Platão e Aristóteles. No caso deste último, especificamente, este consenso toma vigor visto que o mesmo traça uma história da filosofia pregressa visando, de um lado, posicionar-se no debate já então em desenvolvimento, de outro mostrar os erros de seus antecessores de modo a explicitar as deficiências de outros pensadores, dando-se a si mesmo papel prevalente no debate filosófico. Assim é que a tradição apresenta Heráclito de Éfeso, que viveu antes de Platão e Aristóteles, sob o duplo viés de ser um pensador marcado pela reflexão acerca da arché (princípio) da physis (natureza), dando o fogo como logos (razão) da mesma, bem como por buscar compreender o movimento do ser, o que se expressa na famosa expressão, que teria sido i proferida por ele , segundo a qual “não se pode entrar no mesmo rio duas vezes”. Neste ínterim, o pólemos (guerra) aparece como que coadunado ao fogo, exercendo papel de determinação no seio das coisas, as quais, embora contrariamente discordantes, terminam por concordar no âmago da physis ela mesma. Heráclito é apresentado, pois, como físico — expressão de Aristóteles — que travou debate seja com outros físicos que o precederam, seja com Parmênides de Éleia, apresentado como um pensador do imobilismo do ser, contra um Heráclito defensor da mobilidade deste. Eis a forma canônica como se nos apresentam a filosofia de Heráclito de Éfeso. Desta feita, coligimos e desenvolvemos a presente análise. Resultados e Discussão Se bem haja razão em dar papel prevalente ao fogo como elemento determinante na ontologia heraclítica, há de se reposicionar a noção de guerra, bem como o significado de variadas expressões que ora aparecem. Salientamos as traduções de physis enquanto “natureza”, tradução esta de origem latina, e que encaminha já a interpretação, posto que o verbo phyein, de onde a expressão origina-se, significa aquilo que “viceja de modo imanente”; a de arché, traduzida por “princípio” que assim faz perder a duplicidade de sentido do verbo árchein, que significa, ao mesmo tempo, “comandar” e “principiar”; bem como da noção de pólemos, a qual se bem significa “guerra”, deve ser matizada com outros termos que também indicam conflito, como machein e palé e, especialmente, com a noção de stásis, que indica, preferencialmente, “guerra intestina”, em uma palavra “revolução” ou “sedição”. Como é mister ao ofício filosófico, a escolha dos instrumentos de trabalho —em nosso caso, os conceitos — indicam a concepção do objeto em vista. No caso da noção de guerra especificamente, Heráclito a situa na origem de todas as coisas, mas este conflito é reinscrito na harmonia superior da physis com ela mesma; por isso o termo pólemos, “guerra externa”, e não stásis, que terminaria por situar o conflito no âmago da physis, que, assim, concebida, não concordaria com si mesma, mas seguiria na discórdia fundamental e originária. Conclusões Objetivos Nossos objetivos são aclarar as relações entretidas pelo conceito de guerra com o conjunto do construto filosófico de Heráclito, intentando provar que não há aqui, em fato, um pensamento verdadeiramente bélico, do que decorre que discordemos da interpretação canônica do mesmo. Material e Métodos Para levar adiante nossas reflexões nos valemos do texto original de Heráclito, em grego arcaico, de duas distintas traduções do mesmo, bem como de textos de comentadores nacionais e estrangeiros. XXVIII Congresso de Iniciação Científica Compreendemos que, quando contrapostas as noções de pólemos e de stásis, a interpretação dominante de Heráclito é virada ao contrário: não se poderia mais assumi-lo integralmente como filósofo do movimento e da guerra, visto serem estes reintegrados na unidade da physis, a qual, assim, harmonicamente concorda consigo mesmo, sendo a belicidade da mesma mera aparência no fim das contas. i DK 91 in Heráclito de Éfeso: Fragmentos contextualizados, Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 2005, p. 109