1 Elias Couto e Almeida Junior DEFAULT ARGENTINO: A CRISE ENTRE O GOVERNO E OS FUNDOS DE INVESTIMENTO. Monografia apresentada, como requerimento parcial para obtenção do título de Bacharel Internacionais pela em Relações Universidade Católica de Brasília. Autor: Elias Couto e Almeida Junior Supervisor: Msc. Carvalho de Souza Creomar Lima 2 DEDICATÓRIA Dedico primeiramente a minha família que me proporcionou momentos de felicidade e tranquilidade para que eu pudesse chegar até aqui. A um grande professor, parceiro e amigo o Msc. Creomar Lima Carvalho de Souza. Por fim dou minha dedicatória exclusiva a minha namorada, Gabriela Gomes de Assis, por me apoiar em todos os momentos de tensões e de medo. 3 EPÍGRAFE “A criatividade dos jovens que mudará o mundo“ 4 RESUMO A situação econômica e política da Argentina está vivendo um período muito complexo, envolvendo dívidas passadas que retraem o crescimento do país e pode coloca-lo uma vez mais em um calote internacional. Para evitar ou reduzir o impacto deste problema a intervenção e atores internacionais e transnacionais se tornou imprescindível. A presidente Cristina Kirchner se despede da política argentina deixando um legado crítico para o seu sucessor. Este trabalho objetiva a interpretação dos fatos ocorridos entre os anos de 2001 a 2014, período o qual tivemos no seu início uma crise deflagrada por um calote internacional nos primeiros anos do século XXI e doze anos depois um novo default. A transição do governo peronista para o Kirchnerismo faz parte da interpretação do caso estudado, por tanto este assunto estará presente ao longo do trabalho desenhando o panorama da Argentina. O estudo busca entender quais os motivos da crise, quem são os atores envolvidos e qual o cenário atual. Palavras Chaves: Argentina, Economia, Política, Nestor Kirchner, Cristina Kirchner, Peronismo, Kirchnerismo, Default, Fundos de Investimento, Fundos Abutres, RUFO, Negociação. 5 ABSTRACT The economic and political situation in Argentina is going through a very complex period, involving past debts that shrink the country's growth and can put it once more in an international default. To avoid or reduce the impact of this problem the intervention of international and transnational actors has become essential. President Cristina Kirchner bids farewell to Argentine politics leaving a critical legacy for his successor. This work aims to interpret the events that occurred between the years 20012014, a period, which we had at the bottom a crisis triggered by an international default in the early years of the twenty-first century, and twelve years later a new default. The transition from the Peronist government to Kirchnerism is part of the interpretation of the case study; therefore this issue will be throughout the work drawing the panorama of Argentina. The study seeks to understand the motives of the crisis, who are the stakeholders and what the current situation. Key Words: Argentina, Economy, Politics, Nestor Kirchner, Cristina Kirchner, Peronism, Kirchnerism, Default, Investment Funds, Vultures Funds, RUFO and Trading. 6 LISTA DE FIGURAS Tabela 1 – Lista de defaults Argentinos Imagem 1 - Tomadores de decisões e seu poder de influência Gráfico 1 – Crescimento econômico Argentino Gráfico 2 – Índice de desemprego da Argentina Gráfico 3 – Balança comercial da Argentina Imagem 2 – Razão de Guidotti dos países do BRIC e Mercosul entre 2000 e 2009.* Imagem 3 - Histórico de Classificações do Moody's sobre a Argentina Imagem 4 - Explicação do significado das siglas utilizadas pelas agência de risco 7 LISTA DE SIGLAS FMI – Fundo Monetário Internacional RUFO – Rights Upon a Future Offers INDEC - Instituto Nacional de Estatísticas e Censo 8 SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO...................................................................................10 1.1 O Problema e sua Importância.................................................10 1.2 Hipótese....................................................................................13 1.3 Objetivo.....................................................................................13 1.3.1 Objetivos Gerais..............................................................13 1.3.2 Objetivos Específicos.....................................................13 1.4 Metodologia..............................................................................14 2. ABORDAGEM TEÓRICA..................................................................14 2.1 Revisão de Literatura................................................................15 2.2 Referência Teórica...................................................................16 3. DESENVOLVIMENTO.......................................................................18 3.1 O Kirchnerismo e a Degradação Institucional Argentina..........18 3.1.1 O Kirchnerismo................................................................18 3.1.2 A crise do modelo político Argentino..............................21 3.2 Hedge Funds conceito e relevância para a economia internacional................................................................................27 3.2.1 Entendendo o Conceito de Fundos de Hedge................27 3.2.2 Influência dos Fundos de Hedge no cenário Político Argentino ......................................................................................29 3.2.3 Cláusula RUFO e suas consequências políticas.............30 3.3 O passo a passo da Crise entre o Governo Argentino e os Fundos de Hedge........................................................................32 3.3.1 A Negociação entre Governo Argentino e os Fundos..32 9 3.3.2 A ação dos Fundos de Hedge na Corte de Justiça de Nova York...................................................................36 4. CONCLUSÃO....................................................................................38 5. REFERENCIAS ................................................................................39 6. ANEXO..............................................................................................42 6.1 Mapa de relacionamento entre o governo argentino...............43 10 1. INTRODUÇÃO A pesquisa busca descrever a crise da Argentina com os fundos de investimento. Neste contexto é importante entender o que são os fundos de investimento e de onde este montante é adquirido, para assim entender a motivação de reduzir o impacto nas suas receitas. O propósito principal deste ensaio é apresentar as causas que levaram os hedge funds entrarem contra o governo argentino na Corte de Justiça de Nova Iorque. Interessante ressaltar que a crise está entre um ator público e outro privado. Neste cenário, o trabalho a seguir é estruturado em problema e sua importância, hipótese, objetivos e metodologia. 1.1. O PROBLEMA E SUA IMPORTÂNCIA O que são os Hedge Funds? Os “hedge funds” são fundos de investimentos que usam várias modalidades de aplicações financeiras, afim de garantir retorno absoluto do valor investido. 12 Os fundos que serão tratados neste trabalho se referem aos que tem sua principal sede em Nova Iorque nos Estados Unidos da América (EUA) e são eles o fundo NML, Aurelius e o EM. O fundo NML Capital (fundo vinculado ao Elliot Management Corporation), foi criado em 1977 nos Estados Unidos ( no estado de Nova Iorque), iniciando com um capital de aproximadamente US$ 1 milhão, e que renderam até 2014 cerca de US$23 bilhões3 . Outro fundo importante de ser ressaltado é o EM, que tem como seu proprietário o Sr. Kenneth Dart, um magnata que teve aparições importantes no cenário latino americano. Ganhou um julgamento contra o Brasil depois de comprar bônus “lixo” e foi 1 http://www.infomoney.com.br/educacao/guias/noticia/412945/hedge-funds-sem-misterios-entenda-quesao-como-funcionam 2 http://www.eurekahedge.com/database/faq.asp#1 3 http://www.efe.com/efe/noticias/brasil/economia/conhe-fundos-abutres-detentores-divida-que-espreitamargentina/3/2019/2352363 11 denunciado pelo Fisco argentino por supostos superfaturamentos e fuga de divisas por sua empresa norte-americana de produção de copos térmicos com sede na Argentina4. Não obstante, também está o fundo Aurelius, fundado por Mark Brodsky, conhecido por “Exterminador”5 pelo jornal Independent do Reino Unido. Mark possui este apelido por não dar flexibilidade à nenhum credor e também por praticar a compra de empresas em crises e posteriormente revendê-las ao seus donos com um valor acima do esperado. Relação entre os Fundos de Investimento e o Governo Argentino A Argentina passou por quarto grandes momentos de crise financeira6 (como é possível ver na tabela a seguir). A crise de 2001/2002, foi o início da tensão que se instaura no país até o presente momento7. A tabela abaixo mostra os momentos de default na Argentina, e o presidente que fez a declaração ao longo da história deste país. Tabela 2: Lista de defaults Argentinos 4 Ano Presidente 1827 Vicente López y Planes 1890 Julio Roca 1982 Leopoldo Galtieri 2001/2002 Adolfo Rodríguez Saa http://www.bloomberg.com/news/2013-05-21/billionaire-dart-s-argentine-foam-cup-unit-raided-by-taxagents.html 5 http://www.independent.co.uk/news/business/news/coop-members-finding-out-the-harsh-reality-ofmutual-banking-8897589.html 6 http://www.cartafinanciera.com/tendencia-actual/historia-del-default-en-argentina/ 7 “Argentina: Processo de Estabilização”. Secretaria de Finança e Ministério da Economia. Abril de 2003. 12 Produzido por: Elias Couto Após 12 anos do pedido de moratória na Argentina8 (referente à crise de 2001), encerra-se o prazo para que o governo se alinhasse com os Fundos de Investimentos afim de realizar o pagamento dos títulos de dívida pública adquiridos durante a crise, com o intuito de ajudar a reerguer o país. Durante esse período ocorreram negociações para um acordo, que beneficiaria a todas as partes, pois o que foi previamente acordado não poderia ser pago pela Casa Rosada9 no tempo determinado. Alguns fundos de hegde aceitaram uma negociação para redução do valor previamente acordado, aproximadamente 92% dos detentores dos papeis de dívida pública. Entretanto a outra parte, 8%, não aceitou a negociação, e pediu algo acima do oferecido, porém ainda abaixo do valor pré-acordado10. Negociação com a atual presidente, Cristina Kirchner, não foi fácil, esta relutou até o último momento sem aceitar os valores propostos pelos negociadores dos fundos. A governante temia a cláusula Right Upon Future Offers (RUFO)11. A RUFO garante que o direito sobre as oferta futuras de renegociação, deve ser aplicado a todos os “holdouts” – partes que não estão diretamente envolvidas na negociação. Então caso uma negociação vazasse a público, poderia constranger os outros atores a reivindicar um aumento no valor a ser recebido. Por fim o grupo de representantes argentinos, comandados pelo ministro Axel Kicillof, Ministro da Economia, recusaram a proposta dos Fundos de investimentos NML Capital e Aurelius Management 12 , que acabaram por acionar a Corte de Justiça de Nova Iorque nos Estados Unidos da América, para receber os vencimentos que o governo argentino se recusou a pagar. 8 http://g1.globo.com/economia/noticia/2014/07/termina-nesta-quarta-prazo-para-argentina-evitar-novocalote.html 9http://www.foreignpolicy.com/articles/2014/08/25/argentina_default_bond_vulture_hedge_fund_sovereign _debt_grenada 10http://g1.globo.com/economia/noticia/2014/07/termina-nesta-quarta-prazo-para-argentina-evitar-novocalote.html 11 http://www.economist.com/blogs/americasview/2014/06/argentina-and-hold-outs 12 http://agenciabrasil.ebc.com.br/internacional/noticia/2014-07/delegacao-ministerial-argentina-esta-emnova-iorque-para-negociar 13 A desavença entre as partes foi levada à Corte de Justiça de Nova Iorque, como acordado no contrato assinado em 2001. Sob o comando de Thomas Griesa, o julgamento parecia estar com um caminho certo desde o início das conversas sobre acordos. Como forma de evitar de desaprovar a ação movida em Nova Iorque, Cristina Kirchner solicitou apoio para países vizinho, e países com a mesma situação econômica. As informações até aqui levantadas somadas ao contexto do conflito entre as autoridades argentinas e os hedge funds levam ao seguinte questionamento norteador: O que levou os fundos reagirem desta forma ao cenário político da Argentina? 1.2. HIPÓTESE As oscilações da política interna argentina tornam este país um ator político pouco confiável e isto leva os Fundos de Investimentos recorrerem à Corte de Justiça de Nova Iorque. 1.3. OBJETIVOS 1.3.1. Objetivos Gerais Traçar um panorama da situação política argentina no período estudado e suas consequências econômicas 1.3.2. Objetivos Específicos 1. Analisar a história econômica e política da Argentina; 2. Entender o que são os Hedge Funds e qual a sua relevância para a política internacional; 14 3. Explicar o processo de desgaste no diálogo entre o Governo e os Fundos de Investimento. 1.4. METODOLOGIA O significado de pesquisa deste projeto é baseado em dados coletados e interpretados, obtidos em artigos de opinião, palestras, e leituras sobre a relação dos fundos de investimentos e o governo argentino. As informações foram retiradas de fontes do governo argentino e de leitura de análises de diversos analistas da politica econômica internacional. Reúne dados retirados de fontes do governo e interpretações da obra clássica de Carlos Escudé, que trata a respeito da teoria do realismo periférico. Além disso, foram feitas leituras sobre o papel dos Fundos de Investimentos norteamericanos, a fim de configurar a importância destes no cenário político e econômico. Portanto, este projeto é um ensaio baseado no método hipotético-dedutivo, promovendo uma construção de cenários em cima das verdadeiras conjunturas do caso estudado. É importante destacar que, o tema que está sendo abordado neste ensaio é de caráter atual e poderá sofrer alterações com o decorrer do período. Por isso está definido que as informações que serão tratadas relativo a este assunto estarão presentes no recorte histórico de janeiro de 2000 até agosto de 2014. 2. ABORDAGEM TEÓRICA A análise teórico conceitual deste caso passa necessariamente pela compreensão de conceitos fundamentais das relações internacionais, tais como: Soberania, Ingerência e Dependência. Nestes termos, ganha importância o pensamento que apresenta estes como países periféricos aos outros grandes tomadores de decisão (ESCUDÉ, Carlos). 15 A soberania nacional é um conceito indicador de exercício exclusivo da autoridade do Estado (BOBBIO, Norberto). Para que isso ocorra, a ingerência do Estado não pode contribuir para o mal funcionamento da gestão da máquina pública, ou seja, as ações erradas, tomadas pelos altos representantes do governo, impactam no convívio da sociedade. A dependência de outros atores internacionais, proporcionam divergências de ideias e podem, por consequência, causar conflitos internos no país de por exemplo: bater de frente com o outro ator e causar um constrangimento internacional; ou encarar as críticas e vinda da população e enfrentar uma crise interna. É possível entender a reação dos fundos perante a instabilidade política argentina. A utilização de três principais atores e a divisão deles como agentes primários (Argentina e os Fundos de Investimentos) e agentes secundários (Estados Unidos da América e investidores do fundo) apresenta um quadro de interdependência. 2.1. REVISÃO DE LITERATURA Os fundos de investimentos surgiram como uma forma de encontrar alternativas aos bancos internacionais. A necessidade de buscar organizações privadas para resolver problemas da economia, pode ser benéfica mas também tem seus problemas. A forma de organização dos fundos nos Estados Unidos da América, constitui uma união de aplicações feitas desde aposentados da classe média, até os milionários norte-americanos. Após o governo argentino declarar o default do século XXI, a Argentina declarou que precisaria de investimentos externos para tentar reconstruir o país. Para isso, houve uma aproximação das duas partes para que os Hegde Funds fosse esse credor. De acordo com escritor do livro Globalization and Austerity Politics in Latin America, a instabilidade política na região dificulta a prospecção de novos investimentos externos (KAPLAN, Stephen B.). Isto significa que a imagem dos países latino americanos, em especial a Argentina, está manchada com a marca de devedor e “caloteiro”. 16 Após 13 anos da reestruturação, o custo foi muito caro para o governo, que teve de renegociar com os chamados “Fundos Abutres” uma redução da tarifa a ser repassada. 7% dos fundos não aprovaram a nova renegociação, e este foi o estopim do que seria uma guerra de discursos. (REBOSSIO, Alejandro) 2.2. REFERÊNCIA TEÓRICA De acordo com a agência de classificação de risco Moody’s 13 , o governo argentino é visto como um ator com descrédito na comunidade internacional. A partir da guerra pela conquista da ilha das Malvinas sem sucesso, seguida de fraco desempenho econômico e o seu afastamento das relações exteriores do período da década de 80, Carlos Escudé apresenta o termo realismo periférico. Este referencial teórico entende que a Argentina é um país que está na “periferia” da tomada de decisão no cenário internacional. Para obter maiores resultados na busca por decisões favoráveis ao seu entendimento, o governo argentino deveria atrair maior apoio para fazer frente a um- ator mais influente. 13 https://www.moodys.com/research/Moodys-changes-Argentinas-outlook-to-negative-as-default-willhasten--PR_305436 17 Imagem 1 - Tomadores de decisões e seu poder de influência Fonte: http://www.zazzle.com.br A imagem 1 representa o nível de importância dos atores na tomada de decisão (indicado pelo círculo vermelho). Quanto maior é o número da pontuação do alvo, maior é sua influência no cenário internacional e consequentemente o menor número representa atores sem expressão relevante. No caso apresentado por Escudé, os Fundos de Investimento estariam na casa dos cinco ou seis pontos, enquanto a Argentina poderia ser entendida na pontuação quatro ou três. O realismo periférico explica que a tendência dos atores periféricos é entender que os outros tem maior expressão na tomada de decisão. Portanto, para alcançar seus objetivos, precisa buscar mais pontos - seja somando: por meio de engrandecimento da dependência deste; ou agregando pontos de atores parceiros. Esta análise reflete no objetivo da presidente Cristina Kirchner de atrair apoio internacional de países que tem dívidas com os Fundos de Investimentos, para “somar pontos” e ter mais força na disputa. Países como o Brasil apoiaram publicamente a presidente argentina, mas isto não foi suficiente para pressionar os fundos de investimento. 18 A negociação entre as partes não foi fácil. A justificativa apresentada pelo autor é de que os beneficiários não estariam dispostos a abrir mão de seus interesses e impostos prometidos ainda em 2001.(LABORDA, Fernando) 3. DESENVOLVIMENTO 3.1. O Kirchnerismo e a Degradação Institucional Argentina 3.1.1. O Kirchnerismo; A ruptura do pensamento peronista14 nas eleições de 2003, alinhado com a crise econômica instaurada em 2001, foi palco da inserção do casal Nestor e Cristina Kirchner na Casa Rosada. Na política desde os anos setenta, os Kirchners lideraram o movimento do peronismo combativo durante o período universitário de suas vidas, integrando assim o grupo Juventude Peronista. ...si se tiene en cuenta que la rivalidad entre el peronismo combativo y el "participacionista" se convertiría en el principal clivaje del movimiento. Con el paso del tiempo, estos dos grupos cambiarían de nombre pero siempre, manteniéndose dentro de una misma línea de oposición entre un peronismo de lucha o revolucionario y la burocracia sindical o burguesía peronista. (ROJO) O termo “Kirchnerismo” remete ao período ininterrupto, desde 2003, de eleição de Néstor Kirchner, falecido em 2010, e de Cristina Kirchner. Este pensamento político é decorrente de um movimento nascido do peronismo de esquerda caracterizado pelo rompimento com o idealismo neoliberal do peronismo de direita. O aumento das taxas de crescimento argentino foram reflexos dos esforços para consolidar uma classe burguesa nacional, criar programas sociais voltados ao grupo menos favorecidos, enfrentamento feroz com o patronato e a mídia privada. 14 Entende-se como período peronista os anos de 1946 a 2003, marcando seu fim com a saída de Duhalde e a entrada de Nestor Kirchner 19 Em 2003 foi o primeiro ano da década que a Argentina pôde experimentar um aumento na sua taxa de crescimento do PIB. As políticas econômicas adotadas por Roberto Lavagna na época Ministro de Economia e Produção, surtiram efeito. Dentre essas ações, estão a renegociação da dívida externa 15 com o Fundo Monetário Internacional (FMI) e com os credores internacionais, tais como os Fundos de Investimentos. O Produto Interno Bruto da Argentina retoma seu crescimento no mesmo ano em que Néstor Kirchner assume a presidência do país. O retorno do desenvolvimento estável foi bem recebido pela população, aumentando os índices de popularidade do kirchnerismo. Três pilares desenharam a retomada de crescimento do país: a renegociação da dívida externa, a política econômica em geral e a política externa do país. Com a adoção destas medidas o presidente eleito no segundo turno, sem enfrentar nenhum candidato, superou as expectativas de qualquer analista. A inflação foi balanceada com aumento do salário mínimo em 20%. Kirchner chegou a obter 57,3% de aprovação popular. Com a aproximação a Luís Inácio Lula da Silva, Michelle Bachelet e Hugo Chavez, o processo de renegociação das dívidas se tornou mais sutil. O ano de maior bonança para a Néstor Kirchenr foi 2006, quando o crescimento econômico argentino acompanhou o índice de popularidade do governo. O desemprego caiu de 17,3% em 2003, para 8,7% em 2006 e a balança comercial teve um aumento de aproximadamente 68%. O Kirchnerismo em primeiro momento, se desviou da corrente de pensamento do peronismo, criando um estilo próprio de socialdemocracia, nacionalista, com políticas de “boa vizinhança”, porém deixando a desejar na tomada de decisões democráticas. A principal ressalva contra os Kirchners é a falta de respeito com as opiniões adversas. O sentimento de mandar e ordenar cega, até o presente momento, a possibilidade de negociação e tomadas de decisões democráticas. Esta forma de reagir 15 A moratória da dívida externa foi declarada pelo ex-presidente Rodríguez Saa, que sucedeu Antonio De la Rúa e ficou menos de um mês no poder. O fugaz mandatário foi sucedido por Eduardo Duhalde. 20 a novas propostas ou questionamentos, gerou revolta dentro do partido Justicialista, ao qual os Kirchners pertenciam, criando um sentimento peronista anti-k16. Em 28 de outubro de 2007, Cristina toma posse como primeira mulher presidente da Argentina. Eleita com 44,77% dos votos, mais do que seu marido quando eleito em 2003, se propôs a manter o modelo econômico e político já estabelecido. Porém, logo no primeiro período de governo, o crescimento econômico e desenvolvimento avançado começa a se deteriorar. A gestão atual não estava preparada para gerir uma situação grave de crise, como foi a “Grande Depressão”. Em 2008, os governantes receberam fortes críticas na forma de gestão do país, principalmente pelas decisões relacionadas ao campo econômico. A Presidenta Kirchner não soube lidar com as greves agrárias e trabalhistas, gerando um impacto negativo na situação econômica do país. Estes atos de rebeldia dos agricultores foram uma resposta ao aumento da taxa de juros na produção de soja e girassóis. Em resposta, medida do governo foi elevar a taxa de 35% para mais de 40%, deixando vários pequenos e médios produtores sem margem de lucro. Neste ano houve uma forte crise alimentícia, sintoma da situação crítica mundial. Desde o início da era Kirchner, os governantes foram contra os princípios das políticas neoliberais compreendido entre 17 2003 . As políticas econômicas desenvolvidas no período e 2014 condizem com um aprimoramento do desenvolvimentismo industrial. Dentro do cenário sul-americano, a Argentina tem apoiado discursivamente o fortalecimento do Mercosul. Contudo, a sua obsessão pelo autodesenvolvimento do bloco tornou-se um problema para os outros países membros. O Brasil, maior interessado na conclusão do acordo entre União Europeia e Mercosul, enfrenta dificuldades pelo fato do kirchnerismo pregar o desenvolvimento de políticas protecionista de desenvolvimento econômico.18 16 Este termo se refere à palavra Anti-kirchnerista Durante o período de recuperação econômica argentina, o desenvolvimento da indústria na região foi prioridade do governo, crendo que a abertura para novos mercados poderiam quebrar as indústrias nacionais, uma vez que o crescimento econômico do mundo estava acelerado. 18 O governo brasileiro é o principal mediador das conversas entre o Mercosul e a União Europeia, em diversos discursos oficiais a vontade de finalizar um acordo com este bloco está explicita 17 21 3.1.2. A crise do modelo político Argentino Para compreender o estado atual da crise política que vive a Argentina, é necessário enumerar os principais motivadores desta situação. Dentre estes fatores estão: O calote de 2001; restrições de compra de dólar; inflação alta e dados maquiados; derrota política, doença e reforma; mudança do perfil de Cristina Kirchner; sucessão ameaçada em 2015; protestos de policiais e saques; a 'guerra' contra o Clarín; crise longa e futuro preocupante. O megacalote de 2001 Em 2001, Adolfo Rodríguez Saá, presidente por 8 dias, anunciou um calote da dívida pública argentina, que rondava os US$100 bilhões. Esta medida, e a repentina mudança de governante poucos dias depois, abalaram a confiança dos investidores, afastando empresas estrangeiras e dificultando negociações de empréstimos internacionais. O único recurso de entrada de dólar no país eram as exportações do agronegócio, com a ressalva de que a venda de grãos e carnes também caiu. Imagem 2 - Razão de Guidotti dos países do BRIC e Mercosul entre 2000 e 2009.* Fonte: GOLLO, Romário de Souza; Análise do nível de reservas internacionais dos países emergentes de 2000 a 2010. Esta situação dificultou a possibilidade de financiar as suas contas externas, com isso as reservas internacionais se mantiveram baixas até 2006. Neste ano o 22 governo conseguiu elevar a Razão de Guidotti19 a pelo menos um, que é considerado um número baixo para um país que almeja maior representatividade no cenário internacional. De acordo com dados do Banco Mundial, neste período as reservas que protegeriam o país das fortes consequências de uma crise, caíram de US$43 bilhões para US$30 bilhões em menos de um ano. Néstor Kirchner tentou recuperar a credibilidade argentina em 2005, oferecendo aos fundos prejudicados pelo calote, pagamentos com descontos acima de 70%, sendo repassados em 30 anos. Apenas 7% dos credores não aceitaram a negociação, então o processo corre em instâncias jurídicas internacionais. Não se poder retirar o mérito de uma estratégia argentina bem sucedida, portanto a crise estourada em 2001 ainda não foi resolvida totalmente e o desenrolar desta situação será detalhada neste trabalho. Restrições de compra de dólar A diminuição de entrada de recursos e investimentos externos no país resultou em uma política de aumento tributário nas transações econômicas internas. O objetivo desta medida era aumentar as reservas em moedas estrangeiras nos cofres nacionais. O governo argentino tentou bloquear, ou pelo menos reduzir, a saída de dólares do país com medidas impopulares como: Aumento dos impostos sobre o cartão de crédito no exterior, impôs restrições para o e-commerce e passou a exigir a aprovação de compra de dólar para turismo do Banco Central Argentino. Com a falta de dólares circulando na Argentina, o peso argentino bateu uma queda expressiva e 11% em janeiro de 2002, com a cotação de oito pesos por dólar americano. O mercado paralelo de venda de dólares chegou a cobrar 10 pesos por um dólar, sendo chamado popularmente como “Dólar Messi” em referência a camisa de um dos melhores jogadores de futebol do mundo e ídolo nacional. Esse cenário criou um sentimento de insegurança em relação ao sistema financeiro do país. A resposta da 19 A Razão de Guidotti é o calculo que mede as reservas internacionais de um país, e é calculado pela medida de liquidez reservas, dividida pela dívida externa de curto prazo 23 população para isso foi retirar do dinheiro das poupanças, juntar e guardar os dólares em casa, o que fez disparar ainda mais o preço da moeda no país, batendo o preço de 13 pesos, para desespero do governo. Outro grande afetado com estas medidas impopulares argentinas foram as grandes empresas como a Fiat, que teve de interromper a sua fábrica por falta de peças de automóveis. Com o intuito de manter a balança comercial positiva, o governo obrigava as empresas a ter uma politica de compensação, ou seja, o quanto a empresa importar, ela devia pelo menos exportar também. Inflação em alta e dados maquiados A pesquisa feita pelo Instituto Nacional de Estatísticas e Censo (Indec), órgão similar ao Ipea no Brasil, afirmou que a inflação no país fechou em 10,9% em 2013. Porém, outros institutos particulares, suspeitam que os números estão sendo maquiados para esconder informações da população. De acordo com estes institutos, a inflação anual foi de pelo menos 28%. Fato que comprova esta informação é o aumento cedido pelo governo aos caminhoneiros neste ano, de 25%. Até mesmo o próprio governo assume que os 10,9% estão fora da realidade argentina atual. De certa forma, a crise de 2001 nunca foi resolvida totalmente, pois parte dos credores não aceitou o calote e foi para a Justiça, o que impede até hoje o país de levantar fundos internacionais de ajuda. (TREVISAN) Para ressalvar este fato, o Conselho Executivo do Fundo Monetário Internacional (FMI) emitiu uma nota, declarando que este organismo internacional censura as informações enviadas pelo governo argentino, por considerar que a qualidade das informações são baixas. O governo tentou segurar o crescimento da inflação congelando e tabelando cerca de 500 produtos. A Argentina, que sempre foi uma das maiores exportadoras de commodities, teve que importar tomates do Brasil afim de suprir o mercado em crise no país, objetivando a contenção da alta de preços. Derrota política, doença e reforma ministerial 24 Dentro do cenário político argentino, a primeira derrota significativa para o Kirchnerismo foi a perda nas eleições legislativas em 2012 nos principais distritos, apesar de garantir a maioria no Congresso. Com isso, a possibilidade de uma reforma política durante o governo de Cristina Kirchner, ponto forte da reeleição da presidente em 2011, se torna quase impossível. O fato da presidente ter passado por uma cirurgia de drenagem de uma hematoma cerebral, durante a campanha de 2011, e entendendo que este fato recebeu apelo popular, é possível ligarmos a reeleição dela com o estado momentâneo de saúde. A verdade é que neste período as incertezas políticas, econômicas e sociais eram tão grandes, que em uma situação “sadia”, possivelmente Cristina não seria reeleita. Em resposta ao péssimo resultado nas urnas em 2013, a presidente surpreendeu com o anúncio dos novos ministros da Economia, Axel Kicillof, e da Agricultura, Carlos Casamiquela. Analistas políticos entenderam o sinal como uma aproximação entre as pastas e a presidência, pois ambos novos ministros são ligados diretamente à presidente, vide mapa apresentado como anexo I deste trabalho. Em uma situação crítica para a política kirchnerista, a melhor estratégia foi trazer um dos seus principais aliados para mais perto, protegendo assim outras influências na Casa Rosada. Mudança de perfil Com o fim da reforma dos ministérios em 2013, Cristina se isolou por cerca de um mês, fato que gerou estranheza para a população. A presidente sempre possuiu um perfil mais próximo ao povo, com várias declarações para jornais e televisões, uma personalidade midiática. O “sumiço” foi encarado como um grande momento de autorreflexão do modelo politico implementado. O ex-embaixador brasileiro na Argentina, Cristina 25 Kirchner percebeu que o projeto político, derivado da gestão kirchnerista, estava esgotado.(AZAMBUJA, Marcos)20 "Ninguém acredita no que sai da boca dela [Cristina]. Há uma presunção de que tudo é uma mentira. Agora ela se deu conta que tem menos tempo, menos prestígio e menos pano de onde cortar. O que faz ela sobreviver é que na Argentina não há alternativa ao peronismo". (AZAMBUJA) As palavras da presidente argentina perderam valor no mercado após mentiras sistemática dos números da economia para agentes internacionais. A reforma ministerial, medida inesperada para o momento, foi um indicativo forte que Cristina tem se preocupado cada vez mais com a manutenção do seu partido na “Casa Rosada”. Descontinuação do Kirchnerismo Os principais candidatos da oposição são Sergio Massa, ex-prefeito da província de Tigre e atual deputado pela capital Buenos Aires, e Mauricio Macri, atual prefeito de Buenos Aires. Apesar de hoje serem parte da oposição do governo, a pouco tempo os presidenciáveis seguiam a mesma linha política e econômica da gestão kirchnerista. Pelo fato da base governista não ter um candidato forte o suficiente que possa assumir o posto de “sucessor de Cristina Kirchner” a oposição poderá ter uma eleição fácil. Porém, ambos os candidatos não apresentam nada novo ao país, mais mudanças no estilo de governar do que grandes reformas políticas. "A ideia geral é que o kirchnerismo sai em 2015. Eles não têm um candidato que seja viável eleitoralmente. Isso só seria possível se a situação estivesse muito boa, como foi o caso de Lula e Dilma no Brasil em 2010. Para construir um candidato viável, é preciso gerar melhoras. E esse ano vai ser um ano de baixo crescimento" (AYERBE) Complementando o discurso do professor Luis Fernando Ayerbe, o exembaixador Carlos Azambuja afirma que o peronismo “é uma grande ameba”, pois varia entre um governo de esquerda e direita, dependendo da sua vontade, porém continua 20 Este foi o parecer apresentado pelo Emb. Azambuja em uma palestra para o IREL da UnB em 2014. 26 sendo a força motriz da Argentina. Segundo ele, a “ameba” se torna algo entre nacionalismo, populismo e estadismo “com doses maciça de corrupção”. Os anos de 2013 e 2014 foram anos complicados para o Kirchnerismo, principalmente relebrando os protestos que ocorreram. Os desfechos dessas situações afetaram a aprovação do governo. Dois grandes momentos foram marcantes no país, primeiramente com a greve dos policiais e depois as “marchas do silencio”. Logo após o retorno de Cristina Kirchner de sua licença por complicações médicas, a situação política parecia estar se encaminhando a um momento de desenvolvimento sem dificuldades. Foi justamente quando começou a greve dos policiais em todo o país e aumentaram os índices de saques,. Portanto, aumentou também o receio da população em sair de suas próprias casas na iminência de um assalto.. Foram cerca de 40 horas de demasiado medo para os argentinos. Em 2014, a grande marcha do silêncio marcou os protestos contra a morte do promotor Alberto Nisman, cerca de 1 milhão de pessoas foram às ruas. Neste momento marcante, todos os manifestantes, convocados pelos promotores de justiça, caminharam em silêncio pelas grandes capitais argentinas. A morte de Nisman ocorreu logo após a denúncia de que Cristina Kirchner acobertou iranianos no atentado contra uma associação judaica em 1994, deixando 85 mortos e 300 feridos, sendo registrado como o pior da história do país. Os argentinos estão bastante insatisfeitos com a situação do país, que ruma rapidamente para se tornar uma Venezuela, com produtos importados sumindo das prateleiras e as pessoas impedidas de comprar dólares. Agora as empresas também estão irritadas com a falta de dólares no Banco Central (BC), que já avisou que não vai mais liberar divisas para as importações. (LANDIM, 2014, Até quando Cristina Kirchner fica no poder? Folha de São Paulo) Analisando estes e outros protestos, é possível ver sentimento de descontentamento generalizado com a atual presidente, inclusive muitos analistas se questionam como ela foi reeleita em 2011. 27 3.2. HEDGE FUNDS CONCEITO E RELEVÂNCIA PARA A ECONOMIA INTERNACIONAL 3.2.1. Entendendo o Conceito de Fundos de Hedge; Atualmente a riqueza privada mundial está, em sua maioria, investida em ativos internacionais, vinculado à esfera financeira, que por sua vez é mobilizada através de estratégias de curto prazo de variados atores. Dentre estes estão os gestores dos fundos de hedge, fundos de pensão, bancos entre outros agentes financeiros. A atração dos investimentos é condicionada à atração de influxos de capitais, podendo ser aplicadas em atividades produtivas ou em políticas sociais. Nestes termos surgem os hedge funds, ampliando os riscos sistêmicos e a instabilidade do hipertrofiado sistema financeiro internacional. Os países latinoamericanos, como a Argentina e o Brasil nos anos de 1990, e do Caribe, como Jamaica e Porto Rico na década de 2000, se debruçaram sobre a dependência estrutural dos influxos de capitais voláteis com o intuito de financiar os seus esforços de crescimento. O risco sistemático é o risco do mercado como um todo ou a um segmento específico que não se pode diversificar. Todos os investidores e empresas estão expostos ao risco sistemático, que pode advir de fatores externos não controláveis, como decisões políticas, flutuação das taxas de juro, forças da natureza, recessões e depressões económicas. (NOGUEIRA) O risco sistêmico avalia o grau de probabilidade e consequências negativas para o corpo maior. O termo “sistêmico” é comumente utilizado em discussões voltadas ao cenário da crise econômica, como a crise das hipotecas subprime, em 2008. O risco sistêmico de uma instituição financeira é a possibilidade de existir uma intervenção do governo, uma vez que o cenário está altamente negativo para a economia. A vulnerabilidade deste sistema altamente correlacionado entre o risco sistêmico e o 28 governo dos EUA, é uma preocupação e é vastamente debatido de forma a abordar uma reforma regulamentar a estes serviços financeiros. Os fundos de hedge são credores internacionais que, por meio de modalidades diferenciadas de aplicações financeiras, garantem o sucesso do investimento.2122 Os fundos tratados neste trabalho estão principalmente sediados no estado de Nova York nos Estados Unidos da América (EUA) . Os fundos de investimento tem uma função muito importante no cenário econômico mundial, como atores internacionais capazes de interferir no desenvolvimento dos países. Eles representam uma parcela do capital financeiro mundial, contudo, a capacidade de ampliação do risco sistêmico deste grupo é significante. Estes podem produzir abalos significativos na vulnerável configuração no sistema financeiro internacional23. Os fundos de investimentos apresentam uma forte tendência de ações no mercado financeiro internacional, sinalizando os principais movimentos dos capitais. Estes podem ser apresentados como potenciais desencadeadores de instabilidades de pagamentos vinculados aos outros agentes financeiros. O mercado de capitais pode perder sua estabilidade no momento em que os hedge funds apresentam comportamento de manada, fazendo grandes movimentações especulativas contra commodities, moedas e outros ativos. Também poderá afligir este mercado caso aconteça uma falha na estratégia de gestão, que compromete o capital dos credores destes fundos. As operações feitas pelos fundos estão fora da lógica normal da Economia Política Internacional de que o comércio, as finanças e as políticas estatais que influenciam a economia. A atuação deste ator privado é feita por meio da oferta de liquidez aos atores estatais e portanto também afeta significativamente o capital financeiro. 21 http://www.infomoney.com.br/educacao/guias/noticia/412945/hedge-funds-sem-misterios-entenda-quesao-como-funcionam 22 http://www.eurekahedge.com/database/faq.asp#1 23 http://www.sbpcnet.org.br/livro/58ra/senior/RESUMOS/resumo_559.html 29 3.2.2. Influência dos Fundos de Hedge no cenário Político Argentino A Argentina é mais um país no mundo que é dependente do investimento do capital estrangeiro para que seja possível melhorias na infraestrutura, principalmente. Afim de garantir segurança aos investidores, foram criados alguns indicadores de confiabilidade dos países, como por exemplo o Standard & Poor's Service, Moody's Investors Service e Fitch Ratings. Cada um destes possui sua forma de calcular os riscos de investir nos países e tem sido grandes aliados dos grandes investidores mundiais. Como podemos ver na Figura 1, a classificação no período da crise de 2002, foi a mais baixa na história da Argentina, ocasionada pela declaração do default naquela época. O risco Ca, como está explicado na Figura 2, é a segunda pior classificação que um Estado pode ter. É qualificado o país que tem alta possibilidade de inadimplência e baixo interesse pelo retorno financeiro para o agente investidor. Atualmente a Argentina se encontra em uma posição um pouco melhor do que em 2002, porém ainda abaixo do nível ideal de confiabilidade. Após oito anos consecutivos mantendo um padrão B ( médio risco), em 2014, com o fim do prazo de pagamento dos vencimentos vinculados aos Fundos de Investimentos dos Estados Unidos, o país volta ao status de padrão C ( alto risco). O impacto deste mal desempenho foi amenizado com a tentativa de pagamento aos fundos que aceitaram os valores da negociação. Em 2014, a Casa Rosada emitiu o pagamento da dívida para parte dos credores, indo contra a indicação do juiz Tomás Grieza, O juiz havia informado que, caso isto ocorresse, os valores seriam congelados até que se chegasse a uma conclusão que agrade todos os envolvidos. O depósito de US$ 832 milhões foi feito e como afirmado pelo Dr. Grieza, os bens foram travados pela justiça de Nova York, NY. A atitude de tentativa de pagamento foi vista com bons olhos pelo mercado, reduzindo o abalo na bolsa Merval de Buenos Aires do Default. Interessante ressaltar a falta de participação dos políticos argentinos na questão. Pouco foi discutido pelos partidos, deixando que a articulação com os Fundos 30 fosse feita pela Presidente e por Axel Kicillof, Ministro da Economia. Como apresentado no Anexo 1, a relação entre os dois atores é muito forte, o ministro é considerado o braço direito de Kirchner. Com esta postura bem desenhada, podemos entender que o governo está preocupado com os impactos imediatos da crise, portanto prefere seguir em apoio ao manifesto popular. Em vários momentos é possível ver a retaliação da população contra os Fundos de hedge, em passeatas, manifestações em locais públicos e na principalmente na internet. Este acabaram por receber a denominação de “Fundos Buitre”, traduzindo ao português, Fundos Abutres. Esta denominação é justificada pelo fato dos fundos investirem em empresas ou países a beira da falência, com o intuito de ressuscitá-los no longo prazo. 3.2.3. Cláusula RUFO e suas consequências políticas O problema analisado neste trabalho tem seu agravante na principal cláusula do acordo entre os investidores e o governo argentino. A cláusula RUFO (Right Upon Future Offers)24 tem o objetivo de garantir igualdades de tratamento entre os atores envolvidos no contrato em caso de ofertas futuras de renegociação. Neste caso, a aplicação da cláusula implica em garantir a proporcionalidade do pagamento, com a mesma taxa de conversão. Uma vez que o valor pago é maior para um credor, ele se torna obrigatório para os outros também. O valor oferecido para os fundos foi de cerca de 20 centavos de dólar a cada US$1,00 investido na Argentina. Aproximadamente 92,4% dos credores aceitaram a negociação, porém outros 7,6% não se colocaram a disposição de perder mais de 75% do valor investido (o valor final não foi divulgado ainda, pois devem ser somados os juros e impostos aplicados). De acordo com as condições garantidas com a RUFO, se outro valor for acertado com a minoria dos fundos credores, este valor passará a valer para todos os outros envolvidos na situação. 24 http://www.economist.com/blogs/americasview/2014/06/argentina-and-hold-outs 31 A solução para esta situação está descrita no próprio acordo, a cláusula tem um prazo de execução de até o dia 31 de dezembro de 2014, ou seja, caso não tenha sido acordado nenhum valor diferente entre as partes, ao fim deste acordo, o governo teria liberdade de negociar valores distintos para os investidores. Caso a Argentina fosse obrigada a pagar 100% do valor para alguns dos fundos antes desse prazo, o montante final seria de aproximadamente US$120 bilhões, quatro vezes mais do que as reservas disponíveis do país, sendo assim impossível para o país honrar o custo de débito.2526 A cláusula RUFO levantou uma grande discussão no cenário nacional, aceitar o calote até esta cláusula vencer e ser taxado de um país “caloteiro” ou honrar as dívidas e quebrar o país mais uma vez? A voz popular pouco se importou com a repercussão internacional deste caso, a sua preferencia sempre foi pelo bem estar dos cidadãos mesmo que isso ocasione em uma situação crítica internacional. Fato é que no primeiro momento pouco influenciaria a nominação de “mal pagador”, a crise vem logo em seguida, com escassez de dólares no país, fim dos investimentos em obras de infraestrutura, entre outras situações agravadas pela crise internacional. A solução encontrada pela Sra. Kirchner foi buscar novos parceiros econômicos que poderiam se beneficiar de uma relação instável com os Estados Unidos da América. Esta medida resultou no Convênio Complementar de Cooperação de Infraestrutura com a China. A criação deste não foi digerido pela oposição do governo, por ter sido aprovada em caráter de urgência pelo Parlamento Argentino, na capital Buenos Aires, no mês de dezembro, dois dias antes da festa de réveillon. O convênio teve sua aprovação sem debate prévio no Senado, na última sessão do ano. A oposição alega que o governo entregou os principais setores da economia para o país asiático, que terá prioridades em áreas essenciais como energia, mineração, agricultura e desenvolvimento de parques industriais. Dois artigos deste convênio foram arduamente criticados. Primeiramente a entrega de todas as obras de 25 http://economia.estadao.com.br/noticias/geral,argentina-nao-chega-a-acordo-com-fundos-e-mediadorfala-em-calote,1536381 26 http://www.economist.com/news/americas/21637438-argentina-may-spurn-chance-settle-its-creditorslets-not-make-deal 32 infraestruturas para a China, sem a necessidade de passar por licitações, segundo foi a criação de facilidades trabalhistas e profissionais aos empregados chineses que serão transferidos para a Argentina. O valor estipulado dos acordos entre Pequim e Buenos Aires gira em torno de US$7,5 bilhões 27 , um montante que na atual conjuntura econômica e política seria quase improvável. Outro país que se beneficiou da situação crítica da economia argentina foi a Rússia. Após o encontro da Cúpula dos BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), Vladmir Putin, presidente da Federação Russa viajou para a Argentina, com o intuito de assinar alguns tratados com este país. Cerca de vinte acordos foram feitos, sendo eles comerciais, militares, de comunicações, energia e cooperação nuclear para bens pacíficos. A intensificação da relação entre os países foi decorrente de uma série de restrições alimentícias, importadas de mais de dez países, redirecionando o mercado para os produtos argentinos. Em abril de 2015 a presidente argentina visitou o Kremlin, em Moscou, para assinar o que foi chamada pelo presidente russo de “associação estratégica global”. O objetivo era selar novos acordos na área de cooperação em energia nuclear e hidroelétrica, proteção do meio ambiente e na luta contra o tráfico de drogas. Duas visitas em menos de oito meses, asseguram a aproximação dos dois países aproveitando as portas fechadas dos europeus e norte-americanos. 3.3. O passo a passo da Crise entre o Governo Argentino e os Fundos de Hedge 3.3.1. A Negociação entre Governo Argentino e os Fundos Em 2005, quando os primeiros sinais da possibilidade de um calote apareceram, frente aos Fundos de Investimentos, a reação foi de uma série de conversas com a presidente Cristina Kirchner e seu ministro da economia. Com o intuito de proteger a imagem pública dos fundos e do governo, a proposta era encontrar a 27 http://economia.estadao.com.br/noticias/geral,a-china-desembarca-na-argentina-imp-,1621423 33 melhor forma de resolução desta crise sem a participação da mídia e da Corte de Nova York. Entre 2005 e 2010 houve uma divisão de interesses entre os fundos, separando-os em adeptos a renegociação, aceitando o desconto do pagamento de cerca de 70% do valor a ser devolvido, e os contrários a uma renegociação desvalorizada (cerca de 7% dos fundos). Entre os fundos que não aceitaram a negociação estão o NML Capital e o Aurelius, que não emprestaram dinheiro ao governo porém adquiriam títulos argentinos, que segundo o país, pode render até 1.600% do valor investido. Durante esse período, o governo acreditava que seria viável diminuir o retorno financeiro ao patamar que era desejável, pouca importância foi dada dentro do cenário político-econômico do país. Partidos, deputados, senadores entre outras figuras públicas importantes não se manifestaram sobre o assunto por bastante tempo. Para eles a negativa era temporária, pois os fundos não queriam perder o seu status para com os seus investidores, que acreditam no poder de influência destas instituições, no cenário nacional e internacional. A credibilidade destas instituições são o seu maior Soft Power. Para atrair novos investidores a depositar sua confiança em um investimento de risco e de longo prazo, os fundos devem demonstrar retornos cada vez mais seguros e reais. Ninguém investiria em uma organização que não soubesse escolher o destino do dinheiro do aplicador, por isso o enfrentamento a este desconto no pagamento é positivo para mídia do credor. Às atuais relações interpessoais demonstram que o que afeta o bolso do investidor inicial, não é facilmente digerido por ele, até mesmo quando existe uma apelação para que um país, no caso a Argentina, não entre em um colapso econômico, afetando milhares de vidas, trazendo mais miséria e desordem. En este libro desarrollo una teoría sistémica del ‘Estado parasitario’, un nuevo tipo de Estado hasta ahora no identificado que vive del resto del mundo a la vez que se consume así mismo.” (ESCUDÉ, 2005) 34 É importante correlacionar a obra de Carlos Escudé, El Estado Parasitario, com a situação econômica vivida na Argentina. De acordo com os Fundos de Hedge, este país vive do apoio financeiro do resto do mundo acabando por nunca honrar seus vencimentos de forma digna, como defende a teoria de Carlos Escudé. Por outro lado temos o discurso do ministro da economia, Axel Kicillof, onde acusa os Fundos de serem parasitas de países em necessidade e portanto não se preocupar com o impacto que pode causar, focando somente na realização financeira.28 Por fim, quem parasita quem nesta situação? Os argentinos por se aproveitarem do dinheiro dos investidores externos, ou os fundos de investimento por se aproveitarem de uma oportunidade para aumentar sua rentabilidade? Entre 2010 e 2013, o grupo de fundos que não aceitaram a renegociação buscaram alternativas para contornar esta situação, afim de não levar esta questão para a Corte de Justiça de Nova York. A sua primeira investida foi a aproximação de importantes empresários na Argentina que poderiam exercer uma certa influência nas decisões a serem tomadas pela presidente argentina. A tentativa foi em vão: Cristina Kirchner não abriu uma possibilidade de nova renegociação dos valores, afirmando não ter condições de assumir essa responsabilidade. No segundo momento, os Fundos de Hedge tentaram uma abordagem ao governo argentino por meio de um ator conhecido na região da América do Sul como intermediário de situações conflituosas, a República Federativa do Brasil. Convencer a presidente kirchnerista a ceder aos desejos dos nova-iorquinos era uma tarefa que somente poderia ser alcançada por uma presidente que estava dentro do círculo de amizade e confiança de Kirchner. Portanto, o próximo passo seria convencer Dilma Rousseff a atuar como intermediadora de um conflito, que poderia causar impactos importantes na economia da região. Apesar da formação em economia e sua representatividade na América Latina, a mandatária brasileira não seria facilmente convencida por um pedido de uma instituição norte-americana. Era necessária uma aproximação mais estruturada, com o 28 http://www.infolatam.com/2015/04/30/argentina-califica-de-parasitos-especializados-a-los-fondosbuitres/ 35 apoio de um ministério essencial para este tipo de conversa. O então ministro da fazenda na época, Guido Mantega, foi o escolhido para ser a ponte entre os fundos e a presidente brasileira. Uma série e conversas foram estabelecidas com o ministro Mantega, até que, baseando-se em uma argumentação que poderia afetar ainda mais a economia do Brasil, uma vez que a Argentina é um grande comprador regional de produtos brasileiros, chegou-se a um consenso de que o calote argentino traria piora para o cenário instável daquele momento. Apesar de Mantega não ser o mais influente interlocutor com a presidência, o assunto chegou aos conhecimentos de Dilma Rousseff. A dúvida para a tomada de decisão do Brasil é: vale a pena arriscar um relacionamento próspero com a Argentina por uma negociação, uma vez que é sabido que as possibilidades de avanço são mínimas e a resposta negativa da Casa Rosada é a mais provável resposta que será obtida? Mantendo a postura política de Dilma Rousseff perante o Mercosul e com países vizinhos, a conversa entre as presidentes foi tradada por fora dos meios convencionais e midiáticos. Apesar do aconselhamento brasileiro, Cristina Fernandez Kirchner manteve seu posicionamento, e mais uma vez não aceitou a proposta de uma rediscussão dos valores da dívida. Daniel Pollack, um ator de importante destaque nesta negociação, mediou as conversas entre os Fundos de Investimentos e o governo argentino. O advogado tem em seu currículo diversas ações pró fundos de investimentos, o que garante ao litígio uma inclinação à defesa do ator privado. De acordo com o mediador, a Argentina escolheu em diversos momentos o déficit ao invés de “soluções criativas” para o caso, por isso sofrerá fortes problemas econômicos nos próximos meses. Impossível analisar quais soluções seriam estas, tendo em vista que a negociação foi secreta. Até o momento, a estratégia do governo argentino foi aguardar os “fundos abutres” acatarem o seu pedido de renegociação dos valores, entendo a impossibilidade do Estado em cumprir com o acordo inicial. Contudo a condução das negociações coordenadas pelo ministro da economia, acarretou em um sintoma contrário do esperado. Tendo em vista que as tratativas eram inúteis, os credores 36 entraram com pedido na Corte de Justiça de Nova York para garantir seus direitos e obter o seu retorno financeiro. Na construção do contrato internacional entre as partes, a escolha da Corte de Justiça de Nova York foi previamente acordada para que esta solucionasse qualquer litígio que houvesse entre os signatários. Desde já podemos observar que o ambiente não é propício para os argentinos, pois, a condução da negociação esta sendo feita por um advogado americano que já defendeu causas a favor dos fundos de investimento, e a legislação aplicável para qualquer problema é do mesmo país e estado, de onde são provenientes os fundos de investimento, que por sua vez possui grande influência política no órgão. Os fundos possuem um trabalho de lobby forte no cenário político dos Estados Unidos, os investimentos em infraestrutura são muito bem quistos pelo congresso norte-americano, isto garante a eles, grande força política. 3.3.2. A ação dos Fundos de Hedge na Corte de Justiça de Nova York No ano de 2012, os fundos de investimentos que não aceitaram a renegociação da dívida, entraram com um processo na Justiça dos Estados Unidos da América, afim de garantir o cumprimento do contrato. No mesmo ano, a decisão do caso foi feita pelo juiz Thomas Griesa, que conduziu o processo até o fim do julgamento. A palavra de ordem de Griesa era que a Argentina deveria pagar os US$ 1,33 bilhão ao NML Capital e ao Aurelius. Descontentes com a decisão do juiz, entendendo-a como uma ordem muito prejudicial ao país, o governo argentino entrou com uma apelação no Tribunal de Apelações de Nova York, buscando uma nova solução para o caso. Várias rodadas de negociações foram abertas entre as partes, mas todas foram pouco produtivas. Em um dos discursos de Axel Kicillof, ele retratou o momento como uma reunião com terroristas, que não entendiam a dimensão dos valores pedidos e as consequências que isto poderia trazer para um país democrático. As tratativas foram em vão, já que nenhuma das partes aceitou ceder à pressão da outra. Em 19 de maio de 2014, com o fim do prazo das negociações, outra 37 decisão foi tomada em favor dos Fundos de Hedge. Após chegar na instância máxima da justiça norte-americana, a Argentina foi condenada a pagar pelos dividendos integralmente até o dia 30 de junho de 2014. Sem condições para fazer o pagamento desta dívida, outra preocupação rodeou os representantes argentinos, a cláusula RUFO. Como já explicada anteriormente, esta cláusula escrita nos contratos com todos os fundos, garante pagamento igual todos aos fundos negociados naquele período, portanto se a Argentina pagasse o valor integral para os dois fundos citados acima (NML Capital e Aurelius), os outros 93% dos credores poderiam pedir o pagamento integral. Importante frisar que a cláusula tem um período de validade até o primeiro dia de janeiro de 2015. Como forma de tentar driblar este percalço, no dia 26 de junho de 2014, a Argentina enviou um pagamento de US$ 832 milhões para os fundos que aceitaram anteriormente a renegociação, por meio do Bank New York Mellon. O intuito era honrar com seus débitos antes do prazo máximo de pagamento, e não ser taxado como um novo calote. Porém, o pagamento foi retido pela justiça. Thomas Griesa emitiu uma liminar no dia 27 de junho de 2014, afirmando que o pagamento era ilegal e portanto bloqueou o repasse da verba para os cofres dos entes privados. Segundo o entendimento do jurista, o país somente poderia fazer tal pagamento quando honrar também os pagamentos dos que exigem receber o valor sem descontos ou parcelas. Caso esta ação seja executada o governo argentino teria que repassar cerca de US$166 bilhões, sendo que as reservas deste país são de US$28 bilhões. No dia primeiro de julho de 2014, a Justiça de Nova York declarou um calote técnico. Este termo se refere ao fato de que a Argentina tem possibilidade de pagar o que esta sendo exigido (não considerando que os outros atores pediriam a igualdade dos valores pagos), porém não o faz com temor da aplicação da RUFO. No dia 30 de setembro de 2014 o governo Argentino transferiu cerca de US$ 161 milhões para o pagamento de um novo vencimento de dívida aos credores que aceitaram a renegociação. Este, porém, não foi bloqueado pela Justiça de Nova York. Isto é decorrente de um plano complexo criado pelo governo argentino, que conseguiu 38 a aprovação de uma lei no congresso, sancionada pela presidente Kirchner, para mudar o interlocutor do pagamento de Nova York para Buenos Aires, ou seja, substituíram o Bank New York Mellon pelo Banco La Nación. Uma vez que a Corte não tem jurisdição para julgar atos fora do país, o pagamento foi feito para cumprir vencimentos de bônus reestruturados em trocas de dívida de 2005 para 2010. “A Argentina vai tentar protelar judicialmente a execução desta decisão e tentar manobrar politicamente, inclusive em instâncias que não necessariamente tem a ver com a corte americana, como a Organização das Nações Unidas (ONU). Ela vai ter que falar que não tem dinheiro, mas que quer pagar e negociar. Esta é única saída” (DE SOUZA) A saída para o governo argentino agora, em relação aos fundos NML Capital e Aurelius, é levar esta discussão a foros internacionais, como a Organização das Nações Unidas, e para a Corte Internacional de Justiça de Haia, na Holanda. Como citado pelo professor José Maria de Souza Junior, Cristina Kirchner terá que apelar para uma jogada emocional, afirmando que quer pagar, mas não tem condições caso estas medidas sejam aplicadas. 4. CONCLUSÃO O processo de negociação entre os Fundos de Hedge e a Argentina, é certamente mais um caso complexo, que dificilmente terá uma resolução positiva para as duas partes. As conversas chegaram a um estágio desgastado, as trocas de acusações de ambas as partes tem prejudicado bastante o diálogo. Para o público que assiste e acompanha este debate, a Argentina esta sendo taxada de mal pagadora e os Fundos de Investimento como Fundos Abutres, referindo ao fato de se aproveitarem de Estados falidos para ganhar dinheiro. Seguindo a linha de raciocínio do professor José Niemeyer, o problema macroeconômico que se vive terá uma solução diferente, uma vez que nenhum ator nacional ou internacional pode forçar à Argentina a fazer o pagamento de suas dívidas. Caso o calote seja confirmado, seguramente haverá sansões econômicas e 39 dependendo políticas, mas reaver o dinheiro investido não é uma situação de total certeza. Até o momento, poucos países se manifestaram contrários ou favoráveis às ambições argentinas. Por isso, Cristina Fernandez Kirchner utilizou-se do discurso de abertura da 69ª Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas em 2014 para expor o caso e pedir a criação de um grupo de países, afim de legislar e criar acordos para proteção dos Estados devedores. A expectativa de Cristina Kirchner é a criação de um marco regulatório, que possa se debruçar sobre a reestruturação de dívidas soberanas. Seu discurso foi aplaudido veemente principalmente pelos países sul-americanos e africanos. Contudo até o início de 2015 pouco foi tratado sobre o assunto e provavelmente será algo que demorará bastante a ser concretizado. Por fim, todo esse processo demorado é benéfico para a Argentina, que pôde esperar o fim da obrigatoriedade da Cláusula RUFO (dia 31 de dezembro de 2014), e agora pode renegociar um valor mais alto com os 7% dos fundos e continuar a pagar o valor previamente acordado com os outros 93%. O julgamento está na última instância possível, a Corte Internacional de Justiça de Haia. Não existem previsões para o fim deste imbróglio, porém, a Argentina ainda manterá o selo do calote de 2014 até que se mude o status ou faça os pagamentos. 5. 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