O Mercado de Títulos de Países Emergentes nos Anos 90 Tema: Ajuste Fiscal e Dívida Pública Subtema: Dívida Pública Externa 1. Introdução O mercado internacional de títulos tem se mostrado a mais importante ferramenta de financiamento externo para os países emergentes desde o início dos anos 90. Antes disso, o principal instrumento de financiamento externo eram os empréstimos sindicalizados, os mesmos que tiveram seus pagamentos em atraso e sua restruturação depois das diversas crises da década de 80. O perdão parcial dessas dívidas em atraso e sua securitização a partir de 1990 se deu em um processo iniciado pelo então Secretário do Tesouro dos Estados Unidos, Nicholas Brady. Os empréstimos em atraso foram transformados em títulos e a participação dos investidores no chamado Plano Brady foi quase compulsória. Os títulos oriundos das negociações ficaram conhecidos como bônus Brady e até hoje representam o maior volume de títulos de países emergentes negociados no mercado secundário. No caso da dívida externa de responsabilidade do Tesouro Nacional, por exemplo, a dívida mobiliária externa representa 73% da dívida externa total. Ou seja, os títulos emitidos no mercado internacional correspondem a mais de dois terços dos recursos externos, ficando a dívida contratual junto a bancos, agências e organismos internacionais relegada a um papel secundário. Por outro lado, um dos aspectos mais marcantes da internacionalização das finanças é a crescente interdependência da variação de preços entre os ativos financeiros dos diversos países, denunciando que a sua avaliação tem refletido algo mais que os fundamentos econômicos que os suportam. As relações entre as nações têm mostrado influência além dos campos político e do comércio internacional implicando uma alta volatilidade 1 no mercado financeiro, o que afeta fluxos de capitais, taxas de câmbio e juros, demandando resposta por parte das autoridades nacionais na administração de crises e da própria volatilidade dos ativos para minimizar os efeitos negativos sobre a economia real. A literatura sobre crises financeiras em si, além de profícua, é fascinante e ao mesmo tempo controversa. Fascinante porque as discussões sobre bolhas especulativas, bulls e bears, manias, pânicos e crashes atraem desde os leigos até os grandes economistas, pela sua referência ao mundo real, grandes histórias sobre a especulação, perdedores e vencedores. Ao mesmo tempo em que é histórica, esta é uma vertente da economia voltada para o porvir, ao invés de aprender com os próprios erros, busca-se aprender a partir dos erros dos outros. Controversa, pois a interpretação sobre os episódios de crise jamais parece ser definitiva. Exemplo disso é a recente discussão sobre a bolha especulativa no mercado de tulipas holandesas em 1636, cuja existência, por um lado é defendida pelos historiadores em geral e, em especial, por Kindleberger (1996) e refutada, por outro lado, por Garber (1994) com base em uma análise econométrica que conclui que a elevação do preço das tulipas foi uma resposta do mercado aos fundamentos. Se essa discussão ressurge 360 anos depois do episódio, que se pode dizer da análise das recentes crises financeiras? Uma característica especial das crises ocorridas na segunda metade da década de noventa é a não contenção dos seus efeitos dentro das fronteiras dos países que as originaram. Sem dúvida, a moratória da dívida externa mexicana no início da década de oitenta foi o estopim para a redução do fluxo de capitais para a América Latina e deu início à famosa crise da 2 dívida externa cujos efeitos perduraram por mais de dez anos. Naquele episódio, as vítimas foram países em situação econômica semelhante, altamente endividados, com dificuldades nos balanços de pagamentos, tendo problemas para enfrentar a alta dos preços do petróleo e das taxas de juros norte-americanas [Kaminsky & Reinhart (1998) analisam as crises da região em perspectiva histórica]. O mesmo não se pode afirmar com tanta certeza a respeito da Crise do México em 1994/1995 [v. Krugman (1995) e Sachs et al. (1996)], da Crise Asiática em 1997 [v. Alba et al. (1998), Kaminsky & Schmukler (1999) e Mishkin (1999)], da Crise da Rússia em 1998 [v. Calvo (1998)], da desvalorização do Real brasileiro em 1999 [v. Goldman Sachs (1999)] e dos episódios menores de especulação que permearam essas grandes crises . As crises mais recentes não tiveram seus efeitos restritos a países fundamentalmente semelhantes, tampouco que apresentassem ligações estreitas entre si, de forma que a sua propagação global é, em si, um fenômeno à parte. Explicar o porquê da grande afetação dos preços dos títulos da dívida externa brasileira em meio à crise da Rússia de agosto de 1998 e a alta volatilidade dos retornos das bolsas dos países emergentes como um todo são apenas alguns exemplos do problema por trás da análise das crises recentes, inúmeros outros casos podendo ser citados. A parcela da literatura sobre o contágio financeiro concentrada no mercado de títulos em especial é pouco representativa. Um dos motivos para isso pode ser o fato de o mercado de títulos de países emergentes ter ganho um impulso significativo apenas depois da conclusão das reestruturações no âmbito do Plano Brady, cuja última negociação se deu em fevereiro de 1995. 3 Os mercados de ações e de câmbio, sem dúvida, fornecem possibilidades de trabalho melhores, na medida em que existem dados para épocas remotas, décadas atrás, permitindo avaliar os efeitos internacionais de um maior número de crises, além de dispor de períodos de calmaria substanciais, que podem servir de grupos de controle. A própria natureza dos títulos de renda fixa, com uma data determinada de maturação e a redução natural da volatilidade de seus preços ao passar do tempo, pode ser apontada, por outro lado, como outro fator de desestímulo ao desenvolvimento de artigos específicos no assunto. Alguns artigos que abordaram a questão dos títulos de países emergentes são os de Calvo e Reinhart (1996), Valdés (1997), Bazdresch e Werner (1999) e de Rigobon (2000). Nenhum desses, porém, tratou o mercado de bônus de países emergentes como seu único objeto de estudo, estendendo a análise para outros tipos de ativos financeiros e agregados macroeconômicos. Eichengreen e Mody (1998), por sua vez, concentram seu estudo no mercado de títulos de países emergentes a fim de verificar quais seriam os determinantes das mudanças nos spreads nos mercados primário e secundário de dívida. Sua conclusão vai na direção de que o sentimento do mercado joga um importante papel na determinação dos spreads no curto prazo, independentemente da situação dos fundamentos macroeconômicos. Os artigos citados acima forneceram uma intuição a respeito das mudanças nos padrões de comovimento entre os preços dos títulos nos momentos de turbulência. Contudo, a sua base de dados parece estar viesada, pois os autores se utilizam, na maioria das vezes, de séries de preços de títulos que, como se pretende mostrar nesse trabalho, não são 4 uma boa escolha a incorporar em modelos de mensuração de contágio, existindo melhores indicadores do valor dos títulos de países emergentes. É importante enaltecer que o comportamento das séries de preços de títulos é diferente do comportamento das séries de índices de bolsas e moedas, demandando tratamento diferenciado por parte dos estudiosos, o que não foi o caso dos artigos citados. Ademais, para a compreensão do porquê do contágio internacional, mesmo em situações em que os fundamentos macroeconômicos indiquem perfis de risco diferenciados, é importante analisar todas as variáveis levadas em consideração pelos investidores do mercado de títulos de países emergentes, antes de alegar que o aumento do custo de captação de recursos por parte do Brasil no exterior foi injustamente afetado, que foi um movimento irracional dos investidores. Expostos a importância do mercado de títulos para o financiamento dos países emergentes e os problemas advindos da imperfeita compreensão desses instrumentos e de seu mercado na análise das crises recentes, julgase necessária uma explanação a respeito das peculiaridades dos mesmos a fim de permitir a confecção de análises corretas do ponto de vista técnico. Isto posto, a intenção deste trabalho é fornecer uma breve introdução sobre os títulos de países emergentes propriamente ditos, seu mercado e os fatores que influenciam a variação de seus preços. Busca-se, paralelamente, enaltecer as diferenças entre esse mercado e os mercado de ações e moedas, em especial nas características que servem para mensurar e explicar a existência de contágio financeiro. 5 Para tanto, o artigo se divide em seis seções além dessa introdução. A primeira expõe os conceitos básicos dos instrumentos de renda fixa. A seção seguinte apresenta os participantes no mercado de títulos de países emergentes, os emissores e o processo de colocação de papéis de um lado, e os principais tipos de investidores de outro. A terceira seção trata das variáveis analíticas do mercado emergente, em especial aquelas relacionadas aos fundamentals e aos technicals, bem como os índices que servem de benchmark para o retorno nesse mercado. Em seguida são traçadas breves colocações a respeito do processo de classificação de risco soberano pelas agências de rating e sua influência na demanda por papéis de países emergentes. Na seção seguinte, descreve-se a história recente do mercado de títulos de países emergentes, desde a solução adotada como remédio para a crise da dívida dos anos 80 até as mais recentes operações externas dos países emergentes, passando por todas as crises do período, enaltecendo evidências e justificativas para a existência de contágio neste ou naquele episódio. A seção de considerações finais encerra o trabalho. 2. Instrumentos de Renda Fixa As variáveis principais que definem um bônus são: preço, prazo de maturação, cupom, freqüência do cupom, forma de pagamento do principal, além da moeda. O preço de um título é normalmente cotado em porcentagem do par (100%) ou em dólares por US$ 100.00 ou por US$ 1000.00 (ou na moeda de denominação) e, idealmente, deve representar o valor presente dos fluxos de caixa que compõem aquele instrumento. O prazo de maturação é o tempo de vida remanescente do título até o seu vencimento, normalmente 6 medido em anos. O cupom é a taxa nominal de juros que incide sobre o principal devido do título a cada ano, podendo ser fixo, flutuante (LIBOR mais spread, por exemplo), variável (a taxa assume valores predeterminados ao longo da vida do título) ou mesmo zero (os chamados bônus de desconto puro ou zero-coupon bonds). A freqüência do cupom determina se os juros são pagos mensalmente, semestralmente ou anualmente. A forma de pagamento do principal define o processo de amortização do papel. A forma mais comum é a amortização do título bullet, ou seja, uma única parcela paga na data de maturação do título. Existem outras formas, como a amortização em parcelas iguais depois de um período de carência, parcelas pequenas ao longo da vida do título seguidas de uma parcela mais significativa na data de vencimento do título, e inúmeras outras modalidades de amortização. A moeda define a denominação do principal e dos juros, em que moeda estes devem ser pagos. O mais comum é que ambos sejam pagos na mesma moeda, ienes por exemplo. Existem porém títulos mais exóticos, como os chamados dual-currency-notes, que pagam principal e juros em moedas diferentes. Um título é, portanto, como se fosse um empréstimo comum, uma promessa de pagamento futuro, com uma taxa de juros, um prazo e um vencimento. A diferença é que o primeiro encontra um mercado secundário organizado, podendo ser inclusive listado em bolsa, e geralmente goza de senioridade frente às demais dívidas do emissor, enquanto o empréstimo tem um mercado secundário mais escasso e pode apresentar diferentes características de subordinação diante dos demais débitos do emissor, além de atingir um número menor de investidores em potencial. 7 Os bônus emitidos internacionalmente se diferenciam dos outros ativos financeiros como ações, moedas e commodities em diversos fatores. De especial interesse nesse trabalho são o método de precificação e a negociação dos mesmos. Ao contrário dos demais ativos financeiros, o preço de tela de um título não representa o preço que o investidor irá pagar ou receber (Elton e Gruber, 1995:526). O valor de liquidação das operações embute a cotação do título ajustada pelas amortizações já realizadas, mais os juros pró-rata devidos desde o último pagamento de cupom. Um exemplo ilustra bem essa característica especial dos títulos que, dentre outros motivos, justificará a adoção de um índice de retorno total na análise da existência de contágio, como será descrito mais adiante. Tome-se, por exemplo, o título Par Bond do Brasil, que paga 6% a.a. de cupom semestralmente, nos dias 15 de abril e 15 de outubro de cada ano, e tem amortização do tipo bullet. Suponha-se que no dia 12 de agosto de 2000, esse título estivesse sendo negociado a US$ 67.00 cada US$ 100.00 de valor de face e houve uma operação de venda do mesmo. A liquidação da operação se dá, via de regra, em D+3, ou seja, 3 dias úteis depois de efetuada a transação. Assim, o comprador deverá recompensar o vendedor pelos juros devidos desde a última data de pagamento do cupom até a data da liquidação da transação, 15 de agosto no caso, pois na próxima data de pagamento ele estará recebendo a parcela de juros integralmente. O preço de venda do título será, portanto: 120 6% × × $100 = $69.00 180 2 O segundo termo da equação acima fornece o cálculo dos juros pró$67 + rata. Segundo a convenção de contagem de dias utilizada no caso do Par 8 Bond brasileiro1, haviam sido decorridos desde a última data de pagamento de cupom até a data da liquidação 120 dias. Como o semestre, nessa convenção, tem 180 dias, divide-se 120 por 180 para encontrar a parcela dos juros à qual o vendedor tem direito a receber. Em seguida, toma-se a taxa nominal do cupom, 6%, e divide-se por 2, que é o número de pagamentos de juros ao longo de um ano. Os juros, nesse caso, são simples e não compostos. O produto desses dois termos é multiplicado por $100.00, que é o valor de principal devido do título, e chega-se ao valor de US$ 2.00 que devem ser pagos pelo comprador a título de juros acumulados. Elton e Gruber (1995) notam a diferença entre a base de cotação de ações e bônus. A ação é cotada ao preço de negociação e, quando um empresa paga dividendos aos acionistas, o preço da ação se reduz a fim de se ajustar ao evento. Isso não é verdade no caso dos títulos que, imediatamente após o pagamento de juros, o preço se mantém estável e os juros acumulados retornam a zero. Assim, os preços dos títulos não são uma referência apropriada do seu valor real, uma vez que as taxas de cupom são diferenciadas entre os papéis, não permitindo a comparação pura e simples entre os preços de dois bônus semelhantes de um mesmo emissor, com cupons diferentes. Um título pode, também, ser encarado como uma cesta de fluxos de caixa predeterminados distribuídos ao longo do tempo. Invocando a teoria do valor do dinheiro no tempo da matemática financeira, podemos afirmar que o 1 Existem diversas convenções de contagem de dias no mercado de títulos em geral. No caso do Par Bond e da maioria dos títulos Globais, considera-se um ano com 12 meses de 30 dias cada, o que caracteriza o método de cálculo 30/360. Outras convenções consideram dias corridos e anos de 365 dias, dias úteis e anos de 252 dias úteis, e diversas outras variações do mesmo tema. Não é importante para o objetivo do trabalho, entretanto, entrar no detalhe dessas convenções. 9 preço nada mais é que o valor presente dos fluxos de caixa de um título descontado às taxas de mercado para cada período. O rendimento de um título de renda fixa se dá de duas maneiras: o juro nominal pago a cada período (cupom) e o ganho de capital oriundo da variação entre o preço de compra e o seu valor do papel no vencimento, que é 100% ou o par. A combinação dessas duas fontes de ganho nos fornece a primeira e mais importante das ferramentas analíticas no mercado de títulos, a yield-to-maturity (YTM), ou rendimento até o vencimento. A YTM é a taxa interna de retorno do investimento em um título, ou seja, aquela taxa que iguala o preço do título hoje à soma do valor presente de todos os fluxos futuros. Matematicamente, tomando o preço p e os fluxos de caixa no período i Ci como parâmetros, a YTM é o y que resolve a seguinte equação: n C3 CN Ct C1 C2 M ... + + + + = + ∑ 1 2 3 N t (1 + y ) (1 + y ) (1 + y ) (1 + y ) (1 + y ) n t =1 (1 + y ) A relação entre o preços de um título e sua yield-to-maturity não é p= linear, mas sim convexa, de forma que, no limite, tangencia os eixos conforme ilustra a figura 1 a seguir. A convexidade ali mostrada implica que o preço do título sobe a uma taxa crescente com a redução da YTM, e cai a uma taxa decrescente com o aumento da YTM, o que, obviamente, é uma característica positiva. Fabozzi, Pitts e Dattatreya (1997) chamam a atenção para o fato de que dada relação preço/yield só é válida para um ponto no tempo. Com o passar do tempo, dois fatores vão afetar o preço do título: os movimentos nas taxas de juros e o acúmulo dos ganhos/perdas de capital no caso dos títulos com preços diferentes do par. 10 Figura 1 – Relação entre Preço e Yield – bônus de 20 anos, 6% de cupom 130 120 Preço 110 100 90 80 70 4% 5% 6% 7% Yield 8% 9% Fonte: Fabozzi (1997) Outro conceito de rendimento importante no caso dos títulos de países emergentes é a stripped yield to maturity, utilizada na análise daqueles títulos que possuem garantias de principal e juros a fim de verificar o retorno da parcela referente ao risco soberano. A diferença para a YTM é que, no caso de garantia de principal, se subtrai do preço o valor da garantia (normalmente um título do Tesouro dos EUA) e se desconsidera o pagamento de principal no vencimento (Garantia, 1995). Esse indicador é especialmente útil no caso dos títulos Par e Discount dos diversos países emergentes emitidos sob a égide do Plano Brady. Existe ainda a current yield, que é uma medida do retorno de um título em um ano, mantido o preço constante. Ou seja, considera-se apenas o ganho relativo ao recebimento do cupom. Seu uso é limitado, mas pode ser a diferença motivadora da escolha entre dois títulos de mesma YTM e demais características. Sua fórmula é dada por: Current Yield = Taxa do Cupom Preço de Mercado Outra medida de retorno importante no mercado de títulos de países emergentes é o chamado spread over Treasury, ou prêmio sobre o título do Tesouro. O spread é o diferencial da YTM do título em análise e a YTM do 11 título do Tesouro do país onde esse título foi emitido de prazo equivalente, supostamente o ativo livre de risco naquela economia. O título do Tesouro, no caso, é tido como o instrumento de risco de crédito zero nos países desenvolvidos, de forma que o spread over Treasury é uma medida do prêmio de risco, o retorno em excesso cobrado do emissor do título de menor qualidade. Imagine-se o título brasileiro Global 2030, denominado em dólares e com uma YTM de 13%. Tome-se, então, o título do Tesouro dos EUA (referência para o mercado de dólares) com mesma maturação e que rende 6% até o vencimento. O diferencial das yields é de 7%, ou 700 bp (basis points, ou 0,01 ponto percentual), que vem a ser justamente o spread do título brasileiro sobre o título americano de prazo semelhante. De posse das YTM para títulos de diferentes prazos, pode-se construir o que se chama estrutura a termo das taxas de juros de um país, ou curva de rendimentos, ou ainda yield curve. A yield curve mostra o suposto custo de captação do país nos diferentes prazos. A curva de rendimentos do Brasil, hoje, no mercado de euros, por exemplo, é formada por 8 títulos. Esses papéis têm vencimento em 2001, 2002, 2003, 2004, 2005, 2006, 2007 e 2010. Cada qual apresenta preços e yields diferentes dos demais, mas também, cada um indica o quanto o Brasil deveria, idealmente, pagar de juros ao efetuar novos lançamentos naqueles prazos. A yield, depois de emitido um título, se encontra no nível determinado pelo mercado, de forma que se torna referência para novas operações. A figura a seguir mostra a yield curve brasileira no mercado de euros. 12 Figura 2 – Yield Curve Brasileira – Títulos denominados em Euros 11% YTM 10% 9% 8% 7% 6% 2000 2002 2004 2006 2008 Vencimento 2010 Fonte: Bloomberg, em 02.10.2000 A yield e o spread são medidas de retorno de um instrumento de renda fixa. Como na teoria de carteiras2 se trabalha no espaço risco versus retorno, julga-se apropriado discorrer brevemente sobre as medidas de risco dos títulos de renda fixa. A data de maturação representa um risco não propriamente financeiro, mas relativo à capacidade de pagamento do emissor. Um título da vence dois meses depois de uma eleição presidencial apresentará, potencialmente, um risco maior de não pagamento do que um outro título de características semelhantes com maturação anterior à eleição, pois este não embute o risco de descontinuidade do governo e de uma eventual moratória como ato político. O diferencial entre as YTM dos dois papéis será tão maior quanto menor for a percepção de estabilidade política no país. Das variáveis financeiras consideradas na avaliação de risco, as mais importantes são a duration e a convexity. Utiliza-se com menor freqüência, também, o conceito de vida média, que leva em consideração os diversos pagamentos de principal efetuados ao longo da vida do título ponderados 13 pelos períodos de ocorrência da amortização (válido para os casos de títulos com amortização, em oposição àqueles do tipo bullet). Fabozzi (1997) afirma que a duration de um título pode ser interpretada com a mudança percentual aproximada do preço de um título para um movimento de 1 ponto percentual na taxa de juros3. Em outras palavras, a duration reflete o quanto o título se valorizará ou desvalorizará diante de uma mudança pontual na sua yield to maturity. Uma definição mais rigorosa do ponto de vista matemático é que a duration é a primeira derivada da função preço/yield. Outra definição é temporal, a duration representa a média do número de anos que faltam para resgatar o título ponderada pelo valor presente de cada fluxo de caixa. Apesar de as três estarem corretas, a primeira definição é a que faz mais sentido do ponto de vista do investidor ou do administrador de carteira. Assim, um título com duration de 6 (anos), por exemplo, valorizará 0,06 ponto percentual se a sua yield to maturity (anual) se reduzir em 0,01 ponto percentual. Um título de duration 5, por outro lado, se valorizaria menos (0,05 ponto percentual), mas também, em caso de alta dos juros, se desvalorizaria menos. O segundo título, portanto, apresenta risco menor. Essa aproximação da duration se faz menos precisa para mudanças maiores nas taxas de retorno como mostrar-se-á mais adiante. 2 A moderna teoria de carteiras tem origem no artigo de Harry Markowitz, “Portfolio Selection”, Journal of Finance 7(1), março de 1952. 3 O conceito de duration vem do artigo de Frederick Macaulay – “Some theoretical problems suggested by the movements of interest rates, bond yields and stock prices in the United States since 1865”, NBER, 1938, e por isso a duration comum é conhecida como Macaulay duration. 14 O cálculo da duration leva em consideração o preço do título, o número de fluxos, e o valor presente de cada um dos fluxos de caixa. A fórmula é: n FC t t ∂P 1 = ∑ ∂y (1 + y ) t =1 (1 + y ) t Onde FCt é o fluxo de caixa do período t, P é o preço do título ou a Dur = soma do valor presente de todos os fluxos de caixa, e y é a YTM. Esta, na realidade, é a chamada modified duration, mais utilizada correntemente, que guarda a seguinte relação com a Macaulay duration: Macaulay Duration 1+ y k Conforme mencionado anteriormente, a duration é uma aproximação Modified Duration = para a mudança nos preços dada uma mudança na yield que é válida para pequenas variações da taxa. Como a relação preço/yield não é linear, a primeira derivada não basta para aproximar a variação. A figura 3 a seguir mostra o porquê desses erros de estimativa. Figura 3 – Estimativa da Mudança do Preço com base na Duration Preço Real Erros de estimativa feita exclusivamente com base na duration Preço Preço Estimado Yield Fonte: Fabozzi (1997) A convexidade da relação, portanto, também deve ser levada em consideração na estimação da variação dos preços diante de uma mudança na taxa de retorno do título. Não por acaso, o indicador que mensura essa 15 mudança de segunda ordem é chamado convexity. Conforme mencionado anteriormente, um título com alta convexity tende a se valorizar mais rápido e se desvalorizar mais lentamente do que outro com menor convexity. A convexity pode ser interpretada como a segunda derivada da relação preço/yield. A fórmula para o cálculo da convexity é a seguinte: n FC t × (t 2 + t ) ∑ (1 + y ) t 1 ∂2P 1 t =1 C= × 2 = n FC t P ∂y (1 + y ) 2 ∑ t t =1 (1 + y ) A aproximação da variação do preço de um título considerando a duration e a convexity, portanto, é dada pela seguinte relação: ∆P = Duration × ∆y + Convexity × ∆y 2 ∆y Pela fórmula se percebe que o segundo termo é sempre positivo, independente da direção da mudança da taxa4. Por isso, a convexity sempre afeta positivamente o preço do título, sendo uma característica bastante desejável dos títulos de renda fixa, do ponto de vista do investidor. Além dos instrumentos de risco e retorno analisados, os títulos de renda fixa de países emergentes possuem certas características relacionadas ao mercado em que são emitidos. As diferenças são sutis em termos puramente técnicos, mas se mostram importantes no que se refere ao tipo de investidor final e na liquidez dos mercados. 4 Em verdade, isso é só é válido para títulos sem opções, que sempre apresentam convexity positiva. Papéis com opção de call, por exemplo, apresentam convexity negativa. Não é a intenção dessa dissertação, contudo, entrar no detalhe da mensuração de risco de papéis com opções. Uma referência apropriada para o estudo do assunto é Fabozzi (1999). 16 O mercado global, ou mercado de eurodólares5, pode ser tratado como o mais importante e mais líquido dos mercados para títulos de países emergentes. Como o próprio nome sugere, pode ser negociado globalmente, com poucas restrições, e é emitido e negociado fora da jurisdição de qualquer país específico (Steward e Greshin, 1997). O mais importante é que é nesse tipo de instrumentos que os grandes investidores institucionais com base nos Estados Unidos aplicam seus recursos em países emergentes. Isso aufere aos países a possibilidade de emitir títulos com prazos superiores a 30 anos, o que amplia o leque de opções em termos dos instrumentos de financiamento adotados. A maioria dos títulos globais é denominada em dólares, apresenta resgate do tipo bullet, paga juros semestralmente e apresenta volumes superiores a US$ 1 bilhão. O mercado de eurobônus denominados em moedas européias, por sua vez, não é tão desenvolvido nem tão líquido quanto o mercado de eurodólares. Os volumes emitidos nos mercados dos países europeus são mais modestos, normalmente inferiores a EUR 1 bilhão e de prazo mais curto, não superior a 10 anos, com algumas exceções. O perfil dos investidores também é diferente, predominando o mercado de varejo no qual o investidor compra o título e o retém até o seu vencimento, com pouca participação relativa de investidores institucionais. Espera-se, contudo, que com o desenvolvimento do mercado e consolidação do euro como moeda 5 Na realidade, existiam diferenças entre os bônus globais e os eurodólar. Originalmente, os bônus do mercado eurodólar não podiam ser vendidos originalmente a investidores americanos, por não estarem registrados junto à Securities and Exchange Comission dos EUA. Contudo, com a emissão do primeiro bônus global em 1989 pelo Banco Mundial, com características que uniam o mercado eurobônus com as exigências do mercado doméstico dos EUA, deu início ao processo que, praticamente, eliminou a segmentação entre os dois mercados. O prefixo euro deveria significar offshore, mas o que 17 única da União Monetária Européia, o mercado europeu venha a se assemelhar ao global. Os chamados bônus Samurai são os títulos denominados em ienes emitidos no mercado doméstico do Japão por entidades estrangeiras. O mercado Samurai apresenta liquidez ainda menor do que o europeu, de modo que praticamente inexiste mercado secundário para tais papéis. Depois de alguns problemas financeiros enfrentados pela economia japonesa, o mercado Samurai vem se recuperando e se firmando como a opção mais barata de financiamento para países emergentes em termos absolutos, dadas as baixas taxas de juros na terra do sol nascente. Os prazos dos títulos de países emergentes têm se estendido até 5 anos, sempre em volumes modestos, em torno do equivalente em ienes a US$ 500 milhões. Outros mercados pouco utilizados ultimamente por países emergentes, mas também de importância, são o mercado doméstico dos EUA (Yankee) e o chamado mercado Bulldog, o mercado doméstico de títulos na Inglaterra. Diante da maior liquidez do mercado global e da maior disponibilidade de instrumentos analíticos e de fontes de precificação, considera-se prudente restringir neste estudo, sem grandes perdas, a análise aos títulos de países emergentes emitidos nesse mercado. Finalmente, é oportuno traçar as pequenas diferenças entre os bônus globais e os títulos Brady. Os bradies, também denominados em dólares na sua maioria, tiveram sua origem na reestruturação da dívida de diversos países. Para que alguns detentores originais das dívidas externas desses países aceitassem reestruturar seus créditos, foi necessário oferecer uma ocorre hoje é que os bônus globais são um tipo especial de eurobônus que pode ser 18 gama de opções, dando origem a complicadas estruturas para os papéis. Os prazos são longos e os volumes bastante expressivos. Alguns títulos, como o C-Bond brasileiro, apresentam capitalização, ou seja, parte dos juros é incorporada ao principal, de forma que o saldo devedor aumenta ao longo de um certo período. Isso leva a complexas convenções de cotação de preços. Outros títulos apresentam amortizações ao longo de sua vida, o que não é uma característica propriamente desejável pois aumenta o capital investido exposto ao risco de reinvestimento. As taxas de cupom dos bradies, levando em conta que a maioria foi emitida com desconto, são artificialmente baixas, o que aumenta a parcela do rendimento ligada ao ganho de capital, reduzindo a current yield. Alguns bradies apresentam taxas de cupom flutuantes com relação à LIBOR, dificultando a correta precificação dos mesmos pelos agentes do mercado. Os títulos Brady carregam consigo o estigma da reestruturação, de dívidas que já foram sujeitadas a moratórias e não pagamentos. Mais do que uma má lembrança, essa característica impede que alguns grandes investidores possuam bradies em suas carteiras, seja por motivos legais (como as companhias seguradoras dos EUA), seja por orientação interna às instituições. Assim, o comprador potencial de um bônus global não necessariamente é comprador de um título Brady, havendo uma diferenciação na base de investidores. Por fim, o fato de alguns bradies apresentarem garantia de pagamento de principal e de algumas parcelas de juros afasta uma série de investidores interessados em investir no risco exclusivo do país. No caso do Discount negociado nos Estados Unidos. (Steward e Greshin, 1997). 19 Bond brasileiro, por exemplo, o investidor gasta US$ 80 para comprar um título com US$ 100 de valor de face. No entanto, por possuir um Título zerocoupon do Tesouro dos EUA como colateral, o principal desse título é descontado a valor presente pela taxa dos Treasuries, pois não possui risco soberano relativo ao seu pagamento. O investidor, portanto, estaria investindo cerca de US$ 50 em risco Brasil outros US$ 30, involuntariamente, em risco Treasury, o que pode não ser o seu interesse. Apesar das diferenças expostas, os preços dos títulos globais e dos bradies costumam variar nas mesmas proporções, uma vez que as grandes agências de classificação de risco deixaram, há alguns anos, de diferenciar o risco de crédito dessas duas classes de bônus. O risco soberano é o mesmo, pois o devedor é mesmo. Existe, contudo, um diferencial de yields entre os dois tipos de título não ligado ao risco, mas sim às características mais complexas dos bradies. Mantendo em mente as diferenças elencadas, podese facilmente tratar os bônus globais e os bradies como pertencentes a um mesmo mercado, pois ambos são negociáveis nos Estados Unidos e no resto do mundo. 3. Participantes A securitização das dívidas dos países emergentes na década de noventa ampliou o universo de participantes na negociação da dívida externa dessas nações, anteriormente restrito aos bancos credores originais e àqueles que eventualmente houvessem comprado créditos no mercado secundário de empréstimos. O volume de negociações no mercado secundário de empréstimos, entretanto, era reduzido antes da conversão dos 20 mesmos em títulos, pois grande parte dos bancos incorreriam em problemas contábeis se vendessem a dívida com desconto (Garantia, 1995). Com o aumento do volume negociado, tornou-se natural o desenvolvimento do mercado e a diversificação dos participantes. Os novos agentes no mercado de títulos de países emergentes se enquadram em um (ou mais) dos seguintes papéis: originação, intermediação e investimento. Na ponta da colocação de papéis ou originação, se encontram os países e empresas interessados em captar recursos no mercado internacional de títulos e os bancos que atuam como agentes na colocação de títulos no mercado primário de dívida. Os países e empresas, ou os emissores, determinam sua estratégia de financiamento contemplando, simultaneamente, suas necessidades de recursos e as alternativas para levantar esses fundos, tendo em mente o custo e o risco envolvido em cada uma delas. Uma vez tomada a decisão de tomar recursos no mercado internacional de títulos, os emissores contratam um ou mais bancos que se encarregam de fazer a conexão entre a oferta de novos títulos e a demanda dos investidores pelos mesmos. Esses bancos atuam como consultores dos emissores na determinação de qual o melhor instrumento a emitir, considerando o prazo ideal, a estrutura a termo da taxa de juros daquele país ou empresa, o mercado em que o papel será emitido e demais decisões estratégicas. Ademais, os managers ou bookrunners, como os bancos líderes de operações são conhecidos, se encarregam da divulgação da operação e da situação econômica do país junto a seus clientes a fim de promover um maior interesse pelo título. O processo de colocação se dá, normalmente, através 21 de um leilão em torno da taxa do novo título, decidindo o emissor qual a taxa de corte. Alternativamente e com freqüência, faz-se uso do método conhecido por bookbuilding, no qual os bancos recolhem ofertas dos investidores construindo um “livro” de ofertas para intervalos decrescentes de taxas até atingir um consenso a respeito do preço justo para o novo papel, ficando a critério do emissor a definição do volume emitido e da distribuição do título entre os investidores. No papel de intermediação, se encontram os market-makers e os brokers. Os primeiros são as grandes instituições financeiras que se comprometem a dar liquidez ao mercado, possuindo uma carteira própria de papéis, sinalizando sempre um preço ao qual estão dispostos a comprar e a vender determinado títulos. Atualmente, as casas mais atuantes como market-makers no mercado de títulos emergentes denominados em dólares são os bancos J. P. Morgan, Chase e Deutsche Bank6. Os brokers, por sua vez, são legítimos intermediários das transações. Não mantêm posição própria, apenas divulgando as cotações de compra e venda através de um sistema eletrônico, unindo as pontas interessadas na negociação dos papéis. Os títulos de países emergentes são normalmente negociados no mercado de balcão (over the counter) apesar de poderem ser listados em bolsa. Daí surge a importância do serviço dos brokers na divulgação das cotações, pois, não havendo um mercado centralizado para essa negociação, os investidores buscam orientação de preços nas telas de 6 Em setembro de 2000 foi anunciada a compra do J. P. Morgan pelo Chase, que se fará efetiva no primeiro trimestre de 2001, quando os dois bancos passarão a trabalhar juntos sob o nome de J. P. Morgan Chase e Co. As análises iniciais do impacto da aquisição sobre o mercado de títulos emergentes não foram muito positivas, prevendo um eventual impacto na liquidez do mercado ao fundir os dois maiores market-makers. Por outro lado, há quem 22 diferentes brokers. Alguns dos principais brokers do mercado de títulos emergentes em dólares são Tullet & Tokyo, Tradition, Prebon Yamane e Cantor Fitzgerald. Finalmente, na ponta do investimento se encontram os compradores finais dos títulos e todo o arcabouço de pesquisa que suporta sua decisão de investir. Pode-se dividir esses investidores em dedicados e crossover. Os investidores dedicados podem ser descritos como aqueles que investem prioritariamente no mercado de títulos de países emergentes. São eles os fundos mútuos de investimento em mercados emergentes e os administradores de recursos de hedge funds e global growth funds que têm o rendimento de suas carteiras atrelado ao retorno nesse mercado e comparado ao retorno das carteiras de seus concorrentes. Esses agentes possuem como benchmark índices que emulam o retorno total da classe de ativos em estudo. O índice mais utilizado é o Emerging Markets Bond Index Plus (EMBI+), produzido e calculado pelo banco J. P. Morgan. Segundo Brauer (1997), as características dos títulos emergentes – os bradies em especial – no que se refere ao alto retorno, potencial de apreciação e liquidez, se tornaram um grande atrativo para investidores institucionais que passaram a investir nesse mercado pela primeira vez em meados dos anos noventa. Os chamados investidores crossover são aqueles dedicados a outros mercados, como o mercado doméstico de títulos highyield nos Estados Unidos, tendo como benchmark índices como o Merrill Lynch High Yield Index e o Lehman Aggregate (que possui uma pequena parcela de sua composição em papéis emergentes). A redução dos retornos aposte na abertura de espaço para outras instituições bastante atuantes, como o Morgan 23 nesses mercados fez com que uma maior parte dos recursos de suas carteiras passasse a ser alocada em títulos de países emergentes, por fornecerem um maior retorno com nível de risco semelhante ou mesmo um pouco mais elevado. Brauer (1997) aponta, além do descrito acima, a valorização dos títulos norte-americanos e a queda dos juros americanos em torno de 1993 como um fator que atraiu uma classe ainda mais conservadora de investidores para o mercado de bônus emergentes: seguradoras e fundos de pensão. Esse último tipo de investidores crossover passou a investir em mercados emergentes em busca de maiores retornos para suas carteiras. A esses grandes investidores institucionais, juntam-se, como investidores ocasionais, os grandes bancos, os credores originais das dívidas emergentes e os investidores locais (muito importantes no caso da Argentina, por exemplo), que têm o foco voltado para o retorno total de suas carteiras e incorporam bônus de países emergentes nas mesmas pelo maior rendimento oferecido. Deve-se salientar que, apesar de não serem dedicados ao mercado emergente, os investidores crossover, de maneira geral, possuem um potencial de investimento muito alto, capaz de afetar as relações de demanda e oferta por papéis ao alterar mais que marginalmente sua alocação nesses títulos. A diversificação de investidores e o próprio desenvolvimento do mercado tornou necessário um maior investimento por parte das instituições na pesquisa macroeconômica relacionada a cada um dos países emergentes e na pesquisa a respeito das condições do mercado, a fim de subsidiar as Stanley Dean Witter e a Merrill Lynch. 24 decisões de investimento. Apesar de não agirem diretamente no mercado, as equipes de pesquisa e estratégia possuem um papel fundamental nos rumos que tomam os preços dos títulos. Exemplo da importância da pesquisa é a argumentação de Calvo e Mendoza (1999) a respeito da racionalidade do contágio em momentos de crise relacionada aos altos custos de processamento de informações específicas de cada país, situação na qual os investidores encontrariam sentido em atuar por instinto de manada, na direção seguida pela maioria do mercado. Essa linha de raciocínio vem a relacionar o contágio ao problema da assimetria de informações. As equipes de pesquisa nas grandes instituições geralmente são especializadas. Um maneira bastante simplista de descrever o processo é a seguinte: um grupo se encarrega da pesquisa econômica, outro da análise das condições gerais do mercado e um último grupo consolida as informações a fim de desenhar a estratégia da instituição naquele mercado. Os grandes bancos e instituições privadas de pesquisa se utilizam do material produzido tanto para uso interno quanto como commodity na atração de clientes. As opiniões dos analistas se mostram cada vez mais importantes, pois em um mercado que se encontra imerso na assimetria de informações, qualquer manifestação negativa a respeito da qualidade do crédito de um país é capaz de gerar fortes desvalorizações dos seus bônus. Na próxima seção são discutidas mais a fundo as variáveis envolvidas na pesquisa sobre os mercados de títulos emergentes. 25 4. Variáveis Envolvidas Além das variáveis analíticas descritas na primeira seção deste capítulo, existem outros fatores que afetam a decisão de investir em instrumentos de renda fixa de países emergentes. A primeira variável é a estrutura a termo das taxas de juros dos países onde os títulos são emitidos. O formato da yield curve e seus movimentos afetam consideravelmente os potenciais de valorização ou desvalorização dos títulos emergentes. É sobre essas curvas que é medido o spread do rendimento dos títulos e, dada a importância desse indicador, um movimento nas mesmas pode afetar o referencial dos investidores a respeito do valor relativo dos bônus. Um exemplo recente pode ser citado para ilustrar esse efeito. À época da crise da Rússia, em agosto de 1998, o Federal Reserve (o banco central dos Estados Unidos) iniciou um agressivo processo de redução das taxas de juros no intuito de evitar um aperto nas condições monetárias mundiais diante da terceira crise financeira em menos de 4 anos. Essa ação deslocou paralelamente e para baixo a curva de referência dos títulos do Tesouro dos Estados Unidos. Com o forte crescimento e as baixas taxas de desemprego, a autoridade monetária americana passou a se preocupar com as pressões inflacionárias no primeiro semestre de 1999, iniciando um processo inverso ao anterior, aumentando as taxas de curto prazo, enquanto o Tesouro dos EUA promovia recompras de títulos antigos da parte longa da curva financiado pelo superávit fiscal daquele país. O efeito dessas medidas sobre a yield curve não foi paralelo como anteriormente, mas sim uma torsão. A curva dos Treasuries se tornou invertida, com maior custo do dinheiro para 26 prazos mais curtos do que para os prazos mais longos. O impacto nos mercados emergentes foi o seguinte: apesar dos menores spreads no curto prazo (não por fatores ligados às condições dos países emergentes, mas sim por causa do formato da curva americana), havia maior demanda para colocação de títulos de longo-prazo, onde a taxa do Tesouro americano oferecia baixa remuneração e os investidores buscavam maiores retornos, ainda que arriscados. Figura 4 – Curvas de Rendimento dos Títulos do Tesouro dos EUA 6.75 Yield 6.25 5.75 5.25 4.75 4.25 0 5 10 15 20 25 30 Prazo AGO'98 FEV'99 MAR'00 OUT'00 Fonte: Bloomberg, em 02 de outubro de 2000 A figura 4 mostra a yield curve dos títulos do Tesouro americano em quatro momentos da história recente. O primeiro é em agosto de 1998, logo antes do início da crise da Rússia. O segundo momento é em fevereiro de 1999, logo após a desvalorização brasileira, quando o Banco Central americano conclui o seu ciclo de redução das taxas de curto prazo, promovendo o deslocamento paralelo da curva como um todo. A terceira data mostrada é março de 2000, quando a menor oferta de títulos de longo prazo e o aumento das taxas de juros do Fed promoveram a inversão da curva e o aumento do custo de captação. A quarta situação mostrada é recente, 27 outubro de 2000, quando ocorre uma nova torsão, com a redução dos rendimentos dos títulos de curto e médio prazo diante da percepção de que as elevações de taxas de juros pelo Fed estariam, momentaneamente, suspensas. Figura 5 – Emissão total de títulos no Mercado Samurai - 1990 a Jun/2000 4500 3873.7 JPY bilhões 4000 3500 3000 2500 2123.3 1700 2000 1500 1194 1173 1656.5 1162.5 681 1000 660.5 602.6 205 500 0 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 até Jun Fonte: Nomura Securities Outro caso interessante de efeito de condições monetárias de um país desenvolvido no andamento do mercado de títulos de países emergente é o do Japão no final da década de 90. Antes um mercado atrativo e de bastante recurso por parte de países emergentes, o mercado Samurai foi afetado fortemente pelas condições monetárias e pela instabilidade do setor financeiro daquele país. A partir de 1997, o Japão apresentou uma forte redução das suas taxas de juros de curto e longo prazo até chegar à situação de uma "armadilha de liquidez". A taxa de redesconto chegou a 0,2% a.a. e as taxas de longo prazo se encontravam ao redor de 2% a.a.. Com tal cenário, os investidores japoneses preferiam expatriar recursos a investí-los em ativos denominados em ienes, praticamente fechando o acesso ao mercado por parte dos países emergentes. A figura 5 mostra a redução do volume total de títulos emitidos no mercado Samurai a partir de 1990. 28 Além das condições monetárias nos países desenvolvidos, existem outros fatores que devem ser levados em consideração na determinação dos valores dos títulos de renda fixa emergentes. Vine (1997) divide esses fatores em três grupos, que são: (i) risco soberano; (ii) formação global de capital / condições técnicas; e (iii) os fundamentos dos emissores não soberanos (empresas, bancos privados e outros que não atingem a qualidade de crédito do país). Vine observa ainda que, entre 1993 e 1995, houve uma alteração no peso dos três conjuntos na tomada de decisões, atribuindo maior importância relativa aos fatores soberanos e fundamentais, em detrimento das condições técnicas. Isso seria um sinal de amadurecimento do mercado. À exceção do terceiro grupo citado, cuja análise vai um pouco além do objetivo deste trabalho, descrever-se-ão as principais variáveis que afetam a percepção do risco soberano (fundamentos macroeconômicos) e das condições técnicas do mercado. A análise de risco soberano embute dois componentes principais: (i) a pretensão por parte de um governo de pagar suas dívidas em dia, o que está relacionado a questões essencialmente ideológicas; e (ii) a habilidade em pagar as dívidas, composta de considerações econômicas. Em suma, essa parte da análise envolve questões como a estabilidade social do país, as condições econômicas, o arcabouço jurídico, entre diversos outros fatores. No que se refere à pretensão em pagar, não se espera de antemão que um país anuncie um atraso ou suspensão do pagamento de sua dívida externa por motivos estritamente políticos ou ideológicos. Essa característica afeta a previsibilidade de eventos de crédito dessa natureza. Afortunadamente, segundo Vine (1997), tais acontecimentos são raros, tendo 29 ocorrido não mais que quatro vezes no século XX: com o governo bolchevique da Rússia em 1917, Hitler e o repúdio à dívida alemã sob o Tratado de Versalhes em 1934, o Japão em 1941 e a China comunista em 1949. Por outro lado, a habilidade em efetuar os pagamentos é mais previsível além de predominante na análise. A inabilidade em honrar as dívidas externas dá origem a um ato político de declaração de moratória que, ao contrário do exemplo do parágrafo anterior, tem raiz em fundamentos macroeconômicos. Alguns exemplos recentes de atrasos e moratórias que foram precedidas por problemas econômicos e poderiam, de certa forma ser previstas, são a crise da dívida da América Latina na década de 80, todo o problema envolvendo a crise do México em 1994/1995, a moratória da Rússia no segundo semestre de 1998 e a moratória seguida de restruturação da dívida do Equador entre 1999 e 2000. A concentração da análise no nível das reservas internacionais por parte de Vine (1997) se justifica pelo fato de que, no limite, é dali que sairão os recursos destinados ao pagamento das dívidas no exterior. Uma alta relação Exportações/Reservas dá sinais de pequena dependência de investimento estrangeiro, por exemplo. Não é esse o caso da maioria dos países emergentes atualmente, que contam com poupança externa para compensar a falta de poupança doméstica. Uma alta concentração de investimento estrangeiro em carteira (ativos financeiros) é outro fator negativo, pois essa classe de investimentos é, por natureza, mais volátil do que o investimento físico, em capital fixo. A existência de divisas suficientes à 30 disposição para o pagamento das dívidas é, por motivos óbvios, condição necessária para que os mesmos possam ser efetuados. As questões de composição e sustentabilidade das exportações são abordadas da seguinte maneira. Uma alta parcela de commodities na lista de exportações, por exemplo, denota uma alta relação com os preços das mesmas no mercado. Citem-se os casos de México e Venezuela, altamente dependentes das exportações de petróleo. A sustentabilidade, por sua vez, leva em consideração os fatores como preço dos insumos produtivos e taxas de câmbio sub ou sobrevalorizadas. Não são essas as únicas variáveis macroeconômicas usualmente monitoradas. Outros fatores como o crescimento do PIB, o estoque relativo da dívida e seu perfil ao longo do tempo, o controle da inflação e o comportamento dos agregados monetários também são fortes indicativos da estabilidade econômica e da situação creditícia de cada país. Uma pequena analogia pode ser feita também com os resultados do estudo de Kaminsky, Lizondo e Reinhart (1997) a respeito dos indicadores de crises cambiais. Tratando a crise cambial como um estágio importante de uma crise financeira, os autores elencam uma série de indicadores macroeconômicos que devem ser monitorados a fim de antecipar a possibilidade de um choque. A maior probabilidade de crise implica um maior risco para a estabilidade financeira e para o retornos do ativos de um país, o que justifica uma eventual desvalorização dos títulos dessa nação. Assim, em adição aos indicadores já citados, considera-se apropriado citar aqueles considerados mais significativos pelos três autores. 31 No setor externo, são analisados 16 indicadores ligados à situação da conta de capitais do balanço de pagamentos, 10 relacionados ao perfil da dívida, outros 18 relativos ao balanço em transações correntes e 4 referentes ao cenário internacional. Dentre esses, os mais significativos do ponto de vista estatístico na previsão das crises foram o nível de reservas internacionais, a taxa de câmbio real, o perfil da dívida pública e a balança comercial. Os indicadores relativos ao setor financeiro são 21 ao todo, 6 dos quais referentes à liberalização financeira. Destes, o crescimento do crédito, a base monetária e a razão entre o M2 e as reservas internacionais são aqueles de maior sucesso na antecipação de crises. Somadas, as variáveis relativas aos setores real, fiscal, institucional, estrutural e político são 34. Do ponto de vista do poder de explicação de crises, as mais importantes se mostraram a inflação, o PIB real, o nível de emprego, o déficit fiscal, o crédito ao setor público, o regime de câmbio e as mudanças de governos. No caso específico dos títulos de países emergentes, a análise dos fundamentos não pode ser feita em termos absolutos, mas sim em termos relativos, comparando um país a outro de mesmo nível de risco a fim de comparar as perspectivas dos mesmos e permitir a precificação diferenciada entre os papéis. Dentro da literatura sobre crises financeiras alguns autores caracterizam o papel das profecias auto-realizáveis, bolhas, equilíbrios múltiplos, comportamento de manada e contágio como resultado de escolhas 32 aparentemente irracionais, não orientadas pelos fundamentos macroeconômicos (Andrade e Silva, 1999). Levando isso em consideração, descreve-se a seguir um importante conjunto de variáveis que pode ajudar a compreender como alguns fatores não relacionados aos fundamentals influenciam na decisão dos investidores sobre suas alocações no mercado de títulos emergentes. Esses fatores, os technicals, podem se mostrar bons indicadores de uma mudança de direção do mercado de títulos, sendo apontados, por vezes, como a razão para a existência de contágio entre os títulos dos diversos países ao maximizar a influência de rumores e más notícias. Por motivos que justificar-se-ão mais adiante, convém analisar o papel dos índices de retorno agregado do títulos de países emergentes antes de estudar os technicals propriamente ditos. Os índices no mercado de títulos de países emergentes são semelhantes aos índices de bolsas de valores, mas com algumas diferenças fundamentais, em especial na construção dos mesmos. Em primeiro lugar, os índices de bolsas existem há mais de 100 anos, enquanto os índices de retorno total para títulos de renda fixa só vieram a ser desenvolvidos para o mercado norte-americano nos anos 70, sendo que os primeiros índices para o mercado high-yield só foram criados em meados da década seguinte (Reilly e Wright, 1997). Os usos dos índices de renda fixa, contudo, guardam semelhança à utilização dada aos índices de ações. São utilizados, principalmente, para medir a performance relativa de carteiras de títulos como nos casos dos fundos de ações. Mas o trabalho de um administrador de um fundo de renda fixa ao tentar acompanhar a performance de um índice 33 termina por ser um pouco mais complicado, pois este deve estar atento a outros fatores além da composição do mercado, como as diferentes distribuições de maturação e duration dos diferentes títulos. A construção de um índice de ações leva em consideração tão somente os critérios escolhidos para a ponderação de cada ativo e o método computacional a ser utilizado. O ajuste do índice, a partir de então é automático de acordo com a valorização das ações que o compõem. Os eventos que demandam o ajuste da carteira hipotética do índice são do gênero de fusões, aquisições e falências, sem os quais uma ação pode continuar fazendo parte do índice por décadas. No caso dos índices de títulos de renda fixa, por outro lado, a construção e manutenção é mais trabalhosa. Reilly e Wright (1997) apontam quatro complicadores na criação de índices de retorno total para bônus. Em primeiro lugar, seu universo é mais amplo do que o das ações de empresas, ao contemplar, no mesmo mercado, títulos governamentais, corporativos e de diferentes qualidades de crédito. Além disso, cada governo ou empresa possui mais de um instrumento (em oposição a uma ou duas ações), diferentes em prazos, cupons e características de resgate. Assim, um índice do mercado de renda fixa pode ser dividido em inúmeros sub-índices. No exemplo da série de índices da Merrill Lynch existem mais de 150 subíndices. O segundo ponto é a respeito das mudanças freqüentes no universo de títulos. Novas emissões e resgates de bônus por parte dos emissores inserem ou retiram instrumentos da composição do índice. 34 O terceiro complicador é a variação da volatilidade dos preços dos títulos ao longo do tempo e entre emissões diferentes. A mudança natural na duration e na convexity de cada instrumento de acordo com a aproximação do seu vencimento, como observado na primeira seção deste capítulo, dificulta a estimação da volatilidade implícita em cada instrumento e no próprio conjunto de títulos. Por fim, a precificação de cada título adiciona outro empecilho na correta manutenção dos índices. Emissões menores tendem a apresentar menor liquidez e uma precificação menos precisa. A própria característica do mercado de balcão induz a esse problema, uma vez que os brokers são os responsáveis pelo fornecimento das informações de preços e nem sempre existem preços disponíveis para todos os títulos. As razões para inserir a discussão sobre os índices antes da análise dos technicals têm relação com o posicionamento dos investidores com relação ao resto do mercado. Da mesma maneira que um índice de ações como o S&P 500 busca refletir a bolsa, ou ser uma proxy da mesma, um índice de retorno total para títulos tem o intuito de representar a carteira hipotética representativa do mercado e seus retornos. No caso dos países emergentes, o índice mais utilizado é o EMBI+ do J. P. Morgan7, como já citado anteriormente, sendo composto por papéis de Argentina, Brasil, Bulgária, Colômbia, Coréia do Sul, Equador, Filipinas, México, Marrocos, Nigéria, Panamá, Peru, Polônia, Rússia, Turquia e Venezuela. A parcela do 7 Exitem outros índices de retorno total para o mercado de títulos de países emergentes, como o Salomon Brady Index e o Merrill Lynch Brady Index. O próprio banco J. P. Morgan desenvolveu um índice mais abrangente do que o EMBI+, o EMBI Global, criado em 1999, e que, paulatinamente, deve substituir seu antecessor como o benchmark para toda uma classe de fundos. 35 índice relativa a cada país é calculada pela capitalização em mercado dos títulos que o compõem. As posições dos investidores são, então, classificadas como underweight, neutral ou overweight, dependendo da parcela de suas carteiras investida em títulos de cada país emergente comparada com a composição do índice EMBI+. Um investidor estará em uma posição neutra com relação a todos os países emergentes se possuir em sua carteira a mesma composição relativa do EMBI+. Por outro lado, se um investidor possui 15% de sua carteira investidos em títulos brasileiros, por exemplo, pode-se afirmar que está underweight em Brasil, pois a ponderação do país na composição do EMBI+ é de 22,78% (na composição do final de agosto de 2000). Os motivos para que os investidores se encontrem overweight ou underweight com relação aos títulos de um país são relacionados aos fundamentos macroeconômicos já descritos, mas isso não garante, contudo, que bons fundamentals garantam maior atratividade dos papéis. Essa colocação pode parecer contraditória, mas é nesse ponto que a análise dos technicals entra para esclarecer os fatores por trás do interesse dos investidores nos instrumentos de cada país. A análise da formação de capital (ou condições técnicas) é o estudo das forças por trás da oferta e demanda do mercado pelos diversos títulos associadas ao posicionamento dos investidores frente aos instrumentos disponíveis. Essa análise, contudo, é menos objetiva do que a análise dos fundamentals. Da mesma maneira que a análise grafista ou técnica dos mercados de ações e moedas é encarada mais como uma arte do que como 36 uma ciência8, o estudo dos technicals no mercado de títulos assume um caráter bastante subjetivo, nem tanto pelas crenças individuais dos analistas de mercado, mas sim pela dificuldade de se obter informações confiáveis a respeito dos fluxos de entrada e saída de recursos, do posicionamento dos investidores dedicados e as eventuais movimentações por parte dos investidores crossover. As condições monetárias dos países desenvolvidos, como exposto no início desta seção, afetam sobremaneira o volume de capital disponível para investimento no mercado de títulos de países emergentes, principalmente no que se refere à disponibilidade de recursos dos investidores crossover, atuantes tanto no mercado emergente quanto no mercado de Treasuries9. Isto posto, grande parte da análise dos technicals se concentra na análise do posicionamento dos investidores e na estimativa dos fluxos de recursos investidos entre os mercados emergentes e os mercados de menor risco. Não existe literatura acadêmica aprofundada no assunto, de forma que aqui será transmitida uma visão eminentemente de mercado10. A posição tomada pelos agentes financeiros é estimada pelas instituições financeiras através de pesquisas junto aos administradores de 8 O prós e contras da análise técnica do mercado de moedas podem ser encontrados em Luca, C. (1995) - Trading in the Global Currency Markets, capítulo 19. 9 Vine (1997) aponta a participação de investidores de diferentes partes do mundo como um fator complicador na determinação do valor dos títulos de países emergentes. Isso se dá porque, da mesma maneira que os investidores norte-americanos avaliam os bônus comparados com o retorno dos títulos do Tesouro americano, os investidores dos outros países os comparam às taxas dos títulos domésticos de seus próprios países. Com diferentes referenciais, os investidores terminam por chegar a conclusões diferentes, de modo que, mantidos constantes os fundamentos macroeconômicos dos países emergentes, mesmo assim pode haver uma grande volatilidade nesse mercado oriunda das mudanças das condições monetárias em algum dos grandes centros financeiros do mundo. 10 Grande parte das referências a respeito das condições técnicas do mercado emergente vem de Vine (1997) e Bayliss (1999 e 2000). 37 recursos, atividade dos clientes no mercado à vista e de repo11, o beta de fundos mútuos12, posições publicadas (como no caso dos fundos de pensão argentinos) e informações obtidas junto aos clientes. Este é um trabalho árduo e custoso, muitas vezes contratado junto a consultorias que têm acesso à composição das carteiras dos fundos mútuos e se comprometem em divulgar tão somente as posições consolidadas13, além do que os bancos não encontram estímulos para compartilhar as informações recebidas de clientes com os concorrentes. Assim, a assimetria de informações a respeito do posicionamento dos clientes é, mais do que uma deficiência, uma característica aparentemente irrevogável do mercado de títulos. Adicionalmente, os bancos monitoram os fluxos de investimento a partir dos seguintes indicadores: atuação dos clientes na mesa de operações; captação de recursos por parte dos fundos mútuos; volumes de emissões recentes; fluxos oriundos de amortizações e pagamentos de cupom; necessidade de financiamento externo de países emergentes; e alocações de novos recursos no mercado. Vine (1997) cita dois padrões de oscilação devidas a características técnicas do mercado que considera dignos de nota. O primeiro é o que chama de “lumping effect”, ou efeito queda, através do qual uma notícia ruim 11 Mercado de repo (sigla para “sale and repurchase agreement”) é o instrumento à disposição dos investidores para a realização de vendas de títulos a descoberto. As taxas de repo para cada título são importantes indicadores do apetite dos investidores para cada papel específico. 12 O beta é o coeficiente angular no sentido do modelo Capital Asset Pricing Model, com base no retorno ativos líquidos publicados por 20 fundos mútuos dos EUA dedicados a mercados emergentes contra o retorno do EMBI+. Bayliss (1999) descreve a metodologia de cálculo desses dados e discute sua relevância na avaliação do posicionamento dos investidores e na previsão dos movimentos do mercado. 13 O Deutsche Bank, por exemplo, compra os dados da consultoria Russel Mellon, que monitora os fundos de 14 carteiras de recursos investidos em títulos de renda fixa emergente, 1/3 das quais é européia e 2/3 dos Estados Unidos. Comparam-se as exposições à composição do índice EMBI+ do J.P. Morgan. 38 a respeito de um dos países afeta o valor dos títulos dos demais14. Isso teria sido especialmente relevante no caso da crise do México, quando o fato de a, supostamente, mais sólida economia emergente ter sucumbido diante de problemas financeiros tornou razoável a hipótese de que todas as demais economias, em pior situação, enfrentariam problemas em breve. O desenvolvimento e a crescente disponibilidade de análises dos fundamentos macroeconômicos, contudo, tendem a reduzir o efeito dessa “miopia” por parte dos investidores. O segundo padrão de oscilação citado por Vine (1997) é o “efeito pêndulo”. Em momentos de baixa logo após uma má notícia, os operadores, além de venderem os títulos do país em questão, assumiriam posições a descoberto nos instrumentos daquela nação. Ao buscar cobrir suas posições vendidas, os operadores trariam o mercado de volta, provocando alta volatilidade até atingir um novo preço de equilíbrio. A descrição de Calvo e Mendoza (1999) a respeito da racionalidade do instinto de manada se encaixa perfeitamente nessa descrição do mundo dos operadores de mercado. Em auxílio aos padrões de oscilação de preços identificados por Vine (1997), podemos citar o conceito de “ciclo de posicionamento dos investidores” de Bayliss (2000) para mostrar como os preços podem oscilar por motivos desligados dos fundamentals, como no caso onde a existência de um grande número de investidores superexpostos ao país tem efeitos nocivos na valorização dos títulos e na transmissão de choques no mercado. Deve-se ter em mente que quando um investidor se encontra overweight nos títulos de 14 Note-se a percepção de contágio que pode ser extraída dessa hipótese. 39 um país isso significa que está mais exposto ao risco daquele país do que a média do mercado (a composição do índice). Isso significa que está com seus ativos em composição diferente da do índice e, possivelmente, da composição das carteiras dos seus concorrentes. Isso é importante, em particular, no caso dos investidores dedicados e daqueles cujos retornos das carteiras são comparados aos rendimentos das carteiras dos concorrentes. Figura 6 – Ciclo de Posicionamento dos Investidores overweight 2. 3. neutral neutral 1. 4. underweight Fonte: Bayliss (2000) O ciclo de posicionamento de investidores mostra a seqüência de momentos identificada com relação às decisões dos administradores de carteira de títulos de países emergentes buscando se manter em linha com o mercado. A figura 6 acima ilustra esse ciclo. No quadrante marcado com o (1), existe um movimento de compra levando a posição dos investidores de underweight para market neutral. No segundo quadrante, tem seqüência o movimento de compra levando as posições para overweight. Saindo dessa posição, ocorre um movimento de venda, com conseqüente desvalorização dos títulos, trazendo os investidores de volta à posição de neutralidade. O fim do ciclo se dá com a seqüência do processo de venda, levando os investidores de volta à posição original, quando se reinicia o processo. 40 Ainda sem uma descrição científica, o conceito do ciclo de posicionamento dos investidores corrobora com as conclusões do “efeito pêndulo” de Vine (1997), dando-lhe uma visualização gráfica. O extrato abaixo, retirado de um artigo sobre a economia brasileira intitulado “Brazil debt hit by technical factors though fundamentals strong”, vem a ilustrar o potencial dos technicals em gerar desvalorização dos preços de títulos: “Brazilian long dated Globals vulnerable to technical factors – The strength of Brazil is a source of weakness as most EMBI-indexed investors held an overweight position in Brazilian debt for the past twelve months. The latest bout of profit taking has hit Brazil almost the hardest as investors shifted from an ‘overweight to a neutral weight status’, protecting against the high betas of Brazilian bonds.(...) The Brazilian EMBI+ was likely dragged down by the longer end of the Brazilian curve, with the 27s, 30s and 40 year Globals having a significant 24% share of the Brazilian EMBI+.(...) For various technical reasons, Brazilian bonds have suffered in recent days, though we believe the credit risk remains strong and the virtuous economic momentum will continue. We would even recommend slowly scaling back into an overweight position on Brazilian debt once the market begins to consolidate, particularly in the longer duration Globals and Bradys” – Siobhan Manning Morden, Emerging Markets Strategy: Brazil Update, Caboto USA, 22 de setembro de 2000. A análise acima justifica por que os títulos brasileiros se desvalorizaram em determinado momento por fatores completamente desligados dos fundamentos macroeconômicos que, por si só, estimulariam uma valorização por estarem em boas condições, com perspectivas de melhora. No período imediatamente anterior à análise da estrategista da Banca Caboto, a agência de classificação de risco Moody’s havia, inclusive, 41 indicado potencial de upgrade da nota do Brasil, o que, normalmente, provoca a valorização dos títulos. Aparentemente, isso foi impedido por fatores ligados à formação de capital no mercado. O papel das agências de classificação de risco é estudado na próxima seção. Apesar de positivos a respeito dos fundamentos, os investidores não se sentiriam confortáveis em se expor mais ainda em títulos do Brasil, pois, lembrando que os seus resultados são comparados com os retornos do EMBI+ e dos concorrentes, isso significaria se distanciar em demasia do seu benchmark. Por isso, o mercado se torna mais sensível a especulações negativas quando se encontra overweight em um país, a simples materialização de um rumor implicaria em perdas tanto absolutas quanto, mais importante, relativas, o que gera um incentivo para o administrador de recursos retornar à exposição neutra, vendendo parte de seu estoque. A importância dos technicals na análise do contágio entre os títulos dos diversos países tem potencial de se mostrar útil na avaliação da intensidade do contágio nos diversos momentos de crise. Bayliss (2000), analisando os episódios mais recentes de crise com base no posicionamento dos fundos mútuos, sugere que o contágio nas crises da Ásia em 1997 e da Rússia em 1998 foi forte por causa da superexposição dos investidores aos títulos de países emergentes naqueles momentos. Por outro lado, na crise cambial brasileira em janeiro de 1999, os investidores se encontravam underweight nos títulos de países emergentes, o que justifica o efeito limitado sobre os bônus dos países emergentes em geral e a rápida recuperação de seus preços. 42 As mudanças na composição dos índices também são responsáveis por flutuações nos fluxos de recursos para países emergentes. Um exemplo recente é a substituição do índice Lehman Aggregate pelo recém criado Lehman Universal, ambos calculados pelo banco Lehman Brothers, como benchmark de uma classe de fundos de grandes investidores institucionais norte-americanos. O Lehman Aggregate possuía exposição de 1% em títulos de países emergentes, enquanto o novo índice possui 4% de sua carteira indexada a esses papéis. Isso significa, potencialmente, uma nova alocação ao mercado emergente de 3% do capital investido em fundos high-yield indexados aos índices da Lehman Brothers. Isso, no primeiro momento, impulsionará a demanda pelos títulos de países emergentes, trazendo investidores não dedicados com um volume significativo de recursos. 5. Classificação de Risco Como mencionado anteriormente, as agências de classificação de risco monitoram as condições creditícias dos diversos países e empresas. De certa maneira, seu trabalho vai de encontro ao problema da informação assimétrica a respeito das condições macroeconômicas dos países. Ao atribuir notas a respeito do perfil de um país e as possibilidades de o mesmo vir a honrar todos os seus compromissos, as agências de classificação de risco disseminam a informação a respeito da qualidade do crédito daquele emissor em especial. Essas notas, ou ratings, servem de balizamento para os diversos agentes do mercado a respeito do risco embutido na compra de títulos daquele país ou empresa. 43 Atualmente, as duas principais agências de classificação de risco de dívida de países e empresas emergentes são a Moody’s e a Standard & Poor’s (S&P). De acordo com Beers (1997), discorrendo sobre o caso específico da S&P, os ratings são baseados na avaliação da qualidade do crédito do país segundo critérios tanto objetivos quanto subjetivos. Os critérios quantitativos são os indicadores macroeconômicos e financeiros já mencionados na seção anterior. A parcela qualitativa da análise se refere à percepção da agência com relação à capacidade de o país honrar seu serviço da dívida no futuro. Com base em Standard & Poor’s (2000), podemos descrever cada uma das classes de risco de emissor utilizadas pela agência, que deve representar uma opinião atualizada sobre a capacidade financeira geral de um emissor para honrar suas obrigações financeiras. As categorias de risco da S&P são as seguintes: “AAA – Um emissor classificado como AAA apresenta uma capacidade extremamente forte de honrar seus compromissos financeiros. O rating AAA é a classificação mais alta atribuída pela Standard e Poor’s. AA – Um emissor classificado como AA apresenta capacidade muito forte de honrar seus compromissos financeiros. Esse emissor difere pouco de outros com ratings mais altos. A – Um emissor classificado como A apresenta forte capacidade de honrar seus compromissos financeiros, mas é um pouco mais suscetível às condições e situações econômicas adversas do que os emissores em categorias de ratings mais altas. BBB – Um emissor classificado como BBB apresenta capacidade adequada de honrar seus compromissos financeiros. Porém, condições econômicas adversas ou mudanças conjunturais provavelmente levarão à redução de sua capacidade de honrar seus compromissos financeiros. 44 Emissores classificados como ‘BB’, ‘B’, ‘CCC’ e ‘CC’ são vistos como emissores que apresentam características especulativas significativas. BB indica o menor grau de especulação e CC o mais alto. Embora tais emissores possam apresentar características de qualidade e proteção, tais características podem ser suplantadas por grandes incertezas econômicas ou exposições a condições adversas. BB – Um emissor classificado como BB é menos vulnerável, no curto prazo, do que outros emissores com ratings mais baixos. Porém, tal emissor apresenta dificuldade de enfrentar situações financeiras, econômicas ou comerciais adversas, que podem reduzir sua capacidade de honrar seus compromissos financeiros. B – Um emissor classificado como B é mais vulnerável à inadimplência do que emissores com rating BB, porém apresenta capacidade de honrar seus compromissos financeiros. Certas condições financeiras, econômicas e comerciais provavelmente irão prejudicar a capacidade e boa vontade desse emissor de honrar seus compromissos financeiros. CCC – Um emissor classificado como CCC está atualmente vulnerável, e depende de condições financeiras, econômicas e comerciais favoráveis para honrar seus compromissos financeiros. CC – Um emissor classificado como CC está atualmente fortemente vulnerável à inadimplência. Um sinal de mais (+) ou menos (-): Os ratings de AA a CCC podem ser alterados pela adição de um sinal de mais ou menos para sinalizar posições relativas dentro das principais categorias de risco. SD e D – Um emissor com um rating SD (inadimplência seletiva) ou D não honrou uma ou mais de suas obrigações financeiras (com ou sem ratings) dentro do prazo estabelecido. Um rating D é atribuído quando a Standard e Poor’s acredita que a inadimplência será geral e que o devedor não pagará pontualmente todas ou quase todas as suas obrigações. Um rating SD é atribuído quando a Standard e Poor’s considera ter sido um caso de 45 inadimplência seletiva com relação a uma emissão específica ou classe de obrigações, porém o emissor continuará honrando outras emissões ou classes de obrigações dentro dos prazos estabelecidos.” – Standard e Poor’s, “Brasil: Ratings e Comentários”, 2a. edição, 2000, páginas 58 e 59. Além das classificações acima, a agência fornece perspectivas de rating, ou outlook, avaliando a direção potencial do rating, considerando quaisquer mudanças nas condições econômicas e/ou de mercado. Um outlook positivo significa que o rating pode se elevado, o outlook negativo, rebaixado, e um outlook estável significa que o rating provavelmente não será alterado. As categorias utilizadas pela Moody’s, por sua vez, são as seguintes: “Aaa – Títulos classificados como Aaa são tidos como os de melhor qualidade. Eles carregam o menor risco de investimento. Os pagamentos de juros estão protegidos por uma larga margem e o repagamento do principal é certo. Aa – Títulos classificados como Aa são tidos como de alta qualidade sob todos aspectos. Junto aos títulos Aaa formam o conjunto conhecido por títulos highgrade. Suas margens de proteção não são tão grandes quanto no caso dos títulos Aaa ou a flutuação dos elementos de proteção podem apresentar maior amplitude de forma qua os riscos de longo prazo aparentam ser algo maiores que os dos títulos Aaa. A – Títulos classificados como A possuem muitos atributos favoráveis ao investimento e devem ser considerados como obrigações de qualidade médio-superior. Os fatores que fornecem segurança aos pagamentos de principal e juros são considerados adequados, mas podem existir elementos que sugerem a suscetibilidade a inadimplência em algum momento futuro. Baa – Títulos classificados como Baa devem ser considerados como obrigações de média qualidade, nem altamente nem pouco protegidas. A segurança dos pagamentos de juros e principal parece adequada no presente, mas alguns fatores podem ser de pouca confiança no longo prazo. 46 Ba – Títulos classificados como Ba são tidos como portadores de elementos especulativos, com futuro incerto. A proteção aos pagamentos pode ser moderada, gerando incerteza com relação a sua efetividade tanto em momentos bons quanto ruins. B – Títulos classificados como B geralmente não apresentam características desejáveis para um investimento. A proteção aos pagamentos e a manutenção dos termos do contrato pode ser pequena ao longo do tempo. Caa – Títulos classificados como Caa são de baixa qualidade. Tais emissões podem estar em default ou apresentar elementos que ameacem o pagamento de juros ou principal. Ca – Títulos classificados como Ca representam obrigações altamente especulativas. C- Títulos classificados como C são da mais baixa categoria da escala. Tais emissões podem ser encaradas como possuidoras de baixíssima probabilidade de representar um investimento real.” – Elton e Gruber (1995), capítulo 20 No caso da Moody’s, as escalas intermediárias dentro de cada categoria são assinaladas com os números de 1 (melhor) a 3 (pior). A tabela abaixo mostra uma escala comparativa dos ratings das duas agências, a título de referência. Tabela 1 – Escala comparativa dos ratings das agências Moody’s e S&P Investment Grade Moody's S&P Aaa AAA Aa1 AA+ Aa2 AA Aa3 AAA1 A+ A2 A A3 ABaa1 BBB+ Baa2 BBB Baa3 BBB- Speculative Grade Moody's S&P Ba1 BB+ Ba2 BB Ba3 BBB1 B+ B2 B B3 BCaa1 CCC+ Caa2 CCC Caa3 CCCCa CC Fonte: Bloomberg 47 Os ratings atribuídos pelas agências influenciam diretamente nos prêmios de risco e rendimentos dos títulos dos diferentes países no mercado secundário e, indiretamente, na base de investidores potenciais para esses instrumentos. Elton e Gruber (1995) afirmam que muitas organizações enfrentam restrições à compra de títulos abaixo de uma certa classificação. As origens podem ser legais ou mesmo inerentes às políticas de investimento das empresas. Apesar de não contarem com evidência a respeito, os autores sugerem a possibilidade da segmentação do mercado de renda fixa entre os títulos de alta qualidade e aqueles de baixa qualidade. O diferencial dos prêmios de risco pode ser visualizado pelo spread entre as curvas de referência para os diferentes níveis de crédito. A figura 7 mostra bem o efeito do rating sobre o custo de captação das empresas e países de diferentes riscos. Figura 7 – Curvas de Rendimento de Referência no mercado dos EUA 8.5 Yield 8 7.5 7 6.5 6 0 5 10 AAA 15 Prazo A3 20 25 30 BBB3 Fonte: Bloomberg, em 02.10.2000 Os países emergentes se encontram distribuídos entre os diversos níveis da escala de classificação de risco de longo prazo das agências. Não obstante, a grande maioria dos países se encontra abaixo do chamado nível de investimento, limitado pelas notas BBB- e Baa3 na Standard & Poor’s e 48 Moody’s respectivamente. O Brasil, atualmente, tem classificações B+ e B2, com perspectivas positivas. As mais importantes alterações de ratings ocorridas entre julho de 1999 e junho de 2000 foram os upgrades de Hungria, Coréia do Sul, Malásia, México, Polônia, África do Sul e Tailândia. No lado negativo, se encontram os downgrades de Colômbia e Equador (IMF, 2000). 6. A História Recente Esta seção possui dois objetivos principais. O primeiro é traçar em linhas gerais um breve histórico do desenvolvimento do mercado de dívida de países emergentes. Em segundo lugar, busca-se chamar a atenção para a resposta dada pelo mercado a episódios importantes e crises financeiras ocorridos na última década. Isto posto, a estrutura de subseções que se segue não apresenta, necessariamente, uma ordem cronológica, buscando, entretanto, fornecer uma visão compacta de cada assunto abordado. 6.1. A Crise da Dívida Latino-Americana e o Plano Brady Os problemas de financiamento externo que a América Latina veio a enfrentar entre 1982 e1989 têm origem nas estratégias adotadas pelos governos da região nas décadas anteriores. Os choques de preços do petróleo, a alta dos juros na administração Volcker no Fed e a própria mudança na maneira como os investidores encaravam os empréstimos foram outros fatores que precipitaram a crise de liquidez na região (v. Ketkar e Natella, 1993). 49 O México, dentre os países latino-americanos em dificuldade, foi o que apresentou o mais rápido processo de deterioração ao buscar financiamentos de prazos cada vez mais curtos entre 1979 e 1981. Segundo Ketkar e Natella (1993), a dívida externa de curto-prazo do México saltou de US$ 1,5 bilhão em 1980 para US$ 11 bilhões no final do ano seguinte, dando a noção da rapidez com que o problema se desenvolveu. O acúmulo de empréstimos se mostrou de difícil administração e, em agosto de 1982, o México declarou a moratória de seus pagamentos externos reescalonando-os, uma solução que se mostrou necessária diante da queda dos preços de petróleo e da situação dos demais fundamentos macroeconômicos do país. No intuito de promover alívio à situação mexicana aumentando sua disponibilidade de recursos externos, foi implementado um pacote de emergência por parte dos credores e de agências multilaterais. Os créditos e empréstimos envolvidos nesse programa somavam US$ 8,8 bilhões. Ademais, promoveu-se o reescalonamento de US$ 23,7 bilhões de dívidas do setor público mexicano, vincendas entre agosto de 1982 e dezembro de 1984, ao longo de oito anos, com quatro anos de carência. O princípio por trás desse programa é que o problema dos países latino-americanos era de curto-prazo, uma crise de liquidez, e não um problema de super endividamento. A reestruturação da dívida do México serviu, então, de exemplo para outros 40 refinanciamentos de dívida de países emergentes nos seis anos que se seguiram. O padrão era que as renegociações terminassem por consolidar vários empréstimos em um só, significando um alongamento do perfil de maturação, redução dos juros originais e, por vezes, a alocação de 50 parcelas de dinheiro novo aos países em crise. Alguns desses empréstimos reestruturados vieram a ser negociados no mercado secundário, e não raro vieram a ser submetidos à conversão em títulos Brady. Outros empréstimos foram securitizados e deram origem aos chamados pré-bradies, títulos de reestruturação emitidos antes da conclusão dos acordos no âmbito do Plano Brady. No caso do Brasil, existem o Brazil Investment Bond (BIB) e o Interest Due and Unpaid Bond (IDU) que se enquadram na situação. A década de oitenta presenciou diversas iniciativas para solucionar o problema da dívida externa dos países menos desenvolvidos e uma grande discussão no meio acadêmico a respeito de qual seria a melhor forma de criar condições para permitir a estabilidade das relações entre credores e devedores a partir de uma reestruturação15. A própria maneira de encarar a crise da dívida como um problema de curto prazo se alterou, ganhando força a visão de que havia um problema fundamental, que demandava pelo perdão de parte das dívidas dos países em crise que, de outra maneira, não conseguiriam se recuperar. Finalmente, em 1989, o então Secretário do Tesouro dos EUA, Nicholas Brady, apresentou um plano de refinanciamento das dívidas dos países em dificuldade. Na essência, o Plano Brady provia alívio através da reestruturação das dívidas para com os bancos comerciais a taxas de juros mais favoráveis e por meio da possibilidade de securitizar essas dívidas por títulos de renda fixa. Os países, por sua vez, se comprometeriam a adotar reformas macroeconômicas. Aos bancos foi dada a opção de abater o valor de seus créditos ou por meio da redução dos juros, ou por meio do 51 abatimento do valor de face da dívida, o que não veio a gerar grandes problemas contábeis para aquelas instituições que não haviam provisionado as dívidas como créditos de liquidação duvidosa (Brauer e Chen, 1999). Durante as negociações, foi oferecido um amplo menu de possibilidades de reestruturação à escolha dos credores, que tiveram meses para decidir a respeito de qual delas se encaixaria melhor na sua estratégia. Uma vez que todas as soluções apresentavam o mesmo valor presente líquido, os bancos ponderaram a respeito de suas expectativas com relação aos movimentos do mercado de títulos do Tesouro dos EUA e tiveram em conta seus procedimentos contábeis internos para escolher o título pelo qual trocariam seus créditos. Os dois principais títulos Brady são o Par e o Discount, que representavam 45% do mercado de bradies no final de 1999 (Brauer e Chen, 1999). Os bônus Par foram emitidos contra o valor de face original das dívidas, porém com taxas de cupom fixas abaixo dos níveis de mercado. Os títulos Discount, por sua vez, apresentam taxa de juros flutuante sobre a LIBOR, mas tiveram seu valor de face descontado entre 35 e 50%. Esses dois títulos são de longo prazo, entre 25 e 30 anos dependendo do país, e apresentam garantias de pagamento do principal e de duas parcelas de juros. O colateral é um título zero-coupon do Tesouro dos EUA comprado pelo país devedor e depositado no Banco de Compensações Internacionais – BIS ou no Federal Reserve Bank of New York. No caso de não pagamento de juros desses títulos por parte do país, os investidores têm direito a receber 15 Krugman (1995) analisa os diferentes tipos de soluções de mercado para a redução de dívida, incluindo seu conceito de debt overhang. 52 recursos retirados das garantias em pagamento. A garantia de principal, por sua vez, garante o resgate da dívida no vencimento do título. Brauer e Chen (1999) descrevem os outros tipos de títulos Brady à disposição para escolha dos investidores à época das negociações. Os Debt Conversion Bonds (DCBs), Capitalization Bonds (C-Bonds), Front-Loaded Interest-Reduction Bonds (FLIRBs) e os New-Money Bonds (NMBs) não apresentam garantias de principal e apresentam características diversas. São títulos de prazo mais curto que os Pars e Discounts, e o seu principal não é do tipo bullet, amortizando ao longo dos anos. Os DCBs foram emitidos sem desconto do principal, mas a escolha desse tipo de título implicava a compra, por parte dos bancos, dos NMBs por dinheiro novo. Os FLIRBs carregavam garantia de pagamento de juros até o sexto ano de vida do título. Os CBonds, por sua vez, apresentavam pagamento reduzidos de juros nos primeiros anos, sendo a diferença incorporada ao principal devido. Os juros devidos e não pagos referentes aos empréstimos envolvidos na reestruturação do Plano Brady também foram securitizados. Essa foi a origem dos Past-Due Interest Bonds (PDIs), Interest Due and Unpaid Bonds (IDUs), Eligible Interest Bonds (EIs), Interest Arrears Bonds (IABs) e FloatingRate Past Due and Unpaid Bonds (FRBs). Ketkar e Natella (1993) descrevem em linhas gerais os resultados de algumas reestruturações no âmbito do Plano Brady. O primeiro país a concluir seu refinanciamento foi o México, em dezembro de 1989, quando renegociou mais da metade de sua dívida externa de então, somando US$ 48,5 bilhões. Um ano depois foi a vez da Venezuela, ao trocar US$ 16,3 bilhões em dívidas para com os bancos comerciais por Pars, Discounts, 53 DCBs e FLIRBs. A Argentina concluiu suas negociações em dezembro de 1992, inovando ao incluir o refinanciamento dos juros devidos e não pagos através da emissão dos FRBs, em conjunto com a emissão de mais de US$ 20 bilhões entre Pars e Discounts. O acordo do Brasil foi concluído em novembro de 1993, com um conjunto de 7 títulos emitidos no primeiro semestre de 1994 reestruturando cerca de US$ 44 bilhões de empréstimos sindicalizados. Alguns países, contudo, optaram por não transformar suas dívidas em bônus, mas sim em novos empréstimos. Algéria, Marrocos e Rússia, entre outros, optaram por não participar do Plano Brady, mas se aproveitaram da oportunidade para reestruturar suas dívidas por empréstimos nos moldes do ocorrido no âmbito do plano. Esses novos empréstimos seriam instrumentos subordinados aos títulos desses países, o que lhes atribuía um maior risco. As razões para essa opção variaram de país para país. No caso da Rússia, a dívida que se transformou nos empréstimos PRIN e IAN, somando US$ 26 bilhões, era originária do Vneshcomenbank da antiga União Soviética. A Federação Russa aceitou a responsabilidade pelos antigos empréstimos da URSS, mas não reteve a obrigação legal de efetuar os pagamentos. Isso teve grande importância à época da crise da Rússia de 1998, quando o país cessou de pagar os juros desses dois empréstimos, apesar de manter em dia as obrigações de seus eurobônus (Brauer e Chen, 1999). O grande efeito positivo da criação dos títulos Brady, além de permitir o refinanciamento das dívidas dos países emergentes, foi sobre o mercado secundário de títulos. Em primeiro lugar, a padronização dos empréstimos através dos títulos tornou mais fácil a sua negociação. A base de investidores 54 se expandiu naturalmente. Em última análise, o aumento do volume negociado e as melhores perspectivas creditícias dos países depois da reestruturação promoveram a valorização da dívida mesmo dos países que ainda não tinham concluído suas negociações no início dos anos 90. Estimase que o volume negociado no mercado secundário de dívida emergente tenha saltado de US$ 1 bilhão em 1984 para US$ 600 bilhões em 1992, crescendo ainda mais desde então (Ketkar e Natella, 1993). 6.2. O Novo Cenário das Emissões Soberanas Com a consolidação do mercado de títulos Brady, abriu-se a oportunidade de os países emergentes se financiarem externamente através do mercado internacional de títulos. O retorno ao mercado de capitais internacionais se deu tão logo o México se tornou o primeiro país a concluir as negociações do Plano Brady. A primeira emissão voluntária de título de país emergente no mercado de eurobônus desde a crise da dívida foi do Banco Nacional de Comércio Exterior do México, em junho de 1989, com um título de US$ 100 milhões e 5 anos de prazo (Ketkar e Natella, 1993). A presença dos emissores emergentes no mercado internacional cresceu consideravelmente desde 1994, inclusive com emissões de países que não participaram do Plano Brady, como algumas nações do Leste Europeu e da Ásia. Isso é reflexo de que os países cumpriram seu compromisso de promover as reformas econômicas a fim de permitir-lhes acesso ao mercado de eurobônus (Brauer e Chen, 1999). O objetivo primário é, por motivos óbvios, a busca de financiamento externo. Em segundo lugar, pretende-se, com a presença regular nesses 55 mercados, estabelecer curvas de referência para o custo de captação por parte de empresas do setor privado desses países no exterior. Por fim, alguns países têm aproveitado a oportunidade para encampar operações de administração de seu passivo externo, ao promover a retirada de títulos Brady com desconto no mercado secundário de títulos, através de operações de troca por bônus globais. Figura 8 - Emissão de Títulos de Países Emergentes 160 133.2 US$ bilhões 140 120 105.3 100 80.2 80 62.7 60 40 20 53.8 87.0 59.2 24.4 14.0 0 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 Fontes: IMF(1998:26) e IMF (2000:52) O volume de títulos emitidos por países emergentes no mercado internacional tem crescido ano a ano, à exceção da queda apresentada no ano de 1998, em que as condições monetárias globais pioraram com os efeitos da crise asiática de 1997 e da Rússia em 1998 (IMF, 2000). Pode-se afirmar que o mercado internacional de títulos é, hoje, uma das mais importantes ferramentas de financiamento externo dos países emergentes. A Argentina, em especial, com o seu sistema de currency board, apresenta uma real dependência das captações externas para manter um volume adequado de reservas internacionais, não podendo contar exclusivamente com a atração de investimento estrangeiro. A figura 8 a seguir mostra a evolução do volume de títulos emitidos no mercado emergente na década de 90, deixando 56 patente o crescimento no mesmo com a conclusão do Plano Brady e o retorno dos países ao mercado de emissões livres em 1995, e a tendência de recuperação dos volumes a partir de 1999. No que se refere ao processo de construção de yield curves de referência nos principais mercados, pode-se afirmar que a maioria dos grandes países emergentes têm tido sucesso em criar pontos de referência tanto no mercado de dólares quanto no mercado de euros. O mercado Samurai, por motivos inerentes à economia japonesa apresentados na terceira seção deste capítulo, tem apresentado pouca atividade e praticamente nenhuma liquidez, de forma que o processo de criação de pontos de referência não é considerado naquele mercado. A grande atividade no mercado de bônus globais tem permitido aos países alongar os perfis de maturação de suas dívidas. O Brasil, por exemplo, conta hoje com nove títulos globais em circulação e com oito títulos denominados em euros. A esses títulos somam-se dois samurais, um eurolibra (emitido na moeda inglesa) e alguns outros títulos denominados em moedas européias (marco alemão, lira italiana, franco francês, franco belga e florim holandês) ainda não convertidos para o euro. Os prazos das emissões chegam a 40 anos no caso dos globais brasileiros e 10 anos no mercado de euros16. A situação de México e Argentina não é muito diferente, com sólidas curvas de referência em ambos mercados. 16 Existe um eurolira com vencimento em 2017, emitido em 1997, que poderia ser tratado como o ponto mais longo da curva de euros do Brasil se apresentasse liquidez suficiente. A situação atual, contudo, é que não existem títulos emergentes emitidos originalmente em euros acima do prazo de 10 anos. Com a maior participação de investidores institucionais, contudo, o alongamento dos prazos deve ser inevitável. 57 Finalmente, é importante analisar o papel das operações de troca de bradies implementadas recentemente. Foram enunciadas as diferenças em termos da estrutura e da base de investidores entre os globais e os bradies na primeira seção desse capítulo. Por causa dessas diferenças e de uma percepção velada (e errônea) de que os bradies são títulos de maior risco que os globais, os primeiros são negociados a um prêmio da curva de bônus globais de uma maneira geral. Essa diferença de yields permite aos países captar recursos a um custo mais baixo no mercado global e utilizar esses recursos para recomprar bradies a uma taxa mais elevada. As vantagens dessas operações são muitas. Em primeiro lugar, estão os ganhos a valor presente líquido oriundos da diferença de taxas, que são, de certa maneira, os ganhos de arbitragem disponíveis apenas aos países emissores. Em segundo lugar, essas operações têm sido um importante instrumento de alongamento do perfil de vencimentos externos. Os bradies apresentam amortizações de principal que impactam as necessidades de financiamento externo no curto prazo, de forma que a troca por um global de amortização bullet posterga essas necessidades. Em terceiro lugar, a liberação das garantias dos títulos Par e Discount é um outro objetivo, pois hoje valem cerca de 30% do valor de face dos mesmos, unindo o interesse dos países em dispor desses recursos e dos investidores em manter seus recursos aplicados em instrumentos de puro risco soberano. Por fim, dada a sua liquidez, alguns bradies apresentam maior volatilidade que os globais, o que tem influência sobre os custos de referência para a captação dos países emergentes. O caso patológico é o do C-Bond brasileiro, o título emergente de maior negociação no mercado secundário, que, normalmente, é o primeiro 58 a se desvalorizar em momentos de crise no mercado como um todo. Eliminar essa influência é um objetivo secundário que tem sido atingido através de sucessivas operações de troca. Brauer e Chen (1999) descrevem as principais modalidades de retirada de bradies. A mais simples é simplesmente exercer a opção de compra embutida em cada um dos bradies. Normalmente os títulos são resgatáveis ao par nas datas de pagamento de cupom. O México exerceu sua opção sobre os bônus Aztecs, por exemplo. Apesar da facilidade, os preços dos títulos externos se encontram muito abaixo do par, de uma maneira geral, o que implica não ser interessante o exercício da opção. A recompra através do mercado secundário é um outro recurso passível de utilização, mas não permite efetuar a retirada de grandes volumes de títulos. Operações de troca públicas, abertas à participação de qualquer investidor voluntariamente, têm o maior alcance e costumam gerar títulos de referência de longo prazo, como no caso das operações do México em 1996 (bradies por um Global 2026), Argentina e Brasil em 1997 (bradies por um Global 2027). Por fim, pode-se lançar mão do recurso das trocas privadas, conhecidas como blocktrade, através da qual o país pode recomprar até 5% do valor total de cada Brady no mercado, contatando até dez investidores diferentes. Esse mecanismo já foi utilizado em duas ocasiões pelo Brasil: em março de 2000 na reabertura de US$ 600 milhões do Global 2030, e em julho do mesmo ano, com o lançamento do Global 2007, composto de US$ 600 milhões contra dinheiro novo e o restante em troca de bradies. Uma operação recente que merece ser citada é a troca do Global 2040 do Brasil por US$ 5,2 bilhões em bradies. Realizada em agosto de 2000, foi a 59 maior operação de troca já realizada e também lançou o título mais longo de país emergente. Os ganhos a valor presente líquido da operação somaram US$ 144 milhões e o Brasil liberou cerca de US$ 312 milhões em garantias de Par e Discount. Ademais, reduziu-se o volume nominal de amortizações e pagamentos de juros de bradies nos 10 anos seguintes em quase US$ 1 bilhão. Foram retirados US$ 634 milhões de Pars, US$ 326 milhões de Discounts, US$ 926 milhões de C-Bonds, US$ 1,61 bilhões de DCBs, US$ 334 milhões de NMBs, US$ 85 milhões de BIBs, US$ 368 milhões de EIs e US$ 933 milhões de FLIRBs. O título possui, ainda, uma opção de resgate antecipado por parte do Brasil com exercício a partir de 2015, o que permite ao país resgatar o papel caso as condições de financiamento externo se encontrem mais favoráveis. A emissão, liderada por um sindicato formado pelos bancos Goldman Sachs, Chase e Morgan Stanley Dean Witter, foi considerada um grande sucesso e, como mostrado, atingiu todos os objetivos de uma operação de troca enunciados anteriormente. Tabela 2 – Porcentagem dos Bradies Resgatados até Novembro de 99 País Pars Discounts Outros Total Retirado Argentina Brasil Costa Rica Rep. Dominicana Equador México Panamá Peru Uruguai Venezuela Bulgária Costa do Marfim Jordânia Nigéria Filipinas Polônia Vietnã 44% 63% 0% 0% 10% 41% 25% 0% 43% 68% 0% 0% 0% 0% 61% 17% 0% 39% 46% 0% 0% 0% 54% 12% 11% 0% 32% 16% 0% 0% 0% 0% 73% 0% 18% 13% 0% 5% 4% 96% 40% 8% 20% 22% 0% 1% 32% 0% 24% 14% 0% 34% 28% 0% 2% 1% 50% 38% 8% 31% 41% 6% 1% 4% 0% 41% 36% 0% Total 46% 45% 18% 33% Fonte: Brauer e Chen (1999) 60 Até novembro de 1999 já haviam sido recomprados ou amortizados 33% dos valores originais dos bradies. A tabela 2 mostra os números então vigentes. 6.3. As Crises Financeiras da Década de 90 e o Mercado de Títulos A década de 90 apresentou quatro grandes episódios de crises financeiras em países emergentes que tiveram seus efeitos transmitidos para além de suas fronteiras. Foram estes a crise do México entre 1994 e 1995, as crises cambiais dos países do sudeste asiático em 1997 e 1998, a crise da Rússia em meados de 1998 e a desvalorização do real brasileiro em janeiro de 1999. Em meio a esses episódios, outros fatos menores contribuíram para atribuir grande volatilidade aos preços de ativos emergentes em geral, e dos títulos da dívida externa dos países emergentes em especial. Não se pretende, nesta seção, ir a fundo a respeito das razões que levaram às crises, mas sim fornecer uma visão geral dos acontecimentos a partir de 1994, chamando a atenção para os efeitos dos mesmos sobre o mercado de títulos de países emergentes. A exemplo dos artigos de Brauer (1997) e Brauer e Chen (1999), é interessante analisar a figura 9 abaixo, que, juntamente ao nível do índice EMBI+, traz assinalados alguns fatos importantes, permitindo avaliar o efeito de cada acontecimento sobre a valorização ou depreciação dos títulos emergentes. 61 Figura 9 – Emerging Markets Bond Index Plus – 1994 a 2000 200 Desvalorização do Baht Tailandês 180 Carta de Intenção México e FMI 160 Desvalorização do Peso Mexicano 140 Alta dos juros e queda das bolsas nos EUA Aumentos das taxas de juros do Fed 120 Equador deixa de pagar juros de seus bradies Desvalorização do Won Coreano 100 Desvalorização do Real S&P reduz o rating de Tailândia e Coréia do Sul Anúncio do programa de auxílio ao Brasil no volume de US$ 41,5 bilhões 80 60 Fed inicia um processo de redução gradual dos juros nos EUA Assassinato de candidato a Presidente do México Mar-00 Dez-99 Set-99 Jun-99 Mar-99 Dez-98 Set-98 Jun-98 Mar-98 Dez-97 Set-97 Jun-97 Mar-97 Dez-96 Set-96 Jun-96 Mar-96 Dez-95 Set-95 Jun-95 Mar-95 Set-94 Dez-94 Jun-94 Mar-94 40 Dez-93 Índice Desvalorização do Rublo e declaração de moratória por 90 dias para pagamentos externos da Rússia Fontes: J. P. Morgan, IMF (1995), IMF (1998), Petan e Seshadri (1998) e IMF (2000) As origens da crise mexicana de 1994 estão relacionadas a fatores domésticos e internacionais17. Do ponto de vista interno, havia uma crescente instabilidade política no país, com a tomada de seis cidades no estado de Chiapas por grupos rebeldes em janeiro e o assassinato do candidato presidencial Luis Donaldo Colosio em março. As pressões políticas se arrefeceram em meados de 1994 com a eleição de Ernesto Zedillo para a presidência, mas o ambiente voltou a se tornar agitado com o assassinato do secretário geral do partido governista em setembro e a nova ocorrência de tumultos em Chiapas. Externamente, em resposta à turbulência no mercado internacional de títulos, o banco central dos EUA elevou suas taxas básicas de juros de 3% para 3,25%, permitindo que o mercado antecipasse novas altas nas taxas no 17 A análise da crise mexicana aqui exposta está essencialmente baseada em IMF (1995). 62 futuro. Tanto o foi que no final de novembro as taxas dos Fed Funds estavam em 5,5%. Do ponto de vista dos fundamentos macroeconômicos, a estratégia de esterilização dos fluxos externos por parte do Banco do México teve efeitos funestos sobre a economia. A redução das reservas internacionais e a expansão da base monetária por conta da manutenção dos juros baixos (enquanto o resto do mundo elevava suas taxas) promoveram a desvalorização real do peso mexicano em 9% entre fevereiro e novembro de 1994. O déficit em transações correntes também se ampliou de 6,4% do PIB em 1993 para 8% do PIB em 1994. Outros problemas que surgiram no decorrer do ano foram a fuga de capitais dos mercados acionários e a estratégia de financiamento do governo mexicano, que passou a emitir mais títulos indexados ao dólar (Tesobonos) em substituição aos títulos denominados em pesos (Cetes). Entre fevereiro e novembro de 1994, a participação de Tesobonos sobre a dívida pública mexicana saltou de 6% para 50%. Os preços dos bradies e a bolsa do México passaram a sofrer pressões desde o episódio de Chiapas, em janeiro de 1994, em resposta à instabilidade política e à alta dos juros externos. Os acontecimentos que marcaram a crise de fato foram os seguintes. Dadas as pressões dos mercados financeiros nas duas primeiras semanas de dezembro de 1994, o governo mexicano desvalorizou o peso em 20.12.94, e, dois dias depois, permitiu sua flutuação frente a renovadas pressões. Por trás dessas estavam a situação dos Tesobonos, impactando negativamente o estoque de dívida pública do país, e também uma série de problemas com empréstimos locais de taxa flutuante que entraram em atraso, pois tiveram 63 suas taxas elevadas juntamente com o aumento dos juros que se seguiu à desvalorização. As últimas semanas de dezembro de 1994 presenciaram seguidas quedas na bolsa do México e alta dos spreads dos títulos externos do país, além da desvalorização continuada do peso. Uma trégua por parte dos rebeldes em Chiapas e os rumores sobre um auxílio internacional ao país, contudo, permitiram uma leve recuperação dos preços dos ativos mexicanos antes do ano novo. A solução à crise se iniciou logo em 2 de janeiro de 1995, com o anúncio de um pacote de assistência no volume de US$ 18 bilhões vindos dos governos dos Estados Unidos e Canadá, do BIS e de bancos privados. O governo mexicano anunciou um plano de estabilização, um programa de privatizações e a abertura irrestrita do sistema bancário ao capital estrangeiro. Diante de novas pressões sobre os mercados e de efeitos sobre outras economias emergentes, se fez necessário um novo pacote, anunciado em 31 de janeiro, no valor de US$ 50 bilhões. O anúncio de um novo plano econômico em 9 de março de 1995 marca o estágio final da solução da crise mexicana. Os fatores que sugerem a existência de contágio internacional a partir da crise mexicana são descritos a seguir. No primeiro momento, apenas os mercado bursáteis da Argentina e do Brasil pareceram afetados pela queda da bolsa mexicana. As bolsas de Colômbia, Chile e dos países do sudeste asiático se valorizaram nas duas últimas semanas de 1994. No caso dos títulos Brady, a situação foi diferente. Os spreads dos títulos de países emergentes aumentaram significativamente, tanto na América Latina quanto 64 na Ásia, uma vez que havia a percepção de que o México servia de referência para o risco dos demais países. Um estudo publicado em IMF (1995:68) mostra como a correlação entre os retornos dos bradies dos diferentes países aumentou no período entre dezembro de 1994 e maio de 1995, comparada com os períodos anteriores. A Argentina foi o primeiro país a sofrer as conseqüências da crise mexicana, em grande parte por apresentar características macroeconômicas semelhantes, como o regime cambial e a baixa taxa de poupança interna. Os efeitos locais foram notados por meio do enfraquecimento do sistema financeiro e pelo aumento das taxas interbancárias. A resposta do governo ao anunciar cortes de gastos e um programa de auxílio aos bancos teve efeito em março, provocando uma reação positiva dos mercados, notável tanto no movimento das ações quanto no preço dos títulos. No Brasil, as pressões se traduziram na queda da bolsa de valores de São Paulo nos meses de janeiro e fevereiro de 1995, e na necessidade de intervenção do banco central no mercado de câmbio. Em 6 de março foi instituído o regime de bandas cambiais, em oposição à livre flutuação que vigorava desde o início do Plano Real. O ataque sobre o real só foi contido com o estreitamento da banda cambial e com a elevação das taxas de juros para 65% a.a. em 10 de março. Os mercados asiáticos sofreram as maiores pressões a partir de janeiro, quando houve forte especulação acerca da desvalorização do baht tailandês e um breve ataque sobre o peso das Filipinas. A resposta das autoridades dos dois países foi um imediato aumento das taxas de juros de curto prazo, que conteve a especulação. Hong Kong também experimentou 65 um aperto de liquidez diante de sinais de um ataque especulativo contra o seu dólar. Turbulências menores também foram sentidas na Indonésia e na Malásia. Uma interpretação do efeito contágio na crise mexicana é que os investidores viram a necessidade de reavaliar sua exposição ao risco de países emergentes. O México havia sido o primeiro país a retornar ao mercado internacional depois da crise da dívida, tinha recebido o maior volume de capitais internacionais na década de 90 até então, acabara de ingressar na OCDE e firmar o acordo do NAFTA com os EUA e Canadá. A percepção dos investidores foi que se uma crise dessa magnitude podia se abater sobre o México, poderia muito bem ocorrer em outros países emergentes fundamentalmente em pior situação. Assim, o rebalanceamento das carteiras de investimentos dos investidores institucionais teria sido o mecanismo de transmissão da crise mexicana para os demais países. Uma aparente calmaria nos mercados emergentes por mais de um ano depois da crise mexicana permitiu uma forte valorização dos títulos dos países emergentes. Entretanto, a partir do segundo semestre de 1996, o baht tailandês voltou a sofrer pressões diante das dúvidas do mercado a respeito da sustentabilidade da conta corrente da Tailândia diante da queda das exportações. A falência de uma grande empresa do setor imobiliário da Tailândia levantou suspeitas sobre a manutenção do preço dos imóveis em toda a região, e os investidores passaram a temer uma superexposição das instituições financeiras a esses ativos. As pressões levaram os bancos centrais de Cingapura, Malásia, Indonésia e Filipinas a impor medidas 66 reduzindo a exposição dos bancos ao setor imobiliário, dando fim ao ciclo de crédito iniciado cinco anos antes. O marco inicial da crise asiática é tido como o dia 2 de julho de 1997, quando a Tailândia cedeu aos constantes ataques especulativos e permitiu a flutuação do baht18. A instabilidade se transferiu imediatamente para as outras moedas da região, com a flutuação do peso filipino em 11 de julho, do ringgit malaio uma semana depois e da rúpia da Indonésia em 14 de agosto. Nessa altura dos acontecimentos, as moedas da região já haviam se desvalorizado em 20% contra o dólar dos EUA. Em outubro, a crise atingiu Formosa (Taiwan) levando a fortes pressões contra o regime cambial de Hong Kong. O anúncio de um pacote de auxílio financeiro à Indonésia em 3 de novembro trouxe um pouco de calma ao mercado. Entretanto, 4 dias depois, o epicentro da crise foi transferido para a Coréia do Sul, afetando as bolsas da região como um todo. A crise se aprofundou com os rumores a respeito de uma eventual moratória da dívida sul-coreana. O downgrade do rating da Coréia do Sul pela Moody’s trouxe um nova onda de quedas em todos os mercados da região, atingindo também o Japão. No início de janeiro de 1998, para adicionar mais incerteza e pânico ao mercado, a Indonésia anunciou que não estaria mais comprometida com o programa de reformas estruturais. De janeiro a maio, depois de uma postura mais responsável por parte da Indonésia, os mercados mantiveram-se no mesmo nível, apesar da alta volatilidade. 18 A descrição da crise asiática se baseia mormente em Armstrong, Garber e Spencer (1998) e em Kaminsky e Schmukler (1999). 67 A solução encontrada para a crise foi atacar a vulnerabilidade das instituições financeiras e estabilizar os balanços de pagamentos dos países do sudeste asiático. Os recursos vieram do FMI, através de um novo instrumento de financiamento emergencial criado após a crise do México. Como os programas não surtiram os efeitos esperados de atração voluntária de investimentos estrangeiros, os termos dos acordos foram seguidamente renegociados com o Fundo. Coréia do Sul e Tailândia foram capazes de renegociar suas dívidas externas diretamente com os credores logo em abril de 1998. O caso da Indonésia, por sua vez, foi mais complicado, implicando em uma moratória de fato (Armstrong, Garber e Spencer, 1998). As reformas estruturais passaram pela recapitalização dos setores bancários, mas ainda demandariam novas medidas que permitissem a redução do custo do capital na região. Os efeitos da desvalorização generalizada na Ásia tiveram efeitos sobre a balança comercial latino-americana de três formas. A primeira através da redução das exportações para o sudeste asiático, que apresentava baixo crescimento econômico. Em segundo lugar, houve um efeito através da competitividade, uma vez que os preços dos produtos asiáticos ficaram mais baratos depois da desvalorização. Por fim, a depressão nos preços das commodities (principal produto de exportação da América Latina) teve um impacto no valor das exportações da região. Ademais, a conta de capitais dos países emergentes como um todo apresentou maior dificuldade de atração de recursos, pois as condições de financiamento externo pioraram com a retração dos volumes de capitais disponíveis e aumento dos custos de financiamento. Prova da piora dessas 68 condições é o menor número de emissões de títulos por parte dos países emergentes em 1998, com relação ao ano anterior. No leste europeu, a terceira das regiões emergentes no mundo atual, os efeitos da crise asiática foram reduzidos, pois grande parte dos fluxos internacionais de capitais foram para lá redirecionados. Os países do leste europeu, à exceção de Rússia e Ucrânia, contavam com uma confortável posição externa, ao não apresentar grande parcela de dívida de curto-prazo. A relação comercial com a Europa e a baixa inserção nos mercados financeiros internacionais foram outros dois fatores responsáveis pelo limitado contágio na Europa oriental. Os maiores movimentos foram sentidos pelos mercados de ações da Hungria e Polônia, e na desvalorização da coroa tcheca, sem maiores conseqüências por causa dos sólidos fundamentos macroeconômicos desses países. Os casos de Rússia e Ucrânia eram especiais, pois a mais importante fonte de financiamento para esses países era a tomada de empréstimos de curto prazo com forte participação de estrangeiros. Estima-se que um terço dos títulos domésticos do Tesouro russo era de propriedade de estrangeiros, sul-coreanos e brasileiros em especial, que começaram a resgatar esses recursos logo no início da crise asiática (Cassard, Papi e Turtelboom, 1998). O rublo russo manteve-se estável apesar das pressões, mas não sem um custo: as reservas do banco central russo se reduziram de US$ 18,7 bilhões em outubro de 1997 para US$ 10,2 bilhões em março de 1998, além do aumento das taxas de juros para mais de 40% a.a. Não havendo grandes conseqüências fundamentais na transmissão do contágio da Ásia para as demais regiões, devem-se buscar explicações para 69 a forte queda no valor dos títulos dos países emergentes a partir do dia 23 de outubro de 1997 por três semanas seguidas sem nenhuma razão aparente. Provavelmente, e nunca saberemos com certeza, o contágio entre os papéis emergentes se deu através da venda de títulos das carteiras de grandes investidores para recompor as perdas incorridas nos bônus de países asiáticos. Adicionalmente, estima-se que os investidores sul coreanos eram grandes detentores de papéis brasileiros e se desfizeram dos mesmos ao enfrentar os primeiros problemas de liquidez. Dada a alta liquidez do mercado de títulos emergentes, a venda desses ativos se mostrou a maneira mais rápida de levantar recursos em moeda forte, o que, em última instância, provocou a depressão dos preços dos títulos. A situação da Rússia começou a se agravar com as incertezas políticas no país, ajudando a derrubar ainda mais os preços dos ativos russos, já afetados pelos problemas da Ásia e pela queda nos preços das commodities. O mês de maio trouxe novas quedas aos mercados locais, como resultado de novas ondas de especulação na Indonésia e em Hong Kong, e forçou o banco central russo a elevar suas taxas para 150% a.a. A situação continuou a deteriorar até que, em 17 de agosto de 1998, o governo surpreendeu ao anunciar medidas incluindo a desvalorização do rublo, reestruturação da dívida doméstica e moratória dos pagamentos de principal dos empréstimos IAN e PRIN. O grande choque se deu porque o mercado acreditava que a Rússia jamais sucumbiria a crises por contar com continuado apoio dos países industrializados e instituições financeiras internacionais (IMF, 1999). 70 O impacto das medidas sobre os preços dos ativos russos foi dramático. A taxa de câmbio do rublo saltou de RUB 6,2 para RUB 20 por dólar até dezembro de 1998, a bolsa russa caiu 95% medida em dólares, e o valor dos títulos da dívida externa caiu para 7% do valor de face (com um spread de 5000 bps sobre os Treasuries) na medida em que se levantaram dúvidas com relação ao pagamento dos mesmos. A queda do valor dos ativos teve forte impacto sobre o patrimônio dos investidores e marketmakers desse mercado. Algumas instituições não foram capazes de cumprir as chamadas de margem nos mercados futuros, e, na medida em que essas aumentavam, os investidores se viam forçados a liquidar ativos de outros países emergentes, provocando o contágio nos preços dos títulos e ações ao redor do globo (IMF, 1999). Os títulos de países emergentes atingiram níveis de spread jamais vistos na década. Países em situação similar à russa foram os que mais sofreram: Bulgária, Equador e Venezuela. Outros, como Coréia do Sul e México, tiveram seus spreads dobrados para mais de 1000 bp. A Europa central, por outro lado, foi a região que menos sofreu o impacto do contágio da crise da Rússia, novamente por apresentar fundamentos macroeconômicos mais sólidos e menor abertura ao mercado internacional. Calvo (1998) apresenta uma visão a respeito da inter-relação entre investidores informados (e alavancados) e investidores desinformados, que agem por instinto de manada, na explicação da queda dos preços dos títulos emergentes no episódio da crise da Rússia. Os investidores informados seriam aqueles mais arrojados, que se encontravam alavancados nos mercados futuros e sofreram as chamadas de margem. Os desinformados, por sua vez, tomam suas decisões baseados no comportamento dos 71 primeiros, julgando que os investidores informados possuem informações privilegiadas. Quando os investidores do primeiro grupo foram obrigados a se desfazer de seus ativos para os demais investidores, estes concluíram precipitadamente que havia problemas em todas as demais economias emergentes e se recusavam a comprar os títulos. Isso teria gerado um problema de liquidez que aprofundou a depressão dos preços dos ativos. Uma nova turbulência em outubro de 1998, com a quase falência de grandes hedge-funds norte-americanos e a imposição de controles de capital na Malásia, interrompeu o que parecia ser a recuperação dos mercados emergentes depois de declarações de Brasil e Argentina a respeito da implementação de programas de ajuste fiscal. Só o anúncio do pacote internacional de auxílio ao Brasil, somando US$ 41 bilhões, foi capaz de acalmar os mercados. Com os seguidos cortes das taxas de juros do mundo desenvolvido, proveu-se liquidez aos mercados internacionais e permitiu-se uma recuperação dos preços no final de 1998. Não obstante a mudança no sentimento do mercado como um todo, o atraso no cumprimento de parte das medidas de ajuste fiscal por parte do Brasil manteve os investidores ressabiados com relação à recuperação da economia do país. A fuga de capitais entre o final de dezembro de 1998 e o início de janeiro de 1999 levou o governo brasileiro a promover a desvalorização do real em 13 de janeiro e, finalmente, a flutuação do câmbio dois dias depois. A taxa de câmbio do real atingiu níveis superiores a R$ 2,00 por dólares no final dos meses de janeiro e fevereiro, em grande parte devido a pressões dos vencimentos do mercado futuro de dólares. Depois disso, o câmbio se estabilizou entre R$ 1,70 e R$ 1,90 por dólar. 72 A julgar pela a experiência das crises anteriores, pode-se afirmar que foi surpreendente o fato de a desvalorização do real brasileiro ter tido impacto limitado nos demais mercados emergentes. Os mercados argentinos sofreram um pouco mais do que a média, por causa das estreitas relações comerciais com o Brasil. Nem as bolsas nem os títulos dos países emergentes atingiram os níveis de desvalorização observados previamente, e mesmo os ativos do Brasil já mostravam recuperação em meados de fevereiro. Existem algumas razões que explicam o reduzido contágio no episódio de janeiro de 1999. O colapso do regime de bandas cambiais do Brasil parece ter sido antecipado pelo mercado, que ajustou suas posições sem que incorressem em perdas inesperadas. Depois dos problemas com a Rússia, os hedge funds e aqueles fundos que assumiam posições alavancadas nos mercados emergentes haviam se retirado do mercado, reduzindo o volume de capital especulativo investido em títulos emergentes. A sinalização de que a política econômica do Brasil pós-desvalorização seria ortodoxa, por meio das metas de inflação e soluções de mercado para os problemas financeiros, também agradou aos investidores. Finalmente, o ambiente benigno na economia global, com recuperação dos preços do petróleo e melhora dos fundamentos macroeconômicos dos países emergentes, além da forte valorização das bolsas dos EUA, permitiu a rápida recuperação dos preços de ativos emergentes no primeiro semestre de 1999 (IMF, 1999). A passagem citada a seguir, escrita em linguagem bíblica, foi retirada de um documento de pesquisa emitido pela Goldman Sachs menos de uma semana depois da desvalorização do real. É interessante notar que, em tão 73 pouco tempo, já haviam formadores de opinião disseminando a percepção de que os efeitos da desvalorização do real seriam limitados. "In the beginning, there was the Asian Flu. And the Asian Flu spread from Thailand to the other ASEAN economies and to South Korea. And there was desolation in commodity markets, and emerging-markets sovereign spreads rose to high levels. And investors saw that the Asian Flu was bad, and there was fear in the land lest the Asian Flu could infect the developed economies, and force them to absorb most of the Asian current account adjustments. So it was that the IMF and the US Treasury felt pity upon the world and organized a generous rescue package for Asia, which imposed stringent conditions but stabilized Asian currencies. And the IMF and the US Treasury liked what they saw, so it was the end of the first stage of the Asian crisis. But the Asian Flu traveled to the foreign lands of Russia. And there was depreciation and default and political instability. And it was thenceforth that the Asian Flu mutated into the Russian Virus, and there was desolation in world equity markets. And investors saw that the Russian Virus was bad, and there was fear in the land lest the Russian Virus could infect the lands of Brazil. So it was that the IMF and the US Treasury felt pity upon the world and organized a generous rescue package for Brazil. And confidence was restored, and equity markets recovered. And the IMF and the US Treasury liked what they saw, so it was the end of the second stage of the Asian crisis. But the Russian Virus never left the lands of Brazil. And so it was that the Real remained under pressure, and reserve losses continued and interest rates stayed high. And there was recession and deflation in Brazil. And so it was that a man ordered “Let my currency go!” And the Real was first floated, and then it sank. And some analysts saw that the Brazilian Plague was bad, and could infect other Latin lands and send them wandering into the Desert. But many investors saw that the Real devaluation could be good, and there was joy in the markets, and the BOVESPA rose 33% in one day. And some investors became convinced that instead of sending Latin economies wandering into the Desert, the Real 74 flotation could become a stroll on the Beach. And so it was that some came to believe that there would be no third stage of the Asian crisis." Alberto Ades "Real Contagion", Goldman Sachs Emerging Market FX Views , 19.01.99 Desde então, os episódios mais importantes que têm afetado a valorização dos títulos de países emergentes são fatores ligados à condição da economia mundial, não sendo específicos a este grupo de países. A exceção é a reestruturação da dívida externa do Equador, que enfrentou uma forte crise financeira entre 1999 e 2000. Dado o tamanho da economia equatoriana, o impacto de sua crise sobre o resto do mercado foi praticamente nulo. Os outros eventos mais recentes foram os seguintes. A apreensão dos mercados com relação ao chamado “bug do milênio” se mostrou excessiva, quando nenhum grande problema ocorreu com os computadores no mundo emergente. Passada a primeira semana do ano 2000, uma turbulência nos mercados de títulos do Tesouro dos EUA se refletiu nos preços dos papéis emergentes, desvalorizando-os. As razões para a turbulência se basearam em dois movimentos: o início de um processo de elevação das taxas de juros por parte do Fed e o gradual resgate de títulos longos por parte do Tesouro dos EUA. A incerteza com relação à política monetária dos Estados Unidos persistiu no primeiro semestre do ano, provocando uma correção no nível das bolsas de valores daquele país até o mês de agosto, quando o Fed promoveu o último aumento de suas taxas de curto prazo. Outros dois fatores de natureza internacional que têm contribuído para impedir a valorização dos títulos dos países emergentes, apesar da melhora dos fundamentos macroeconômicos dos mesmos, são o enfraquecimento do euro e a forte alta dos preços do petróleo. 75 Uma análise interessante, levando em consideração as variáveis técnicas discutidas na terceira seção deste trabalho, é feita ao comparar o posicionamento dos investidores nos momentos de crise e os efeitos das crises. Figura 10 – Mutual Fund Beta e EMBI+ - Junho de 1996 a Setembro de 2000 1,4 Crise Asiática 1,3 Crise da Rússia Desvalorização do Real Brasileiro Mutual Fund Beta (escala da esquerda) 1,2 220 EMBI + (escala da direita) 200 1,1 180 1 160 0,9 140 0,8 Média de Longo Prazo do Mutual Fund Beta 0,93 0,7 120 Jul/00 Ago/00 Abr/00 Mai/00 Jan/00 Fev/00 Out/99 Nov/99 Jul/99 Ago/99 Abr/99 Mai/99 Fev/99 Dez/98 Set/98 Nov/98 Jun/98 Ago/98 Mai/98 Fev/98 Mar/98 Dez/97 Set/97 Nov/97 Jun/97 Ago/97 Mai/97 Jan/97 Mar/97 Out/96 Dez/96 Jul/96 100 Set/96 0,6 Fontes dos Dados: Deutsche Bank (Mutual Fund Beta), J.P. Morgan (EMBI+) Para isso, podemos utilizar o mutual fund beta descrito em Bayliss (1999), que mede o risco das carteiras de grandes fundos mútuos de investimento em títulos de países emergentes. Quando uma carteira apresenta um beta muito elevado com relação ao EMBI+, significa que tende a exacerbar tanto os ganhos quanto as perdas no mercado de títulos de países emergentes. Se as carteiras apresentam betas acima de sua média histórica, podemos concluir que os fundos se encontram overweight no mercado de títulos, com todas as características positivas e negativas 76 embutidas nesse posicionamento. A figura 10 compara o mutual fund beta com o nível do EMBI+, assinalando os momentos de crise. Note-se que a média de longo prazo do beta é de 0,93, o nível do beta tido como o posicionamento neutro. Comparando o posicionamento dos investidores nas três últimas crises analisadas, vemos confirmada a intuição de que os technicals jogaram um papel fundamental na dispersão do contágio financeiro no mercado de títulos em meio às turbulências estudadas. Conforme sugerido por Bayliss (1999), vale observar que na crise da Ásia (outubro de 1997) e na crise da Rússia (agosto de 1998) os fundos se encontravam bastante alavancados no mercado de títulos emergentes, o que se refletiu na transmissão das crises entre os títulos de diversos países. Em janeiro de 1999, por outro lado, o mercado estava underweight nos papéis emergentes, o que, além de ter limitado o contágio financeiro, impulsionou a valorização dos bônus no primeiro semestre daquele ano. 7. Considerações Finais Este trabalho fornece, em linhas gerais, as principais características do mercado de títulos de países emergentes. Dada a importância do mesmo no financiamento externo de países como o Brasil, defende-se um maior conhecimento das características desse mercado por parte dos autores acadêmicos, a fim de fornecer conclusões precisas aos estudos a respeito dos instrumentos de renda fixa de países emergentes. Uma corrente da literatura econômica em especial é a principal beneficiária do material exposto neste trabalho. Os estudiosos do efeito 77 contágio no mercado de títulos em momentos de crise têm, aqui, descritas as características mais importantes que afetam os papéis de países emergentes. De acordo com o raciocínio aqui defendido, a utilização de séries de preços de título não é, do ponto de vista estatístico, a melhor escolha para mensurar a flutuação conjunta do valor dos ativos de diferentes países. Esta tem sido a grande falha dos trabalhos voltados para o mercado de bônus emergentes. Como alternativa, sugere-se que os estudos se utilizem de sub-séries dos índices de retorno total calculados para os títulos de países emergentes. Existem algumas alternativas para tanto, como o Emerging Markets Bond Index Plus e o Merrill Lynch Brady Index, cada qual com séries individuais para o retorno dos papéis de cada país. Essa pequena alteração permite que o tratamento dado aos títulos seja igual àqueles dos estudos que versam sobre o mercado de câmbio e as bolsas. Outra contribuição importante é a descrição das condições de formação de capital no mercado, freqüentemente ignoradas nas análises das crises recentes. A falta de literatura acadêmica específica torna o assunto um monopólio dos agentes do mercado financeiro, existindo uma lacuna no seu tratamento junto aos fatores ligados aos fundamentos macroeconômicos. Foi para essa ausência que buscou-se chamar a atenção, procurando motivar o tratamento analítico completo dos fatores por trás do mercado de títulos. A revisão da história recente, à luz dos fatores fundamentais e técnicos que afetam o mercado de títulos, mostra que, de fato, as condições de formação de capital e o posicionamento relativo dos investidores tiveram um papel importante na transmissão internacional das crises recentes. Não se pretende afirmar que os technicals foram os únicos fatores que geraram 78 contágio no mercado de títulos a partir de 1994, mas sim que também tiveram influência nos episódios. A importância destas constatações extrapola o ambiente acadêmico. Do ponto de vista da classificação de risco soberano, surgem argumentos em defesa dos países por uma classificação mais justa. O hábito das agências de rating têm sido rebaixar imediatamente as notas dos países emergentes em momentos de crise (normalmente depois de os mercados apresentarem quedas bruscas) e muito lentamente devolvê-los aos níveis de risco anteriores. O caso do Brasil, por exemplo, mostra a demora em fazê-lo. O país teve suas notas rebaixadas em um nível por Moody’s e S&P no final de 1998 e em janeiro de 1999, respectivamente, por causa dos efeitos da crise da Rússia e da desvalorização do real. Desde então, a economia apresentou forte recuperação sem que as agências tomassem atitudes no sentido de devolver o país para as classificações B1 e BB- que possuía anteriormente às crises. Por outro lado, as conclusões aqui apresentadas têm aplicação imediata no desenho da estratégia de financiamento do Tesouro Nacional no exterior, bem como no caso dos demais países emergentes. A incorporação das variáveis relacionadas ao posicionamento dos investidores na análise permite antever movimentos de pressão para valorização ou desvalorização dos papéis, o que significa, em última análise, prever a direção em que se movimentará o custo de captação de recursos no exterior, permitindo estabelecer escolhas ótimas quanto à viabilidade e conveniência de novas emissões externas. 79 Duas sugestões de pesquisa surgem como conseqüência das questões levantadas nesse trabalho. A primeira é a realização de estudos sobre contágio financeiro levando em conta as especificidades dos instrumentos de renda fixa de países emergentes. A outra, é a incorporação das características técnicas do mercado de títulos na modelagem das crises recentes, buscando auferir quanto da volatilidade é devida aos fundamentos macroeconômicos e quanto se deve atribuir ao posicionamento dos investidores. 80 Referências: ALBA, P., BHATTACHARYA, A., S. CLAESSENS, S. GHOSH e L. HERNANDEZ - “Volatility and Contagion in a FinanciallyIntegrated World: Lessons from East Asia's Recent Experience”, Paper presented at the PAFTAD 24, Asia Pacific Financial Liberalization and Reform, Maio 20-22, Chiangmai, Thailand, 1998 ANDRADE, Joaquim P. e Maria Luiza Falcão SILVA – “Divergências e Convergências sobre as Crises Cambiais”, in Lima, G.T, J. Sicsú e L. 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