Idade Média_música profana - História da Cultura e das Artes

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História da Cultura e das Artes
Ano letivo: 2012/2013
IDADE MÉDIA: DOS ESPAÇOS RELIGIOSOS AOS ESPAÇOS PROFANOS
Índice
1)
Desenvolvimento da monodia profana .................................................................................. 2
2)
Trovadores e Troveiros ......................................................................................................... 3
3)
Difusão do movimento trovadoresco .................................................................................... 5
3.1 Alemanha ........................................................................................................................... 5
3.2 Península Ibérica ................................................................................................................ 6
4)
Instrumentos musicais ........................................................................................................... 8
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1) Desenvolvimento da monodia profana
As primeiras formas musicais profanas que se conservam são canções com textos latinos.
As primeiras entre estas formam o reportório das canções dos goliardos dos séculos XI e XII.
Os goliardos (“goliardo”, palavra associado ao latim “gula” ou então à figura bíblica “Golias”)
eram estudantes ou clérigos errantes que migravam de escola em escola nos tempos que
precederam a fundação das grandes universidades. Formavam um grupo heterogéneo de poetas
e compositores latinos, ativos na França, Alemanha, Inglaterra e Itália. Deixaram canções em
latim, de todos os géneros: satíricas, báquicas, eróticas, moralizantes, satíricas, etc. Estas
canções conservam-se em alguns manuscritos, dos quais o mais conhecido é o Codex Buranus
(Códice do Mosteiro de Beuron Baviera) do século XIII, que contém cerca de 200 composições
do século XI e XII.
Contudo, o espírito secular da Idade Média reflete-se mais claramente nas canções com
textos em língua vernácula. Um dos tipos mais antigos conhecidos é a chanson de geste, ou
canção de gesta, um poema épico, narrativo, relatando os feitos de heróis nacionais, cantada
com base numa ou mais fórmulas melódicas simples. Os poemas eram inicialmente transmitidos
oralmente, só se passando à escrita em data relativamente tardia, conservando-se muito pouco
da música que os acompanhava. Todos os exemplos sobreviventes, cerca de 100, são do Norte
de França e a maior parte do século XII. O mais famoso é a Chanson de Roland, que data
possivelmente da segunda metade do século XI, cujo poema narra o fim heroico do conde
Rolando, sobrinho de Carlos Magno, que morre junto aos seus homens na batalha de
Roncesvales.
Os indivíduos que cantavam as chansons de geste e outras cantigas seculares da Idade
Média eram chamados de jongleurs ou ménestrels (jograis ou menestréis), uma categoria de
músicos profissionais que começa a surgir por volta do século X: homens e mulheres vagueando
isolados ou em pequenos grupos de aldeia em aldeia, de castelo em castelo, ganhando
precariamente a vida a cantar, a tocar, a fazer habilidades ou a exibir animais amestrados. Como
classe, não eram poetas nem compositores no sentido preciso que damos hoje a estas palavras.
Cantavam, tocavam e dançavam cantigas compostas por outras pessoas, alterando ou criando as
suas próprias versões.
De todos os manuscritos que se preservam de canções em latim, o mais notório é o códice
designado por Carmina Burana, compilado provavelmente no final do século XIII no mosteiro
de Benediktbeuern, no sul de Munique.
Os jograis e os menestréis, com as suas habilidades, tiveram um papel importante no
desenvolvimento da música dos trovadores e dos troveiros.
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2) Trovadores e Troveiros
Paralelamente ao desenvolvimento da música litúrgica assistiu-se na Europa Medieval ao
florescimento de um movimento literário-musical, de índole profana, o qual ficou
genericamente conhecido como movimento trovadoresco. Este movimento desenvolveu-se
inicialmente em França, com os trovadores e os troveiros, mas rapidamente influenciou as
literaturas poéticas da Europa, tendo na Alemanha tomado o nome de Minnesang. Esta arte foi o
primeiro movimento a trabalhar línguas vernáculas segundo um estilo literário e, também, o
primeiro movimento cultural profano a distanciar-se da forte religiosidade que dominou o
ocidente medieval.
Estas duas palavras, trovadores e troveiros, têm o mesmo significado: descobridores e
inventores. Provêm de trobar/trovar, visto que ambos tentavam inventar (trouver) linhas
melódicas para as suas poesias. Deste modo, em finais do século XI, surgiu no Sul de França,
nomeadamente em Provença, uma arte poética aplicada à Música, em dialeto provençal, ou seja,
na langue d´oc. Esta poesia foi cultivada por poetas-compositores denominados trobadours
(trovadores). A sua linguagem poética e o modo artístico de tratarem os seus temasfizeram
surgir, por volta do fim do século XII, uma arte semelhante no Norte de França, num outro
dialeto, a langue d´oil, o dialeto do francês medieval que deu origem ao francês moderno. Estes
poetas-compositores foram chamados de trouvères (troveiros).
A atividade dos trovadores situa-se desde os fins do século XI a princípios do século XIV,
tendo sido no século XII suplantada pela dos troveiros.
Os temas e a estrutura da lírica medieval era bastante diversificados (alba – canta a
separação dos amantes na alvorada; pastorela – canta o amor da rapariga camponesa; sirventes
– canções políticas, sociais, morais; chanson de croisade – exortação às Cruzadas ou relato das
mesmas; lamentação – canta a morte do amo), mas é destacar a temática do Amor Cortês:
conceito europeu medieval de atitudes, mitos e etiqueta para enaltecer o amor; a poesia
expressava os seus elogios a uma mulher da nobreza, demonstrando subordinação às damas da
corte, que deveriam ser tratadas com cortesia.
Nem os trovadores nem os troveiros constituíam um grupo bem definido. Estes termos não
definem um determinado estatuto ou proveniência social, mas referem-se apenas à capacidade
de criar poesias musicadas. Por isso, encontram-se entre eles os mais diversos
estratos sociais,
desde servos, a duques, reis e prelados. Também se podem encontrar trovadores do sexo
feminino (troubaritz), normalmente damas de grande instrução literária. Entre os troveiros
encontra-se uma menor disparidade social: são, na sua maioria, senhores feudais ou burgueses
prósperos, como foi o caso de Adam de la Halle.
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As atividades dos trovadores e dos troveiros inseriam-se numa atitude de diletantismo,
nunca profissionalizada, ao contrário dos jograis ou menestréis. Eram compositores e intérpretes
das suas canções, embora remetessem muitas vezes a interpretação para os cantores e músicos
ao seu serviço (menestréis). A sua arte pressuponha uma grande formação literária e uma
técnica vocal elevada.
Dos trovadores conhecem-se c.450 nomes, quase 2500 poemas e aproximadamente 300
melodias. Entre eles destacam-se Guilhaume IX de Aquitânia (1071-1126), Jaufré Rudel
(c1113-1150), Bernart de Ventadorn (1130-1195), Pere Vidal (1175-1205), Guiraut Riquier
(c.1230-1298), entre outros. Dos troveiros conservam-se mais de 4000 poemas, para além de
2000 melodias. Entre eles destacam-se Chrétin de Troyes (1120-1180), Ricardo Coração de
Leão (1157-1199), Thibaut IV de Champagne (1201-1258) e Adam de la Halle (1237-1287).
Estilo musical:

As melodias e a estrutura formal dependiam do poema;

As canções trovadorescas são geralmente silábicas, podendo surgir ocasionalmente
pequenos segmentos melismáticos;

O âmbito é reduzido, geralmente de uma 6ª;

Os modos mais usados são os modos autênticos e plagais de Ré e Sol (Dórico,
Hipodórico, Mixolídio, Hipomixolídio);

O uso da sensível era generalizado, particularmente na parte cadencial (finais de frases e
estrofes);

A notação utilizada era em geral imprecisa quanto ao ritmo, mas vigora o princípiode
que a palavra é que determina o ritmo a usar.
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3) Difusão do movimento trovadoresco
O movimento trovadoresco difundiu-se por toda a Europa, não apenas por influência
literária, mas devido a conjunturas políticas. É o caso, por exemplo, de Portugal, Castela e
Inglaterra, que tomaram certamente contacto desde cedo com este fenómeno, devido às ligações
das suas cortes com a cultura francesa, o que sem dúvida foi determinante. De facto, D. Afonso
Henriques e o seu primo Afonso VI de Leão eram ambos filhos de cruzados e cavaleiros
franceses, o que motivou o interesse por esta arte na Península Ibérica. No caso de Inglaterra,
Leonor de Aquitânia, neta de Guilherme IX de Aquitânia, influente na introdução da arte
trovadoresca no Norte de França, casou em segundas núpcias com o Rei Henrique II de
Inglaterra, onde a referida arte também se desenvolveu. Portanto, Leonor de Aquitânia
desempenhou um papel importante na divulgação da arte trovadoresca, pois casa-se pela
primeira vez, em 1137, com Luís VII, rei de França, e depois casa-se com Henrique II, em 1152,
que se tornou Rei de Inglaterra em 1154. Traz consigo a tradição trovadoresca para o Norte de
França e, mais tarde, para Inglaterra.
3.1 Alemanha
No século XII este movimento chega à Alemanha, assumindo dois grandes momentos: o
dos Minnesaenger (Cantores do Amor) e o dos Meistersinger (Mestres Cantores). Os
Minnesaenger eram poetas-cantores do Amor, equivalentes aos trovadores, em que as melodias
das suas canções (designadas por lied) eram inventadas por eles. Entre os Minnesaenger
destacam-se Walter von der Vogelweide (c.1170-1230), Wolfram von Eschenbach (c.11751220), Oswald von Wolkenstein (1377-1445), entre outros. Tal como em França, em que a
partir dos finais do século XIII a arte dos troveiros começou a ser cada vez mais cultivada por
burgueses cultos e não predominantemente por nobres, o declínio da cavalaria e o
fortalecimento das cidades alemãs no século XIV faz com o Minnesang seja substituído pelo
Meistersang burguês.
Deste modo, os Meistersingers eram burgueses, sobretudo artesãos, agrupados em
corporações de ofícios nos quais funcionavam uma espécie de “escolas de música” corporativas,
com regulamentos e estatutos fixos. Os músicos dessas corporações passavam por diversas
escalas de aperfeiçoamento, que iam de Aluno a Poeta e, finalmente, a Mestre. Os textos
podiam estar relacionados com a Bíblia ou então serem satíricos ou cómicos. O período de
maior esplendor dos Meistersingers situa-se nos séculos XV e XVI, já no Renascimento. Esta
arte foi desenvolvida em várias cidades alemãs, sobretudo em Moguncia, Munique, Wuerstburg
e Nuremberga. Entre os principais mestres-cantores destacam-se Hans Folz (c.1437-513) e Hans
Scahs (1494-1576).
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A partir do século XII, a atenção dos compositores foi sendo cada vez mais absorvida pela
polifonia. As canções monofónicas dos trovadores e troveiros eram uma expressão artística
própria da aristocracia feudal; eram essencialmente obra de músicos amadores talentosos e não
de compositores profissionais. O mesmo acontece com os Meistersingers.
A música monofónica continuou a ser interpretada na Europa quase até ao final do século
XVI, mas, com a exceção de Guillaume de Machaut, poucos compositores profissionais de
primeira grandeza utilizaram este meio de expressão depois do século XIII.
3.2 Península Ibérica
Está bem documentada a presença em Espanha, tanto na Catalunha como em Castela, de um
número significativo de trovadores provençais (Guillaume Poitiers, Marcabru, Peire Vidal,
Girauld Bornelh). Existem também nomes de troveiros do Norte de França que viveram em
Espanha (Thibaut de Champagne).
No entanto, desenvolveu-se uma tradição trovadoresca própria no espaço ibérico, que tem,
pelo menos em parte, uma raiz local, embora tenha sido também influenciada pela lírica
provençal. Esta tradição está toda ela vertida em galaico-português, a língua do Noroeste da
Península, cujo grande centro cultural foi Santiago de Compostela.
O mais antigo trovador galaico-português é João Soares de Paiva, nascido por volta de
1140, e o último D. Pedro (c.1285-1354), Conde de Barcelos, filho do Rei D. Dinis. O apogeu
da cantiga trovadoresca em Portugal deu-se na corte de D. Afonso III (1248-1279), sendo
igualmente trovadores os reis D. Sancho I (1154-1211) e D. Dinis (1262-1352). É ainda de
referir os poetas, tanto galegos como portugueses, leoneses e castelhanos, que viveram nas
cortes de Fernando II e de Afonso X, o Sábio, de Leão e Castela (1226-1284).
Existem cerca de 2100 poemas escritos em galaico-português, quatrocentos dos quais
pertencem ao corpus da temática religiosa das chamadas Cantigas de Santa Maria. São canções
de louvor à Virgem Maria, atribuídas a Afonso X. Para além de incluírem notação musical são
ricamente ilustradas com representações de músicos, constituindo um dos mais importantes
repositórios de iconografia musical trovadoresca da Península Ibérica.
Os restantes poemas, de caráter profano, conservam-se em três manuscritos principais,
nenhum dos quais possui notação musical: o Cancioneiro da Ajuda, o da Biblioteca Vaticana e o
da Biblioteca Nacional de Lisboa. O principal interesse do Cancioneiro da Ajuda para a
história da música reside nas suas iluminuras, que representam cantores, bailarinas ou
jogralescas, e tocadores de viola de arco, viola dedilhada, saltério, pandeiro ou adufe, dirigidos
por um nobre trovador sentado num escabelo, com um rolo de pergaminho na mão que contém
as letras das cantigas.
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Na lírica galaico-portuguesa, destacam-se principalmente três géneros poéticos: as Cantiga
de Amor e as Cantigas de Amigo, ambas de temática amorosa, e as Cantigas de Escárnio e
Maldizer, de temática satírica.
De destacar ainda dois documentos sobreviventes: o Pregaminho Vindel, descoberto em
1913 por Pedro Vindel, que contém sete Cantigas de Amigo, mas apenas 6 melodias, compostas
por Martim Codax; e o Pergaminho Sharrer, descoberto em 1990, que contém 7 Cantigas de
Amor de D. Dinis.
Site a consultar:
http://cantigas.fcsh.unl.pt/index.asp
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4) Instrumentos musicais
Um dos papéis fundamentais da arte trovadoresca é a valorização da música instrumental,
bastante repudiada pela música litúrgica de então. De facto, a produção trovadoresca mais
comum é a vocal com acompanhamento instrumental.
De uma maneira geral, pode dizer-se que a Idade Média recolhe o instrumentário da
Antiguidade. No entanto, não existe nesta época um desenvolvimento intencional dos
instrumentos, nem se estabelecem normas para a sua construção. Consequentemente, surge uma
grande diversidade e uma falta de uniformidade na denominação. Só no século XV-XVI ocorre
a formação das famílias instrumentais e a sua sistematização teórica.
Nesta época, não era comum a existência de grandes orquestras, mas sim de pequenos
agrupamentos solistas. A sonoridade privilegiada era aguda, penetrante, baseada nas tessituras
de soprano e tenor.
A música instrumental pura é muito rara e os instrumentos musicais eram utilizados como
acompanhamento, onde a sua execução era essencialmente improvisada. Apenas na polifonia, os
instrumentos tocam partes próprias ou duplicam as partes vocais. Os executantes eram, para
além do organista, jograis ou menestréis ao serviço da corte ou então artistas ambulantes que
animavam feiras e festas.
Remonta ao século XIV a distinção entre música alta (instrumentos mais sonoros, próprios
para utilizar ao ar livre, cerimónias militares e religiosas ou para acompanhar as chamadas
“danças altas”) e música baixa (instrumentos de sonoridade mais suave, “música de interior”,
música de “sala”).

Cordofones
Entre os cordofones (instrumentos de cordas) destacam-se: a harpa, nesta época designada
como harpa de caixilho; a lira e a cítara, instrumentos típicos da Antiguidade, continuam a
utilizar-se, embora com modificações, sendo de destacar a crotta - cítara com escala e arco para
friccionar as cordas; o saltério, cuja existência está documentada a partir do século IX, possui
uma caixa de madeira com orifícios sonoros, estando as cordas esticadas e fixas em ambos os
lados por cravelhas, as cordas são dedilhadas com os dedos ou com plectros; o alaúde, pode
apresentar-se como alaúde friccionado (embora também pudesse ser dedilhado), com um corpo
pequeno e abaulado, ou como alaúde de braço dobrado, com um corpo grande e com muitas
cordas; a viela, um instrumento friccionado, posicionado geralmente sobre o ombro esquerdo ou
transversalmente diante do corpo, contendo uma caixa e um braço separado desta; e a sanfona
(ou organistrum), inicialmente com 3 cordas (depois até 6), friccionadas simultaneamente por
uma roda, ou seja, as tangentes giratórias tocam todas as cordas ao girar para cima e com uma
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afinação quinta-oitava das cordas produzem-se sons paralelos, como no antigo organum (daí a
designação organistrum).
Lira
Harpa
Alaúde de braço dobrado
Crota
Saltério
Viela
Alaúde de
braço curto,
friccionado
ona ou Organistrum
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
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Aerofones
Neste período surgem dois outros tipos de órgão: o órgão positivo, mais pequeno e prático,
que se podia movimentar como uma peça de mobília; e o órgão portativo (ou organetto), de
pequenas dimensões, que podia ser transportado (como acontecia nas procissões), cujos tubos
estavam distribuídos por duas filas e podiam ir até duas oitavas, o fole encontrava-se por detrás
do instrumento, que era atuado pela mão esquerda do músico, enquanto a mão direita tocava no
teclado. De destacar também a trompa de caça (pequena trompa natural de metal, de corno de
animal ou de marfim), a flauta longitudinal ou reta e a flauta transversal, a siringe (ou
flauta-de-Pã) e a gaita-de-foles (referências desde o século IX, com um ou dois tubos melódicos
e bordões).
Órgão positivo
Trompa de caça
Gaita de foles
Órgão portativo
Órgão portativo
Relativamente aos instrumentos de percussão, destacam-se tambores de mão, pandeiros,
pratos, címbalos, sinos, castanholas entre outros.
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