A antropologia como ciência

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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE BRASÍLIA
Pró-Reitoria de Extensão (Proex)
Diretoria de Programas de Pastoral (Dipas)
Centro de Reflexão sobre Ética e Antropologia da Religião (Crear)
DISCIPLINA: Antropologia da Religião
A antropologia como ciência
José Lisboa Moreira de Oliveira*
Para compreendermos bem a disciplina Antropologia da Religião é importante, antes de tudo, entender o significado da Antropologia, vista antes de
tudo como ciência da humanidade, como aquele âmbito do conhecimento e do
saber que procura conhecer cientificamente a pessoa humana na sua totalidade. Além disso, para se estudar em profundidade o fenômeno religioso, objeto
primário da nossa pesquisa, é indispensável “uma reflexão sobre a experiência
do conhecimento humano” (RAMPAZZO, p. 23).
Comecemos então pela etimologia da palavra. “Antropologia” vem do
grego αντροποσ (anthropos), homem, e λογοσ, λογια (logos, logia), estudo, e,
etimologicamente, significa estudo do homem (MARCONI; PRESOTTO, p. 1-2).
Embora a Antropologia compreenda três dimensões básicas (biológica, sociocultural e filosófica), neste estudo vamos nos deter muito mais no seu aspecto
cultural, deixando os outros elementos para as disciplinas dos cursos especificamente voltados para essas áreas.
Segundo alguns autores as origens da Antropologia remontam à Grécia
antiga. Os gregos teriam sido os primeiros a reunir informações sobre diversos
povos e culturas, embora não possamos desconsiderar as contribuições dos
chineses, dos egípcios e dos romanos. Heródoto, filósofo grego do V século
A.C. é considerado por esses estudiosos o “pai da Antropologia” (Ibid. p. 1011). Mas há quem discorde dessa afirmação e coloque em dúvida essa ideia
*
Licenciado em Filosofia, doutor em Teologia, escritor e conferencista, gestor do Centro de Reflexão
sobre Ética e Antropologia da Religião (Crear) da Universidade Católica de Brasília onde é também professor de Antropologia da Religião e Ética.
(DAMATTA, p. 86-87). Na opinião desses antropólogos não se pode situar o
nascimento da Antropologia num simples relato de viagem de Heródoto no qual
ele reúne informações de povos que os gregos consideravam “bárbaros”. Eles
acreditam ainda que a história da Antropologia é uma verdadeira especulação,
uma vez que ela tem a ver com a capacidade dos seres humanos de perceberem as suas diferenças e com os sistemas ideológicos que usaram os próprios
dados da Antropologia para justificar invasões e aniquilações de tantos grupos
étnicos.
Para DaMatta todo antropólogo terá que conviver sempre com generalizações sobre o específico de uma certa sociedade ou grupo e com a necessidade de escolher alternativas (Ibid. p. 87-89). Jamais será possível num determinado momento ter-se uma visão completa e definitiva de uma determinada
cultura. Isso explica porque até o século XVIII a Antropologia não era vista como ciência. Muitas pessoas como cronistas, viajantes, soldados, missionários,
comerciantes relataram fatos e deixam dados sobre povos e culturas, mas somente nos meados do século XVIII é que a Antropologia começa a aparecer
como ciência. Normalmente se considera como primeiros antropólogos os seguintes cientistas: Linneu (que foi o primeiro a descrever as raças humanas),
Boucher de Perthes (o primeiro a relatar achados pré-históricos) e John Lubock
que fez os primeiros estudos sobre a Idade da Pedra, estabelecendo as diferenças culturais entre o Paleolítico e o Neolítico. Porém, a consagração definitiva da Antropologia como ciência vai se dar somente depois dos estudos de
Darwin, o qual propôs a teoria da evolução. No século XX a Antropologia conhece um grande progresso, fruto das descobertas sobre o ser humano e as
constantes pesquisas de campo realizadas com bastante rigor científico
(MARCONI; PRESOTTO, p. 10-11).
1. A antropologia dentro do campo das ciências sociais
Sabemos que o ser humano “sempre teve curiosidade a respeito de si
mesmo, independentemente do seu nível de desenvolvimento cultural” (Ibid. p.
10). Assim sendo, o surgimento da Antropologia está ligado a este desejo da
humanidade de conhecer-se a si mesma buscando perceber e registrar as se-
melhanças e as diferenças entre os diversos grupos sociais e culturais. Esse
dado histórico nos leva à definição do objeto e, do objetivo da Antropologia.
Podemos afirmar que o objeto do estudo da Antropologia é a pessoa
humana e a sua atividade. No caso da Antropologia Cultural o objeto é o ser
humano e os seus comportamentos, ou seja, o homem e a mulher enquanto
integrantes de grupos sociais que fazem cultura. Por essa razão é possível dizer que o objetivo da antropologia é o estudo da humanidade como um todo,
bem como das suas diversas manifestações e expressões. Assim sendo, podese dizer que no seu objetivo a Antropologia se preocupa com a pessoa humana
na sua condição de ser biológico, ser pensante, ser que produz culturas e ser
capaz de organizar-se em sociedades estruturadas (Ibid. p. 2-3).
No caso da Antropologia Cultural, dentro da qual se situa a Antropologia
da Religião, seu objetivo é procurar uma compreensão do ser humano enquanto tal e da sua existência ativa, capaz de interferir no destino do planeta que
habitamos. O papel da Antropologia Cultural é interpretar as diferenças culturais na medida em que elas formam sistemas culturais integrados. Sua função
é captar o essencial das culturas e buscar uma verdadeira compreensão de
tais sistemas. O essencial do trabalho do antropólogo cultural é o estudo da
vida das pessoas organizadas em grupos culturais, vendo o seu conjunto formado por tantos elementos como os valores, as reflexões, os costumes, as
normas, etc. (DAMATTA, p. 143-150).
Trata-se, pois, de estudar o ser humano enquanto capaz de produzir cultura. Por isso é fundamental percebermos desde agora a diferença e a relação
entre sociedade e cultura. De fato, pode existir sociedade sem cultura. O que
caracteriza a sociedade é a vida ordenada, com divisões de trabalho, de espaços, de idades, de extratos sociais, de sexos e assim por diante. Por isso também os animais são capazes de viver em sociedade. Já a cultura, como veremos depois, supõe uma tradição viva que passe de geração em geração o que
foi elaborado coletivamente, de modo que o próprio grupo perceba e tenha
consciência de que seu estilo de vida é diferente dos outros. A partir dessa
percepção e dessa consciência o grupo estabelece as suas normas de inclusão
e de exclusão. Consequentemente, podemos ter um grupo ordenado socialmente, mas sem consciência do seu próprio estilo de vida, isto é, sem cultura.
A cultura se caracteriza, pois, pela tradição, ou seja, pela transmissão do jeito
próprio de ser de um grupo, o qual é mais do que viver ordenadamente com
regras e normas estabelecidas. A cultura é a vivência coletiva consciente e
responsável dos padrões, costumes e hábitos, dentro de um espaço e de uma
temporalidade, e que identificam um determinado grupo. Na cultura há uma
interação dialética entre as regras e o grupo, com possibilidades de reciprocidade e de mudanças. O grupo age ou não desta ou daquela forma porque tem
consciência de que esse agir lhe dá ou não identidade e o diferencia dos outros
grupos sociais (Ibid. p. 47-58).
2. Divisões e Campos da Antropologia
A definição de Antropologia nos ajudou a perceber que ela tem um campo muito vasto, abrangendo espaços, situações e tempos amplos e bem diferentes. Por esse motivo ela possui âmbitos diversos e uma infinidade de campos de ação. De um modo geral os antropólogos costumam dividir a Antropologia em dois grandes campos de estudo: a Antropologia Física ou Biológica e a
Antropologia Cultural (MARCONI; PRESOTTO, p. 3-7).
A Antropologia Física ou Biológica estuda o ser humano na sua natureza
e na sua condição física. Procura compreendê-lo nas suas origens, no seu processo evolutivo, na sua estrutura anatômica, bem como nos seus processos
fisiológicos e biológicos. Ela está estruturada em cinco campos: 1) a Paleontologia que estuda a origem e a evolução da espécie humana; 2) a Somatologia
(do grego soma, corpo + logia, estudo) que estuda o corpo humano nas suas
variedades existentes, nas diferenças físicas e na sua capacidade de adaptação; 3) A Raciologia que se interessa pela historia racial do ser humano; 4) A
Antropometria (do grego anthropos, homem + metria, medida) que trabalha
com técnicas de medição do corpo humano, especialmente de esqueletos (crânio, ossos, etc.), usando instrumentos especiais de precisão, com o objetivo de
fornecer informações detalhadas acerca de pessoas ou de achados arqueológicos, sendo muito usada no âmbito forense para tentar identificar corpos e
esqueletos; 5) Antropometria do crescimento, voltada para o conhecimento e o
estudo dos índices de crescimento dos indivíduos, relacionando-o com o tipo
de alimentação, de atividades físicas e assim por diante.
Por sua vez a Antropologia Cultural, o campo mais amplo dessa ciência,
estuda o ser humano enquanto fazedor de cultura. O seu principal objetivo é
compreender os relacionamentos humanos, os comportamentos tanto instintivos como aqueles adquiridos pela aprendizagem, sem deixar de analisar os
aspectos biológicos que contribuem para o desenvolvimento das capacidades
culturais dos seres humanos. Portanto, seu objetivo é conhecer o ser humano
enquanto capaz de criar o seu meio ou ambiente cultural através de formas
bem diferenciadas de comportamento.
3. Campos da Antropologia Cultural
A Antropologia Cultural abrange seis campos específicos de atuação (Ibid.: 4-7). O primeiro deles é a Arqueologia que tem como objeto o estudo das
culturas extintas que viveram em épocas, em tempos e em lugares diferentes,
de modo particular as que não deixaram documentos escritos. Por isso o estudo da Arqueologia consiste basicamente na análise de vestígios e de restos de
materiais dessas culturas encontrados em escavações e que resistiram à destruição através do tempo.
Um segundo campo de atuação da Antropologia Cultural é a Etnografia
(do grego éthnos, povo e graphein, escrever) que se ocupa com a descrição
das sociedades humanas por meio da observação e da análise dos grupos sociais, tentando, na medida do possível, fazer a reconstituição fiel de suas vidas.
De um modo geral a Etnografia se ocupa com as culturas simples, denominadas “primitivas” ou “ágrafas” (não possuidoras de escrita). Ligado a esse campo
está a Etnologia que, utilizando os dados coletados e oferecidos pela Etnografia, procura fazer a análise, interpretação e comparação das diversas culturas
pesquisadas, tentando perceber as semelhanças e diferenças entre elas, buscando a existência ou não de inter-relações do ser humano com o seu ambiente, da pessoa com a cultura, em vista da percepção de mudanças e de ações.
O quarto campo da Antropologia cultural é a Linguística que estuda a
linguagem, as formas de comunicação e também a forma de pensar dos povos
e culturas. A lingüística é um dos espaços mais independentes e mais ricos da
Antropologia. Basta pensar, por exemplo, na quantidade e diversidade de línguas, sendo que cada uma delas possui a sua forma e a sua estrutura básica.
Por essa razão ela é considerada o âmbito mais autossuficiente da Antropologia. A Linguística é muito importante para a Antropologia da Religião. Basta
pensar, por exemplo, nas religiões que possuem “livros sagrados”. A Linguística ajuda a compreendê-los melhor, evitando a leitura puramente literal e fundamentalista destes textos.
Temos ainda o campo do folclore e o campo da antropologia social propriamente dita. O folclore é o estudo da cultura enquanto fenômeno humano
espontâneo. Possui diversos aspectos e âmbitos (rural, urbano, material, espiritual, espacial, temporal etc.). Já a Antropologia Social se interessa da sociedade e das suas instituições. Estuda o ser humano enquanto ser social, capaz de
organizar-se e de tecer relações sociais. Também ela inclui diversos aspectos:
vida social, família, economia, política, religião, direito etc. Ela pode estudar
tanto um aspecto, como também o conjunto das organizações e instituições
sociais, tendo presente a sua totalidade. De fato, para se compreender uma
sociedade é indispensável vê-la como um todo.
No campo da Antropologia Social é de fundamental importância estudar
a relação que existe entre cultura, sociedade e indivíduo, uma vez que esse
último não é um mero receptor e portador de cultura, mas também agente de
mudança cultural. Por outro lado, sabemos que a cultura tem uma influência
determinante sobre a vida do indivíduo. Pelo processo de endoculturação o
grupo social confere um tipo de personalidade às pessoas que dele fazem parte. Conhecer estas inter-relações é sumamente importante para analisar o
comportamento humano e a capacidade de adaptação dos indivíduos aos valores propostos pelos grupos aos quais pertencem.
4. Interação da Antropologia com outras ciências
O que acabamos de analisar, nos mostra que, embora a Antropologia
seja uma ciência autônoma, ela necessita de uma interação com outras ciências para que possa cumprir a sua tarefa de ciência da humanidade (MARCONI; PRESOTTO, p. 8-10). No âmbito da Antropologia Cultural e Social é de
fundamental importância a sua interação com a Sociologia, com a Psicologia,
com as Ciências Econômicas e Políticas e com a História.
Através da interação entre Antropologia e Sociologia é possível conhecer melhor a condição humana e social dos indivíduos e dos grupos a que pertencem. A Antropologia vai trabalhar mais o enfoque cultural, enquanto a sociologia analisa tanto o conceito como a experiência de vida em sociedade. O cruzamento de dados e informações contribui significativamente para o conhecimento do ser humano na sua globalidade.
Já a interação entre Antropologia e Psicologia se dá pelo interesse acerca do comportamento humano. A Psicologia analisa mais o comportamento
individual, enquanto a Antropologia aprofunda os comportamentos grupais, sociais e culturais. Desse modo a Psicologia ajuda a Antropologia a compreender
a complexidade das culturas a partir da avaliação do comportamento dos seus
indivíduos. Essa, por sua vez, auxilia a Psicologia a perceber cada indivíduo
como ser inculturado que recebe influência do ambiente onde vive e do grupo
cultural a que pertence. Os dados resultantes desse processo ajudam a desvendar melhor o mistério da existência humana.
No que se refere à interação entre Antropologia e Ciências Econômicas
e Políticas, pode-se afirmar que os estudos comuns estão relacionados à compreensão das organizações econômicas e das instituições que regulam o poder
dentro dos grupos humanos. Trata-se, sem dúvida alguma, de uma realidade
complexa e bastante diferenciada, mas que é determinante para a existência
das sociedades e de suas culturas.
Quanto à relação entre Antropologia e História podemos afirmar que o
ponto de encontro é basicamente a tentativa de reconstrução de culturas que já
desapareceram. A História permite a Antropologia conhecer as origens dos fenômenos culturais, bem como as formas de adaptação e de modificação introduzidas pelas pessoas no meio ambiente.
5. Métodos científicos da Antropologia
Enquanto ciência social que estuda o ser humano, a Antropologia faz
uso de diversos métodos, de acordo com os seus campos e com as situações
(MARCONI; PRESOTTO, p. 11-14). Por método entende-se um conjunto de
regras bem definidas que são utilizadas na investigação. Normalmente o método segue um procedimento anteriormente elaborado e que deve ser cuidadosa
e escrupulosamente observado. O método tem como finalidade descobrir quais
são as lógicas e as leis da natureza e da sociedade, visando respostas satisfatórias.
Normalmente são utilizados sete métodos nas pesquisas de Antropologia. O primeiro é o método histórico utilizado para a investigação de culturas
passadas. Por meio dele o antropólogo, com a ajuda do historiador, tenta reconstruir as culturas, explicar fatos e observar fenômenos, como, por exemplo,
as mudanças ocorridas e as adaptações. O segundo é o método estatístico
empregado, sobretudo para analisar as variações culturais das populações ou
sociedades. Os dados são obtidos por meio de tabelas, gráficos, quadros comparativos etc. O terceiro é o método etnográfico utilizado para descrever as sociedades humanas, de modo particular as consideradas primitivas ou ágrafas
(sem escrita). O método consiste essencialmente em levantar todos os dados
possíveis sobre uma determinada cultura ou etnia e, a partir desses levantamentos, tentar descrever o estilo de vida ou cultura desses grupos.
O quarto método é chamado de comparativo ou etnológico. É usado de
modo particular para a pesquisa sobre populações extintas. Por meio da comparação de materiais coletados, especialmente fósseis, se estudam os padrões, os costumes, os estilos de vida das culturas, vendo de modo particular
as diferenças e semelhanças existentes entre elas. O objetivo é melhor compreender as culturas passadas e extintas. O quinto método é conhecido como
monográfico. É também chamado de estudo de caso. Consiste em estudar com
profundidade determinados grupos humanos, considerando todos os seus aspectos como, por exemplo, as instituições, os processos culturais e a religião.
O estudo monográfico é muito importante para os casos de culturas que estão
ameaçadas de extinção, uma vez que permite analisá-las e descrevê-las de
forma bem pormenorizada.
Por fim, temos o método genealógico e o método funcionalista. No primeiro caso trata-se de um método usado para o estudo do parentesco e todos
os outros aspectos sociais dele decorrentes. Visa à análise da estrutura familiar
e exige a presença de um informante, ou seja, de alguém que possa revelar os
nomes das pessoas que compõem a árvore genealógica. No segundo caso, a
cultura é estudada e analisada a partir do âmbito da função ou das funções.
Por meio dele busca-se perceber a funcionalidade de uma determinada unidade cultural no contexto da cultura geral ou global.
6. Técnicas de pesquisa da Antropologia
Já foi possível perceber que aos métodos estão associadas determinadas técnicas de pesquisa. Por técnica entende-se a habilidade do cientista ou
pesquisador no uso dos métodos, ou seja, daquele conjunto de regras bem
definidas que são utilizadas na investigação e que lhe permite obter os dados
desejados. As técnicas usadas no campo antropológico são três: observação,
entrevista e formulário (MARCONI; PRESOTTO, p. 14-16).
A técnica da observação consiste na coleta e obtenção de dados. Nela
os sentidos têm um lugar privilegiado. Ela pode ser sistemática ou participante.
Na sistemática o pesquisador direta (pessoalmente) ou indiretamente (por meio
de outras pessoas) observa os fatos no local da investigação e por um período
de tempo. Na participante o pesquisador, por um longo período de tempo, participa do seu campo de pesquisa. É muito utilizada para a pesquisa cultural.
Neste caso o cientista torna-se um participante ativo da cultura que quer estudar. Ela exige fina capacidade de observação, superação de preconceitos, trabalho diário de anotação, registro de fatos e de dados. Exemplo desse tipo de
pesquisa é aquela feita pelo francês Roger Bastide sobre as religiões africanas
em Salvador (Bahia) ou o caso de Dacyr Ribeiro que conviveu durante muito
tempo com os índios Kayapós em Mato Grosso. Também Roberto DaMatta
descreve a sua pesquisa entre os índios Gaviões no Pará e entre os Apinayé
no atual estado de Tocantins (DAMATTA, p. 182-240).
A técnica da entrevista consiste num contato direto, face a face, do cientista e pesquisador com a pessoa entrevistada, da qual ele pretende obter informações. A entrevista pode ser estruturada ou semiestruturada (livre). A entrevista estruturada é aquela na qual o entrevistador segue um roteiro préestabelecido. A semiestruturada é aquela do tipo informal, sem roteiro a ser
seguido, na qual o entrevistador vai colhendo as idéias do entrevistado, manifestadas de forma espontânea.
O formulário é uma técnica que se parece com o questionário. Consiste
num levantamento de dados feito através de uma série organizada de pergun-
tas escritas entregues ao entrevistado, às quais ele é convidado a responder.
De certa maneira é uma pesquisa dirigida, uma vez que o rol de perguntas é
feito pelo entrevistador, visando obter esclarecimentos sobre determinadas
questões.
Convém observar que no caso das duas últimas técnicas, embora as
respostas sejam dadas pelo entrevistado, o modo de formular as perguntas e a
escolha do público alvo pode induzir a um determinado resultado. Isso acontece, por exemplo, em certas pesquisas de opinião pública, como ficou bem evidente por ocasião das recentes eleições no Brasil. O risco de manipulação dos
resultados pode sempre existir. Neste caso temos um problema ético muito
grave e o cientista encarregado da pesquisa pode ser responsabilizado por falsificar os resultados.
Conclusão
Podemos concluir afirmando que, dada as suas características, a Antropologia é uma ciência de extrema atualidade. Ela pode contribuir para o desenvolvimento dos seres humanos e dos povos. O resultado de seus estudos e
pesquisas ajuda na superação de desequilíbrios e de tensões culturais. Os antropólogos costumam apontar as causas das tensões sociais e indicar soluções
para que se restabeleça o equilíbrio entre os diversos grupos culturais.
O grande desafio está no fato de que as culturas dominantes nem sempre concordam com as conclusões dos estudos e das pesquisas dos antropólogos. Por isso muitas tensões sociais permanecem e até tendem a se agravar.
Não se quer escutar uma verdade que incomoda.
“A ação do antropólogo é de relevância, mas a perspectiva histórica tem demonstrado que sua tarefa lhe tem sido decepcionante, em face das pressões da cultura dominante, que nem
sempre concorda com as posições teóricas e os métodos humanísticos por ele adotados, ao desempenhar o papel de conciliador entre o mundo dominante e o mundo dominado” (MARCONI;
PRESOTTO, p. 19).
Mesmo assim vale a pena insistir sobre a importância da Antropologia no
mundo de hoje. Com a sua função de produzir interpretações das diferenças e
de captar, com reverência e profunda compreensão, o essencial de cada cultura diferente, ela contribui para alargar nossas visões e romper esquemas ideológicos que tendem a desvalorizar aqueles que não são e não pensam como
nós (DAMATTA, p. 143-150). A Antropologia, mesmo no atual contexto, tem
essa função de ser ponte e mediação entre dois mundos. Cabe-lhe a tarefa de
ajudar-nos a ver o diferente não como algo exótico, distante e marginal, mas
como uma realidade familiar. Embora não deixe também de ter a função de
manter o caráter “exótico” de cada cultura, ou seja, de insistir sobre o direito
que cada cultura tem de permanecer diferente, com suas características próprias, sem que lhe seja imposta uma aculturação forçada.
Bibliografia
DAMATTA, Roberto. Relativizando. Uma introdução à Antropologia Social. Rio de Janeiro: Rocco, 1987.
MARCONI, Marina de Andrade; PRESOTTO, Zélia Maria Neves. Antropologia. Uma introdução, São Paulo: Atlas. 2006, 6ª edição.
RAMPAZZO, Lino. Antropologia, religiões e valores cristãos, São Paulo:
Loyola.
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