envelhecimento humano e as alterações na postura corporal do

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ARTIGOS DE REVISÃO
SAÚDE
ENVELHECIMENTO HUMANO E AS ALTERAÇÕES
NA POSTURA CORPORAL DO IDOSO
HUMAN AGING AND BODY POSTURE CHANGES IN THE ELDERLY
Michele Marinho da Silveira1, Adriano Pasqualotti2, Eliane Lucia Colussi3 e Lia Mara Wibelinger4
1
Fisioterapeuta pós-graduada em Ortopedia e Traumatologia, pelo Colégio Brasileiro de Estudos Sistêmicos – CBES; mestranda bolsista
do programa de pós-graduação em Envelhecimento Humano da Universidade de Passo Fundo – UPF.
2
Professor titular da Universidade de Passo Fundo – UPF; coordenador do Programa de Pós-Graduação em Envelhecimento Humano
da Universidade de Passo Fundo – UPF; doutor em Informática na Educação e mestre em Ciência da Computação, pela Universidade
Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS; editor da Revista Brasileira de Ciências do Envelhecimento Humano.
3
Professora do Programa de Pós-Graduação em Envelhecimento Humano da Universidade de Passo Fundo – UPF; mestre e doutora em
História, pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul – PUC/RS.
4
Fisioterapeuta; docente da Faculdade de Fisioterapia da Universidade de Passo Fundo – UPF; mestre e doutoranda em Gerontologia
Biomédica da PUC/RS.
RESUMO
O Brasil tem vivenciado um rápido processo de envelhecimento de sua população. Junto ao crescente aumento
da população idosa, há a necessidade de serem mais bem entendidas as alterações provocadas pelo envelhecimento e as consequências que elas acarretam para o idoso. Assim, são importantes novos estudos que mostrem melhor as alterações ocorridas na postura corporal destes indivíduos, de modo que possam ser adotadas
medidas preventivas e até corretivas desta postura, a fim de se evitarem dores e deformidades, pois a modificação da postura ereta é uma das alterações mais comuns que ocorrem no sistema osteomuscular durante o
processo do envelhecimento. Portanto, esse artigo de revisão de literatura teve como objetivo verificar, dentre vários estudos produzidos sobre a matéria, quais as alterações posturais mais presentes no idoso e relatar
as estruturas envolvidas em todo este processo, desde as manifestações clínicas do envelhecimento aos próprios conceitos sobre envelhecimento humano e idoso no contexto mundial e do País.
Palavras-chave: envelhecimento, idoso, corpo, saúde.
ABSTRACT
Brazil has experienced a rapid aging of its population.Along with the increasing aging population there is a need
to better understand the changes caused by aging and the consequences that may cause the elderly, being
important new studies that show better the changes in body posture of these individuals so that preventive
and corrective measures can be taken to this posture in order to avoid pain and deformity, because the change
of stance is one of the most common changes that occur in the musculoskeletal system in the aging process.
Therefore, this article of literature review aimed at verifying in the literature which postural alterations that
occur in the elderly are more present and report the structures involved in this process since the clinical
manifestations of aging, the very concepts of human aging and elderly in the global context and the country.
Keywords: aging, elderly, body, health.
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RBCS
1. INTRODUÇÃO
O crescimento da população de idosos é um fenômeno mundial e está sendo ultimamente enfatizado,
particularmente no que se refere às suas implicações
sociais e em termos de saúde pública. A Organização
Mundial de Saúde (OMS) previu que, em 2025, a população mundial de pessoas com mais de 60 anos será
de, aproximadamente, 1,2 bilhões, sendo que os muitos
idosos (com 80 anos ou mais) constituem o grupo
etário de maior crescimento (WHO, 2004).
Segundo dados do IBGE (2000), no Brasil, a população de idosos representa um contingente de quase
15 milhões de pessoas com 60 anos ou mais de idade,
o que corresponde a 8,6% da população brasileira. As
mulheres vivem, em média, oito anos a mais que os
homens, e correspondem a 55,1% da população idosa.
Em 2025, os idosos representarão 14% dos brasileiros,
e o Brasil terá uma proporção de idosos semelhante à
que é hoje registrada em países desenvolvidos (COELHO
FILHO & RAMOS, 1999).
2. ENVELHECIMENTO HUMANO E AS
SUAS MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
NO IDOSO
É notório o rápido crescimento do tempo de vida
da população brasileira nas últimas décadas. O índice
de envelhecimento da população, que era igual a 6,4%
em 1960, alcançou 13,9% em 1991, representando 7,5%
da população de idosos em todo o mundo, o que
demandará custos com políticas públicas de saúde
(CHAIMOWICZ, 1997).
No Brasil, considera-se idoso o indivíduo que tem
60 anos ou mais de idade. É uma fase da vida em que
as pessoas tiveram muito ganhos, mas também muitas
perdas, dentre as quais se destaca a saúde como um
dos aspectos mais afetados nos idosos (RODRIGUES &
DIEGO, 1996).
Segundo Passerino & Pasqualotti (2006), o envelhecimento humano compreende todos os processos de
transformação do organismo, tanto físicos quanto
psicológicos e sociais, envolvendo, principalmente,
papéis sociais desempenhados pelos indivíduos.
Em adição, observa-se que o envelhecimento manifesta-se por declínio das funções dos diversos órgãos
e sistemas, que caracteristicamente tendem a ser lineares em função do tempo, não se conseguindo definir
um ponto exato de transição. O termo idoso inicia-se
aos 65 anos em países desenvolvidos e aos 60 anos
nos países em desenvolvimento (PAPALÉO NETTO &
PONTE, 1996).
Já para Papaléo Netto (2002), o envelhecimento
pode ser conceituado como um processo dinâmico e
progressivo, no qual há alterações morfológicas, funcionais e bioquímicas, que vão alterando progressivamente o organismo, tornando-o mais suscetível às
agressões intrínsecas e extrínsecas que terminam por
levá-lo à morte.
Nessa perspectiva, nem todas as pessoas chegam à
velhice no mesmo estado – umas são mais vigorosas,
mais autônomas e mais desenvolvidas do que outras,
que não conseguem conservar seu dinamismo. Assim,
alguns idosos estão mais propensos do que outros a
diversas condições patológicas que podem levar a alterações da mobilidade, do equilíbrio e da postura (SOARES
et al., 2003; RUWER, ROSSI & SIMON, 2005).
Além disso, o envelhecimento pode ser considerado
como um processo de mudanças universais, pautando
geneticamente para a espécie e para cada indivíduo,
que se traduz em diminuição da plasticidade comportamental, em aumento da vulnerabilidade, em acumulação
de perdas evolutivas e no aumento da probabilidade
de morte. O ritmo, a duração e os efeitos desse processo comportam diferenças individuais e de grupos
etários, dependentes de eventos e natureza genéticobiológica, sócio-histórica e psicológica (NÉRI, 2001).
A alteração da postura corporal é um dos problemas mais frequentes relacionados ao envelhecimento,
pois há uma dificuldade na execução dos movimentos
com rapidez, sendo que, desta forma, o equilíbrio
corporal fica mais difícil (KNOPLICH, 2001). Por isso, esse
artigo de revisão de literatura pretende estudar as alterações que ocorrem na postura corporal com o processo de envelhecimento, de modo que possam ser
adotadas medidas preventivas e até corretivas desta
postura a fim de evitar dores e deformidades nos
idosos.
Os sinais do envelhecimento vão aparecendo com
a idade, incluindo-se neles os seguintes aspectos:
branqueamento e espessamento do cabelo; perda de
elasticidade e secura da pele; possibilidade de a audição
ficar prejudicada, a visão diminuída, a adaptação ao escuro limitada e a fala tornar-se restrita; o aprendizado
e a memória de curto prazo ficam prejudicados; os limiares da dor passam a ser altos e a sensibilidade a ela
se manifesta em menor intensidade; o sistema cardiovascular diminui quanto à eficiência, ocorrendo uma
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mobilidade torácica mais restrita; e a capacidade vital
é reduzida (THOMPSON, SKINNER & PIERCY, 2002).
3. ALTERAÇÕES NA POSTURA
CORPORAL DO IDOSO
Os idosos apresentam, também, diminuição da
elasticidade dos tecidos moles, as articulações são
menos capazes de absorver pressões e tornam-se mais
rígidas, as cartilagens menos elásticas, o poder muscular
diminui, levando à desaceleração dos movimentos e à
perda da coordenação, ossos podem se tornar
osteoporóticos, aparecem as dificuldades com o equilíbrio e alterações na postura corporal (THOMPSON, SKINNER & PIERCY, 2002).
A manifestação do processo de envelhecimento é
variável tanto em indivíduos da mesma espécie como
de espécies diferentes. Esta constatação motiva pesquisadores a buscarem inúmeras definições sobre o
que vem a ser envelhecimento, o que não impede que
essas várias definições tenham algo em comum, que é
a ideia de declínio das funções fisiológicas do corpo,
perda da funcionalidade com o avanço da idade, aumento da incidência de doenças e elevação da probabilidade
da morte (MOTA, FIGUEIREDO & DUARTE, 2004).
Nessa perspectiva, outras modificações ocorrem
com o envelhecimento, segundo Papaléo Netto (2009),
revelando que a musculatura apresenta-se com uma
espessura menor; os vasos sanguíneos ficam mais frágeis, propiciando fácil aparecimento de lesões e alterações; com o passar do tempo, a pele perde colágeno
e elastina, originando as rugas e hematomas por pequenas batidas e levando, ainda, à hipotermia facilmente
em situações de queda brusca de temperatura; o aparecimento de manchas é comum, principalmente em
áreas muito expostas à luz; há queda da massa óssea,
perda de massa muscular, diminuição dos espaços intraarticulares, alterações do sistema nervoso decorrentes
da perda de massa encefálica, com consequente comprometimento de equilíbrio. Ocorrem, também, transformações no miocárdio e no sistema respiratório,
com a diminuição da expansão torácica e, pelas modificações posturais, há alteração da relação ventilaçãoperfusão; o sistema digestivo fica mais lento, acontecem
mudanças nos índices hormonais, com diminuição da
produção de estrógeno nas mulheres e redução gradual
de testosterona nos homens; o sistema urinário e o
glandular também sofrem um processo degenerativo
com o passar dos anos (PAPALÉO NETTO, CARVALHO FILHO
& SALLES, 2005).
Sendo assim, o envelhecimento não é somente uma
passagem pelo tempo; mais do que isto, é o acúmulo
de eventos biológicos que ocorrem ao longo do tempo.
O envelhecimento, portanto, pode ser definido como
a perda das habilidades de adaptação ao meio.Assim, a
idade biológica e funcional torna-se a forma mais adequada de se medir o envelhecimento e suas adaptações
(ACSM, 2001). Por conseguinte, são importantes estudos que mostrem melhor as alterações ocorridas no
idoso com sua postura corporal, de forma que se possa
conhecer melhor esta postura a fim de minimizar e
até prevenir alterações patológicas que causem dor e
desconforto neste indivíduo.
54
Conforme salientaram Papaléo Netto, Carvalho
Filho & Salles (2005), o corpo humano é uma máquina
perfeita, mas, como toda máquina que é utilizada constantemente, após um certo tempo de uso, começa a
apresentar alterações. A partir dos 40 anos, a estatura
começa a se reduzir em torno de um centímetro por
década – isso se deve à redução dos arcos plantares,
ao aumento da curvatura da coluna vertebral, à redução
do volume dos discos intervertebrais, o que, por sua
vez, ocorre porque o volume de água do corpo diminui
através de perda intracelular. Constatam-se, também,
reduções do número de células nos órgãos, o que leva
à perda de massa, principalmente em fígado e rins
(CARVALHO FILHO & PAPALÉO NETTO, 2000).
Muitas dessas transformações acontecem lentamente com o passar de décadas devido a alguns fatores,
como os patológicos, os traumáticos ou os degenerativos, ou ainda decorrentes de alterações musculoesqueléticas e neurológicas primárias. As mudanças
decorrentes do avanço da idade manifestam-se principalmente no plano sagital e incluem algumas características, como o aumento da curvatura cifótica da
coluna torácica, a diminuição da lordose lombar, o aumento do ângulo de flexão do joelho, o deslocamento
da articulação coxofemoral para trás e a inclinação do
tronco para diante, acima dos quadris (KENDALL, 1995).
Entretanto, não é possível definir o que se poderia
chamar de postura típica, dada a enorme variabilidade
que se observa na posição bípede dos indivíduos da
terceira idade (PICKLES et al., 2002).
Diante disso, a postura é, em termos gerais, definida
como uma posição ou atitude em que a estrutura corporal se mantém relativamente em alinhamento, considerando-se as várias partes que a compõem, para uma
atividade específica, ou uma maneira característica de
sustentar o próprio corpo.Algumas estruturas são res-
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ponsáveis pela sustentação do corpo, dentre elas estão
ligamentos, fáscias, ossos e articulações, enquanto que
os músculos e seus tendões são estruturas dinâmicas
com o propósito de manter o corpo em uma postura
ou movimentá-lo de uma postura para outra (KISNER &
COLBY, 1998).
Em adição, uma postura alerta e ativa é o resultado
de uma atividade mental sobre o corpo, promovendo,
assim, o equilíbrio e a estabilidade do corpo e da mente.
A postura errada está ligada a uma contração excessiva
dos músculos, que diminui a atividade dos fusos musculares do sistema gama, provocando uma carência de
transmissão de impulsos do cérebro, que não é informado sobre o grau de deformidade corporal que o
organismo assumiu, de modo que a postura, por isso,
não é corrigida (CLARKSON, 2003).
Já para Kauffman (2001), a postura é o alinhamento
das partes do corpo entre si em um dado momento;
ela envolverá interações complexas entre os ossos, as
articulações, o tecido conjuntivo, os músculos esqueléticos e os sistemas nervoso e periférico. Além disso,
com o passar do tempo, cada organismo sofre alterações decorrentes de microtraumatismos, de lesões
francas e de patologias do tecido conjuntivo, nos músculos e nos mecanismos de controle neural, que resultam nas variações singulares da postura do idoso.
Entretanto, as alterações de postura não são inevitáveis nem se manifestam obrigatoriamente juntas. Essas transformações surgem como mecanismo do corpo de sustentação, o qual consiste em assegurar uma
postura ereta, sem desvios. No idoso, estas mudanças
se manifestam após os 40 anos de idade, principalmente
no plano sagital, caracterizando-se por um aumento
da curvatura da coluna torácica, um aumento ou diminuição da lordose lombar, o que contribui, assim, para
a diminuição de estatura e para a posição inclinada, e
pode acarretar desvios posturais, comprometendo,
dessa forma, as AVDs1 (PICKLES et al., 2002).
Nem todas as modificações na postura podem ser
classificadas como defeituosas ou anormais; algumas
delas podem ser alterações compensatórias normais,
resultantes de outras mutações neuromuscoloesqueléticas na coluna vertebral, nos membros ou nos mecanismos de controle central. São numerosas combinações de alterações resultantes do desgaste natural,
de maus hábitos posturais e de patologias no sistema
1
Atividades de vida diária.
neuromusculoesquelético. Estas alterações provocam
as características posturais singulares dos indivíduos
idosos (KAUFFMAN, 2001).
As transformações posturais são frequentes e
atuam como forma predisponente de incapacidade,
provocando diminuição na qualidade de vida do idoso
(LIANZA, 2001). Em todo o corpo, atuam as cadeias musculares, onde uma tensão inicial é responsável por uma
sucessão de tensões associadas. Cada vez que um
músculo sofre encurtamento, ele aproxima suas extremidades e desloca os ossos sobre as quais ele se insere
– assim as articulações se bloqueiam e o corpo se
deforma (SOUCHARD, 1986).
Toda deformidade, seja qual for sua natureza, propiciará sempre uma ou mais compensações, que poderão, por sua vez, acarretar deformidades (BIENFAIT,
1987). Toda pressão permanente de uma cadeia muscular pode modificar a estática (BUSQUET, 2001).
Os fatores traumáticos desequilibram a estrutura
corporal, devido a uma lesão direta ou indireta em um
dos componentes do aparelho locomotor, impossibilitando, desta maneira, uma postura adequada e perfeita. Há relatos, ainda, segundo os quais o quadro emocional reflete-se com grande frequência no padrão
postural do indivíduo idoso. Em geral, seres humanos
confiantes e positivos apresentam um padrão postural
adequado, ocorrendo o contrário com pessoas deprimidas e insatisfeitas (LIANZA, 2001).
As alterações degenerativas associadas à idade
podem afetar predominantemente o disco vertebral
de alguns pacientes, enquanto em outros podem vitimar, principalmente, as articulações apofisárias.A maioria dos discos mostra alguns sinais de degeneração
com a idade, sendo que, combinado com a diminuição
da altura do corpo vertebral, isso resulta numa diminuição da estatura do idoso. Ressalta-se, também, que a
degeneração do disco e, subsequentemente, a reduzida
capacidade de absorção de choques da coluna vertebral
contribuem para a formação de osteófitos (OLIVER &
MIDDLEDITCH, 1998).
Segundo Guccione (2002), com o processo do
envelhecimento, a arquitetura óssea que compõe e
sustenta o corpo humano sofre uma considerável alteração, no que diz respeito à densidade mineral óssea e
à microarquitetura óssea durante o envelhecimento.
Sabe-se que há uma redução na densidade dos ossos
e, que essa redução, dá-se mais precocemente na coluna vertebral que nos membros. A perda óssea em
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homens acontece em uma taxa média de 0,4% por
ano, iniciando-se aos 50 anos de idade, mas não se torna
caracteristicamente problemática até que o homem
esteja na faixa dos 80 anos. Em homens e mulheres
entre 60 e 80 anos, a taxa média de diminuição na altura
é de cerca de dois centímetros por década, podendo
atingir até 12cm nos casos mais extremos de perda
óssea; em homens e mulheres entre 60 e 80 anos, a
taxa média de diminuição na altura é de cerca de dois
centímetros por década, podendo atingir até 12cm nos
casos mais extremos de perda óssea.
O idoso não está sujeito apenas a modificações na
sua arquitetura ou na sua densidade óssea; a alteração no
disco intervertebral relacionada à idade é um fenômeno
bastante conhecido e que, segundo Hall (1993), acontece
durante toda a existência do indivíduo, iniciando-se por
volta da segunda década de vida. Vale lembrar que o
envelhecimento altera as propriedades e a proporção
relativa dos elementos do tecido conjuntivo do disco
intervertebral, sendo que a elastina torna-se menos
distensível e pode sofrer fragmentações sucessivas.
Hall (1993) afirmou, também, que as lesões e o
envelhecimento reduzem irreversivelmente a capacidade de absorção de água pelos discos, resultando
numa diminuição na sua capacidade de absorção de
choque. O referido autor disse ainda que um disco
geriátrico típico possui um conteúdo líquido reduzido
em cerca de 35%. Com a ocorrência dessa alteração
degenerativa fisiológica, movimentos anormais entre
os corpos vertebrais adjacentes serão observados, e
uma maior proporção das cargas compressivas, de
tração e de cisalhamento que agem sobre a coluna
deverá ser suportada por outras estruturas – mais
especificamente as facetas e as cápsulas articulares.
Em adição, observam-se alterações da estrutura do
colágeno como redução do comprimento das cadeias
de condroitina na cartilagem articular. Porém, é importante salientar que tais alterações não indicam que a
pessoa possui uma doença articular degenerativa ou
virá a apresentá-la, e sim que existe uma possibilidade
aumentada de que a cartilagem articular possa passar
por microfraturas ou lesões a partir de forças como
desgaste, obesidade, trauma, doença metabólica ou
fatores hereditários (GUCCIONE, 2002).
Para Kauffman (2001), no idoso, o comprimento
do músculo pode estar aumentado ou diminuído. Há
perda das fibras musculares, o que provavelmente resulta em redução da força. Com relação à força muscular, Guccione (2002) referiu que esta atinge seu má56
ximo com cerca de 30 anos e permanece constante
até cerca de 50 anos, começando, então, a mostrar
uma perda crescente que faz algum paralelo com o
declínio do tecido corporal magro.
A alteração existente entre a relação das fibras do
tipo I e II implicaria diretamente a resposta e os mecanismos do controle postural, pois tal alteração foi descrita por Guccione (2002), relatando que a diminuição
na quantidade de fibras musculares do tipo II de contração rápida, à medida que a pessoa envelhece, associada ainda à redução na atividade da miosina adenosino-trifosfase, tende a explicar por que existe um alongamento no tempo para atingir a tensão máxima do
músculo e um alongamento da metade do tempo de
relaxamento. As consequências funcionais da atrofia
muscular pré-vertebral e pós-vertebral poderiam resultar em algumas das alterações posturais e biomecânicas observadas em idosos.
Matsudo (2001) relatou, também, que o decréscimo
da massa muscular e, por consequência, da força muscular é o principal fator a se levar em conta para notar
a deterioração da mobilidade e da capacidade funcional
do ser humano no processo de envelhecimento.
Portanto, no idoso, pode-se observar uma diminuição da funcionalidade e da integridade destas estruturas
já citadas, as quais começam a resultar em alterações
e aquisições de formas senis, causando compensações
ao alinhamento da coluna vertebral, decorrentes da
perda da estatura. Esta, por sua vez, é influenciada pela
diminuição do arco medial do pé, por um aumento
das curvaturas da coluna, bem como pela diminuição
no tamanho da coluna vertebral, aspectos decorrentes
da perda de água dos discos intervertebrais, ocasionada
pelos esforços a que muitos seres humanos são submetidos no decorrer das suas vidas. Constatou-se, além
disso, a influência de vários outros fatores, como estilo
de vida, sedentarismo, hábitos alimentares, enfim, aspectos sociais e ambientais que estão presentes no
cotidiano do idoso em geral (PICKLES et al., 2002).
Sendo assim, a escolha da postura para a correção
postural deve levar em conta a avaliação realizada com
o indivíduo, de modo que se tenha clareza do tipo de
correção mais indicado para cada grupo muscular
afetado (MARQUES, 2000).Todo tratamento postural deve
atingir a globalidade do sistema musculoesquelético,
pois há uma interação entre todos os segmentos corpóreos, sendo impossível a disfunção atingir isoladamente um único músculo ou articulação. O controle
da postura não é um ato apenas musculoarticular, e
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sim um complexo neuromotor, daí a importância da
participação ativa do paciente no programa de
tratamento (CAILLIET, 1998).
4. CONCLUSÃO
Como se pode observar, as alterações posturais se
iniciam com o processo do envelhecimento a partir dos
40 anos de idade. As características desse quadro mais
comuns ao idoso são as seguintes: o aumento da curvatura cifótica da coluna torácica; a diminuição da lordose
lombar; a ampliação do ângulo de flexão do joelho; o
deslocamento da articulação coxofemoral para trás; e a
inclinação do tronco para diante, acima dos quadris.
A alteração da postura corporal é um dos problemas mais frequentes relacionados ao envelheci-
mento, pois há uma dificuldade na execução dos
movimentos com rapidez. Desta forma, o equilíbrio
corporal fica mais difícil, sendo de extrema importância
que se conheçam as transformações que ocorrem na
postura corporal com o processo de envelhecimento,
de modo que possam ser adotadas medidas preventivas e até corretivas desta postura, a fim de evitar
dores, deformidades nos idosos, além de dificuldades
de locomoção e equilíbrio, melhorando a qualidade de
vida desses indivíduos.
Sugere-se que novos estudos sejam realizados a
fim de que, a partir do conhecimento destas alterações
posturais e do que elas podem causar no idoso, busquem-se alternativas para um envelhecimento mais
saudável, e com uma postura mais adequada.
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Endereço para correspondência:
Michele Marinho da Silveira. Rua Palmeira, n. 20, apto. 803. Bairro Vera Cruz – CEP 99040-460, Passo Fundo, Rio Grande do Sul.
E-mail: [email protected]. (Trabalho realizado na Universidade de Passo Fundo, Rio Grande do Sul).
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Revista Brasileira de Ciências da Saúde, ano 8, nº 26, out/dez 2010
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