Supremo Tribunal Federal 1 Coordenadoria de Análise de Jurisprudência DJe nº 54 Divulgação 20/03/2013 Publicação 21/03/2013 Ementário nº 2683 - 01 02/05/2012 PLENÁRIO AÇÃO CÍVEL ORIGINÁRIA 312 BAHIA RELATOR REDATOR DO ACÓRDÃO AUTOR(A/S)(ES) PROC.(A/S)(ES) LIT.ATIV.(A/S) ADV.(A/S) ASSIST.(S) ADV.(A/S) RÉU(É)(S) ADV.(A/S) RÉU(É)(S) ADV.(A/S) RÉU(É)(S) ADV.(A/S) RÉU(É)(S) ADV.(A/S) RÉU(É)(S) ADV.(A/S) LIT.PAS.(A/S) PROC.(A/S)(ES) RÉU(É)(S) ADV.(A/S) RÉU(É)(S) ADV.(A/S) RÉU(É)(S) ADV.(A/S) RÉU(É)(S) ADV.(A/S) : MIN. EROS GRAU : MIN. LUIZ FUX : FUNDAÇÃO NACIONAL DO ÍNDIO - FUNAI : PROCURADOR-GERAL FEDERAL : UNIÃO : ADVOGADO -GERAL DA UNIÃO : COMUNIDADE INDÍGENA PATAXÓ Hà Hà HÃE : PAULO MACHADO GUIMARÃES : ANANIAS MONTEIRO DA COSTA : PEDRO AUGUSTO DE FREITAS GORDILHO : ALMIR PINTO CORREIA : ALTAMIRANDO MARQUES : AGENOR DE SOUZA BARRETO : WHILDE COSTA SOUZA : JOSINO PINTO CORREIA E OUTRO(A/S) : PEDRO AUGUSTO DE FREITAS GORDILHO : MANOEL NASCIMENTO CARVALHO : EDVALDO SANTIAGO : ESTADO DA BAHIA : PROCURADOR-GERAL DO ESTADO DA BAHIA : ANTÔNIO RODRIGUES FERREIRA E OUTROS : PEDRO AUGUSTO DE FREITAS GORDILHO : ANTONIO CARLOS WENSE PINTO : VINICIUS BRIGLIA PINTO : DIRVAN SILVEIRA FERNANDES E OUTROS : MARCOS JOEL DOS SANTOS : GUY FERREIRA DE MELLO E OUTROS : MARCELO MENDES S. PATRIOTA EMENTA: 1) AÇÃO CÍVEL ORIGINÁRIA. AÇÃO DE NULIDADE DE TÍTULOS DE PROPRIEDADE SOBRE IMÓVEIS RURAIS SITUADOS NO SUL DA BAHIA EM RESERVA INDÍGENA. 2) CONFLITO GRAVE ENVOLVENDO COMUNIDADES Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3478833. Supremo Tribunal Federal 2 ACO 312 / BA SITUADAS NA RESERVA INDÍGENA DENOMINADA CARAMARUMU-CATARINA-PARAGUAÇU. AÇÃO JUDICIAL DISTRIBUÍDA EM 1982 IMPONDO A OBSERVÂNCIA DO REGIME JURÍDICO CONSTITUCIONAL DA CARTA DE 1967 PARA DISCIPLINAR A RELAÇÃO MATERIAL SUB JUDICE. 3) PRELIMINAR DE IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO EM RAZÃO DA INEXISTÊNCIA DE INDIVIDUALIZAÇÃO DA PROPRIEDADE REIVINDICADA. PRELIMINAR REJEITADA À LUZ DO PEDIDO DE RECONHECIMENTO DA NULIDADE DE TÍTULOS DE PROPRIEDADE EM ÁREA INDÍGENA MERCÊ DA EXISTÊNCIA DE FARTA DOCUMENTAÇÃO FORNECIDA PELA FUNAI QUE VIABILIZOU A REALIZAÇÃO DOS TRABALHOS PERICIAIS. 4) DEMARCAÇÃO DA ÁREA SUB JUDICE OCORRIDA EM 1938 DESACOMPANHADA DE HOMOLOGAÇÃO. INCERTEZA ORIUNDA DA AUSÊNCIA DE HOMOLOGAÇÃO DA DEMARCAÇÃO DE TERRAS INDÍGENAS RELEGANDO A COMUNIDADE A UMA SITUAÇÃO FRÁGIL E A UM AMBIENTE DE VIOLÊNCIA E MEDO NA REGIÃO. 5) A HOMOLOGAÇÃO AUSENTE, DA DEMARCAÇÃO ADMINISTRATIVA REALIZADA EM 1938, NÃO INIBE O RECONHECIMENTO DA EXISTÊNCIA DE RESERVA INDÍGENA NO LOCAL, ORIGINANDO A IMPOSSIBILIDADE DE SE TER POR VÁLIDOS ATOS JURÍDICOS FORMADOS POR PARTICULARES COM O ESTADO DA BAHIA. 6) AUSÊNCIA DE DÚVIDAS QUANTO À PRESENÇA DE ÍNDIOS NA ÁREA EM LITÍGIO DESDE O PERÍODO ANTERIOR AO ADVENTO DA CARTA DE 1967 EM FACE DOS REGISTROS HISTÓRICOS QUE REMONTAM A MEADOS DO SÉCULO XVII. 7) O RECONHECIMENTO DO DIREITO À POSSE PERMANENTE DOS SILVÍCOLAS INDEPENDE DA CONCLUSÃO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO DE DEMARCAÇÃO NA MEDIDA EM QUE A TUTELA DOS ÍNDIOS DECORRE, DESDE SEMPRE, DIRETAMENTE DO TEXTO CONSTITUCIONAL. 2 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3478833. Supremo Tribunal Federal 3 ACO 312 / BA 8) A BAIXA DEMOGRAFIA INDÍGENA NA REGIÃO EM CONFLITO EM DETERMINADOS MOMENTOS HISTÓRICOS, PRINCIPALMENTE QUANDO DECORRENTE DE ESBULHOS PERPETRADOS POR FORASTEIROS, NÃO CONSUBSTANCIA ÓBICE AO RECONHECIMENTO DO CARÁTER PERMANENTE DA POSSE DOS SILVÍCOLAS. A REMOÇÃO DOS ÍNDIOS DE SUAS TERRAS POR ATOS DE VIOLÊNCIA NÃO TEM O CONDÃO DE AFASTAR-LHES O RECONHECIMENTO DA TRADICIONALIDADE DE SUA POSSE. IN CASU, VISLUMBRA-SE A PERSISTÊNCIA NECESSÁRIA DA COMUNIDADE INDÍGENA PARA CONFIGURAR A CONTINUIDADE SUFICIENTE DA POSSE TIDA POR ESBULHADA. A POSSE OBTIDA POR MEIO VIOLENTO OU CLANDESTINO NÃO PODE OPOR-SE À POSSE JUSTA E CONSTITUICONALMENTE CONSAGRADA. 9) NULIDADE DE TODOS OS TÍTULOS DE PROPRIEDADE CUJAS RESPECTIVAS GLEBAS ESTEJAM LOCALIZADAS DENTRO DA ÁREA DE RESERVA INDÍGENA DENOMINADA CARAMURU-CATARINAPARAGUAÇU, CONFORME DEMARCAÇÃO DE 1938. AQUISIÇÃO A NON DOMINO QUE ACARRETA A NULIDADE DOS TÍTULOS DE PROPRIEDADE NA REFERIDA ÁREA INDÍGENA, PORQUANTO OS BENS TRANSFERIDOS SÃO DE PROPRIEDADE DA UNIÃO (SÚMULA 480 DO STF: Pertencem ao domínio e administração da União, nos termos dos artigos 4, IV, e 186, da Constituição Federal de 1967, as terras ocupadas por silvícolas). 10) A IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO ERIGIDA PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL IMPÕE QUE AS AÇÕES JUDICIAIS PENDENTES EM QUE SE DISCUTE O DOMÍNIO E/OU A POSSE DE IMÓVEIS SITUADOS NA ÁREA RECONHECIDA NESTE PROCESSO COMO RESERVA INDÍGENA SEJAM EXTINTAS SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO NOS TERMOS DO ART. 267, INCISO V, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. 11) O RESPEITO ÀS COMUNIDADES ÍNDIGENAS E À SUA CULTURA IMPLICA RESTE PRESERVADA A POSSIBILIDADE DE SUPERVENIENTE INCLUSÃO, PELA UNIÃO, ATRAVÉS DE 3 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3478833. Supremo Tribunal Federal 4 ACO 312 / BA DEMARCAÇÃO ADMINISTRATIVA OU MESMO JUDICIAL, DE NOVAS ÁREAS NA RESERVA INDÍGENA CARAMURU-CATARINAPARAGUAÇU ALÉM DA JÁ RECONHECIDA NESTES AUTOS. 12) DEVERAS, A EVENTUAL AMPLIAÇÃO DA ÁREA ANALISADA NESTES AUTOS EM RAZÃO DE DEMARCAÇÃO SUPERVENIENTE A ESTE JULGAMENTO DEMANDARÁ COMPROVAÇÃO DE QUE O ESPAÇO GEOGRÁFICO OBJETO DE EVENTUAL AMPLIAÇÃO CONSTITUÍA TERRA TRADICIONALMENTE OCUPADA PELOS ÍNDIOS QUANDO DA PROMULGAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO DE 1988. 13) AÇÃO JULGADA PARCIALMENTE PROCEDENTE APENAS QUANTO AOS TÍTULOS DE PROPRIEDADE E REGISTROS IMOBILIÁRIOS REFERENTES AOS IMÓVEIS ABRANGIDOS PELO ESPAÇO GEOGRÁFICO DEMARCADO EM 1938 E COMPROVADO NESTES AUTOS, TOTALIZANDO APROXIMADAMENTE 54 MIL HECTARES. SOB ESSE ÂNGULO, A AÇÃO FOI JULGADA PROCEDENTE PARA RECONHECER A CONDIÇÃO JURÍDICOCONSTITUCIONAL DE TERRA INDÍGENA SOBRE A TOTALIDADE DA ÁREA DEMARCADA EM 1938 E TOTALIZANDO CERCA DE 54 MIL HECTARES CORRESPONDENTES À RESERVA CARAMARUCATARINA-PARAGUAÇU, E DECLARAR A NULIDADE DE TODOS OS TÍTULOS DE PROPRIEDADE CUJAS RESPECTIVAS GLEBAS ESTEJAM LOCALIZADAS NA ÁREA DA RESERVA. 14) AS RECONVENÇÕES RELATIVAS ÀS TERRAS SITUADAS NO INTERIOR DA ÁREA DEMARCADA EM 1938 IMPROCEDEM. CONDENAÇÃO DESSES RÉUS RECONVINTES, CUJOS TÍTULOS FORAM ANULADOS, A PAGAREM 10% (DEZ POR CENTO) SOBRE O VALOR ATUALIZADO DA CAUSA E COMPENSADOS OS HONORÁRIOS DOS OUTROS RECONVINTES QUE DECAÍRAM DA RECONVENÇÃO. AC ÓRDà O Vistos, relatados e discutidos este autos, acordam os Ministros do 4 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3478833. Supremo Tribunal Federal 5 ACO 312 / BA Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, sob a Presidência do Senhor Ministro Ayres Britto, na conformidade da ata de julgamentos e das notas taquigráficas, por maioria, preliminarmente, em acolher a questão de ordem suscitada pela Senhora Ministra Cármen Lúcia no sentido de dar continuidade, ao julgamento da ACO 312, vencido o Senhor Ministro Marco Aurélio. Por unanimidade, o Tribunal rejeitou a preliminar de impossibilidade jurídica do pedido. Em seguida, o Tribunal, por maioria, julgou parcialmente procedente a ação para declarar a nulidade de todos os títulos de propriedade cujas respectivas glebas estejam localizadas dentro da área da Reserva Indígena CaramuruParaguaçu, todos eles, e, em conseqüência, julgadas improcedentes as reconvenções dos titulares desses títulos anulados, carecedores de ação os demais reconvintes, condenados os réus cujos títulos foram anulados a pagarem honorários de 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa e compensados os honorários dos outros reconvintes que decaíram da reconvenção, vencido o Senhor Ministro Marco Aurélio, que julgava improcedente ação e prejudicados os pedidos de reconvenção. Brasília, 2 de maio de 2012. Ministro LUIZ FUX – Relator para o acórdão Documento assinado digitalmente 5 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3478833. 24/09/2008 TRIBUNAL PLENO AÇÃO CÍVEL ORIGINARIA 312-1 BAHIA RELATOR AUTORA ADVOGADO(A/S) LITISCONSORTE(S) ATIVO(A/S) ADVOGADO(A/S) RÉUS ADVOGADO(A/S) RÉUS ADVOGADO RÉUS ADVOGADA RÉU ADVOGADO RÉU ADVOGADOS LITISDENUNCIADO ADVOGADOS : : : : MIN. EROS GRAU FUNDAÇÃO NACIONAL DO ÍNDIO - FUNAI ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO UNIÃO : : : : : : : : : : : : : ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO ANANIAS MONTEIRO DA COSTA E OUTROS JOSÉ GUILHERME VILLELA E OUTROS ALMIR PINTO CORREIA ALTAMIRANDO MARQUES AGENOR DE SOUZA BARRETO E OUTROS WHILDE COSTA SOUZA JOSINO PINTO CORREIA HUMBERTO DE FIGUEIREDO MACHADO MANOEL NASCIMENTO CARVALHO EDVALDO SANTIAGO E OUTROS ESTADO DA BAHIA PGE-BA - ANTÔNIO JOSÉ TELLES DE VASCONCELLOS E OUTROS R E L A T Ó R I O O declaratória imóveis Índio o 1 SENHOR de rurais. - FUNAI nulidade Ação contra de julho de 1982 2. A autora concedeu parte do Estado. MINISTRO títulos Eros de títulos proposta Ananias pela de da [fls. 2/22 - vol. I ) . relata o Governo que de em área diversos Trata-se Costa do ação ao de Nacional do e outros em Estado indígena municípios de propriedade Fundação Monteiro de propriedade território Grau: da Bahia que abrange sul daquele ACO 312 / BA 3. Afirma terras, sendo que os indígenas submetidos sobrevivência. Ações de às foram mais expulsos adversas agricultores locais, de suas condições de ocupantes da área, contribuíram para acelerar a dispersão dos silvícolas, ações expressivas de malocas, de violência de toda ordem, desde a queima destruição de roçados e castigos físicos à pressão moral e psicológica. 4. As ali terras viviam desde possuídas tempos Sapuyá, Baenã, Kariri pelos membros imemoriais, e Kamakã, vieram das tribos Pataxós sendo que Hã-hã-hãe, paulatinamente invadidas. 5. a 0 Governo delimitação 1.916, de 9 de cinqüenta FUNAI de ocupação agosto de 1926, das aponta silvícola a a posse "porque imemorialmente" A supervisionada relatório livre ou de da de terras delas a Lei n. reserva de "destinadas â ali o Governo e a gozo que local à já era índios dos habitantes". A garantindo terra os a naturaes outros área, uma indígenas, estabelecendo de e Patachos, delimitação dos florestaes a circunstância união, 6. quadradas 1 essências Tupynambás determinado da área léguas conservação índios da do Estado da Bahia determinou, em 192 6, ter apenas comunidade de já domínio usufruíam [fl. 4 - vol. I ] , demarcação pelo foi Engenheiro final, apresentado realizada Alfredo de por Amorim equipe Coelho. 0 em 19 38. Aí a origem da Reserva 1 Segundo dados do Ministério do Desenvolvimento agrário, in http://www.mda.gov.br/arquivos/TABELA_MEDIDA_AGRARIA_NAO_DECIMAL.pdf, uma légua quadrada, no Estado da Bahia, equivale a 4.356 ha, o que totaliza uma área de 217.800 ha, destinados originalmente aos indígenas, área que foi reduzida em 1937. ACO 312 / BA Indígena órgão Caramuru-Catarina-Paraguaçu. de proteção da Guerra, forma aos resolveu de "adotar resolver civilizada que se envolvidas pela índios, então os Após delimitação, vinculado ao encontrava sociais ocupando indígena", e o da como população explorando que o Ministério o instituto do arrendamento problemas reserva a terras contribuiu para acirrar os ânimos na região. 7. A Coelho: grado esses se agregados sabendo fl. autora de do "quando legítimos estavam relatou com em que "não semelhante de a ser [fl. de situação, nenhum apresenta surgiam recomendáveis de demarcação novas e ao da maneira já foi região, o alguma serem se donos O que é mais comprobatórios notícia e afirma com respondíamos que das "de dos tentativas vez insinuações sempre mas com altivez" [fl. 7 - vol. I e fl. 4.109 8. moradores foi vítima durante a execução tentativas, que dá bom 6 - vol. I e alegando títulos Amorim muito arrancharam fazendeiros quizeram alegados!". O engenheiro trabalhos porém se índios" aos que [sic] ali de de corrupção de que sua equipe dos engenheiro humilde passarem terras do das terras que ocupavam. E [ilegível] interessante, direitos Posto", relato "gente - vol. X I I ] . Quanto engenheiro conformar ocupantes, conformaram que 4.109 transcreve com em não quando muito prudência, - vol. X I I ] . A área era inalienável, nos termos do artigo 75 da então vigente Lei sê-lo apenas se usufrutuário. n. e 601/1850 quando da [Lei de Terras], emancipação do deixando grupo de tribal ACO 312 / BA 9. Sobreveio assegurava achem "a posse de permanentemente vedado menciona conta da Quanto trechos existência desde 1.651 10. terras de de de à 1934, cujo silvícolas localizados, aliená-las". FUNAI a a Constituição nellas sendo-lhes, no "permanente relatos de tribos que art. 129 entanto, localização", antropológicos indígenas se Pataxós que na a dão região [fls. 9/10 - vol. I ] . A autora sustenta que a lei baiana de 1.926 operou doação ficando da área ela demarcada em posteriormente 1938 aos abrangida índios pela Pataxós, proteção da legislação federal. 0 Estado da Bahia perdeu então "o poder de disposição sobre tais terras" [fl. 11 - vol. I ] . 11. dos Daí "atos abusiva ainda do Governo e a ilegalidade do Estado e da desrespeitosamente, inconstitucionalidade Bahia, títulos fazendo expedir, definitivos de propriedade em nome de invasores, posseiros, arrendatários e grileiros, incidentes Caramuru-Catarina sobre a Paraguassu". área Os da Reserva títulos Indígena expedidos pelo Estado seriam nulos de pleno direito, vez que decorrentes de aquisição a non domino [a inicial menciona "alienação a non domino"; fl. 11 - vol . I ] 12. A autora arrendatários, de refere transformar tentativas, arrendamento em de alguns propriedade. Menciona, para exemplificar, o caso de Jener Pereira Rocha, fazendeiro cadastrar Imobiliário ocupante junto área ao da região INCRA encravada e na que inicialmente matricular reserva no indígena, tentou Registro em 1978 ACO 312 / BA logrando obter títulos de propriedade dessa área, títulos expedidos pelo Instituto de Terras da Bahia - INTERBA. 13. Desde 1979, área diz concedidos na da silvícolas remanescentes a autora, reserva, do Posto de outros modo títulos que os foram últimos Catarina Paraguaçu foram algumas famílias foram obrigados a deixar o local. 14. A FUNAI informa que acolhidas na Fazenda Guarani, no Município de Carmésia - MG. Diz, porém, da grande dificuldade de adaptação dos índios à nova situação, em razão da ligação profunda do silvícola a sua terra natal. 15. Decididos a retomar as terras que são suas de direito, então se reuniram e retornaram ao Estado da Bahia, fixando acampamento na área da reserva indígena em abril de 1.982, meses antes da propositura da presente demanda. 16. A Fundação sustenta que os índios não abandonaram o local por vontade própria. Não há falar-se, portanto, em terras devolutas. Embora desapossados de suas terras, jamais perderam o animus 17. Requer propriedade e possidendi. a declaração registros de nulidade imobiliários dos expedidos Jener Pereira Rocha, dos demais réus referidos e de outros registros de que porventura propriedade Caramuru-Catarina Paraguaçu, possuam na área nos títulos de em de nominalmente idênticos da Reserva Municípios de nome títulos e Indígena Conquista, ACO 312 / BA Itambé, Itapetinga, Canavieiras, Itabuna, Pau Brasil, e Itajú do Colônia. Pede ainda, com fundamento nos art. 4 o , IV, e 198 18. e seus parágrafos da Constituição Federal de 1.967, vigente à época, e no cancelamento existentes art. das nos 17, inciso III, da Lei n . 6.001/73, o transcrições, cartórios de matrículas situação ou dos registros imóveis objeto desta ação. 19. A ação foi movida contra 396 [trezentos e noventa e seis] proprietários rurais [fls. 23/34 - vol. I ] . 0 Estado da Bahia nela ingressou agosto de 1.982 20. a litisconsorte necessário em [fl. 66 - vol. I ] . A autora requerendo como obteve citação por o endereço edital da maioria de dos réus, aproximadamente 130 [cento e trinta] deles. O primeiro edital foi publicado em 4 de agosto de 1982 [fl. 56 - vol. I ] . 21. Josino 110/111. Opôs Pinto exceção Correia de contestou incompetência da o feito Justiça às fls. Federal para julgamento do feito. No mérito, diz que a não ocupação efetiva da área pelos índios reverteu o domínio das terras ao Estado da Bahia. Isso justificaria a outorga de títulos de propriedade pelo Estado-membro aos particulares. 2 2. Afirma que suas propriedades estão registradas no cartório de imóveis competente e devidamente cadastradas no INCRA, ITR. sendo contribuinte do Imposto Territorial Rural ACO 312 / BA 23. do A União integrou o pólo ativo da ação, nos termos disposto no art. 3 6, parágrafo único, do Estatuto do Índio [fls. 192/193 - vol. I ] , deslocando a competência para o Supremo Tribunal Federal em 1.983 [f1. 197 - vol. I ] . 24. A FUNAI aditou a inicial [fls. 207/219 indicando outros endereços dos réus relacionados - vol. I] às fls. 23/33 para citação por carta de ordem. Requereu, por fim, a citação por edital dos demais [fls. 215/219 - vol. I ] . 25. O relator à época, Ministro MOREIRA ALVES, deferiu os pedidos. Jos ino Pinto Correia opôs-se ao aditamento [fls. 221]. A manifestação foi recebida como agravo regimental, ao qual foi negado provimento. 26. Nova petição, subscrita pela FUNAI, indica cidades e comarcas em que se encontravam outros réus [fls. 233/237 vol. II. ACO 3 1 2 / BA 27. FERPEC fls. 244/300]. originários relatos aos autos Américo Pataxós Minas [fl. de Kariris estariam Indígena outubro 2 de na entanto, Estado Acaso - e os qual índios e produzido vol. na na por diversos antropólogos. Juntam indigenista mapa que região em região do II, eram pelo II], Aymorés [vol. Pataxós comprovado sociólogos presentes aos 1.981. área a da autos Paraguaçu documento indígena o 388 contestação João indicaria a questão; os Estado de atual Gerais. Reserva no Gerais, etnográfico Juntam nesse que historiadores, Peret 28. de Minas mapa presença ofereceram Afirmam de de outros2 e [fls. O órgão que existam proteção como existe, [...] transferência de não domínio titular remanescentes da 468/488 de "[n]ão conhecida Bahia informação - FUNAI vol. ao ã II], indígena lato tendo sobre senso, se União, do domínio [. . . ] é datada observa terra aperfeiçoado, permanecendo direto. de a se [ . .. ] manter FERPEC - Fernandes P e c u a r i a L t d a . [ r e p r e s e n t a d a por Manuel Fernandes Neto, José Henrique F e r n a n d e s , L o u r i v a l Resende dos S a n t o s , Marcus V i n í c i u s de Barros Wanderley e Ananias Monteiro da C o s t a ] , Antônio C a r l o s Wense P i n t o , Armando Brandão P i n t o , Armando Berbet Menezes, E l i r i o Lima Menezes, Enéas Cruz da Fonseca Dórea, Ja i r V i c e n t e de P a u l a , J o f r e Macedo de C a r v a l h o , Joaquim Carvalho Neto, A r l i n d o Fontes de F a r i a , Aida Brugni Nunes, Maria C a r m e l i t a de Andrade Santos Benigno Bonfim de Azevedo, Raimundo Alves dos S a n t o s , J o s é Dias do Nascimento, Cosmiro Henrique Guimarães, Luiz Alves dos S a n t o s , João A v i l l e t e S o b r a l , Pedro F r a n c i s c o X a v i e r , A l b e r t o Gonçalves P e r e i r a , Guy F e r r e i r a de Melo, Thea Benjamin Cunha, Antônio Soares F e i t o s a , Tomáz V i c e n t e C a l d a s , J e n e r P e r e i r a da Rocha, Manoel R i t o Cardoso, F i d e l i o Almeida Pamponet, Antônio Afonso de Miranda, Haroldo S i l v e i r a F e r n a n d e s , Dirvan S i l v e i r a Fernandes, Edulindo R i b e i r o de Carvalho, Milton J o s é R i b e i r o de O l i v e i r a , José Wense P i n t o , Jose S i l v e i r a Motta, Genaro C o r r e i a Q u e i r o z , Edson Menezes dos S a n t o s , Augusto Cézar Kruschewsky, Companhia Chaves A g r í c o l a e P a s t o r i l ( r e p r e s e n t a d a por Manoel de Souza Chaves, Helenilson J o r g e de Almeida Chaves ), Ney de Matos Dantas, Joaquim P e r e i r a da Costa Lino, Paulo Roberto Brugni Nunes, Rui Henrique Brugni Nunes, Alfredo Nunes de Souza, Cláudio S i l v a S o a r e s , A r i s t i d e s Franco Couto, Z e l i t o Brandão F o n t e s , Teodoro R i b e i r o Guimarães, Filogônio Seles, David de O l i v e i r a P i n t o , AGROMASA Agropecuaria Dario Mascarenhas S/A [ r e p r e s e n t a d a por C a r l o s A l b e r t o R i b e i r o O l i v e i r a , D o u r i v a l F r e i t a s B a s t o s , E r i v a I d o B a s t o s Gomes], Almir Brandão P i n t o , Damião Conrado da S i l v a , T i t o B a r r e i r o s Machado e Elba Luiz Santa Rosa. ACO 312 / BA entendimentos situação com o Estado ocupacional, com a fim de regularizar-lhes aplicação do art. 6.001, de 19 de dezembro de 1.973" 2 9. 33 da a Lei n. [vol. II, f1 . 4 6 8 ] . Anexam ainda aos autos trinta e dois documentos de outorga de domínio, região, bem assim certificados de pelo Estado registros de cadas tramento da Bahia, propriedade de imóveis de em terras na cartórios e rurais no INCRA [fls. 583/623 - V o l , I I ] , 30 . qual Oferecem requerem títulos o reconvenção reconhecimento de propriedade [fls. 652/659 - vol. de a validade expedidos domínio e III] na dos pelo Estado da Bahia. Pedem seja admitida a legitimidade da posse dos produtores rurais, determinando-se de invasões a reparação promovidas pelos danos Pataxós causados nas em razão propriedades das rurais vizinhas ao seu local de fixação. 31. A Pereira FUNAI desistiu da Rocha, vez propriedade na área da que ação este da reserva com não relação possuía [fls. 737/738 a Jener título - vol. I I I ] . 0 pedido foi indeferido pelo Relator porque o réu e sua "já contestaram alegações que 0 1.114/1.126 determinou ação afastam injustificada." 32. a a da se opuseram ocorrência, no à Estado desistência caso, da Bahia contestou o de com oposição feito [vol. I V ] . Afirma que a Lei estadual a esposa [fl. 7 60 - vol. I I I ] . formação índios "ali habitantes" razão e de ausência de da reserva [fl. 1.116 população indígena às fls. n. 1.916/26 em favor dos - vol. I V ] . Alega que, em indígena na área, o Serviço ACO 312 / BA de Proteção ao agricultores índio - e criadores SPI arrendou pequenas da região, que nelas se glebas a instalaram, construindo casas e outras benfeitorias. 33. Faz alusão a relatório do Consultor Jurídico do Ministério da Agricultura, em 1.960, segundo o qual a área é de propriedade do Estado da Bahia, "uma vez que não chegou a concretizar-se sua doação à União Federal" IV], cabendo Federal no Aviso da área ao SPI da gleba. o que diz o Estado da Bahia n. do 296 considerada retendo Ministro na Lei apenas indígenas que habitavam 34. restituição segundo GB membro, a [fl. 1.119 Alega que da Agricultura, Estadual 2.000 n. para FUNAI, em uso Governo propôs, a 1.916/26 ha 0 - vol. devolução ao Estado- dos poucos a região. a própria documento assinado pelo Chefe do Setor de Regularização, confirma que a área na qual foram Paraguaçu índios construídos os postos indígenas Caramuru pelo então SPI foi reservada para assentamento Pataxós. transferência Afirma-se de domínio no do documento, imóvel à ademais, União que jamais e dos a teria ocorrido. 35. Sustenta determine a incorporação ao patrimônio qualquer índio Supremo, no da que, das União, naquela sentido de silvícolas caracteriza Relator Ministro o embora região. a CUNHA Constituição terras nunca que a houve a DJ 1.967] silvícolas permanente de jurisprudência do posse indígena PEIXOTO, por posse Menciona apenas terra ocupadas [de permanente [MS n. 01.07.1980; dos 20.234, MS n. ACO 312 / BA 20.2 15, Relator o Ministro DÉCIO MIRANDA, DJ 28.03.1980 e ACO n. 278, Relator o Ministro SOARES MUÑOZ, DJ 11.11.1983], 36. fls. Manoel Nascimento 1.128/1.129 [vol. Carvalho contestou IV] . Esclarece não o feito possuir às nenhum título de propriedade naquela região do Estado da Bahia. 37. Antônio Costa, Durval Elvino Edwirgens Sebastião Rodrigues José de Ferreira, Domingos Santana, Edilson Ferreira, Filho, Manoel Glicério Bispo do Pereira Borges Corrêa da dos Santos, Aguiar, Nascimento, Manoel José Alves dos Santos e Manoel Nicolau da Silva contestaram o feito às fls . 1.691/1.700 38. a [vol. V] . Descrevem a cadeia dominial de suas propriedades, maioria adquirida diretamente Bahia no final dos anos títulos então do Governo do Estado da 70 e início dos anos 80, mediante expedidos. Subscrevem, por fim, os termos da contestação apresentada pela FERPEC. 39. Oferecem reconvenção às fls. 1.701/1.708 [vol. V] em termos análogos aos da apresentada pela FERPEC. Requerem, por fim, a denunciação à lide do Estado da Bahia. 40. a Os mesmos advogados subscrevem, com o mesmo teor, contestação e a reconvenção de Josué Brito de Miranda, Martim Alves dos Santos, Moisés Dias da Silva, José Dionisio Oliveira, representado Nicolau da Silva e por seu Walter filho Paulo Oliveira Oliveira, Rubem da Silva 1.770/1.777 e 1.808/1.815, respectivamente, vol. V ] . [fls. ACO 312 / BA 41. José Carlos Silva, Marlene Sirley Dias Dias da Miranda da de Oliveira, Moisés Silva, Maritan Silva e Miriam Dias contestaram a ação às fls. 1.821/1.828 42. Dias da da Dias da Silva, Sara Silva Aguiar [vol. V I ] . 0 primeiro é proprietário de área cujo título foi expedido em 1.981 pelo então Governador do Estado da Bahia. Os demais são possuidores de 7 2 ha de "terras devolutas" na área em litígio. apresentada Reiteram pela regulamentou a FERPEC, lei os argumentos observando estadual de da que 1.926 o contestação decreto determinou que fossem respeitadas as posses já estabelecidas no local. 43. Alegam que a FUNAI deu continuidade aos trabalhos de medição e demarcação apenas em 1.979, quando milhares de possuidores ocupavam a área, com títulos de propriedade que remontam a 1.903. 44. Dizem que há anos pagam impostos autoridades foi competentes turbada, quer e que pela SPI, em nenhum quer territoriais momento pela FUNAI, sua às posse seja por silvícolas. 45. Abenilson Santos Rocha, Edson Edwirgens Ferreira, Elias Borges de Aquino, Francisco Lins Cardoso, Gilberto Brito Alves, Gildas io Edwirgens Ferreira, Jazon Ramos Neto, José Edwirgens Ferreira, José Nilson Pires de Souza, José Ramos Neto, José Vidal Filho, Josefa Maria de Jesus, Josué Brito Alves, Marivan Chaves, Roberto Pedro Silva de Andrade e Marivalda da Silva Raimundo Magalhães Dias, Pedro Rabelo e Soares Valdemir Oliveira, Silvio Clementino Santos ACO 312 / BA apresentaram contestação e reconvenção sem nada acrescentar ao que já fora dito por Antônio Rodrigues Ferreira e outros [fls. 1.992/2004 e 2.105/2.110, respectivamente, vol. V I ] . 46. Walderaar apresentaram-se Batista de Miranda voluntariamente para e sua integrar a esposa lide na qualidade de litisconsortes passivos, contestando o feito às fls. 2.123/2.133 47. [vol. VII]. José Augusto dos Santos Filho e sua esposa Maria de Lourdes Eduvir, Eduardo Costa de Oliveira, Nelson Sousa e Agenor sua esposa Souza Barreto Barreto, Lopes do Wilmar Terezinha sua esposa Maria Kruschewisky Amorim e sua Nascimento e Kruschewisky Amorim, João Alves Costa da Souza, Glória esposa dos Costa Alves Anatilde Santos e sua esposa Consuelo Braitt Santos, Paulo Roberto Peixinho Lima e sua esposa Peixinho Cristiane Lima Biondi Menezes e seu Lima, esposo Maria Umberto da Conceição Madalena Biondi Filho e Guiomar Damasceno Peixinho Lima contestaram o feito às fls. 2.650/2.660 4 8. [vol. VIII]. Afirmam, preliminarmente, que a autora deixou de individualizar o perímetro de cada propriedade reivindicada, bem como os nomes de todos os réus efetivamente envolvidos, indicando os de pessoas já falecidas ou que nunca possuíram terras na região em litígio. 4 9. No propriedades Estado mérito, desde descrevem a outorga da Bahia, entre o fim a dos cadeia dominial títulos da década de pelo de suas Governo do 70 e início da década de 80. Sustentam que a tribo dos Pataxós "não passa ACO 312 / BA de uma vol. fraude, de um VIII]. Alegam das pretensas local indígenas, a simulacro que as quarenta terras ponto de antropológico" [fl. 2.657 - famílias indígenas que nada ensinarem-lhes habitam lembram "certas costumes'", bem como alguns vocábulos da "língua o povos danças Pataxó" e [ f 1. 2.659 - vol. V I I I ] . 5 0. Domingos Antônio Cabral Cabral Velanes, Cabral de Correia, Quadros Machado, Wilmar Raymundo Souza, José Galvão, Loureiro Amorim Amorim Edvaldo Luciano de Pinto Garcia, Messias Galvão, Kruschewsky, Edinaldo Figueiredo, Jacintho Correia, Theodulo Geraldo Cerqueira Pinto Almeida, Carlos Moura Latrilha, Alba Regina dos Santos Moura, Osmário Moura Latrilha, Souza, Paulo Amazonas, Humberto Cícero Geovanina Rocha Almir Pinto Silva Cabral, Francisco da Julio José de Neres, Correia (viúva Francisca Edênia Barbosa Sobral), Geraldo Pedro Alexandre Silva, Souza, Mendonça Gomes Correia, de Hermano Souza, Antônio de Teles Sobral Soares Rodrigues Lima, José Correia), L u z , Ernestino Sobral (viúva de Santos, Evarista Leite, de Gutemberg Antônio Emenegilda Mendonça Florisvaldo da José Ferreira da Silva, Martins Alves dos Santos, Otávio Antônio dos Santos, Eutímio Santana da Pereira, Silva, Alípio Oliveira, Barbosa, Ace I m o Dantas), Romilton José Dias do Lima de dos Silva, dos da Santos, Silva, Carvalho da C r u z , Santos, Aída Juvenal Nascimento, Altamirando Rodrigues contestaram da Augusto Agnaldo Auxiliadora Augusto Santana Ronaldo Nascimento, Maria Everaldo Dantas Lopes, Erasmo José Guimarães de Marcelino Bispo Souza (viúva Cláudio a ação às fls. 2.768/2.782 Correia Aristides Agenor Maciel do Barreto, de Roberto Alberto Mendes, Fernando [vol. I X ] . Terra ACO 312 / BA 51. Sustentam, jurídica com do pedido nenhuma das preliminarmente, deduzido hipóteses na a impossibilidade inicial, que previstas no não Código se de coaduna Processo Civil atinentes ao chamado "pedido genérico". 52. No mérito, afirmam FUNAI na presente pelos de ou existência da bacia no do Rio Posto Catarina X]. de índios, por que e Santa não estavam promulgação Constituição Colônia, pretendidas de volta banha os da Constituição 1.946. de Apontam 1.950, atuais Diz que títulos de na a região Municípios Cruz da Vitória, todos de reunidos no Paraguaçu. o na pedido medida propriedade declinados em possuam títulos reserva indígena. 54. pela ocupadas A FUNAI ofereceu réplica às fls. 3.308/3.311 determinado réus da poucos Ita jú do Colônia 53. momento mesmo de as terras ação cível originária silvícolas 1.967 que e rol deduzido em que na se pretende e registros bem de Afirma ter empreendido a é como certo nulidade imobiliários apartado, registros inicial [vol. dos em nome dos outros que de propriedade e na todos os esforços área da possíveis para a citação pessoal do maior número de réus, requerendo a citação por edital apenas quando replicou às não obteve o endereço do ocupante na região. 55. Sustenta aqueles A que que União a sentença foram parte a na ser fls. 3.313/3.314 proferida relação "somente jurídica [vol. X ] . alcançará processual". A ACO 312 / BA indeterminação ineficácia de sujeitos da decisão em passivos relação "importaria a quem não apenas na participou do feito por não ter sido citado ou sequer nomeado", o que não implica a impossibilidade do pedido [f1. 3.314 - vol. X ] . 56. Contestou 3.328/3.330 e possuírem reconvenções 3.335/3.337 inadmissibilidade declaratória. as dos vol. pedidos, Sustenta títulos - de que [fls. X]. visto o Pugna tratar-se fato propriedade 3.324/3.326, de os pela de ação reconvintes registrados no cartório competente é matéria que deve ser alegada em contestação ao feito. 5 7. Os títulos apresentados pelos reconvintes nulos, eis que oriundos de aquisição a non de ocupação União e imemorial jamais foram indígena, terras classificadas domino que como são de terras pertenciam devolutas a [as contestações mencionam "alienação a non domino"]. 58 . A FUNAI contestou a reconvenção às 3.339/3.383, 3.406/36449, 3.471/3.515, 3.536/3.579 Reafirma a presença do povo Pataxó na região fls. [vol. X] . em litígio desde 1.651, segundo relatos históricos. 59. Afirma a impôs s ibilidade jurídica da reconvenção e ilegitimidade terras União, derivadas causam habitadas inexistindo a ad dos pelos reconvintes. silvícolas são "qualquer direito a indenização salvo, da na forma ocupação de da lei, boa fé" Isso quanto porque as inalienáveis, ou ações contra às [ f 1 . 3.349 benfeitorias - vol. X] . ACO 312 / BA Assim, não há falar-se em "títulos de propriedade" na área em questão. 60. Alega estatuir a "o nulidade incidentes sobre expressamente os que as dos áreas que A posse toda a área por sustento e necessária apontada limitou a porventura indígena, deferindo adotados na delimitação - vol. X ] . mencionada pela Constituição ao conceito de posse do direito civil. o território [fl- ser permanente "todo cultural" se imobiliários ocupação [fl. 3.351 não pode ser reduzida é, de deveriam das referidas terras" Abrange títulos não ao legislador ordinário a faculdade de definir procedimentos 61. constituinte indígena eles 3.356 à - propriamente habitada, preservação vol. X]. dito, isto para seu utilizada de Essa sua identidade peculiaridade é em voto do Ministro VICTOR NUNES nos autos do RE n. 44 . 585 , DJ de 11.10.1961. 62. MS Transcreve 16.443, que ainda voto do Ministro VICTOR evidencia Constituição de pelos integrarem índios 1.967, inexistir quanto ao fato o patrimônio dúvida, de as antes áreas da União, NUNES no da ocupadas entendimento consolidado na Súmula n, 480 3 . 63. Daí ser contraditória "terras devolutas cuida de 3 de terra terra estaduais devoluta, ocupada por a alusão, dos reconvintes, a ocupadas pelos integrante indígena, e, índios". "[O]u se do domínio por isso, estadual, ou do domínio da Súmula 480: Pertencem ao domínio e administração da União, nos termos dos arts. 4 o , IV, e 186, da Constituição Federal de 1967, as terras ocupadas por silvícolas. ACO 312 / BA União." pela [fl. 3.373]. Mesmo na hipótese de abandono da área comunidade indígena o Estatuto do índio prevê a reversão da gleba à posse e domínio da União [art. 21 da Lei n . 6.001/73]. 64. Sustenta que "as terras ocupadas pelos que, sob o regime da Constituição de 1891, silvícolas integravam o patrimônio coletivo indígena, passaram, com a promulgação da Carta de União (cf. decreto n. 736/36, alínea X]. 1934, em caráter Assim, a concessão irreversível, para de ' a ' ) " [fl. 3.444 - vol. títulos dominiais ocupadas pelos indígenas após a promulgação da de 1934 é nula, de genocídio modo de silvícolas títulos originariamente que não "a o domínio da expulsão, tem o condão o em terras Constituição homicídio ou de convalidar os nulos, concedidos a partir de 16 de julho de 1934" [fl. 3.444 - vol. X]. 65. O processo foi saneado às fls. 3.649 [vol. X I ] , em despacho do Ministro FRANCISCO REZEK, de 17 de maio de 1.993 . 66. A FUNAI requereu histórico-antropológica a [fl. 3.652 realização - vol. de perícia X I ] . FERPEC Fernandes Pecuária Ltda. e outros justificaram a necessidade de prova pericial, 3.671/3.673 67. juntado O aos testemunhal e documental [fls. requereu fosse - vol. XI]. Ministério autos Público memorial demanda [fls. 3.683/3.684 Federal descritivo da área objeto da - vol. X I ] , apresentado pela FUNAI às fls. 3.691/3.694 - vol. XI. ACO 312 / BA 68. da A instrução do feito Bahia [fl. 3.696 - vol. foi delegada a Juiz Federal X I ] . Foram requeridas prova testemunhal, juntada de novos documentos e a realização das seguintes perícias: a] antropológica: área em litigio civilização apresenta para que existem indígena, se comprovasse sinais se a e se na vestígios população de local esses traços e se o local é apropriado ao assentamento de indígenas; b] topográfica: para que se comprovasse se a área reivindicada pela FUNAI foi efetivamente medida e demarcada, identificando respectivos, polígono bem assim atingiria Estadual n. levantamento e aviventando para posses comprovar se anteriores 1.916/26, completo os marcos à procedendo-se dos títulos o Lei ao dominiais expedidos pelo Estado da Bahia; c] agronômica: compreendidas para hoje se avaliasse as no polígono, apurando-se aproveitamento estimativa que agropecuário, econômica existentes, de empregos o grau de bem produção gerados terras assim das e a culturas repercussão econômica da produção dessa área nas receitas dos Municípios Camacã; de Itaju do Colônia, Pau Brasil e ACO 312 / BA d] sanitária: hídrico para da que se apurasse região, possibilidade de o potencial verificando-se aproveitamento da para consumo e assistentes técnicos humano. 69. Quesitos foram nomeados [FERPEC - formulados fls. 3.751/3.754, FUNAI - fls. 3 .766/3.777 - vol. XI] 70. A FUNAI juntou relatório referente à demarcação da área realizada novembro de pelo 1.938 engenheiro [fls. 4.098/4.112 polígono [fls. 4.113/4.114 71. da a hectares ser [fl. esclareceu área que demarcada periciada, 4.143 - a planta em Amorim Coelho em - vol. XII] e mapa do - vol. XII]. O Estado da Bahia área Alfredo insurgiu-se contra de vol. 36.000 XII]. juntada 1.937/1.938, às que a ampliação hectares O Juízo fls. para de 3.685 somava 54.000 instrução consigna a aproximadamente 54.000 ha, de modo que apenas nessa área seriam encontrados os marcos a serem identificados e aviventados [fl. 4.146 - vol. XII]. 72. Luciano A perícia antropológica foi apresentada por Marcos Lopes Messeder [fls. aditada às fls. 4.295/4.296 73. A antropóloga 4173/4270 - vol. XIII] e [vol. XIII]. Maria Elizabeth Brêa Monteiro, assistente técnica da FUNAI, apresentou parecer ao laudo da perícia antropológica, juntando documentos - vol. XIII] . [fls. 4.317/4.361 ACO 312 / BA 74. do Em Juizo 02 de Federal relação dos juntado aos 4.363/4.372 75. da réus de Seção que autos, o Diretor Judiciária não 305 1.998, possuíam de Secretaria Ilhéus título [trezentos da forneceu de e cinco] da Bahia a propriedade réus [fls. - vol. X I I I ] . 0 apresentou abril Instituto relação de de Terras títulos existentes - na INTERBA área [fis. 4.402/4 .411 - vol. XIII ] . 76. A perícia sanitária foi apresentada Raimundo Camelo Mororó às fls. 4.418/4.635 77. 0 apresentou perícia complementada 78. engenheiro Agrônomo às fls. 4.782/4.850 Éfren de Moura às biólogo [vol. X I V ] . Josemário agronômica pelo Santos fls. da Paixão 4.702/4.776, [vol. X I V ] . Ferreira Filho apresentou laudo topográfico, juntado aos autos no Apenso V I I . 79. O Estado argüindo suspeição a realização de da Bahia impugnou o laudo topográfico, do perito. Requereu a nulidade do laudo e nova perícia [fls. 4.888/4.891 e 4.915 - vol. X V ] . 80. O Juízo Federal testemunhal [fls. liminarmente a exceção [fls. 5.164/5.168 indeferiu 5.160/5.162 de - suspeição, - vol. X V ] . a vol. produção XV] porquanto e de prova rejeitou intempestiva ACO 312 / BA 81. Os autos retornaram ao Supremo Tribunal Federal em 19,11.99 [fls. determinou pericial 5.209 que as - vol. partes se Em instrução, seguida o 83. concedendo A FUNAI Reitera "a os vista DEMAIS em DOS RÉUS, quaisquer da do registros, quantos sobre em e nos para 5.343/5.477 fls. [vol. 3.308/3.311 PROPRIEDADE FERREIRA e e registros ROCHA TRANSMISSÕES posteriores e dos ILEGAIS do indígena, com o cancelamento dos imobiliárias, 54.105,1826 municípios as da UNIÃO ha. do áreas de território ESTADO de DA terras DA o valor da BAHIA, objeto COMUNIDADE (CF, art. 231, § lo, e Estatuto e tantos (CF, art. 2 0 , XI) e de EXCLUSIVO processuais sobre partes a restritivos os 2 3 ) , e condenando-se, 20% de transcrições USUFRUTO Hà HÃE despesas ou conseqüência como PROPRIEDADE Hà e indígena, PERMANENTE de prova encerrada as fls. JENER de anteriores incidam reconhecendo das a do ESTADO DA BAHIA, como também de todos e matrículas tradicional às DE advindos atos autos réplica réu domínio da UNIÃO e da posse art. sobre JOBIM [fls. 5.332 - vol. X V I ] . TÍTULOS nome inconstitucionais PATAXÓ NELSON declarou dos manifestou-se termos NULIDADE imobiliários ação manifestassem Relator elaboração de razões finais pede Ministro [fls. 5.230 - vol. X V I ] . 82. XVI]. XV]. O finalmente, os Réus honorários causa" 5.477 do no - POSSE INDÍGENA índio, pagamento advocatícios [fl. da na base vol. XVI, destaques no o r i g i n a l ] . 84. "pugnando A União pela adotou DECLARAÇÃO na íntegra DE as NULIDADE razões dos da FUNAI, TÍTULOS DE ACO 312 / BA PROPRIEDADE e dos registros imobiliários, incidentes sobre o território indígena reconhecendo em conseqüência as áreas de terras objeto da ação como PROPRIEDADE da UNIÃO e de POSSE PERMANENTE COMUNIDADE PATAXÓ e Hà USUFRUTO Hà HÃE" EXCLUSIVO [fl. 5.491 DA - vol. XVI, INDÍGENA destaques no original]. 85. A FERPEC apresentaram referindo "a da reconheça tiveram origem às da validade f. de seus danos, tudo como as autoras ficou bem outros [vol. XVI], autos. Requereram de nulidade títulos em atos administrativos ainda e e a 652/659, a fim de que se ESTADO DA BAHIA e a legitimidade condenando-se aos declaratória de Ltda. 5.496/5.519 juntados ação reconvenção a Pecuária fls. documentos improcedência lhes Fernandes razões alguns procedência - dominiais válidos que emanados do de sua conseqüente posse, a indenizar-lhes especificado a f. perdas 658." e [ f1 . 5.519 - vol. XVI]. 86. 0 Estado da Bahia arrazoou às fls. 5.535/5.540. Reitera a nulidade da perícia topográfica, porquanto membros da FUNAI e indígenas auxiliaram a equipe de trabalho do perito. 87. fls. A Procuradoria 5.545/5.555, Geral da República, em parecer de opinou pela procedência da ação e pela improcedência das reconvenções. 88. Sustenta que "os títulos expedidos pelo ESTADO DA BAHIA são nulos de pleno direito por configurar alienação a non domino". Sustenta que "estes títulos e os concedidos ACO 312 / BA pelo SPI são nulos, pois indisponíveis , sendo imprescritíveis, Constituição deste os como art. 231 efeitos a ocupação, sob terras direitos preceitua Federal. Prossegue mesmo produzindo incidem sobre o art. a nossa afirmando serem e a posse das tais 231. Carta nulos jurídicos, os atos que o domínio inalienáveis terras 4o, § da no § 6 o Magna e extintos, tenham terras e por não objeto indígenas" [fls. 5.553 - v o l . XVII] . 89. Em suscitada 27.02.2002 pelo demarcação, então pela o Supremo decidiu Relator, no União, não é, questão sentido em si, de de ordem que "a indispensável ao ajuizamento da própria ação, mas que, para o juízo de mérito seria necessário consubstancia, ou verificar não, se total a ou área em litígio parcialmente, terra indígena" [fl. 5.568- vol. X V I I ] . 90. 0 Ministro Relator determinou ao Estado da Bahia a juntada de localizados Colônia, reus" planta e memorial nos Municípios "relativos aos descritivo De posse dos Bahia às fls. 5.581/5.677 de Pau Brasil, Camacan e Itajú do títulos imobiliários documentos juntados em judice [fl. 5.679/5.680 anteriormente pelo [vol. X V I I ] , ordenou plotagem das áreas constantes dos documentos perito imóveis nome dos [fl. 5.572- vol. X V I I ] . 91. sub dos - vol. X V I I ] . nomeado, a tarefa engenheiro Agrimensor Edson Fernandes Estado da fosse feita a no mapa da área Ante a recusa foi desempenhada Sant'Anna. do pelo ACO 312 / BA 92. A planta com a delimitação das áreas foi juntada aos autos às fls. 5.775 [vol. XVIII]. A FERPEC manifestou-se sobre a plotagem as fis. 6.042/6.052 [vol. XIX], aludindo às conseqüências da eventual procedência do feito. 93. A União e a FUNAI requereram perícia, com a identificação adicional ao erário. Trata-se não nominados foram obtidas quaisquer de certas áreas, de áreas cujos na inicial informações a complementação da custo proprietários e sobre as quais quanto sem não foram a sua titulação [fls. foi indeferido pelo então Relator [fls. 6.064/6 .072 - vol. XIX]. 94. 0 pedido 6.110/6.113 ao qual - vol. XIX]. A União interpôs agravo regimental, foi negado provimento 5.11.2007 [fl. 7.554 - vol. XXV]. 95. 0 acórdão transitou 7.565 - vol. XXV], em Sessão Plenária em julgado em 5.12.2007 remetidos os autos à de [fl. conclusão em 13.12.2007 . É cópias RISTF]. para o relatório, envio aos do qual Senhores deverão Ministros ser [art. extraídas 2 50 do ACO 312 / BA V O T O O suscitaram 0 SENHOR preliminar perímetro de individualizado. de todos os réus, Código MINISTRO os de cada propriedade Além disso desbordaria não (Relator) : foram limites Civil jurídica Os do reivindicada envolvidos dos Processo Grau impossibilidade proprietários de Eros no os lide. Esta, âmbito dos circunscreve o pedido. não mencionados na réus foi nomes segundo quais chamado o "pedido genérico". 2. na Aqui qual se registros falar-se, pois, os preliminar de entanto, de pedido esforços réus, obteve de endereços propriedade FUNAI trabalhos à por Não e há forneceu periciais. citação à citação dos declaratória, indígena. A os necessários de área genérico. recorrendo os ação títulos em d e t e r m i n a d a possibilitaram pessoal edital 4 requeridos . do apenas Rejeito a suscitada. 3. A questão antecedeu foi seguintes no nulidade em que número não a imobiliários Empreendeu quando trata, requer documentos maior se de ordem solucionada suscitada por esta pelo Corte, Relator em q u e me 2.002, nos termos: "EMENTA: TERRAS INDÍGENAS NÃO DEMARCADAS PELA UNIÃO. DESNECESSIDADE DE PRÉVIA DEMARCAÇÃO ADMINISTRATIVA. PROSSEGUIMENTO DO JULGAMENTO PELO 4 A ação foi proposta, inicialmente, contra trezentos e noventa e seis réus. Às f l s . 1.889/1.899 [vol. VI], a Secretaria informou que, em 1985, haviam sido citados pessoalmente centro e quarenta e nove réus. Noventa e seis proprietários apresentaram contestação, alguns espontaneamente, e foram citados por e d i t a l cerca de cento e setenta réus [ f l s . 2.443/2.444 - vol. VII] ACO 312 / BA TRIBUNAL PARA EMISSÃO DE JUÍZO CONCLUSIVO SOBRE A SITUAÇÃO JURÍDICO-CONSTITUCIONAL DAS ÁREAS ABRANGIDAS PELOS TÍTULOS. Questão de Ordem que assim se resolve: (1) a demarcação prévia da área abrangida pelos títulos, não é, em si, indispensável ao ajuizamento da própria ação; (2) o Tribunal pode examinar se a área é indígena ou não para decidir pela procedência ou improcedencia da ação." 4. 0 Tribunal definiu os contornos do mérito da demanda, que reclama decisão em torno da seguinte questão: a área em litígio jurídica da consubstancia expressão? Essa "terra a indígena", na proposta do então acepção Relator, Ministro NELSON JOBIM: "0 reconhecimento e fixação de limites da afirmada TERRA INDÍGENA são pressupostos para o juízo de procedência, total ou parcial, desta ação. Se for TERRA INDÍGENA, os títulos dos RÉUS serão nulos nos estritos limites do que abrangerem daquela área. Na parte que, eventualmente, não incluir TERRA INDÍGENA, os títulos remanescem íntegros. Assim, para se desconstituir os títulos, impõe-se o prévio reconhecimento, como limites precisos, da TERRA INDÍGENA. Ser, ou não, TERRA INDIGENA é premissa para o juízo nulificante." 5. Para se discute logo se vê, destarte, que nestes autos não a legalidade de demarcação de terra indígena ou como ela deve ser procedida. A matéria de que aqui se cuida não está de modo nenhum relacionada à de que trata outro processo, atinente à área conhecida como de Raposa Serra do Sol. Aliás lá se cogita de aproximadamente 1.700.000 ha, ao passo que a terra dos Pataxós não excede 54.000 ha como três vírgula dezessete por cento da área de algo Raposa ACO 312 / BA Serra do Sol. Na exclusivamente a presente ação nulidade, ou está em debate, ademais, não, de determinados que, no Brasil, títulos de propriedade. 6. Observo terra indígena consubstancia dizemos desde entre algo disputa logo quem quer juridicamente aludimos que seja impossível. a uma oposição disputa e por índios Pois quando entre direitos e, no caso, ao invasor de bem público não se pode atribuir direito nenhum. 7. 0 que pretendo reconhecer que aos índios tradicionalmente à de to5, temperamentos, Marco Aurélio porque como as sobre terras o artigo 231 da Constituição de João ela deve anotou, no RE é que hoje, ao normativo do Alvará de não é preciso contudo exposição mesmo originários desdobramento 1680. No caso conhecida indigena direitos ocupam, Brasil consubstancia de abril neste ponto afirmar Mendes ser percucientemente, 219.983. Ainda que seja Io recorrermos Jr. acatada do sobre com o o alguns Ministro assim, aqui se impõe breve alusão à evolução da legislação atinente ao tema de que cogitamos. 8. 601, 12, A de que chamada 18.09.1850] " [o] já Governo julgar necessárias: 5 Lei de em Terras 1.850 reservará 1o, de D. Pedro estabelecia, das terras para a colonização em II seu devolutas [Lei n. artigo as que indígena". Os indígenas do Brasil, seus direitos individuais e políticos, [edição f ac-similar ] Typ. Hennies Irmãos, São Paulo, 1912, pág. 64. ACO 312 / BA 9. 0 decreto n. 1.318, de 30.01.1854, regulamentou-a, seu artigo 75 estabelecendo colonização destinadas de ao indígenas, seu o Governo conceder o pleno regime por e Imperial, gozo estado de civilização" A e usufruto; enquanto 10. que "[a]s terras delas, não eles reservadas para distribuídas, são poderão por ato por assim ser alienadas, especial, o não permitir lhes o seu (grifei). Constituição republicana de 1891 manteve o anterior: "Art. 83 Continuam em vigor, enquanto não revogadas, as leis do antigo regime, no que explicita e implicitamente não for contrário ao sistema de governo firmado pela Constituição e aos seus princípios nela consagrados." 11. o 0 decreto n. Serviço de 8.072, de 20 de junho de Proteção ao índio, seus 1910, criou artigos 3o e 10 estabelecendo que: "Art. 3°. 0 Governo Federal, por intermédio do Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio, e sempre que for necessário, entrará em accordo com os Governos dos Estados e dos municípios: a) para que se legalizem convenientemente as posses de terras actualmente occupadas pelos índios. [. . . ] Art. 10. Si os índios, que estiverem actualmente aldeiados, quizerem fixar-se nas terras que occupam, o governo providenciará de modo a lhes ser mantida a effectividade da posse adquirida" [grifei]. 12. Nesse quadro e clima sobreveio 1.916/26, de que neste caso cogitamos. a Lei baiana n. ACO 312 / BA 13. 0 artigo 10 e parágrafos do decreto n. 5.484, de 27.06.1928, dispuseram no seguinte sentido: "Art. 10. O Governo Federal promoverá a cessão gratuita para o domínio da União das terras devolutas pertencentes aos Estados, que se acharem occupadas pelos índios, bem como a das terras das extinctas aldeias, que foram transferidas ás antigas Províncias pela lei de 2 0 de outubro de 1887 . §1°. As terras cedidas serão delimitadas em zonas correspondentes á occupação legal já existente, sendo respeitada a posse dos indios, assim como o uso e goso por elles das riquezas naturaes ahi encontradas. §2°. Respeitada essa posse, poderá o Governo Federal empregar as ditas terras para a fundação de povoações indígenas, ou qualquer outra forma de localização de índios." 14. Quanto à Constituição de 1934, dizia o seu art. 129 : "Art. 129. Será respeitada a posse de terras de silvícolas que nelas se achem permanentemente localizados, sendo-lhes, no entanto, vedado aliená-las." [grifei] 15 . estrutura, 0 mesmo pelas preceito foi Constituições reproduzido, de 193 7 e em de sua 1946, respectivamente : "Art.154. Será respeitada aos silvícolas a posse das terras em que achem localizados em caráter permanente, sendo-lhes, porem, vedada a alienação ACO 312 / BA das mesmas" [1937 - grifei]; "Art. 216. Será respeitada aos silvícolas a posse das terras onde se achem permanentemente localizados , com a condição de não a transferirem" [1946 - grifei]. 16. A Constituição de 1967 incluiu as terras ocupadas pelos indígenas entre os bens da União [art. 4°, IV]. Quanto à posse, o art. 186 determinou : "Art. 186. É assegurada aos silvícolas a posse permanente das terras que habitam e reconhecido o seu direito ao usufruto exclusivo dos recursos naturais e de todas as utilidades nelas existentes." [grifei] 17 . A Emenda Constitucional n. 1, de 1969, permaneceu a proteger a posse indígena: "Art. 198. As terras habitadas pelos silvícolas são inalienáveis nos termos que a lei federal determinar, a eles cabendo a sua posse permanente e ficando reconhecido o seu direito ao usufruto exclusivo das riquezas naturais e de todas as utilidades nelas existentes. §1°. Ficam declaradas a nulidade e a extinção dos efeitos jurídicos de qualquer natureza que tenham por objeto o domínio, a posse ou a ocupação de terras habitadas pelos silvícolas. §2°. A nulidade e extinção de que trata o parágrafo anterior não dão aos ocupantes direito a qualquer ação ou indenização contra a União e a Fundação Nacional do índio." [grifei] 18. 0 Estatuto do índio (Lei n. 6.001/73) dispôs sobre a matéria das terras ocupadas: ACO 312 / BA "Art. 22. Cabe aos índios ou silvícolas a posse permanente das terras que habitam e o direito ao usufruto exclusivo das riquezas naturais e de todas as utilidades naquelas terras existentes. Parágrafo único. As terras ocupadas pelos índios, nos termos deste artigo, serão bens inalienáveis da União {artigo 4 o , IV, e 198, da Constituição F e d e r a l ) . Art. 23. Considera-se posse do índio ou silvícola a ocupação efetiva da terra que, de acordo com os usos, costumes e tradições tribais, detém e onde habita ou exerce atividade indispensável à sua subsistência ou economicamente útil. [. . . ] Art. 25 . 0 reconhecimento do direito dos índios e grupos tribais à posse permanente das terras por eles habitadas, nos termos do artigo 198 , da Constituição Federal, independerá de sua demarcação, e será assegurado pelo órgão federal de assistência aos silvícolas, atendendo à situação atual e ao consenso histórico sobre a antigüidade da ocupação, sem prejuízo das medidas cabíveis que, na omissão ou erro do referido órgão, tomar qualquer dos Poderes da República." 19. A Constituição de 1988 dedica um capítulo ao tema : "Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens. § 1o - São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários ao seu bem estar e ACO 312 / BA as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições. § 2 o - As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a sua posse permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes. [. . . ] § 4° - As terras de que trata este artigo são inalienáveis e indisponíveis, e os direitos sobre elas, imprescritíveis. [. . . ] § 6o - São nulos e extintos, não produzindo efeitos jurídicos, os atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse das terras a que se refere o artigo [...], não gerando a nulidade e a extinção direito a indenização ou a ações contra a União, salvo, na forma da lei, quanto às benfeitorias derivadas da ocupação de boa fé" [grifei ] . 20. de A terras "ocupação pelos permanente" ou silvícolas, bem "ocupação assim a tradicional" inalienabilidade dessas terras, são recorrentes nos preceitos referidos. A presente 21. a égide 1/69. da Constituição Este, julgamento pois, do da de o pedido direito material aferir ação cível originária da época nulidade, 1967, com as alterações parâmetro da ou foi proposta FUNAI a e da ser em que proposta não, dos da EC n. utilizado União, sob para tomando-se do para que se possa títulos de propriedade questionados . 22. O texto do permanente do silvícola. art. 198 da CB/67 refere à posse ACO 312 / BA 23. PONTES DE MIRANDA 6 como que anteviu a questão fundiária de que ora tratamos ao comentar a Constituição de então [ 1967 ] : "0 juiz que conhecer de alguma questão de terras deve aplicar a regra jurídica, desde que os pressupostos estejam provados pelo silvícola, ou constem dos autos, ainda que alguma das partes ou terceiro exiba título de dominio. Desde que há posse e a permanência ou localização permanente, a posse da terra é do nativo, porque assim o diz a Constituição. [ . . .] A proteção da posse, que se atribuiu, não é só a que teria qualquer pessoa que se tivesse feito, segundo o sistema jurídico brasileiro, no direito privado, possuidor. A posse de direito privado é posse que tem a tutela jurídica das ações possessórias, conforme a espécie de ofensa (turbação, esbulho, ameaça de violência iminente) e o tempo (menos de ano e dia, mais de ano e dia). 0 texto constitucional não cogitou da duração da posse, nem, sequer, do limite temporal para se reputar permanente. Tem-se de entender a residência, com a posse que não se há de reputar transitória (quaestio facti). Os silvícolas têm a tutela jurídica à pretensão à defesa da posse, como qualquer outro possuidor; mas a sua posse não está sujeita a limite mínimo de tempo, desde que se haja satisfeito o pressuposto da permanência, que é ligada à residência. [ ... ] São nenhuns contra a anteriores promulgação 6 quaisquer títulos, mesmo registrados, posse dos silvícolas, ainda que à Constituição de 1934, se à data da havia tal posse." [grifei] Comentários à Constituição de 1.967 P a u l o , RT, 1972, tomo VI, p . 456/457. com a emenda n. 1 de 1969, 2a edição, São ACO 312 / BA 24. faz Os termos uso com tradicional sentido de e permanente, deles não se "posse imemorial". Diz a esse 7 respeito JOSÉ AFONSO DA SILVA : "0 tradicionalmente refere-se não a uma circunstância temporal, mas ao modo tradicional de os índios ocuparem e utilizarem as terras e ao modo tradicional de produção, enfim, ao modo tradicional de como eles se relacionam com a terra, já que há comunidades mais estáveis, outras menos estáveis, e as que têm espaços mais amplos em que se deslocam etc. Daí dizer-se que tudo se realiza segundo seus usos, costumes e tradições." 25. A indigenato, Abrange posse indígena diz com o ius a relação sobre a possessionis material do sujeito terra, fundada e o ius com possidendi. a direito de seus titulares a possuírem-na como seu 26. no coisa e o habitat. Nessa linha decidiu esta Corte, sob a Constituição de 1946, voto do Ministro VICTOR NUNES LEAL, no RE n. 44.585 [DJ de 11.10. 1961] : "0 objetivo da Constituição Federal é que ali permaneçam os traços culturais dos antigos habitantes, não só para sobrevivência dessa tribo, como para estudo dos etnólogos e para outros efeitos de natureza cultural e intelectual. Não está em jogo, propriamente, um conceito de posse, nem de domínio, no sentido civilista dos silvícolas, trata-se de habitat de um povo". 7 "berras tradicionalmente ocupadas pelos índios", in Juliana Santilli (coord.), Os direitos indígenas e a Constituição, Sérgio Antonio Fabris, Porto Alegre, 1993, pp. 47/48. ACO 312 / BA 27. prova Recorro neles ao laudo antropológico produzida, para definir juntado se a região aos autos, em conflito consubstancia habitat do povo Pataxó. 28. Questionado sobre as tribos ou grupos de índios que habitavam a região do litígio, o perito respondeu: "A consulta a algumas das diversas fontes disponíveis (Métraux, 1963; Nimuendaju, 1987 (1944); Wied-Neuwied, 1989 (1820); Spix e Martins, 1981 (1828); Paraíso, 1976 e 1982) demonstra que a área compreendida entre os rios Pardo e Colônia, que serviram de marcos para a definição da reserva Caramuru Catarina Paraguaçu, em 1937, era habitada pelos Pataxó, Baenã, Gueren e Kamakã. 0 mapa etnohistórico de Curt Nimuendajú é claro quanto a presença destes grupos indígenas na área em apreço. Os Pataxó são referidos em toda a região do atual extremo sul baiano tanto no litoral quanto no interior, como indica o referido mapa, do qual fotocopiamos o trecho concernente ao Estado da Bahia e assinalamos a região sul, conforme o anexo 1. Assim, podemos dizer, com base nas fontes históricas e etnográficas disponíveis, que os povos indígenas habitantes da área em demanda são os Pataxó, Baenã, Kamakã e Gueren ou Gren, autodenominação dos chamados Botocudo, referidos nas fontes como originariamente habitantes da região. Na área próxima a reserva existiram vários aldeamentos indígenas instalados, em períodos diversos, para submeter as populações autóctones ao controle dos colonizados por intermédio da catequese religiosa." [ f 1 . 4.175 - vol. X I I I ] . 29. Quanto Hã-hã-hãe, precisar ao território o perito uma esclareceu concentração serra do Mundo Novo, área mais específico que "Spix intensa dos índios e Martius de Pataxó essa que orientou Pataxó chegam a na área da a instalação do ACO 312 / BA Posto Indígena Paraguaçu" [fl. 4.177 - vol. XIII]. "[A] área demarcada uma da parte diversos Reserva dos povos Caramuru territórios indígenas de que Paraguaçu, [sic] ocupação vieram tradicional a compor contingente populacional, com a óbvia exceção Tupiniquim. Os outros, Kamakã, compreende Botocudo, dos o seu dos Sapuyá e Pataxó e Baenã tinham como seu território a área compreendida entre os rios Pardo e Gongogy" [fl. 4.179 - vol. XIII]. 30. Afirma que os historiadores dão notícia da existência de Pataxós ocupando a área em litígio desde 1651, "quando a expedição de Francisco da Rocha tenta dos arredores da vila de Ilhéus (Campos, 1945)" vol. afastá-los [fl. 4.217- XIII]: "Os fatos subseqüentes que marcam a história da conquista da região só fazem reforçar a presença permanente dos índios. No século XVIII há referências a ataques de Pataxó a Poxim e Olivença. Em seguida, no século XIX temos os relatos detalhados dos viajantes sobre o universo de povos, flora e fauna que eles conheceram no sul da Bahia e em outras áreas pelas quais passaram. A presença Pataxó sempre foi, pelos dados disponíveis, permanente em um território delimitado e claramente reconhecido. Tanto os Pataxó como as demais etnias habitantes da zona ecológica já mencionada detinham precisas determinações de seus territórios. Estes povos não eram nômades, não simplesmente circulavam transitoriamente em áreas diversas, circulavam sim em um território determinado, cujas invasões por parte de outros grupos resultavam em conflitos, os quais devem ter se acirrado com a entrada em cena dos colonizadores. ACO 312 / BA Diante destes fatos a ocupação da fazenda 'São Lucas ' é um episódio que faz parte de uma longa trama histórica, marcada por inúmeras violências contra os indios que sempre estiveram ou foram trazidos para a área da reserva. Sim, porque efetivamente houveram [sic] índios que emigraram para aí, mas chegaram em momentos diversos a partir da década de 1920, quando do estabelecimento da reserva e continuaram a chegar até a década de 1950, em função das pressões sofridas em seus locais de origem para abandonarem seus territórios. A presença indígena é secular, tradicional e permanente sob qualquer perspectiva que se queira analisar a ocupação da região" [fl. 4.22 6 - v o l . X I I I ] . 31. Os réus índios na permanente como apontaram região, abandono e a habitação requisito da a intermitência que exigidas transferência da presença desconfiguraria pela das Constituição terras ao a dos posse de 1967 domínio da confirmou a União. 32 . O existência arrendamento perito-antropólogo de algumas de efetivamente "diásporas algumas teria acirrado ainda mais áreas da de índios", reserva pelo bem SPI, como o o que as disputas na região, ensejando a expulsão dos índios: "O período de maior êxodo dos índios circunscreve um lapso de tempo de tempo que vai de 1936 a 1969, período portanto de administração do SPI, extinto em 1967 e substituído pela FUNAI a partir deste ano. Nesses 33 anos, em que pese oscilações, os atos de violência e intimidação se multiplicaram e coagiram os índios a deixarem suas posses e migrarem para as cidades e vilas próximas, para Porto Seguro, onde vivem os Pataxó do extremo sul da Bahia, ou mesmo para outros Estados da Federação" [fl. 4.195 - v o l . X I I I ] . ACO 312 / BA "[H]ouveram [sic] várias diásporas de índios, que podem ser contabilizadas de maneira precisa na descrição do quesito 16. Na única saída com destino certo foram deslocados para a estação experimental de Almada na década de 1980. Houveram [sic] índios presos que foram levados para o reformatório indígena Krenak, em Minas Gerais. Em nenhuma dessas ocasiões os índios saíram espontaneamente. Em vários momentos famílias foram expulsas por fazendeiros como pudemos constatar baseados nos depoimentos que colhemos em campo" [fl. 4.218 vol. XIII]. 33. Em ausência de nenhum momento, silvícolas na porém, área em a perícia litígio. aponta Mesmo os a que foram obrigados a deixar a terra natal mantiveram laços com os familiares que lá permaneceram [fl. 4.233 - vol. XIII]. 34. A jurisprudência desta Corte considerou questão semelhante no julgamento da ACO n. 323, Relator o Ministro FRANCISCO REZEK, DJ de 08.04.1994, ao cogitar da área indígena Krenak, em Minas Gerais. 35 . presença O de Relator índios diz na em seu região, o voto, que quanto gerou a à pequena extinção do Posto Indígena mineiro: "Desde logo, só se extingue o que preexiste. Caso admitíssemos a reversão também poderia operar na hipótese de ser abandonada a colônia, de todo modo não podia o Estado declarar unilateralmente a falta da União, para reaver as terras e dá-las a terceiros. Revel às tropelias do homem branco, a posse indígena foi constante, embora as vezes rarefeita, e outras tantas vezes ultrajada pela mão daquele." ACO 312 / BA 36. A baixa determinados decorrente demografia momentos de históricos, esbulhos consubstancia indígena na região principalmente perpetrados pelo óbice ao reconhecimento em quando forasteiro, do caráter não permanente da posse dos silvícolas. Exata e precisamente como anotou em seu voto na ACO 323 o Ministro NÉRI DA SILVEIRA: "se houve remoção, como violenta, ficou isso não demonstrado as nos autos, descaracterizou como de forma terras de índios". 37 . Afirmou-se no laudo ser incontestável a identidade étnica indígena especialmente na dos atuais Fazenda São ocupantes Lucas, da principal região, local fixação dos silvícolas à época dos trabalhos periciais 4.228]. [foto Ali foram encontrados vasos cerâmicos - fl. 4.255 - vol. XIII] e um antigo de [ f1 . indígenas cemitério [fi. 4.201 - vol. XIII]. 38. O na perito afiançou, por fim, que a área discutida inicial obstante é as adequada sensíveis ao assentamento alterações do dos indígenas, ecossistema não causadas pela sua ocupação desordenada por estranhos. 3 9. Em suma : a perícia antropológica comprova que a área em litígio consubstancia terra indígena. A presença de silvícolas foi constante, com variações populacionais ao longo do tempo. Dá-se resposta afirmativa, pois, à indagação proposta na questão de ordem decidida pela Corte. A reserva indígena Caramuru-Catarina-Paraguaçu indígena. Por isso mesmo não é dotada de nenhuma relevância a informação trazida aos autos em consubstancia uma das terra contestações, ACO 312 / BA referida no item descontinuidade e 28 do meu relatório. na administração desinformação Evidencia de órgão público, 40. A perícia sanitária concluiu pela precariedade das águas que abastecem necessário Unidades a tratamento de região em seu convencional Tratamento de Água estado para em bruto, consumo Camacã, Colônia, Palmira, Pau Brasil e Santa Luzia sendo humano. Itapé, Há Itajú do [fls. 4.623- vol. X I V ] . Atribuiu-se o resultado negativo ao regime de estiagem prolongada na que, elementos época, infectantes, desenvolvida na concentrou oriundos região pelos nos mananciais principalmente estranhos a ela da os pecuária [fl. 4.625 - vol. X I V ] . 4 1. O região para mandioca, Apontou as agronômico culturas de seringueira, a "devido mananciais favorecem às Referiu do do cultivo potencialidade "conillon", geral emprego regime que a pecuária ser melhoradas, dada em dificuldades e a café palmáceas disponíveis a prática atestou cacau, impossibilidade irrigação XIV]. laudo de impostas pluviométrico sequeiro" bovina, a precariedade e banana, graviola. técnicas pelo de relevo, regular [ f 1 . 4.709 caprina da e ovina que - vol. podem e falta de condições de higiene verificadas em alguns locais. 42. Questionado sobre a produção de cacau na região, o perito não roçados na localizou remanescentes área [trezentas de e 54.0 00 culturas produtivas [fls. 4.806 ha cinqüenta cinco] planta, senão - vol. X I V ] . Informou que periciada e da foram encontradas propriedades rurais, 35 5 186 ACO 312 / BA [cento e oitenta e seis] com produtividade empregam ao todo cerca oito] trabalhadores temporários, com 3.589.004,04 de 478 satisfatória, que [quatrocentos fixos e 539 e setenta e [quinhentos e trinta e nove] estimativa bruta de [três milhões, quinhentos produção e oitenta de R$ e nove mil e quatro reais e quatro centavos] em 199 8. 43. na Sobre a repercussão econômica da produção região, concluiu características de disponibilidade de atuais bens de representaria totalidade a haja modernização que insumos perda serão o léguas entre Estado Alega, pelos perícia n. de novos da Bahia, em impactos a porém não e os que em sua sinais na aos o de fazenda de ordem dos perda que "a dependerá ocupantes topográfica 1.916/26 de pouca social títulos das unidades minimização logicamente aos bens de de ou da produção - vol. X I V ] . os marcos Serviço porém constatados e da juntada área indígena estabeleceu em favor dos indígenas. Em o periciada, nulidade impactos 45. estadual produção e comparados auferidas desemprego [fl. 4.819 aviventou dinamismo receita, receitas declaração existentes" A área oferece - vol. X I V ] . destes imposta seu indígena semoventes da sua de familiares. agravamento em que os principais propriedade VII as meios da dinâmica da vista decorrentes produtivas produção e bens produção dos Afirma atual instabilidade São L u c a s " [fl. 4.817 44. "a agrícola Proteção razão ao a em autos no reserva sua - SPI Anexo questão. A de acordo e o Governo extensão foi Lei cinqüenta 1937 celebrou-se um índio do que aos do reduzida ACO 312 / BA aos atuais 54.105,1826 ha, superiores às estimativas FUNAI na inicial em aproximadamente 36,000 ha. 46. foi A demarcação [relatório do 05.11.1938 - relato, de três de área Engenheiro fls. Alfredo 4.099/4.112 posseiros arrendatários títulos da do da não datados de na XII]. em Coelho, Tais (fl. 4.109 de Segundo a alegando 1933. 1938 esse imputação possuírem títulos não - Vol. 1 2 ] . 0 debate a propósito do aumento da área mencionada não inicial implica o 4.652/4.653 - vol. X I V ] . 48. Federal da que perícia instruiu realizada, o feito como [fls. A FUNAI, embora não conhecesse as exatas dimensões indígena, juntou aos autos os elementos materiais da reserva necessários mais Juízo nulidade esclareceu da Amorim aceitaram Indígena, foram contudo acostados aos autos 47. de vol. região Posto propriedade - concluída da à correta medição, moderna aponta mesmo 1938, erros tecnologia alguns erros de efetivada o emprego georeferenciamento. cometidos atribuíveis mediante à pelos qualidade 0 perito engenheiros, dos em instrumentos topográficos então disponíveis. 49. Os propriedade quesitos relativos após a demarcação à expedição de títulos de não foram respondidos em razão da omissão do INTERBA, que não forneceu os documentos a eles atinentes. A perícia, no entanto, serviu à correta delimitação da área indígena, com a aviventação dos rumos. ACO 312 / BA 50 . Os foram por documentos juntados aos determinação relativos autos do em 2002 Ministro aos [fl. NELSON imóveis 5.572 - dos vol. JOBIM. réus XVII], Títulos de propriedade outorgados pelo Governo do Estado da Bahia entre os anos Pau de 1978 a 1984, nos Municipios Brasil e Camaean, as seguintes de Itajú pessoas do Colônia, físicas [Vol . XVII ] : 1 - Agnaldo Lima da Silva, em 14.03,83, fl. 5593; 2 - Álvaro Luiz de Carvalho, em 2.2.82, fl. 5.599; 3 - Alide Maria da Silva, em 14.3.83, fl. 5.605; 4 - Antonio Rodrigues Ferreira, em 30.8.83, fl. 5. 615; 5 - Benjamim Tito da Luz, em 3.2.83, fl. 5.620; 6 - Domingos Carvalho de Gois, em 24.3.81 e 14.3.83, fls. 5.625 e 5.631; 7 - Eloy Gomes dos Santos, em 22.6.78, fl. 5.636; 8 - Filomeno José dos Santos, em 14.3.83, fl. 5 .642; 9 - Francisco Lins Cardoso, em 5.9.84, fl. 5.646; 10 - Gildemberg Siqueira Viana, em 30.1.81, fl. 5.652; 11 - João Avílete Sobral, em 14.3.83, f 1.5.656; 12 - João Pedro dos Santos, em 29.6.81, fl. Nascimento, em 30.10.78, fl. 14.3.83, fl. 5.664; 13 - José Bispo do 5-668; 14 - 5.674. Luiz Profeta dos Santos, em ACO 312 / BA 51. pelo Os Estado trinta da e Bahia, dois documentos relatório, consubstanciam região e registros certificados de de documentos a outorga propriedade cadastramento de anexados referidos no de domínio em aos item 29 do de terras na cartórios, imóveis autos rurais bem no como INCRA [Vol. I I ] : 1 - Título de Domínio do Governo do Estado Bahia, datado de 28.7.1903, concedendo área Município de Canavieiras, fl. 583; da no 2 - Título de Domínio do Governo do Estado Bahia, datado de 18.11.1934, concedendo área Município de Canavieiras, fl. 584; da no 3 - Título de Domínio do Governo do Estado Bahia, datado de 11.2.1936, concedendo área Município de Canavieiras, fl. 585; da no 4 - Título de Domínio do Governo do Estado Bahia, datado de 15.3.1938, concedendo área Município de Canavieiras, fl. 583; da no 5 - Título de Domínio do Governo do Estado Bahia, datado de 31.3.1938, concedendo área Município de Itambé, fl. 594; da no 6 - Título de Domínio do Governo do Estado Bahia, datado de 10.5.1938, concedendo área Município de Itambé, fl. 595; da no 7 - Título de Domínio do Governo do Estado Bahia, datado de 6.12.1959, concedendo área Município de Itabuna, fl. 596; da no 8 - Título de Domínio do Governo do Estado da Bahia, datado de dia ilegível do mês de novembro de 1940, concedendo área no Município de Itabuna, fl. 597; ACO 312 / BA 9 - Título de Domínio do Governo do Estado Bahia, datado de 8.10.1941, concedendo área Município de Canavieiras, fl. 598; da no 10 - Título de Domínio do Governo do Estado Bahia, datado de 15.10.1943, concedendo área Município de Itambé, f1. 59 9 ; da no 11 - Título de Domínio do Governo do Estado Bahia, datado de 15.10.1943, concedendo área Município de Itambé, fl. 600; da no 12 - Título de Domínio do Governo do Estado Bahia, datado de 17,4,1944, concedendo área Município de Itambé, f1. 6 02 ; da no 13 - Título de Domínio do Governo do Estado Bahia, datado de 9.12.1944, concedendo área Município de Itabuna, fl. 603; da no 14 - Título de Domínio do Governo do Estado Bahia, datado de 17.6.1947, concedendo área Município de Canavieiras, fl. 604; da no 15 - Título de Domínio do Governo do Estado da Bahia, datado de dia ilegível do mês de janeiro de 1949, concedendo área no Município de Itabuna, fl. 605; 16 - Título de Domínio do Governo do Estado da Bahia, dia e mês ilegíveis do ano de 1949, concedendo área no Município de Itabuna, fl. 606; 17 - Título de Domínio do Governo do Estado Bahia, datado de 12.12.1949, concedendo área Município de Itabuna, fl. 607; da no 18 - Título de Domínio do Governo do Estado Bahia, data ilegível, concedendo área Município de Itabuna, fl. 608; da no 19 - Título de Domínio do Governo do Estado Bahia, datado de 2.4.1952, concedendo área Município de Itabuna, fl. 609; da no ACO 312 / BA 20 - Título de Domínio do Governo do Estado Bahia, datado de 31.12.1952, concedendo área Município de Canavieiras, fl. 611; da no 21 - Título de Domínio do Governo do Estado Bahia, datado de 27.3.1953, concedendo área Município de Itabuna, fl. 612; da no 22 - Título de Domínio do Governo do Estado Bahia, datado de 9.12.1954, concedendo area Município de Itambé, fl. 613; da no 23 - Título de Domínio do Governo do Estado Bahia, datado de 15.3.1956, concedendo área Município de Itabuna, fl. 614; da no 24 - Título de Domínio do Governo do Estado Bahia, datado de 15.3.1956, concedendo área Município de Itabuna, fl. 615; da no 25 - Título de Domínio do Governo do Estado da Bahia, datado de 10 de outubro da década de 1950, concedendo área no Município de Canavieiras, fl. 616; 26 - Título de Domínio do Governo do Estado Bahia, datado de 9.6.1960, concedendo área Município de Canavieiras, fl. 617; da no 27 - Título de Domínio do Governo do Estado Bahia, datado de 6.7.1962, concedendo área Município de Canavieiras, fl. 618; da no 28 - Título de Domínio do Governo do Estado da Bahia, datado de 30 de setembro de ano ilegível, concedendo área no Municipio de Canavieiras, fl. 619; 29 - Título de Domínio do Governo do Estado Bahia, datado de 12.5.1965, concedendo área Município de Itabuna, fl. 62 0 ; da no 30 - Título de Domínio do Governo do Estado da Bahia, datado de novembro de 1965, concedendo área no Município de Canavieiras, fl. 621; ACO 312 / BA 31 - Título de Domínio do Governo do Estado Bahia, datado de 11.4.1966, concedendo área Município de Canavieiras, fl. 62 2 ; da no 32 - Título de Domínio do Governo do Estado Bahia, datado de 7.1.1970, concedendo área Município de Canavieiras, fl. 623. da no 52 . Como se vê, nenhum deles nenhum desses títulos da reserva. Daí a nenhum, absolutamente nenhum deles está situado na área absoluta irrelevância de todos, todos eles . 53. De posse determinou-se relatório oitenta dentro e quarenta e tituladas. o da tituladas nem foi e 36 da dos no polígono fls. 5.775 indígena, 43 143 relação encontrada e seis] de réus medido. 0 186 [quarenta [trinta imóveis, revelaram de identificadas disso, constam de reserva três] descritivos glebas mapa áreas não originária; e das seis] Além ocupadas, memoriais a plotagem pericial existência, dos e [cento e [cento e três] áreas, da qualquer a ação não embora cível informação a respeito delas após pesquisas junto ao CEPLAC, cartórios de registros imobiliários, escritórios de compra de cacau, cooperativas e antigos habitantes da região. 54 . A FUNAI juntou aos autos mapa em que combina a plotagem elaborada pelo perito e áreas cujas ocupações foram indenizadas inúmeras pela autarquia benfeitorias extremamente foram importante. que se encontravam [fls. 6.073). indenizadas. Estranhos às dentro da reserva Pois é certo Esse populações aspecto que é indígenas se foram, recebendo a ACO 312 / BA indenização da FUNAI pelas construções e demais acessões efetivadas na área. 55. No julgamento da ACO n. 323, esta Corte decidiu, à unanimidade, outorgados pela pelo Constituição de nulidade Estado 1934 de e, dos Minas antes títulos Gerais dele, de com na propriedade fundamento chamada "Lei na de Terras" de 1850. 56. Colho no voto do Relator, o Ministro FRANCISCO REZEK, o seguinte trecho: "Esta circunstância material comprovada por perícia culminou por ver-se chancelada pelo direito constitucional superveniente - de 19 34 em diante - a consagrar a posse indígena e o domínio da União, nos termos do que estabeleceram, pela ordem cronológica, 'o art. 12, 1o, da Lei n° 601, de 18 de setembro de 1850 (Lei de T e r r a s ) ; os artigos 7 2 , 73 e 75 do decreto n° 1.318, de 1854; o art. 83 da Constituição de 1891; o art. 1o do Decreto n° 5.462, de 10 de dezembro de 1920, do Estado de Minas Gerais; a escritura pública lavrada em 15 de dezembro de 1920 e levada ao Registro de Imóveis em 23 de maio de 1939; o art. 10, §§ 1° e 2 ° , do Decreto-lei n° 5.484, de 1928; o art. 129 da Constituição de 1934; o art. 154 da Constituição de 1937; o art. 216 da Constituição de 1946; o art. 189 da Constituição de 1967; os artigos 40, IV, e 198, e §§, da Emenda Constitucional n° 1, de 1969; os artigos 22, parágrafo único, 25 e 62, § 1 ° , da Lei n° 6.001, de 19 de dezembro de 1973 (Estatuto do í n d i o ) ' . Não podia o Estado, assim, dar as terras a terceiros e promover o registro disso já na segunda metade do século. Em 1958, com o alegado abandono da colônia, o poder público estadual já não tinha base jurídica para invocar condição resolutiva - em gesto unilateral - e disseminar ACO 312 / BA títulos de propriedade a partir de então, porque desde 1934 as constituições vinham dizendo do domínio da União sobre as terras em que verificada como aqui atesta o acervo pericial - a posse indígena. Não vejo como, frente a quadro tão transparente, fazer abstração do que dizem os fatos e o direito constitucional de mais de meio século para tão-só manter o estado atual das coisas". 57. Permito-me PONTES DE MIRANDA existência dos efeitos art. EC relembrar, do a reproduzida silvícolas 198 da na esta altura, linhas região Constituição acima: para de lição que basta a operem os redação da se 1967, na de 1/69. 58. A perícia antropológica demonstrou a existência permanente de índios na região desde 1651, em maior ou menor intensidade. hãe, bem Confirmou como a a identidade ligação de seus do povo Pataxó integrantes à Hã-hã- terra, que lhes foi usurpada. 59. A que reduziram proteção que Lei nos previa membros, estadual a área termos ação n. da da 1.916/26 reserva política conjunta confirmam a e os atos indígena, indigenista entre existência União de visando então [SPI] uma posteriores área e à sua vigente, Estados- ocupada por índios na região dos Rios Pardo, Gongogy e Colônia. 60. Tem-se silvícolas na como área não Terras de 1850, como quando do advento ao patrimônio da demonstrada, apenas também quando eis da Constituição União, destarte, nos de da a edição o que mais 1967. Área termos do seu presença da Lei de de importa incorporada art. 198, ACO 312 / BA independentemente de efetiva demarcação, art. 25 do Estatuto do índio 61. a prova transferidas prospera quem de no [Lei n. 6 . 0 0 1 / 7 3 ] . que pelo Estado quer que seja e terras da Bahia índios impossível. 1967 as terras ocupadas o 4 , I V ) , sendo terras usufruto foram à União ou nelas leio administração a aos e dos aos índios indígena no da silvícolas reconhecido recursos existentes nossa Federal 480: entre Brasil, o seu e 1967, as algo de (art. permanente direito ao todas as de Quanto "Pertencem dos de a posse 186). termos não Constituição naturais (art. Súmula da União, nos Constituição vigência efetivamente pelos índios são bens da União habitam exclusivo consubstancia, Na assegurada que utilidades aspecto, as em favor dos réus. Disputa por terra juridicamente da o disposto O argumento nos termos do qual seria necessária, no caso, das qual ao a este domínio e o arts. 4 , IV, e 186, terras ocupadas por silvícolas". 62. Note-se inicialmente que se cuida bem, arrendou foi a respeito "pequenos o Serviço de "viria o Governo Ministro devolver da aos terra que na quem área de índios, como se do Estado da Bahia. Ademais, o próprio Estado da Bahia diz que Federal, através Agricultura, questão, tratos" de Proteção lê a fls. 1.117, na contestação curiosamente, a fls. 1.119 dessa de 9 do Aviso de maio GB de n. 296 do Sr. 1.958 propor ao Governo do Estado da Bahia a área considerada Lei 1916/26", dela era inalienável na retendo pequena parcela. De resto, a área nos termos do artigo 1934, desde a Lei n. 601/1850 129 da Constituição [Lei de T e r r a s ] , artigo 75. de ACO 312 / BA 63. A propósito, o seguinte trecho do voto do Ministro VICTOR NUNES LEAL, ainda no RE n. 44.585: "Se os índios, na data da Constituição Federal, ocupavam determinado território porque desse território tiravam seus recursos alimentícios, embora sem terem construções ou obras permanentes que testemunhassem posse de acordo com o nosso conceito, essa área, na qual e da qual viviam, era necessária à sua subsistência. Essa área, existente na data da Constituição Federal, é que se mandou respeitar. Se ela foi reduzida por lei posterior, se o Estado a diminuiu de dez mil hectares, amanhã reduziria em outras dez, depois, mais dez, e poderia acabar confinando os índios a um pequeno trato, até o terreiro da aldeia, porque ali é que a 'posse' estaria materializada nas malocas . [- . . ] Entendo, portanto, que, embora a demarcação desse território resultasse, originariamente, de uma lei do Estado, a Constituição Federal dispôs sobre o assunto e retirou ao Estado qualquer possibilidade de reduzir a área que, na época da Constituição, era ocupada pelos índios, ocupada no sentido de utilizada por eles como seu ambiente ecológico". 64. passagem Quanto à inalienabilidade, de outro voto do Ministro reporto-me VICTOR à seguinte NUNES LEAL, nos autos do MS n. 16.443, de 1967: "o simples fato de pertencerem à União as terras ocupadas pelos índios não as sujeita integralmente ao regime legal de venda dos bens públicos, dado o seu caráter de inalienabilidade. Não está envolvido, no caso, uma simples questão de direito patrimonial, mas também um problema de ordem cultural, no sentido antropológico, porque essas terras são o habitat dos remanescentes das populações indígenas do ACO 312 / BA País. A permanência dessas terras em sua posse é condição de vida e de sobrevivência desses grupos, já tão dizimados pelo tratamento recebido dos civilizados e pelo abandono em que ficaram". 65. Demonstrada quando do advento importa tem-se a da presença Constituição que eram elas de silvícolas de 19 67 ocupadas na eis por área o que indígenas não apenas em tempos imemoriais. Daí a irrelevância do relatório do Consultor Jurídico do Ministério - vol. I V ] . Daí também da Agricultura, [fls. 1.119 porque entre a situação de que aqui cuidamos não há e as que de 1960 semelhança foram objeto dos julgamentos desta Corte no RE 219.983 e no RE 262.978. 66. AURÉLIO, O Relator excluiu extraordinário das do o RE caso hipóteses n. 219.983, analisado nas quais há Ministro naquele terra MARCO recurso demarcada e habitada por indígenas: "Conclui-se, assim, que a regra definidora do domínio dos incisos I e XI do artigo 20 da Constituição de 198 8, considerada a regência seqüencial da matéria sob o prisma constitucional, não alberga situações como a dos autos, em que, em tempos memoráveis, as terras foram ocupadas por indígenas. Conclusão diversa implicaria , por exemplo, asseverar que a totalidade do Rio de Janeiro consubstancia terras da União, o que seria um verdadeiro despropósito. Por tais razões, não conheço deste extraordinário, ressaltando, mais uma vez, a impertinência da evocação, em parecer, do precedente da lavra do Ministro Celso de Mello, formalizado quando do julgamento do Recurso Extraordinário n° 183.188, cujo acórdão foi publicado no Diário da Justiça de 14 de ACO 312 / BA fevereiro de 1997, porquanto nele presente controvérsia a envolver demarcadas e habitadas por indígenas". 67. Aqui outra. Eles 1967, lá estavam ainda que afastados, outorgadas permito-me pelo permanente presentes alguns quando repetir na data da tenham sido particulares Estado Bahia. Constituição dela concessões em que posse toda necessária à peculiaridade utilizada preservação para de o sua não a reduzida ao conceito de posse do direito civil. Abrange habitada, Constituição de posteriormente receberam Insisto é bem ser área pela situação pode a mencionada da a se fez terras sustento do identidade índio, cultural, apontada em voto sempre mencionado do Ministro VICTOR NUNES nos autos do RE n. 44.585. 68. Outrossim, circunstância de aquisição a non 69. Em que domino uma não será títulos de demasiada a propriedade alusão à oriundos de são nulos. tentativa de síntese ter-se-á o seguinte quadro : os réus integraram a lide, utilizada a citação por edital somente após todos os esforços da FUNAI para citação pessoal dos réus; a citação por edital surte ou não surte os efeitos estabelecidos na lei processual quer se afirme ou negue vigência a ela; a admitir-se a vigência do instituto da citação por edital, nenhuma circunstância ou peculiaridade estranha à causa de pedir poderá tornar apenas relativos os seus efeitos [efeitos da citação por e d i t a l ] ; não há falar-se, pois, em "ineficácia da decisão em relação a quem não participou do feito por não ter sido citado ou sequer nomeado", qual anotou a União em sua réplica. ACO 312 / BA 70. No mais, não há títulos de domínio, no interior da reserva, que anteriores parecia à vigência complexo no da Constituição início da demanda de 1967. 0 resulta agora, vinte e seis anos após, extremamente simples. Repito: não há títulos de propriedade válidos no interior da reserva. 71. Outrossim, em uma parte da área objeto da lide há ou havia benfeitorias que foram indenizadas pela FUNAI [fl. 6.073 - vol. XIX]; outra parte corresponde a terras quais não há título nenhum, terras de domínio das da União; e uma terceira porção sua é de terras em relação às quais, não obstante as diligências a que fiz alusão linhas acima (item 50), ninguém se manifestou alegando titularidade de domínio. 72. os 0 pedido diz com a declaração de nulidade de todos títulos de propriedade da área. Onde não se alegou a existência de título não há como anular qualquer efeito. Mas a ação é declaratória e visa a restabelecer a integralidade da Reserva deve ser Indígena Caramuru-Catarina-Paraguaçu. julgada procedente na extensão de Daí porque todos os seus efeitos declaratórios. Julgo procedente a ação para declarar a nulidade de todos os estej am títulos de localizadas propriedade dentro da cujas área respectivas da Reserva glebas Indígena Caramuru-Catarina-Paraguaçu, todos eles. Julgo por FERPEC Rodrigues e improcedentes outros Ferreira [fls. e outros as reconvenções 652/659 [fls. - vol. apresentadas III]; Antônio 1.701/1.708 Josué Brito de Miranda e outros [fls. 1.808/1.815 - vol. V] ; - vol. V ] ; ACO 312 / BA e Abenilson Santos Rocha e outros [fls. 2.105/2.110 - Vol. VI] . Condeno os réus ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% [dez por cento] sobre o valor atualizado da causa. 24/09/2008 TRIBUNAL PLENO AÇÃO CÍVEL ORIGINÁRIA 312-1 BAHIA EXPLICAÇÃO O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO (PRESI DENTE)Senhores, para que não se imagine que a Presidência não está assegurando tratamento igual aos interessados, aviso-lhes que o artigo 251 do Regimento Interno permite sustentação de trinta minutos. 24/09/2008 TRIBUNAL PLENO AÇÃO CÍVEL ORIGINÁRIA 312 BAHIA TRIBUNAL PLENO AÇÃO CÍVEL ORDINÁRIA 312 VISTA O SR. MINISTRO MENEZES DIREITO - Senhor Presidente, ouvimos um belíssimo voto do eminente Ministro Eros Grau, trazendo uma contribuição extremamente importante. Gostaria de assinalar, também, que recebi três memoriais exemplares, de ambas as partes e também da Advocacia Geral da União, os quais, na verdade, honram a Magistratura brasileira e a Advocacia brasileira. Pedi vista, em processo anterior, do qual foi Relator o eminente Ministro Carlos Britto, na questão relativa à terra indigena Raposa Serra do Sol. Sou também Relator do Recurso Extraordinário n° 204.647 que cuida de um interdito proibitório, ajuizado pela Funai, o qual mereceu sentença de procedência, confirmada pelo Tribunal Regional Federal, extraordinário. e que agora se encontra também em recurso ACO 312 / BA Diante dessa circunstância, Senhor Presidente, louvando o extraordinário voto, culto, erudito, sedimentado, como sempre o faz, do Ministro Eros Grau, julgo do meu dever pedir vista dos autos para examinar conjuntamente a questão. Entendo, como disse antes, que as questões têm ligação. Elas partem necessariamente, independente da questão dos títulos, da conceituação de terras indígenas. E nós todos estamos aqui, no Supremo Tribunal Federal, a procurar uma definição concreta para estabelecer em definitivo essa conceituação, considerando todo o histórico dos múltiplos precedentes que existem nesta Corte. Com essa fundamentação, peço vênia aos meus eminentes Colegas, em especial ao meu querido amigo Ministro Eros Grau, para pedir vista dos autos. Obs.: Texto sem revisão do Exmo. Sr. Ministro Menezes Direito. (§ 3o do artigo 96 do RISTF, com a redação dada pela Emenda Regimental n° 26, de 22 de outubro de 2008) PLENARIO EXTRATO DE ATA AÇÃO CÍVEL ORIGINÁRIA 312-1 PROCED.: BAHIA RELATOR : MIN. EROS GRAU AUTORA: FUNDAÇÃO NACIONAL DO ÍNDIO - FUNAI ADV.(A/S): ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO LIT.ATIV.(A/S): UNIÃO ADV.(A/S): ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO RÉUS: ANANIAS MONTEIRO DA COSTA E OUTROS ADV.(A/S): JOSÉ GUILHERME VILLELA E OUTROS RÉUS: ALMIR PINTO CORREIA ADV.: ALTAMIRANDO MARQUES RÉUS: AGENOR DE SOUZA BARRETO E OUTROS ADVDA.: WHILDE COSTA SOUZA REU: JOSINO PINTO CORREIA ADV.: HUMBERTO DE FIGUEIREDO MACHADO REU: MANOEL NASCIMENTO CARVALHO ADVDOS.: EDVALDO SANTIAGO E OUTROS LITISDEN.: ESTADO DA BAHIA ADVDOS.: PGE-BA - ANTÔNIO JOSÉ TELLES DE VASCONCELLOS E OUTROS Decisão: Retirado de pauta. Presidência da Senhora Ministra Ellen Gracie, Vice-Presidente no exercício da Presidência. Plenário, 19.04.2006. Decisão: Preliminarmente, o Tribunal, por unanimidade, resolveu questão de ordem, proposta pelo Relator, no sentido de admitir na lide, na condição de assistente simples da autora, a Comunidade Indígena Pataxó Hã Hã Hãe, recebendo o processo no estado em que se encontra. Em seguida, após o voto do Senhor Ministro Eros Grau (Relator), rejeitando a preliminar de impossibilidade jurídica do pedido, julgando procedente a ação e improcedentes as reconvenções, pediu vista dos autos o Senhor Ministro Menezes Direito. Ausente, ocasionalmente, na segunda parte da sessão o Senhor Ministro Joaquim Barbosa. Falaram, pela autora, o Dr. Antônio Solmeirão, Procurador Federal representando a FUNAI; pela litisconsorte ativa, União, o Advogado-Geral da União, Ministro José Antônio Dias Toffoli; pela assistente da autora, Comunidade Indígena Pataxó Hã Hã Hãe, o Dr. Paulo Machado Guimarães; pelo litisdenunciado, Estado da Bahia, o Dr. Antônio José Telles de Vasconcellos, Procurador do Estado; pelos réus, Ananias Monteiro da Costa e outros, o Dr. José Guilherme Villela e, pelo Ministério Público Federal o Procurador-Geral da República, Dr. Antônio Fernando Barros e Silva de Souza. Ausentes, justificadamente, o Senhor Ministro Gilmar Mendes (Presidente) e a Senhora Ministra Ellen Gracie. Presidência do Senhor Ministro Cezar Peluso (VicePresidente) . Plenário, 24.09.2008. Presidência do Senhor Ministro Cezar Peluso (VicePresidente) . Presentes à sessão os Senhores Ministros Celso de Mello, Marco Aurélio, Cezar Peluso, Carlos Britto, Joaquim Barbosa, Eros "Grau, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia e Menezes Direito . Procurador-Geral da República, Dr. Antônio Fernando Barros e Silva de Souza. Luiz Tomimatsu Secretário Supremo Tribunal Federal 02/05/2012 67 PLENÁRIO AÇÃO CÍVEL ORIGINÁRIA 312 BAHIA RELATOR REDATOR DO ACÓRDÃO AUTOR(A/S)(ES) PROC.(A/S)(ES) LIT.ATIV.(A/S) ADV.(A/S) ASSIST.(S) ADV.(A/S) RÉU(É)(S) ADV.(A/S) RÉU(É)(S) ADV.(A/S) RÉU(É)(S) ADV.(A/S) RÉU(É)(S) ADV.(A/S) RÉU(É)(S) ADV.(A/S) LIT.PAS.(A/S) PROC.(A/S)(ES) RÉU(É)(S) ADV.(A/S) RÉU(É)(S) ADV.(A/S) RÉU(É)(S) ADV.(A/S) RÉU(É)(S) ADV.(A/S) : MIN. EROS GRAU : MIN. LUIZ FUX : FUNDAÇÃO NACIONAL DO ÍNDIO - FUNAI : PROCURADOR-GERAL FEDERAL : UNIÃO : ADVOGADO -GERAL DA UNIÃO : COMUNIDADE INDÍGENA PATAXÓ Hà Hà HÃE : PAULO MACHADO GUIMARÃES : ANANIAS MONTEIRO DA COSTA : PEDRO AUGUSTO DE FREITAS GORDILHO : ALMIR PINTO CORREIA : ALTAMIRANDO MARQUES : AGENOR DE SOUZA BARRETO : WHILDE COSTA SOUZA : JOSINO PINTO CORREIA E OUTRO(A/S) : PEDRO AUGUSTO DE FREITAS GORDILHO : MANOEL NASCIMENTO CARVALHO : EDVALDO SANTIAGO : ESTADO DA BAHIA : PROCURADOR-GERAL DO ESTADO DA BAHIA : ANTÔNIO RODRIGUES FERREIRA E OUTROS : PEDRO AUGUSTO DE FREITAS GORDILHO : ANTONIO CARLOS WENSE PINTO : VINICIUS BRIGLIA PINTO : DIRVAN SILVEIRA FERNANDES E OUTROS : MARCOS JOEL DOS SANTOS : GUY FERREIRA DE MELLO E OUTROS : MARCELO MENDES S. PATRIOTA QUESTÃO DE ORDEM A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Senhor Presidente, Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3517788. Supremo Tribunal Federal 68 ACO 312 / BA pedi há algum tempo, uns dois meses, que, se possível, houvesse a continuidade do julgamento do processo na Ação Cível Originária n. 312, que teve início de julgamento em 2009, e diz respeito à questão da área indígena de Patajós, no Sul da Bahia. A situação na área é extremamente grave – como é de conhecimento público, porque tem sido muito noticiado – e, em face disso, se houvesse possibilidade, o material foi amplamente divulgado, embora eu saiba que a pauta é uma pauta dirigida, uma pauta pública, e que, a despeito de o Regimento não prever ou permitir que não haja a necessidade de reinclusão da pauta, nossa prática tem sido nesse sentido. Sei que a tendência é essa e que alguns, como o Ministro Marco Aurélio, nosso quase decano, é até muito rigoroso – acho que está certo –, mas consulto o Plenário e Vossa Excelência, como Presidente da sessão e do Tribunal, se não seria o caso de haver a possibilidade de retomada do julgamento, se for essa a primeira chamada do ProUni, que também é continuidade do julgamento. Apenas em razão da situação grave no local , como eu disse, envolvendo situações de morte. Enfim, estou consultando sobre a possibilidade, mas me curvando à decisão do Plenário e da Presidência. ### 2 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3517788. 69 02/05/2012 PLENÁRIO AÇÃO CÍVEL ORIGINÁRIA 312 BAHIA O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – Presidente, habituamo-nos – nós, os advogados e a sociedade – com a pauta dirigida, veiculada no sítio do Tribunal na internet, com antecedência de 48 horas. Já sustentei neste Plenário – estou sendo coerente com essa posição – que não cabe, por maior que seja a excepcionalidade, descredenciar essa pauta. Implica algo importantíssimo, que é a publicidade. Permite que possíveis interessados que não participem diretamente da relação processual tenham o conhecimento da matéria que será enfrentada pelo Plenário e apresentem memoriais. Por isso, se Vossa Excelência me permite, pronuncio-me no sentido de não se apregoar o processo. Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2010319. 70 02/05/2012 PLENÁRIO AÇÃO CÍVEL ORIGINÁRIA 312 BAHIA VOTO SOBRE QUESTÃO DE ORDEM O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - Se os eminentes Ministros me permitem, eu vou antecipar o meu ponto de vista. De fato, a pauta dirigida nos leva a apregoar para julgamento aqueles processos dela, da pauta dirigida, já constantes. Mas o Direito trabalha também com situações - a própria Constituição - de emergência, de relevância, de imprevisibilidade como pressupostos de edição de atos jurídicos formais. O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – O móvel não seria esse. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - Não. Eu digo que os fatos se precipitaram, nessa região, de modo imprevisível e, ao que parece, incontrolável. O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – Porque esse processo já esteve na pauta dirigida e, atendendo-se a pedido formulado pelo Governador do Estado da Bahia, projetou-se no tempo o exame. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - A precipitação dos fatos se deu nos últimos dias. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Se Vossa Excelência me permite, realmente o Ministro Marco Aurélio tem razão. Entrou em pauta e, na iminência do início da sessão, houve o requerimento para se tentar um acordo, um consenso, em face exatamente da conflituosidade. Em 30 de março, o Estado da Bahia requereu, e eu imediatamente Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2010320. 71 ACO 312 / BA pedi que fosse recolocado em pauta para continuidade, em face da gravidade da situação instalada. Essa situação de 30 de março - o meu despacho é mais ou menos desses dias - até hoje só se agravou. Por isso é que eu trouxe, Ministro Marco Aurélio, não só respeitando, como inclusive concordando com Vossa Excelência quanto à transparência e à segurança que se dá essa pauta. Como eu disse, eu me curvo, Senhor Presidente, ao que for decidido pelo Plenário. O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – Para mim, Presidente, o tratamento deve ser linear, ou essa pauta é oficial, confiável, ou não é, e então, devemos expungi-la do cenário jurídico. Mas qual seria o móvel de apregoarmos esse processo? O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - Não. A confiabilidade é a regra. Agora, há situações excepcionalíssimas: se a eminente Relatora nos dá conta da urgência da situação... A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Eu não sou Relatora, eu sou a próxima a votar, o Relator é o Ministro Eros Grau. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - O Relator é o Ministro Eros Grau, mas caiu para Vossa Excelência, que é a próxima a votar. Se a Ministra Cármen Lúcia nos dá ciência de um fato inusitado, insólito, relevante, urgente, imprevisível, segundo as expectativas mais razoáveis. Eu me lembro de Goethe. O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – Presidente, vamos abrir o livro. O motivo seria realmente surpreender com o julgamento, a pretexto de evitar conflito. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - É por isso 2 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2010320. 72 ACO 312 / BA que estamos ponderando. O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – Vamos escancarar o motivo. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - Vamos, sim. Goethe dizia: a lei é poderosa; mais poderosa, porém, é a realidade. E Ulysses Guimarães costumava dizer: Sua Excelência, o fato. Se o fato é esse, e regimentalmente é possível colocar a matéria em votação, porque é uma continuidade de julgamento... O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – Mas brecamos a iniciativa de possíveis segmentos interessados em apresentarem memorial. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - Eu tenho ciência, em contato com autoridades, que a situação na área é praticamente de conflagração. Então eu me pronuncio, diante da ponderação da Ministra Cármen Lúcia, pelo chamamento do feito a julgamento, mas ouço Vossas Excelências. 3 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2010320. Supremo Tribunal Federal 02/05/2012 73 PLENÁRIO AÇÃO CÍVEL ORIGINÁRIA 312 BAHIA V O T O S/ Q U E S T à O D E O R D E M A SENHORA MINISTRA ROSA WEBER - Senhor Presidente, eu peço vênia ao eminente Ministro Marco Aurélio, mas acato as ponderações da eminente Ministra Cármen Lúcia e de Vossa Excelência, diante da excepcionalidade da situação, na medida em que também a própria mídia tem noticiado, de forma ampla, como está conflagrada a área e como a situação urge uma definição por parte desta Corte, considerando, sobretudo, que estamos em continuidade de julgamento. Esse aspecto me parece extremamente relevante. Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2199084. 74 02/05/2012 PLENÁRIO AÇÃO CÍVEL ORIGINÁRIA 312 BAHIA RELATOR REDATOR DO ACÓRDÃO AUTOR(A/S)(ES) PROC.(A/S)(ES) LIT.ATIV.(A/S) ADV.(A/S) ASSIST.(S) ADV.(A/S) RÉU(É)(S) ADV.(A/S) RÉU(É)(S) ADV.(A/S) RÉU(É)(S) ADV.(A/S) RÉU(É)(S) ADV.(A/S) RÉU(É)(S) ADV.(A/S) LIT.PAS.(A/S) PROC.(A/S)(ES) RÉU(É)(S) ADV.(A/S) RÉU(É)(S) ADV.(A/S) RÉU(É)(S) ADV.(A/S) RÉU(É)(S) ADV.(A/S) : MIN. EROS GRAU : MIN. LUIZ FUX : FUNDAÇÃO NACIONAL DO ÍNDIO - FUNAI : PROCURADOR-GERAL FEDERAL : UNIÃO : ADVOGADO -GERAL DA UNIÃO : COMUNIDADE INDÍGENA PATAXÓ Hà Hà HÃE : PAULO MACHADO GUIMARÃES : ANANIAS MONTEIRO DA COSTA : PEDRO AUGUSTO DE FREITAS GORDILHO : ALMIR PINTO CORREIA : ALTAMIRANDO MARQUES : AGENOR DE SOUZA BARRETO : WHILDE COSTA SOUZA : JOSINO PINTO CORREIA E OUTRO(A/S) : PEDRO AUGUSTO DE FREITAS GORDILHO : MANOEL NASCIMENTO CARVALHO : EDVALDO SANTIAGO : ESTADO DA BAHIA : PROCURADOR-GERAL DO ESTADO DA BAHIA : ANTÔNIO RODRIGUES FERREIRA E OUTROS : PEDRO AUGUSTO DE FREITAS GORDILHO : ANTONIO CARLOS WENSE PINTO : VINICIUS BRIGLIA PINTO : DIRVAN SILVEIRA FERNANDES E OUTROS : MARCOS JOEL DOS SANTOS : GUY FERREIRA DE MELLO E OUTROS : MARCELO MENDES S. PATRIOTA IMPEDIMENTO O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI: Eu estou impedido, porque atuei como Advogado-Geral da União Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3477647. 75 ACO 312 / BA no caso. 2 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3477647. Supremo Tribunal Federal 76 02/05/2012 PLENÁRIO AÇÃO CÍVEL ORIGINÁRIA 312 BAHIA VOTO SOBRE QUESTÃO DE ORDEM O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX - Senhor Presidente, a minha posição talvez seja mais cômoda, porque sucedi ao Relator, que já se pronunciou. Mas realmente observo que essa tem que ser a regra da pauta dirigida. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) Perfeito. O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX - Mas entendo que, em situações de emergência, como nós temos verificado esse noticiário diuturno, dando conta de que a responsabilidade vai acabar recaindo... O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – Não é emergência, Excelência. O problema é outro, o problema é surpreender. O que se quer é que o julgamento do Supremo seja implementado sem que haja a ciência prévia de possíveis envolvidos no conflito. O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX - Eu não sei, Ministro Marco Aurélio, tenho ouvido com constância, no noticiário, dizendo que essa situação fática está ocorrendo por força da inação do Supremo Tribunal Federal. O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – Mas já está ocorrendo há muito tempo e as quarenta e oito horas poderiam ter sido respeitadas. O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX - Então a situação é de periculum in mora mais do que manifesto. Tenho impressão de que a Corte tem responsabilidades a dever à sociedade. Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3122100. Supremo Tribunal Federal 77 ACO 312 / BA O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - E como se trata de continuidade de julgamento, bem ponderou a Ministra Rosa Weber. O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – Mesmo em continuidade a julgamento, temos observado a inserção do processo na pauta dirigida. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - Sim, isso tem sido a regra, e vai continuar assim. Agora, estamos diante de um caso insólito, de um caso excepcional. Por isso que estamos submetendo à votação. O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – Ministro, vou repetir: não sei a razão de não se querer admitir que o objetivo do pregão deste processo, sem estar na pauta na internet, é surpreender. Vamos falar claro, vamos ser minimamente fiéis ao quadro. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - Mas, como é continuidade, a ideia de surpresa fica visivelmente quebrantada. Regimentalmente nós estamos autorizados a fazer o julgamento. O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – Ouvi que a situação é conflagrada, e não é isso, porque conflagrada já o é há muito tempo. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Ministro, só para esclarecer. Efetivamente, quando eu dei um despacho sobre a continuidade, que eu já tinha liberado o meu voto, e da continuidade, eu dizia, há um mês e meio exatamente, que, tanto quanto possível, retomássemos, exatamente por causa da situação de extrema conflituosidade e conflagração. E semana passada, foi noticiado que tinha havido mortes na quarta-feira; na sexta-feira conversei com o Presidente 2 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3122100. 78 Supremo Tribunal Federal ACO 312 / BA exatamente no sentido de que estava pior. O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – Vejo que a balança da vida realmente tem dois pratos: ontem adiamos, a pedido do Governo da Bahia, porque a situação era conflagrada. Hoje vamos julgar, surpreendendo segmentos da sociedade, porque a situação é conflagrada. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Não, Ministro, nós atendemos ao Governo da Bahia. O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – Apenas quero compreender a prática pretendida. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - O requerimento do Estado da Bahia era para a tentativa, ainda uma vez, de um acordo para se evitar exatamente que se tivesse que dar uma decisão que poderia suscitar um acirramento maior. O pedido dele foi esse, isso foi trazido – na época era Presidente o Ministro Cezar Peluso – por escrito e foi deferido por causa disso. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - Então o Ministro Luiz Fux se pronuncia pelo julgamento. 3 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3122100. 79 02/05/2012 PLENÁRIO AÇÃO CÍVEL ORIGINÁRIA 312 BAHIA VOTO SOBRE QUESTÃO DE ORDEM O SENHOR MINISTRO JOAQUIM BARBOSA - Senhor Presidente, eu acompanho, entendo as ponderações da eminente Relatora, mas gostaria de dizer que eu mesmo não estou informado do que se trata. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - Eu fiz distribuir, na última segunda-feira à noite, o material com os gabinetes dos Senhores Ministros. O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – Mas sem o aviso de que seria feito o pregão hoje, Presidente. No Gabinete, recebemos material diariamente. O SENHOR MINISTRO JOAQUIM BARBOSA - Aos montes. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - Mas a Ministra Cármen acaba de pronunciar as seguintes palavras radicais: a situação é de extrema conflituosidade. O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – Já era, Presidente, e continuará sendo. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Mas eu também estou dizendo, Presidente, que eu me curvo à decisão do Plenário. Se o Plenário entender por adiar, não tem problema. O meu voto está pronto, mas não tem problema. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - Eu sei. Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3402638. 80 ACO 312 / BA Ouço o Ministro Joaquim Barbosa, com todo o respeito. O SENHOR MINISTRO JOAQUIM BARBOSA - Eu já me pronunciei, Senhor Presidente. Eu disse que, embora inteiramente desinteirado das questões postas neste processo, eu acompanharia a Relatora. 2 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3402638. Supremo Tribunal Federal 02/05/2012 81 PLENÁRIO AÇÃO CÍVEL ORIGINÁRIA 312 BAHIA VOTO A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA: 1. Senhor Presidente, Senhores Ministros: temos em mesa para continuidade de julgamento um dos casos mais graves que nestes seis anos de Supremo Tribunal me chegou às mãos. São vinte e cinco volumes de sofrimentos, lágrimas, sangue e mortes. E não se cuida de uma expressão, mas de mera constatação. De se afirmar, de pronto, que grande parte dos intensos conflitos (des)humanos hoje havidos na área em questão nesta ação decorrem de comportamentos estatais. Não de um ou outro governo, mas de mudanças formuladas em políticas que não tiveram seguimento, mas tiveram consequências. Consequências na vida das pessoas, geração após geração, daí decorrendo problemas que foram apenas se aprofundando e tornando mais difícil a solução. Foi a União, que pela atuação do Serviço de Proteção ao Índio, nas décadas de cinqüenta e sessenta, arrendou glebas de terras a particulares, na área da reserva demarcada em 1938; foi o Serviço de Proteção ao Índio, sucedido pela FUNAI, autora da presente ação, que na década de sessenta aquiesceu com a escritura de títulos de domínio, fazendo dotar de confiança aos arrendatários e posseiros que se estava diante de comportamentos estatais sérios; foi a União que deixou, em mais de setenta anos, de homologar a demarcação da reserva, deixando em desvalia os índios que deveria proteger e fazendo com que passassem a perambular à cata de um território devidamente afirmado como sendo seu habitat e causando ou permitindo, pelo menos, os estragos culturais, sociais e econômicos com que eles passaram a conviver desde então; foi Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 82 ACO 312 / BA este estado de coisas que trouxe a Brasília, em 1997, o índio Galdino, um dos líderes da tribo, que acabou martirizado pela ação criminosa de civis. É este estado de coisas que faz da área do Sul do Estado da Bahia, nos últimos tempos, território de violência e medo. Esta é uma ação na qual voto com um único juízo de certeza: que a necessária e já muito atrasada prestação da jurisdição importará em solução de Direito, não necessariamente de Justiça. Todos os que visitei na área, em 2010 e ainda uma vez em 2011, não se sentirão titulares de Justiça, embora de um direito que precisa ser aplicado. 2. Esta ação foi ajuizada pela Fundação Nacional do Índio (Funai), em 1º.7.1982, com o objetivo de ver declarada a nulidade de títulos de propriedade e registros imobiliários referentes a imóveis que estariam situados em terras indígenas. Tais imóveis estariam localizados, segundo a Autora, nos municípios baianos de Conquista, Itambé, Itapetinga, Canavieiras, Itabuna, Pau Brasil e Itaju do Colônia. O que primeiro chama a atenção, na peça inicial da ação, é que não havia a descrição de quais, quantos e em favor de quem estavam os títulos cujo registro se pedia fossem declarados anulados. A FUNAI ajuizou a ação sem definir com exatidão o seu objeto. Em favor de sua tese, a Autora faz referência à demarcação, no final da década de 1930, de área reservada aos índios habitantes na região, denominada ‘Reserva Indígena Caramuru-Catarina-Paraguaçu’. Aquela demarcação jamais teria sido homologada. 3. O julgamento de mérito desta ação teve início na sessão plenária do dia 24.9.2008, quando o Relator, Ministro Eros Grau, lembrou que este Supremo Tribunal, ao resolver Questão de Ordem suscitada em 27.2.2002 2 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 83 ACO 312 / BA pelo Ministro Nelson Jobim, então Relator do processo, assentou que a ausência de prévia demarcação administrativa da área abrangida pelos títulos discutidos não seria, em si, indispensável ao ajuizamento da própria ação, uma vez que “... as terras são demarcáveis porque são indígenas, e não passam a sê-lo após a demarcação”. Esta a ementa daquele julgamento: “EMENTA: TERRAS INDÍGENAS NÃO DEMARCADAS PELA UNIÃO. DESNECESSIDADE DE PRÉVIA DEMARCAÇÃO ADMINISTRATIVA. PROSSEGUIMENTO DO JULGAMENTO PELO TRIBUNAL PARA EMISSÃO DE JUÍZO CONCLUSIVO SOBRE A SITUAÇÃO JURÍDICOCONSTITUCIONAL DAS ÁREAS ABRANDIDAS PELOS TÍTULOS. Questão de Ordem que assim se revolve: (1) a demarcação prévia da área abrangida pelos títulos, não é, em si, indispensável ao ajuizamento da própria ação; (2) o Tribunal pode examinar se a área é indígena ou não para decidir pela procedência ou improcedência da ação” (Rel. Min. Nelson Jobim, DJ 27.10.2006). 4. Após expor a evolução da legislação referente ao tema e o trâmite processual desta ação e considerando a época em que proposta, o Ministro Eros Grau realçou que o parâmetro legal a ser utilizado para o julgamento do pedido realizado pela Fundação-Autora e pela União seria a Carta de 1967, alterada pela Emenda Constitucional n. 1, de 1969. Relembrou Sua Excelência, então, lição de Pontes de Miranda comentando aquela Emenda, no sentido de que “são nenhuns quaisquer títulos, mesmo registrados, contra a posse dos silvícolas, ainda que anteriores à Constituição de 1934, se à data da promulgação havia tal posse”. Asseverando que a posse indígena sobre a terra abrange a relação material do sujeito com a coisa e o direito de seus titulares possuírem-na como seu habitat, observou Sua Excelência, recorrendo ao laudo antropológico juntado aos autos, que em nenhum momento teria sido 3 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 84 ACO 312 / BA apontada a ausência de índios na área em litígio, cuja presença, pelos registros históricos, remontam a meados do século XVII. Eles teriam sido obrigados a deixar sua terra natal em períodos específicos, mantendo, contudo, laços com os familiares que lá permaneceram. 5. Citando precedente deste Supremo Tribunal (ACO n. 323, Rel. Min. Francisco Resek, Tribunal Pleno, DJ 8.4.1994), afirmou o Ministro Eros Grau que “a baixa demografia indígena na região em determinados momentos históricos, principalmente quando decorrente de esbulhos perpetrados pelo forasteiro, não consubstancia óbice ao reconhecimento do caráter permanente da posse dos silvícolas”. 6. Tendo como demonstrada a presença de silvícolas quando da outorga da Carta de 1967, concluiu o Ministro Relator que a área atinente à reserva Caramuru-Catarina-Paraguaçu consubstancia terra indígena, motivo pelo qual descabida a alegação de alguns Réus no sentido da necessidade de transferência dessas terras pelo Estado da Bahia à União. 7. Sobre os títulos de propriedade e registros imobiliários juntados aos autos por alguns Réus e pelo Estado da Bahia, o Ministro Relator observou que aqueles outorgados antes da Carta de 1967 não faziam referência a imóvel situado no interior da área da reserva indígena não homologada, donde a sua manifesta irrelevância para a causa. No interior do polígono medido, Sua Excelência anotou que, da plotagem das glebas realizada em 2003, foram identificadas cento e oitenta e seis (186) áreas, sendo cento e quarenta e três (143) tituladas e quarenta e três (43) não tituladas, além de trinta e seis (36) áreas que, embora ocupadas, não constam da relação de Réus da ação cível originária, inexistindo, ainda, qualquer informação quanto à sua titularidade (fls. 5.772 e ss., vol. XVIII). Quanto aos títulos de domínio juntados aos autos e concernentes a 4 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 85 ACO 312 / BA imóveis situados no interior da reserva, Sua Excelência realçou que todos eles seriam posteriores à vigência da Carta de 1967, donde a sua invalidade, porque decorrentes de aquisição a non domino por integrarem patrimônio da União quando de suas concessões pelo Estado da Bahia (Súmula n. 480), havendo mesmo notícia de indenização, pela FUNAI, de benfeitorias realizadas em algumas dessas áreas. 8. Assim, considerando a natureza declaratória da presente ação e o intuito da Fundação-Autora em restabelecer a integralidade do que se convencionou chamar de ‘Reserva Indígena Caramuru-CatarinaParaguaçu’, o Ministro Relator votou no sentido de julgar procedente a presente ação, declarando nulos todos os títulos de propriedade, cujas glebas se localizem dentro dessa área, donde a improcedência das reconvenções apresentadas por diversos Réus, condenados, nos termos do voto do Relator, ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em dez por cento (10%) sobre o valor atualizado da causa. 9. O Ministro Eros Grau afirmou, em seu voto, que a matéria discutida nestes autos não guardava relação ou analogia com aquela tratada na Petição n. 3.388, atinente à higidez da demarcação da reserva indígena conhecida como ‘Raposa-Serra do Sol’, localizada no Estado de Roraima (Rel. Min. Carlos Britto). A despeito disso, o saudoso Ministro Menezes Direito pediu vista dos autos. 10. Com o falecimento do Ministro Menezes Direito e tendo atuado na condição de Advogado-Geral da União neste processo, o sucessor de Sua Excelência, Ministro Dias Toffoli, declarou seu impedimento (fls. 7.664), vindo-me, então, conclusos os autos (fls. 7.665, vol. XXV). Em outubro de 2011 liberei o voto para a continuidade deste julgamento. Requerimento formulado pelo Estado da Bahia para suspender o pregão, que deferi, adiou esta retomada, requerida com urgência há algum tempo. 5 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 86 ACO 312 / BA 11. Estas as anotações que faço para rememorar o caso aos eminentes Pares. Da ação 12. Busca-se com esta ação a declaração de nulidade dos títulos e registros de propriedade indicados pela Funai na petição inicial (quase quatrocentos), ao argumento de que estariam todos situados em terras indígenas. A Autora requereu, ainda, que a declaração de nulidade abrangesse outros títulos e registros não identificados nominalmente, bastando, para tanto, que fizessem referência a imóvel localizado no interior da área chamada ‘Reserva Indígena Caramuru-Catarina-Paraguaçu’, a qual, segundo observa a Funai em sua petição inicial, teria trinta e seis mil hectares de área (36.000 ha) e estaria localizada “no Sul do Estado da Bahia, nos municípios de Conquista, Itambé, Itapetinga, Canavieiras, Itabuna, Pau Brasil e Itaju do Colônia” (fls. 21, vol. I). 13. Por motivos não esclarecidos nestes autos, essa ‘reserva indígena’, cuja origem remonta a 1926, jamais foi homologada, apesar de demarcada em 1938. 14. Assim, para a análise do pedido de nulidade dos títulos não indicados pela Autora, resolveu-se proceder, na fase instrutória destes autos, à aviventação dos marcos utilizados na demarcação realizada pelo Estado da Bahia e pelo Ministério da Guerra no final da década de 1930. 15. Verificou-se, então, que a reserva possuía área superior àquela mencionada pela Autora (aproximadamente 54.000 ha), não obstante situada dentro dos limites de apenas dois (2) dos sete (7) municípios mencionados na petição inicial, além de outro não citado (Camacan), 6 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 87 ACO 312 / BA todos existentes à época em que ajuizada a ação. Essa constatação reforçou a possibilidade de que todos os Réus indicados nominalmente pela Autora possuíssem títulos referentes a imóveis situados, total ou parcialmente, no interior da área demarcada em 1938. Talvez por essa razão os atos de inspeção e colheita de outras provas tenham sido limitados à área da pretensa reserva indígena, embora a própria Funai tenha realçado que o laudo topográfico apresentado não teria verificado a localização das áreas correspondentes aos títulos de propriedade dos Réus, ou seja, aqueles indicados na petição inicial pela Autora (fls. 4.643, vol. XIV). 16. Na Questão de Ordem suscitada nestes autos pelo Ministro Nelson Jobim, este Supremo Tribunal estabeleceu o procedimento para a emissão do juízo conclusivo sobre a situação jurídico-constitucional das áreas abrangidas pelos títulos impugnados, objetos deste processo, conforme se infere da seguinte passagem do voto proferido pelo então Relator: “Tomar-se-iam os títulos dos RÉUS. Verificar-se-ia o perímetro total abrangido pelo conjunto desses títulos. E, por último, examinar-se-ia se tal perímetro seria TERRA INDÍGENA. Para tanto, adotar-se-iam os critérios constitucionais. (...) Efetivamente, a competência da demarcação é da UNIÃO. O Tribunal não promoveria a demarcação da TERRA. Verificaria se o perímetro do conjunto dos títulos dos RÉUS abrangeria, ou não, TERRA INDÍGENA não demarcada. Nada impede essa identificação judicial para os efeitos de uma decisão final. (...) 7 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 88 ACO 312 / BA Examinarei, oportunamente, da necessidade de atos de inspeção judicial e colheita de outras provas.” (grifos nossos). 17. Posteriormente, o Ministro Nelson Jobim determinou a realização da plotagem das áreas correspondentes aos títulos imobiliários dos Réus na planta de fls. 398 (vol. II) e no mapa juntado pela Diretoria de Assuntos Fundiários da Funai, denominado ‘Terra Indígena Caramuru/Paraguassu’, correspondente à área demarcada em 1938 (fls. 5.679-5.680, vol. XVII). Na elaboração desse trabalho técnico, observou o perito topográfico designado, verbis: “... iniciamos os trabalhos no dia 01 de junho do corrente ano [2003], no Município de Itaju do Colônia indo em direção aos Municípios de Pau Brasil e Camacã, conforme a planta topográfica determina a área da reserva indígena. Ocorre que no decorrer dos trabalhos, fomos surpreendidos por um número bastante considerável, cerca de aproximadamente 200 áreas, que estão totalmente fora da área em litígio, não só nos Municípios de Pau Brasil e Camacã, mas e principalmente no Município de Canavieiras, tendo já identificado áreas a 140 km da área em litígio. Além dos Municípios citados, existem áreas ainda a serem identificadas nos Municípios de Itambé, Itapetinga, Santa Luzia, Marau, Mascote e Belmonte, que estão aproximadamente a 150 km da área da reserva e Municípios como Ibotirama, Barra, Alcobaça, que estão a mais de 500 km, e Municípios como Vitória da Conquista e Brumado a mais de 200 km da área. A inclusão destas áreas nos tem causado sérios transtornos não só quanto à identificação, mas também quanto à aceitação dos antigos proprietários, bem como dos atuais proprietários que não compreendem como estão envolvidos num processo em que nunca tiveram conhecimento, e por estarem tão longe da área em questão, e nesta circunstância dificulta nosso acesso às áreas e à documentação” 8 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 89 ACO 312 / BA (fls. 5.751, vol. XVIII)). Os trabalhos de plotagem foram concluídos em setembro de 2003, certificando a existência de 247 áreas fora da chamada ‘Reserva Indígena Caramuru-Catarina-Paraguaçu’ (168 tituladas e 69 sem títulos) e 186 áreas dentro de seus limites (143 tituladas e 43 não tituladas), além de 36 áreas da relação inicial da Funai que não foram identificadas (fls. 5.772 e ss., vol. XVIII). 18. Conquanto este Supremo Tribunal tenha resolvido na Questão de Ordem proposta pelo Ministro Nelson Jobim que o exame da condição jurídico-constitucional, da qual decorreria a nulidade dos títulos de propriedade indicados pela Autora (individualizados ou não), abrangeria o perímetro total do conjunto das áreas referentes a esses títulos, a União e a Funai, em face do resultado do trabalho técnico mencionado, aduziram: “Destaca-se, de início, que é surpreendente a quantidade de áreas dos réus nominados no feito situadas fora da reserva indígena. Em consulta ao setor técnico da FUNAI e ao Chefe do Posto Indígena Caramuru-Paraguaçu, que colaborou e acompanhou informalmente os trabalhos do perito judicial, confirmou-se a procedência e a veracidade da plotagem realizada, que, nesse ponto, deve ser reconhecida. Destarte, voltando-se ao pedido descrito na petição inicial, que se pede vênia para transcrevê-lo, fatalmente será desnecessário e de todo inconveniente a permanência no pólo passivo desta ação dos proprietários das terras situadas fora da reserva indígena. O objeto da presente ação cível originária é: ‘declarar nulos os títulos de propriedade e registros imobiliários em nome de Jener Pereira Rocha e dos demais nomes de réus, ao final nomeados, e de outros que porventura possuírem idênticos títulos e registros de propriedade incidentes sobre a área da Reserva Indígena Caramuru-Catarina-Paraguassu’ (...) Essa retrospectiva é importante para ressaltar que o objeto da 9 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 90 ACO 312 / BA presente ação é tão-só a área constante da reserva indígena. Assim, de suma importância foi o trabalho realizado para evitar a declaração de nulidade de títulos relativos a fazendas que não se encontram no perímetro da reserva” (fls. 6.064-6.072, vol. XIX). 19. A Funai e da União pediram, então, complementação da perícia, visando a identificação de todos os títulos existentes somente no interior da área demarcada em 1938, o que foi indeferido pelo Ministro Nelson Jobim em 29.3.2006, ao fundamento de que o “contrato efetivado com o perito tinha objeto certo e determinado: a plotagem das áreas correspondentes aos títulos imobiliários dos réus”, asseverando Sua Excelência, mais adiante, que as áreas ocupadas no interior da reserva cujos proprietários não foram nominados “... não correspondem aos títulos de propriedade e registro imobiliário que se pretende declarar nulos, objeto desta ação” (fls. 6.112, vol. XIX). O agravo regimental interposto pela União contra esta decisão foi desprovido à unanimidade por este Supremo Tribunal na sessão de 5.11.2007, nos termos do voto do Ministro Eros Grau, novo relator da causa, no sentido da impossibilidade de complementação da perícia pelo encerramento da instrução (fls. 6.125-6.132; DJe 22.11.2007). 20. Nesse contexto o Ministro Eros Grau votou no sentido de considerar irrelevantes todos os títulos de propriedade concernentes a imóveis situados fora dos limites da área demarcada em 1938, considerando a premissa de que o pedido realizado pela Funai na petição inicial visou, tão somente, o restabelecimento da integralidade da reserva indígena demarcada mas não homologada. Assim, a impugnação pela Funai de mais de duzentos (200) títulos de propriedade, alguns distando até quinhentos quilômetros (500 km) dos limites da denominada reserva Caramuru-Catarina-Paraguaçu, poderia ser atribuída a mero erro da Autora - o qual constituiu, diga-se de passagem, um elemento instaurador de insegurança jurídica na região de 10 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 91 ACO 312 / BA conflituosa situação fundiária. 21. Na mesma peça processual em que requerida a complementação da perícia e afirmada a desnecessidade na permanência dos proprietários das terras situadas fora da área da pretensa reserva no pólo passivo desta ação, asseveraram a União e a Funai (Petição n. 134.215/2003): “Isso não quer dizer, todavia, que as áreas situadas fora da reserva indígena não possam vir a ser declaradas como terras indígenas, em outro momento, através de outro procedimento, não existindo nenhuma vedação absoluta a tal possibilidade. Até porque a Lei Estadual n. 1916, de 09 de agosto de 1926, obrigou o Estado da Bahia a reservar ‘50 (cinquenta) léguas quadradas de terras em floresta gerais ou acatingadas, para o gozo dos índios Tupinambás e Patachós, ou outros ali habitantes’. Calculando-se o montante da área a ser obrigatoriamente reservada pelo Estado da Bahia, nos termos supramencionados, fica configurado um total de 9.000.000 hectares, número imensamente superior aos parcos 54.000 ha demarcados. Uma eventual tradicionalidade de território indígena, principalmente em seu aspecto imemorial, poderia vir a alcançar as áreas exteriores à Reserva Caramuru-Paraguassu, mas, ressaltamos novamente, não nesta ação cível originária” (fls. 6.068, vol. XIX). Essa assertiva final evidencia que a impugnação, pela Funai, de títulos referentes a propriedades situadas nos arredores da área periciada nestes autos não decorreu de mero erro na indicação do objeto da ação, considerada a causa de pedir, mas que os órgãos federais encarregados da demarcação administrativa têm como ‘terra indígena’ área muito maior do que aquela à qual se limitou a instrução desta ação. Tal circunstância é confirmada por fato já mencionado, consubstanciado na localização, pela própria Funai, da alegada reserva indígena “no Sul do Estado da Bahia, nos municípios de Conquista, Itambé, Itapetinga, Canavieiras, Itabuna, Pau Brasil e Itaju do Colônia” (fls. 21, vol. I), 11 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 92 ACO 312 / BA embora a Autora já fizesse referência à demarcação procedida no final da década de 1930, cuja área abrange, como visto anteriormente, somente três municípios. 22. É certo que nada impede que, quando da demarcação administrativa que procederá a este julgamento, a União englobe algumas dessas propriedades no interior da área da reserva a ser criada, ao argumento de estarem situadas em terras indígenas, conforme enfatizou o Ministro Nelson Jobim no julgamento da Questão de Ordem suscitada nestes autos: “Feita a identificação de todo o conjunto, possível de ser realizada através do serviço cartográfico do Exército, que tem um levantamento primoroso do Território Nacional em relação a essa situação, colocam-se os títulos dentro disso e identifica-se o todo abrangido por eles, daí será feito um exame, análise, se é ou não compreendido no conceito de terra indígena; em sendo positivo, a ação será julgada procedente total, caso contrário, em parte, para declarar nulos alguns títulos e outros não. Isso não é demarcação da terra indígena, mas declaração de que aquele conjunto, abrangido pelos títulos de domínio dos réus, é ou não integrante de uma área de conceito indígena. A União fará a demarcação futura, e essa, também, não deverá ir contra o que já se estabeleceu como índice mínimo, mas poderá abranger outras situações, porque haverá outras áreas, que não objeto dessa discussão, consideradas em terra indígena, a qual será demanda de outra questão” (fls. 7.491, vol. XXV). 23. O quadro apresentado, portanto, conforme salientado em seu voto pelo Ministro Relator, difere daquele analisado no julgamento do caso ‘Raposa – Serra do Sol’, quando se concluiu pela inexistência de vícios no processo administrativo-demarcatório, do qual resultou o modelo contínuo de demarcação. 24. Na presente ação, a identificação judicial da terra indígena 12 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 93 ACO 312 / BA demarcada mas não homologada possibilita a dissociação do conteúdo positivo do ato demarcatório, conferindo a Poderes distintos a análise de marcos regulatórios determinados antes do definitivo aperfeiçoamento do procedimento administrativo. É que após asseverar que “somente à União compete instaurar, seqüenciar e concluir formalmente o processo demarcatório das terras indígenas”, o Ministro Carlos Britto, Relator daquele caso paradigmático, especificou e analisou minuciosamente os marcos regulatórios que compõem o ato de demarcação de terras indígenas, indicando-os como sendo: a) o marco temporal de ocupação; b) o marco da tradicionalidade da ocupação; c) o marco da concreta abrangência fundiária e da finalidade prática da ocupação tradicional; e d) o marco do conceito fundiariamente extensivo do chamado ‘princípio da proporcionalidade’. No presente caso, em face do que decidido na Questão de Ordem suscitada nestes autos, a identificação judicial das terras indígenas não demarcadas transfere ao Poder Judiciário o exame sobre a tradicionalidade da ocupação considerado determinado momento histórico, ficando mantida a definição da concreta abrangência fundiária necessária para garantir os meios dignos para a preservação da identidade cultural de determinado grupo indígena sob a responsabilidade dos órgãos administrativos federais encarregados da demarcação administrativa da reserva. Conferir ao Supremo Tribunal a delimitação desse espaço geográfico significaria, em última análise, proceder a sua demarcação judicial, o que expressamente rechaçado no julgamento da Questão de Ordem suscitada nestes autos, conquanto se tenha, na passagem antes transcrita, a orientação de que a demarcação futura não poderá ir contra o que já se estabeleceu como índice mínimo, ou seja, o órgão encarregado da demarcação administrativa da reserva a ser criada não poderá deixar de abranger área sobre a qual reconhecida judicialmente a condição de terra 13 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 94 ACO 312 / BA indígena. 25. Tem-se, portanto, situação inovadora do tema, pois, tradicionalmente, o ato estatal homologatório editado pelo Presidente da República “se reveste de presunção juris tantum de legitimidade e de veracidade” (v.g., RE n. 183.188, Rel. Min. Celso de Mello, 1ª Turma, DJ 14.2.1997), donde a existência de várias ações judiciais nas quais se examinam as particularidades referentes a cada título de propriedade concernente a imóvel situado em área reservada aos índios, tudo em observância ao postulado do devido processo legal previsto no inc. LIV do art. 5º da Constituição da República. Neste sentido as Petições ns. 3.742, 3.704, 3.721, 3.755, 3.713, todas da relatoria do Ministro Carlos Britto e referentes a imóveis incluídos na ‘Reserva Raposa – Serra do Sol’ (ainda pendentes de julgamento). 26. Outro item a ser observado de como essa alteração no procedimento demarcatório suscita dificuldades resulta da definição do marco temporal de ocupação estar relacionada com a data de ajuizamento da ação judicial, e não com aquela em que iniciado o procedimento administrativo de demarcação. Como visto, a submissão da pretensão da Autora a juízo no ano de 1982 remeteu o marco temporal de ocupação, ou seja, a data de referência para o dado da ocupação do espaço geográfico discutido, a 1967, como assinalou o Ministro Eros Grau: “21. A presente ação cível originária foi proposta sob a égide da Constituição de 1967, com as alterações da EC n. 1/69. Este, pois, o parâmetro a ser utilizado para julgamento do pedido da FUNAI e da União, tomando-se do direito material da época em que proposta para que se possa aferir da nulidade, ou não, dos títulos de propriedade questionados”. 14 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 95 ACO 312 / BA Necessário saber, portanto, se essa retroação temporal do dado da ocupação indígena também valeria no procedimento administrativo demarcatório subsequente, abrangendo o exame a ser feito sobre as terras eventualmente incluídas na reserva em razão da ampliação da área objeto da ação judicial. 27. Em face dessas dificuldades e considerando o que resolvido no julgamento da Questão de Ordem suscitada nestes autos, tenho, a partir da premissa aproveitada pelo Ministro Relator, que se busca o restabelecimento da integralidade da reserva indígena demarcada em 1938, pelo que esta ação deveria, com a devida vênia, ser conhecida apenas parcialmente, restringindo-se o seu objeto aos títulos de propriedade de imóveis não abrangidos por aquela área, pois não há como se considerar sequer haver interesse processual da Autora quanto aos demais títulos. Essa observação não se pauta em preciosismo técnico, mas na necessidade de deixar claro neste que eventual ampliação da área analisada nestes autos (referente apenas aos 54 mil hectares da Reserva Caramuru-Catarina-Paraguaçu), quando da demarcação administrativa que sucederá a este julgamento, não prescindirá da comprovação, nos termos da legislação aplicável, de que o espaço geográfico fruto dessa ampliação constituía terra tradicionalmente ocupada pelos índios quando da promulgação da Constituição de 1988. Evitar-se-ia, assim, que eventual permanência da ocupação indígena observada nesta ação sirva de fundamento para que a União declare a nulidade de títulos de propriedade situados fora da área examinada nestes autos. 28. Realço, ainda, que a ausência de estudo, nestes autos, sobre as áreas exteriores à demarcação de 1938 e não comprovadas como sendo indígenas neste processo, impede a emissão de juízo conclusivo sobre a 15 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 96 ACO 312 / BA sua situação jurídico-constitucional, donde a impossibilidade de se afirmar a improcedência da ação no ponto. 29. Pelo que conheço da ação apenas quanto aos títulos de propriedade e registros imobiliários referentes aos imóveis abrangidos pelo espaço geográfico demarcado em 1938 e comprovadas nestes autos, totalizando 54 mil hectares, julgando-a extinta, sem resolução de mérito (art. 267, inc. VI, do Código de Processo Civil), no que se refere aos imóveis localizados fora daquela área. Sobre os imóveis situados na área demarcada em 1938 30. Analiso, então, a caracterização da permanência da ocupação indígena sobre as áreas abrangidas pelos títulos de propriedade referentes aos imóveis situados no interior do espaço geográfico demarcado em 1938. 31. A limitação do objeto da causa recomenda explanação da conjuntura histórica referente à área da denominada ‘Reserva Indígena Caramuru-Catarina-Paraguaçu’. 32. Tem-se, nos documentos constantes dos autos e dos minuciosos relatos históricos apresentados pelos Ministros Nelson Jobim (quando da apreciação da Questão de Ordem) e Eros Grau, que, em 1926, o antigo Serviço de Proteção ao Índio (SPI), visando “garantir a effectividade da posse dos territórios occupados por índios, e conjunctamente, de que nelles se contiver, entrando em accôrdo com os governos locaes, sempre que for necessário” (Decreto n. 9.214, de 15.12.1911, art. 2º), ponderou ao Estado da Bahia, o qual procedia, naquele ano, medições de terras devolutas em seu território, a conveniência de aquele ente federativo reservar, “desde já e para ulterior entendimento entre o Governo do Estado e o Federal, as terras onde se encontram o maior número de índios em estado silvícola a serem destinados a postos de povoações indígenas” (fls. 422, vol. II). 16 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 97 ACO 312 / BA Pela ponderação feita pelo órgão federal, o então Governador da Bahia determinou fossem suspensos os trabalhos de medição das terras devolutas, respeitadas, entretanto, as posses observadas na área delimitada naquele ato (Decreto de 9.3.1926, fls. 422/423). 33. Ainda em 1926, para liberar terras para o avanço da frente agropastoril, o Governo da Bahia buscou assentar naquela mesma área, em comum acordo com o Governo Federal, os diversos grupos indígenas existentes na região sul da Bahia, bem como outros oriundos de aldeamentos extintos por força da Lei Estadual n. 198, de 21.8.1897, do que resultou a a Lei Estadual n. 1.916, de 9.8.1926, que estabelecia, no que interessa: “Art. 1º Fica o Governo autorizado a reservar 50 legoas quadradas de terras em florestas geraes e acatingadas, comprehendidas nos limites fixados pelo Decreto do Poder Executivo de 9 de Março do corrente anno, destinadas á conservação das essenciais florestaes naturaes e ao gozo dos índios tupinambás e patachóos, ou outros ali habitantes. Art. 2º O Governo mandará demarca-la discriminando a parte que ficará servindo o Horto Florestal natural e a que for destinada a formar o aldeamento dos índios e de suas respectivas roças, em lotes com a superficie indispensável a taes misteres” (fls. 424, vol. II). 34. Do que consta dos autos, naquela data já havia postos indígenas instalados pelo Serviço de Proteção aos Índios (SPI) na região. O perito antropológico que atuou na presente ação relata que “[h]avia dois postos indígenas. O primeiro deles na parte norte da reserva foi denominado Caramuru, localizado na margem direita do rio Colônia. O segundo, denominado Catarina Paraguaçu, localizado na parte sul da reserva, precisamente às margens do riacho Mundo Novo” (fls. 4.189). 17 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 98 ACO 312 / BA No laudo da perícia antropológica apresentado, a Assistente Técnica da Funai noticia que o Posto Indígena Caramuru foi destinado, primordialmente, ao recolhimento e à pacificação dos índios que ainda estavam nas matas e à criação de gado. Segundo a mesma técnica da Funai, a criação posterior do Posto Indígena Paraguaçu teria objetivado a “agricultura, o pasto para rodízio dos animais do PI Caramuru durante os períodos de estiagem e a concentração dos índios vindos de outros aldeamentos baianos, cuja extinção foi determinada pelo poder executivo do Estado da Bahia através da Lei n. 198, de 21/08/1897” (fls. 4.323). Aquela assistente ainda noticiou a criação do Posto Indígena Ajuricaba, nas cercanias do rio Pardo e na mesma época da criação do Posto Indígena Caramuru. Não há, entretanto, mais nenhuma notícia nos autos sobre esse posto indígena. 35. A administração desses postos ficava a cargo do órgão federal de proteção aos índios até a outorga da Carta de 1967, quando as terras ocupadas pelos índios passaram a ser incluídas entre os bens da União (art. 4º, inc. IV), mas a regulamentação dessas terras foi conferido aos Estados, ficando a legitimação da posse a depender da negociação destes com o órgão federal ao qual atribuído cuidar dos interesses dos índios (SPI e, posteriormente, FUNAI). 36. Assim, para concretizar os objetivos da Lei baiana n. 1.916, de 1926 a 1930 foi feita uma medição inicial da área sob a coordenação do Capitão do Exército Vicente de Paula Teixeira da Fonseca Vasconcellos, não havendo nos autos, contudo, informações precisas sobre o resultado desse trabalho. Entretanto, consta de parecer elaborado em 1979 por assistente do Setor de Regularização Dominial da FUNAI, que a área demarcada nessa 18 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 99 ACO 312 / BA ocasião “... foi alterada, ficando reduzida a 36.000ha, logo após a invasão do Posto em 1936 por forte contingente policial e de fazendeiros regionais. O Cap. Moysés Castelo Branco [representante do governo federal] realizou os novos trabalhos de medição a partir dos entendimentos entre o Governo do Estado da Bahia e o Ministério da Guerra, ao qual então pertencia o SPI. Os limites fixados da citada área constavam do ofício da Secretaria de Agricultura, Indústria, Comércio, Viação e Obras Públicas da Bahia, sob nº 1417 de 07.05.1937, ao Chefe do SPI e no Termo de Audiência Pública e preparatória da demarcação daquelas terras, lavrado em 1937 na sede do PI [Posto Indígena] Caramuru” (fls. 470/471, vol. II). O contexto no qual se iniciou o trabalho de campo para a demarcação dessa reserva está descrito no relatório apresentado em dezembro de 1938 pelo representante do Ministério da Guerra, o Capitão Moysés Castelo Branco Filho, no qual se tem: “Não obstante a determinação da lei [n. 1.916/26], não se procedeu a demarcação do Posto Paraguassú. E, em 1936, dez anos decorridos, invadidas as suas terras, profissionais inescrupulosos procediam medições, em nome próprio e de terceiros, na área mandada reservar pelo Dec. de 9 de Março de 1926, ao Horto Florestal natural e ao Posto Paraguassú. É a eterna luta do homem, que se diz civilizado, contra o silvícola, pela conquista da terra. Políticos ambiciosos e aventureiros outros, empenhavam-se na extinção do Posto, para satisfação de apetites pessoais da fortuna fácil, pela apropriação das terras reservadas ao índio. A questão atinge o auge com a ocupação militar do Posto Paraguassú, por forte destacamento da polícia estadual, a fim de reprimir a propaganda comunista na região daquele posto, de que era acusado o seu próprio encarregado. Atenta à situação, a chefia do Serviço de Proteção ao Índio acerta com o governo da Bahia substituir o destacamento de polícia por um contingente do Exército e entrar em entendimento para demarcação do Posto Indígena. (...) 19 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 100 ACO 312 / BA Discutidas as razões apresentadas por uma e outra parte, propus ao Governo daquele Estado, em ofício n. 1, de 5-V-937, a seguinte divisa para Posto: (...) Essa proposta aceita pelo Governo da Bahia sofreu, posteriormente, pequena modificação, indicada pela Chefia deste Serviço, ficando, afinal, convencionada a divisa (...). O levantamento das divisas do Posto foi dividido em dois polígonos, separados por um travessão interior comum. O Polígono Norte ficou ao meu encargo e o Polígono Sul coube ao Engenheiro Amorim Coelho. As duas turmas de demarcação operaram independentemente, sem subordinação administrativa nem técnica, mas de comum acordo e adotando os mesmos métodos de levantamento” (fls. 151-153, do vol. I, e fls. 3.905-3.904, do vol. XII). 37. De acordo com o relato feito pelo engenheiro civil contratado pelo Estado da Bahia, Alfredo de Amorim Coelho, acertou-se que a demarcação do polígono norte ficaria a cargo da equipe do Ministério da Guerra, “...levando em conta que, no Polígono do Norte, estava a sede do Posto ‘Catarina Paraguassú’ [posteriormente denominado Caramuru] e onde se ligavam interesses maiores do representante do M. da Guerra” (fls. 428-429, vol. II). No mesmo documento, concluído em novembro de 1938, o representante do Estado da Bahia relatou as dificuldades enfrentadas para a demarcação da reserva indígena no polígono sul, anotando ao final: “Com a delimitação dos terrenos dos índios, vários moradores tiveram as suas pretensas posses envolvidas, total ou parcialmente, pelas linhas que determinamos como limites. Na maioria são pequenos lavradores, gente humilde e que de muito bom grado se conformaram de passarem a ser moradores agregados do Posto. E, até porque quando ali se arrancharam já foi sabendo que estavam em terras dos índios. Outros, porém, e com esses os fazendeiros, não 20 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 101 ACO 312 / BA quiseram de maneira alguma se conformar com semelhante situação, alegando serem donos legítimos das terras que ocupavam. E o que é mais interessante, nenhum apresenta títulos comprobatórios dos direitos alegados! Ademais, a nós não cabia atender a essas pretensões descabidas, até porque, tínhamos um traçado para executar e era o que nos interessava” (fls. 435-436, vol. II). 38. Por motivos não esclarecidos nestes autos, da demarcação concluída em 1938 não resultou nenhum ato oficial homologando a área como reserva indígena, nem foi apresentado qualquer documento comprovando a formalização da transferência da área demarcada à União. 39. Certo é que logo após a conclusão dos trabalhos de campo e antes mesmo da apresentação dos relatórios mencionados, ainda no ano de 1938, o órgão de proteção ao índio entendeu por bem fracionar parte das terras sob sua administração em pequenos tratos, arrendando-os a cerca de três mil (3.000) agricultores e criadores da região, “... como forma de resolver os problemas sociais da população dita civilizada que se encontrava ocupando e explorando terras envolvidas pela reserva indígena, na área dos dois postos”, segundo asseverou a própria Funai na contestação apresentada das reconvenções dos Réus (fls. 3.345, vol. X), tendo afirmado, ainda, que “tal medida não foi do agrado de todos, tanto assim que os problemas persistiram, e as mais diferentes formas de pressão prosseguiram, sempre com vista à redução ou extinção da área indígena objeto de doação feita pelo Estado da Bahia” (fls. 3.345). 40. De acordo com trecho de ofício da 4ª Inspetoria Regional do SPI/BA, transcrito pela Assistente Técnica da Funai em seu laudo antropológico, em 1947 o Posto Indígena Paraguaçu não mais subsistia, “ficando o Posto Caramuru reduzido a pouco mais de 100 tarefas [de terras], em face dos arrendamentos que o envolvem” (fls. 4.324, vol. XIII). 41. Os documentos juntados aos autos comprovam que certos 21 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 102 ACO 312 / BA arrendatários foram favorecidos com a ampliação das áreas arrendadas e com a transferência de outros contratos de arrendamento a eles, mediante a declaração expressa de desinteresse do Serviço de Proteção ao Índio quanto a essas áreas a partir do início da década de 50 (fls. 445 a 457 e 462, vol. II), vindo alguns desses documentos a serem averbados nos cartórios de registro de imóveis nos quais registrados os respectivos contratos de arrendamento (fls. 459-461, vol. II). 42. Em 1958, alguns desses arrendatários requereram junto ao governo federal, especificamente à Presidência da República, que lhes fosse vendida, por preço acessível e a prazo, a área por eles arrendada. Em resposta a telegrama dirigido ao Presidente da República em 1º.12.1958, no qual o Presidente da Associação Comercial de Itabuna/BA apresentou esse pleito, o Subchefe do Gabinete Civil da Presidência da República encaminhou cópia das informações recebidas do Ministério da Agricultura, ao qual passara a ser vinculado o SPI, nas quais constava o seguinte: “a) as terras dos Postos Caramuru e Paraguaçu, no Estado da Bahia, foram cedidas ao S.P.I. pelo Governo daquela Unidade da Federação, para uso dos índios ali existentes. Dessa forma, o Serviço não tem a posse das aludidas terras, sendo, apenas, usufrutuário. Ora, não tendo a posse, não poderia arrendá-las a particulares; b) apesar disso, em administrações passadas, foram feitos vários arrendamentos, em cujas terras os arrendatários fizeram benfeitorias, muitas delas com valor atual de milhões de cruzeiros. Os referidos arrendamentos atingiram tal proporção, que, hoje, são inúmeros os indígenas que ali vivem, como verdadeiros marginais, pois não possuem terras de onde possam tirar a própria subsistência; c) criou-se, dessa maneira, um verdadeiro impasse para o S.P.I., pois, embora irregulares os arrendamentos em apreço, não pode este Serviço reaver as terras, porquanto não dispõe de recursos financeiros para indenizar as benfeitorias; d) quanto ao que é proposto pelos signatários do presente 22 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 103 ACO 312 / BA memorial, isto é, a regularização dos arrendamentos ou a venda a eles, pelo S.P.I., das áreas que ocupam, se já não era possível, em face do exposto na letra b, acima, agora, depois da Portaria Ministerial n. 430, de 24 de agosto de 1956, muito menos, pois, a citada Portaria proíbe a exploração, por terceiros, de riquezas do patrimônio indígena, declarando que estas devem ser exploradas pelo próprio Serviço” (grifos nossos, fls. 464 e 465, vol. II). 43. Apesar deste reconhecimento, nesse documento, da presença indígena na região, ao opinar pelo indeferimento do pleito dos arrendatários no mesmo ano de 1958, a Consultoria Jurídica do mesmo Ministério da Agricultura afirmou que os motivos autorizadores da cessão daquelas terras ao Serviço de Proteção aos Índios teriam deixado de existir, razão pela qual as mesmas seriam propriedade do Estado da Bahia, não cabendo, assim, ao governo federal decidir sobre a questão (Parecer n. 279/1958, citado às fls. 441, vol. II). 44. Com base nesse parecer, o Ministro da Agricultura teria, então, comunicado ao Governador baiano o intuito do governo federal de restituir vinte mil (20.000) dos vinte e dois mil (22.000) hectares que haviam sido cedidos ao Serviço de Proteção ao Índio, “desde que o Estado assumisse a obrigação-compensação, os 2.000 ha remanescentes para a localização dos índios acôrdado com a sua Secretaria de Agricultura, Indústria e Comércio” (sic - fls. 441, vol. II). A manifestação do Secretário de Agricultura da Bahia, em ofício de 1959, no sentido da restituição pura e simples da área ocupada pelo SPI, evidenciou a recusa da proposta feita pela União. 45. Daí a Portaria Ministerial n. 178, de 12.2.1960, pela qual o Ministro da Agricultura teria determinado a regularização da área onde instalados os Postos Indígenas. Por conta dessa determinação, o Consultor Jurídico daquele 23 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 104 ACO 312 / BA Ministério realizou diligência no local, enfatizando, após noticiar conflitos envolvendo fazendeiros e arrendatários, que “... não deixa de ter razão o Governo [da Bahia], uma vez que, pelo que nos foi possível apurar, o único sobrevivente de índios que habitavam a região é um ex-cacique patachó, já com os seus dias contados, sendo os restantes, em número de trinta (30) pouco mais ou menos, simples mestiços (caboclos) com conhecimento para orientar-se na vida” (fls. 440-444, vol. II). E continuou o técnico daquela pasta: “22. Assim, quanto às essências Florestais, essas, se é que algum dia existiram, há muito que teriam desaparecido, eis que nem sequer vestígio das mesmas se observa na região, atualmente integralmente tomada por fazendas de criação de gado, fazendas de cacau e pequenas culturas de cereais. 23. Assim, o que incumbia ao S.P.I. fazer, uma vez desaparecidos os motivos que determinaram a reserva da área, era entrar em entendimento com o Governo do Estado, a fim de restituir a área ao seu legítimo proprietário, resguardados, naturalmente, os direitos dos índios sobreviventes, e nunca agir pela forma como agiu, arrendando quase toda ela a particulares e permitindo que nela se construíssem benfeitorias que somam em muitos milhões de cruzeiros”. Concluiu, então, que: a) a área em apreço seria de propriedade do Estado da Bahia, pois não concretizada a sua doação à União; b) cabia ao SPI, sob cuja jurisdição estava a área discutida, providenciar a sua restituição ao seu legítimo proprietário (Estado da Bahia), desaparecidos os motivos que teriam determinado a sua cessão a título precário; e c) tendo sido a área arrendada a particulares que teriam nela, se não o seu único, pelo menos o principal meio de subsistência, caberia ao SPI, como responsável direto pela situação criada, entender-se com as autoridades baianas, para uma solução para o impasse, recorrendo-se, se necessário, à desapropriação. 24 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. 105 Supremo Tribunal Federal ACO 312 / BA 46. Em face desse quadro, a Bahia manteve a política de expedição de títulos de propriedade na região, acentuada no início da década de 70, ou seja, após a inclusão, pela Carta de 1967, das terras ocupadas pelos índios como bens da União (art. 4º, inc. IV). Parece que a solução para o impasse criado pelo SPI foi o estabelecimento de uma política fundiária favorável aos que, regular ou irregularmente, detivessem contratos de arrendamento junto ao SPI, pelo que, segundo a Fundação-Autora, os últimos indígenas remanescentes do Posto Catarina-Paraguaçu teriam sido obrigados a deixar o local, espalhando-se pelo extremo sul da Bahia, tendo algumas famílias sido conduzidas para a ‘Fazenda Guarani’, no Município de Carmésia, em Minas Gerais (fls. 14, vol. I). 47. Consta dos autos, ainda, que, em novembro de 1978, a Funai teria feito pública a sua intenção em proceder novamente à demarcação administrativa da área denominada ‘Posto Indígena Paraguassú’, que se restringiria, pelo edital juntado aos autos pelos Réus (fls. 361), aos limites dos Municípios de Pau Brasil e Itaju (do Colônia), chegando mesmo a celebrar, como consta de ordem de serviço daquela Fundação (n. 03, de 31.1.1979), contrato de empreitada com firma especializada na execução dos trabalhos geodésicos (Contrato de Empreitada n. 009/79, fls. 362, vol. II). Não consegui encontrar, entretanto, nos vinte e cinco (25) volumes destes autos e seus vinte (20) apensos, notícia do desfecho desse procedimento demarcatório iniciado em 1978. 48. Esse fato aumentou o clima de incerteza em relação ao domínio da área discutida, motivo pelo qual a Diretoria Executiva do Instituto de Terras da Bahia (Interba) comunicou à Funai, em 1981, a sustação de qualquer processo de regularização fundiária na área que se supunha de ocupação indígena, requerendo daquela Fundação tudo quanto 25 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 106 ACO 312 / BA respeitasse à reserva Caramuru-Catarina-Paraguaçu, a fim de adotar uma política definitiva de legalização fundiária na região (Ofício DE/290/81, noticiado na Informação-Funai n. 755/DF/DGPI/81, fls. 468). 49. Daí adveio a elaboração de dois novos pareceres pelo Setor de Regularização Dominial da Funai, nos quais se conclui pela inexistência de terra indígena na área conhecida como ‘Caramuru-Paraguaçu’ (Informação-FUNAI n. 755/DF/DGPI/22.10.1981, fls. 468-488; Informação n. 770/DF/DGPI/26.10.1981, fls. 490-507). 50. Contudo, em ofício dirigido ao Interba em 30.10.1981, o Diretor do Departamento Geral do Patrimônio Indígena daquela Fundação limitou-se a reforçar a necessidade de “sustação de iniciativas de deflagração do procedimento de titulação sobre ditas terras”, ao argumento de que “a definição jurídica dessas terras pelo órgão competente desta Fundação (...) aguarda os resultados de pesquisa a ser promovida (...) por este Departamento, junto aos órgãos desse Estado, visando a obtenção de documentação formal que o Governo Federal, em 1958, teria expedido às autoridades da Bahia e ao Presidente da Associação Comercial de Itabuna, manifestando [ilegível] desinteresse da União sobre ditas terras” (Ofício n. 171/DGPI - fls. 489, vol. II). 51. Esse o contexto no qual, segundo relato da própria Autora (Funai) em sua petição inicial, “na manhã de 28 de abril de 1982, eles voltaram, os índios Pataxós-hã-hã-hãi, com suas mulheres e com seus filhos, e assentaram acampamento, justamente na principal sede de suas boas e más lembranças, a do Posto Catarina Paraguassu” (fls. 16, vol. I). 52. Talvez a ocupação da área por descendentes dos autóctones no início da década de 1980 tenha provocado a desconsideração do procedimento demarcatório iniciado em 1978, donde o ajuizamento desta ação ordinária pela FUNAI em 1º.7.1982, ao argumento de que “...as terras são da União, porquanto ocupadas pelos Silvícolas, que somente as deixaram 26 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 107 ACO 312 / BA forçados...” (fls. 20). Precedentes da matéria neste Supremo Tribunal 53. No voto que proferi no ‘caso Raposa-Serra do Sol’ (PET n. 3.388, Rel. Min. Carlos Britto, DJe 24.9.2009) observei que, embora as Constituições brasileiras somente tenham cuidado, especificamente, do tema relativo aos direitos dos indígenas em 1934, a matéria foi objeto de legislação antes mesmo da formação do Estado brasileiro, conforme demonstra a fecunda lição de João Mendes Júnior em seu celebrado trabalho “Os indígenas do Brazil, seus direitos individuais e políticos” (São Paulo: Typ. Hennies, Irmãos, 1912), a qual remete ao Alvará de 1º de Abril de 1680 a origem do indigenato, a distinguir a posse dos indígenas sobre suas terras da posse de ocupação. Naquele estudo, o autor paulista realçou situação retratada nestes autos e que não pode ser desconsiderada sequer após quase cem anos de sua exposição, verbis: “Os pobres índios não tinham cônsules que por eles interviesse, não tinham juízes que lhes reconhecessem direito ao trabalho: fizeram justiça por si, tanto quanto deles não era lícito esperar, porque limitaram-se à evasão e à dispersão. Fugiram alguns; pois, apesar de todas as calúnias, quando queremos derrubar matas e trabalhos mais pesados, não recorremos aos compatriotas de nossos avós europeus, mas aos descendentes dos nossos índios, aos nossos caboclos, aos nossos caipiras” (op. cit., p. 54). Sem órgãos judiciais a garantir o que a legislação colonial e, depois, a imperial a eles assegurava, os índios viram minguados os seus direitos e os seus espaços de existência e de manutenção de suas identidades, situação que nem o advento da República, conforme o caso sob exame evidencia e os sucessivos , teve o condão de resolver. 27 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 108 ACO 312 / BA 54. A comprovação desse fato ressai do relato feito pelo perito antropológico oficial desta causa sobre a demografia indígena na área aqui discutida. Após estimar em dois mil e setecentos (2.700) os índios aldeados em toda a região sul do Estado da Bahia em 1759 (fls. 4.186), afirmou o auxiliar técnico do Juízo sob a fé de seu grau e o compromisso de sua função: “A partir da instalação dos Postos do SPI na Reserva Caramuru Paraguaçu, os dados demográficos disponíveis são os censos produzidos pelo órgão de assistência, que ao que parece só começaram a ser realizados no ano de 1942. Tendo como base estes censos, [a antropóloga Maria Hilda Baqueiro] Paraíso elaborou uma tabela que reúne as informações que vão de 1942 a 1974. Os censos discriminam a população assistida pelos postos Caramuru e Paraguaçu. Para o ano de 1942, o posto Caramuru forneceu um total de 18 índios assistidos e o Paraguaçu um total de 320, perfazendo no cômputo geral 338 índios. No ano de 1947, só foram registrados dados do posto Caramuru, um cômputo de 22 índios. O censo só foi retomado em 1950, computando um total de 120 índios assistidos, sem discriminar a localização em relação aos postos. Em 1952, há um total de 57 índios assistidos, sendo 25 no Caramuru e 32 no Paraguaçu. De 1954 a 1961, só há registro relativo aos assistidos no Paraguaçu, respectivamente, 1954 = 29 índios; 1955 = 32 índios; 1956 = 49; 1957 = 43; 1958 = 31; 1959 = 32; 1960 = 33; 1961 = 32. A partir de 1962 até 1974, os registros só fazem referência aos assistidos pelo posto Caramuru, assim discriminados: 1962 = 31; 1963 = 32; 1964 = 32; 1965 = 32; 1966 = 32; 1967 = 30; 1968 = 8; 1969 = 5; 1970 = 5; 1972 = 4; 1973 = 4; 1974 = 4. Estes números do SPI referem-se unicamente aos índios assistidos, ou seja, aqueles a quem estava garantida a ajuda direta do órgão tutor. Isto significa que todos os outros, excluídos desta categoria, não eram computados. A quantidade de assistidos foi sendo gradativamente reduzida à medida que as condições econômicas dos postos foram se tornando mais precárias, até a desativação total dos postos e também à medida que as 28 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 109 ACO 312 / BA terras eram ocupadas por arrendatários e/ou invasores e os índios dispersados para fora da área (cf. Paraíso, 1976). Estes números devem ser bastante relativizados, inclusive em função da desorganização crescente da estrutura administrativa do SPI na área” (fls. 4.186-4.187). 55. Apesar das ressalvas do Perito Oficial quanto à precisão desses dados, comparando essas informações com o que consta nos autos tem-se que: a) não há uma estimativa sobre o número de índios habitantes na região quando da demarcação procedida pelos governos federal e baiano em 1937 e 1938, quando acordada a afetação de uma área de 54.105,18 hectares para os índios (laudo topográfico às fls. 4.397); b) em 1942, após o arrendamento de 5.123 hectares na área da reserva (fls. 4.192), havia 338 índios assistidos nos Postos Indígenas Caramuru e Paraguaçu; c) em 1958, o governo federal prontificou-se a restituir 20 mil hectares dos 22 mil que teriam sido cedidos pelo governo baiano para a instalação dos Postos Indígenas na região, desde que o Estado assumisse a obrigação de manter os 2 mil hectares acordados com a Secretaria Estadual de Agricultura, Indústria e Comércio, para a localização dos índios remanescentes (Aviso GM n. 796, de 9.8.1958), ou seja, 31 índios mantidos no Posto Paraguaçu, sem informação de quantos estariam situados no Posto Caramuru; d) em 1968, quando registrados apenas 8 índios no Posto Indígena Caramuru, a antropóloga Maria Hilda Baqueiro Paraíso (responsável pelo censo demográfico referido e perita oficial dos autos da ACO n. 323) sugeriu como solução para os conflitos na região, em trabalho resultante de convênio celebrado entre a Funai e a Universidade Federal da Bahia, que se procedesse à demarcação de uma reserva indígena de 29 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 110 ACO 312 / BA aproximadamente 14 mil hectares na região (fls. 473, vol. II); e) descartando essa solução por desconsiderar os dados referentes ao Posto Paraguaçu e a existência de terras ocupadas pela família de dois índios em outras áreas, o Departamento Geral do Patrimônio Indígena da Funai, em estudo de 1979 intitulado ‘Síntese do histórico de ocupação da área dos PI’s Caramuru e Paraguassu pelo Grupo Indígena Pataxó’, sugeriu a formação de um grupo de trabalho para rever e definir a área a ser afetada aos índios (fls. 473, vol. II). Data de então a celebração, pela Funai, do contrato de empreitada antes mencionado, cujo objeto seria a demarcação administrativa de área restrita aos limites dos Municípios de Pau Brasil e Itaju do Colônia, excluindo, portanto, o Município de Camacan (Contrato de Empreitada n. 009/79, fls. 362, vol. II), o que poderia denotar o reconhecimento da própria Fundação, em 1978, da inadequação dos limites fixados quarenta (40) anos antes na demarcação procedida pelo Ministério da Guerra com o Estado da Bahia. De resto, cumpre salientar que nesta área é que se intensificaram os conflitos, até mesmo armados, que vêm sendo denunciados nos últimos meses. 56. Quanto à situação existente após a chamada reocupação da área a partir de 1982, observou o Perito Oficial quando da elaboração do seu laudo antropológico (1997): “Em função da escassez de tempo, além obviamente da não imprescindidibilidade de dados demográficos precisos, não realizamos um censo da população, o que aliás demandaria um tempo muito maior do que o disponível para esta perícia. Contudo, os próprios índios realizaram um levantamento da população atualmente residente nas áreas das fazendas São Lucas, São Sebastião, Bom Jesus, Paraíso, Nova Vida I (parte) e Nova Vida II (parte) e registraram uma população de 979 pessoas, distribuídas em 220 famílias. (...) 30 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 111 ACO 312 / BA No levantamento realizado pelos índios, os mesmos contabilizam um total de 1.439 índios fora da área, espalhados em diversos municípios do Estado da Bahia e do Brasil, somando um conjunto de 306 famílias indígenas ‘errantes’. Portanto, em termos aproximados haveria hoje uma população indígena, residente ou apta a residir na área da reserva, em torno de 2.000 pessoas. Possíveis contestações ao fato dos índios contabilizarem a si mesmos podem ser rebatidas se considerarmos que relações de parentesco fictícias são insustentáveis a longo e até a curto prazo” (fls. 4.187-4.188). 57. Esse quadro fático põe algumas premissas inafastáveis na apreciação desta causa: a) quando da edição da Lei baiana n. 1.916/26 existiam índios ocupando a região de forma permanente e tradicional; b) a demora na ultimação dos objetivos daquela lei estadual contribuiu para o agravamento dos conflitos fundiários existentes; c) com o transcurso do tempo, a presença indígena na região foi, primeiro, reduzida, o que provocou a contínua rediscussão, pelas autoridades competentes federais e estaduais, sobre os limites da área a ser destinada para o estabelecimento da reserva indígena; d) a ocupação das propriedades pelos descendentes dos autóctones no início da década de 1980 voltou a elevar a presença indígena na região, apresentando, assim, dificuldades na delimitação dessa área, donde o ajuizamento da presente ação com o objetivo de declarar a nulidade dos títulos de propriedade apresentados na inicial e daqueles cujo objeto se localizasse no interior da área demarcada em 1938, para, posteriormente, proceder-se à demarcação administrativa da reserva. Consideradas essas premissas, as partes contrapõem duas teses. A Funai e a União sustentam que a acentuada redução da presença de índios nas áreas discutidas resultou de sua expulsão com atos de violência de não-índios, suficiente para delas não afastar a condição jurídico-constitucional de terras indígenas. 31 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 112 ACO 312 / BA Para os Réus, a extensão da área demarcada em 1938 jamais teria sido efetivamente ocupada por índios, exigindo, assim, a reversão do domínio daquelas terras ao Estado da Bahia, motivo pelo qual a reocupação ocorrida a partir da década de 1980 seria verdadeira invasão de propriedades particulares “por índios que, ao longo dos últimos 20 anos desta disputa judicial foram trazidos de outras regiões pela FUNAI”, o que atrairia a incidência do entendimento assentado na Súmula n. 650 deste Supremo Tribunal, segundo a qual “os incisos I e IX do art. 20 da Constituição Federal não alcançam terras de aldeamentos extintos, ainda que ocupadas por indígenas em passado remoto” (fls. 6.042-6.052, vol. XIX). O cerne da questão está, portanto, em saber se a redução da presença indígena na região, em determinado período, possibilitaria a conseqüente diminuição do espaço geográfico que se pretendeu reservar aos índios em 1938, porque, no regime constitucional de 1934 a 1946, a posse indígena a ser respeitada condicionava-se ao caráter de permanência na localização imemorial estabelecida pelo índio ou decorrente de definição do órgão oficial com a atribuição de cuidar dos seus interesses. 58. Para o Relator, Ministro Eros Grau, “a baixa demografia indígena na região em determinados momentos históricos, principalmente quando decorrente de esbulhos perpetrados pelo forasteiro, não consubstancia óbice ao reconhecimento do caráter permanente da posse dos silvícolas”, de acordo com o entendimento assentado no julgamento da Ação Cível Originária n. 323 (Rel. Min. Francisco Resek, Tribunal Pleno, DJ 8.4.1994), donde o necessário restabelecimento da integralidade da reserva indígena demarcada em 1938. 59. Tenho, entretanto, que o caso examinado naquele precedente apresentava circunstâncias distintas às destes autos, dificultando a invocação do entendimento firmado naquela ocasião. 32 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 113 ACO 312 / BA 60. Naquele precedente, no qual também se pretendia a declaração de nulidade de vários títulos de propriedade outorgados pelo Estado de Minas Gerais, o decreto estadual por meio do qual efetivada a doação de terras à União (Decreto Estadual n. 5.462, de 10.12.1920) discriminava com precisão os limites da área a ser destinada exclusivamente para o alojamento dos índios Crenacs. O aperfeiçoamento da transferência das terras mediante a lavratura, em escritura pública, da doação (registrada em cartório de imóveis), constituiu elemento fundamental para o reconhecimento da inafastabilidade do domínio da União em relação àquela área reservada, motivo pelo qual nem o seu abandono pelos índios seria capaz de reverter o domínio das terras ao Estado mediante gesto unilateral. 61. A mesma situação fática, aliás, foi apresentada no julgamento do Recurso Extraordinário n. 44.585 (Tribunal Pleno, DJ 11.10.1961 – Ministro Victor Nunes Leal). 62. É inegável, assim, que somente a política de delimitação administrativa dos espaços geográficos destinados à preservação das identidades culturais dos índios funcionou como instrumento eficaz na garantia dos seus direitos congênitos até o advento da Carta de 1967, quando a convergência do domínio das terras indígenas e da responsabilidade pela proteção dos interesses dos índios à União impôs dificuldades à atuação daqueles que pretendessem violar os direitos desses brasileiros. 63. No caso em exame, portanto, a inexistência de ato estatal conclusivo da demarcação administrativa, que não foi homologada, impediu a precisa identificação e, consequentemente, a efetiva proteção jurídica das terras indígenas, sendo certo que a dupla afetação da extensa área mencionada na Lei baiana n. 1.916/26 (50 léguas quadradas de terras 33 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 114 ACO 312 / BA destinadas à conservação das essências florestais e ao gozo dos índios ali habitantes) tornou manifesta a imprecisão dos limites nela fixados, conforme realçou o Ministro Nelson Jobim no julgamento da Questão de Ordem. 64. Essa a particularidade que gerou grande parte dos problemas a serem agora enfrentados: até a edição da Carta de 1967, quando alterada a posição dos Estados quanto às terras ocupadas pelos silvícolas, o seu abandono pelos índios, sem sacrifício dos seus interesses, autorizava o ente estadual, diante da falta do pressuposto de permanência, a reaver as terras e doa-las a terceiros. Nesse sentido, o seguinte trecho do voto do Ministro Néri da Silveira na Ação Cível Originária n. 278-MT (Rel. Min. Soares Muños, Tribunal Pleno, acórdão unânime, DJ 11.11.1983), quando Sua Excelência, relembrando parecer por ele elaborado na condição de Consultor Jurídico da Procuradoria-Geral do Rio Grande do Sul sobre a extensão dos efeitos do art. 216 da Constituição de 1946, julgou procedente a ação para assentar a inexistência de posse permanente dos índios sobre as áreas objeto dos títulos de propriedade adquiridos do Estado de Mato Grosso: “Dessa maneira, o que vedado está é o desapossamento, de forma real, dos silvícolas, em relação àquelas terras, que – em verdade – ocupem e aproveitem, utilizando-as, concretamente, em seu favor e de suas famílias. Nada obsta, portanto, respeitadas as frações de certa área de terras, onde os selvagens estejam estabelecidos, com suas famílias, e as utilizem, - possa o Estado-membro desmembrar partes de território, primitivamente reservado aos silvícolas, que não mais estejam servindo à habitação, uso e gozo dos aborígines, ou porque não possuam recursos naturais aproveitáveis pelos indígenas, de acordo com seu estágio de desenvolvimento, ou porque dessas frações de terras não mais aufiram proveitos aos índios. Em realidade, tratandose de terras públicas estaduais, a garantia constitucional da posse em apreço não extingue, como é óbvio, o direito dominial; daí, a viabilidade do exercício, pelo titular do domínio, dos poderes 34 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 115 ACO 312 / BA correspectivos, se e quando desaparecer o fato restritivo do pleno jus. Nem se altera a solução em foco, quando o próprio Estado, por ato administrativo, entendeu de demarcar a área, que se haveria de considerar reservada aos índios. As terras foram definidas, em proteção aos silvícolas, na hipótese ora argüida. Ora, se estes não necessitam de toda a zona demarcada – ordinariamente, ‘com largueza’ – a partir de um dado momento – ou porque as famílias diminuíram, numericamente, por causas que não vale, aqui, perquirir, - ou porque preferiram localizar-se, apenas, em uma certa porção do território delimitado, com caráter permanente, - impede concluir-se que o titular do domínio, - respeitada, dessa forma, a posse localizada dos índios, - poderá aproveitar o que remanesce, sem utilização efetiva, para dar-lhe destinação social valiosa. Nenhuma infração ocorreria ao dispositivo constitucional em apreciação, porque os índios não estariam a ser ‘arrancados’ ou desapossados das terras, nem seriam sacrificados em seus interesses pessoais”. 65. O que a Ação Cível Originária n. 323 (Relator o Ministro Francisco Rezek) inovou em relação a essa orientação foi a impossibilidade de re-assenhoramento das terras pelo Estado quando efetivada a transferência das terras à União, quer dizer, quando tenha havido a doação de terras do Estado à União. Como observou o Ministro Francisco Rezek em passagem destacada pelo Ministro Eros Grau no voto proferido nesta ação, “só se extingue o que preexiste”. A existência de reserva indígena tem o condão de transferir para a União a competência para extingui-la, motivo pelo qual o abandono da área pelos índios, ainda que consentido, o que não se demonstra tenha ocorrido no presente caso, que, como afirmado pelo Relator, teria sido forçada, não autorizaria a atuação unilateral do Estado nessa hipótese. 66. O que se há de concluir, pois, no presente julgamento, é se a ausência do ato homologatório da demarcação administrativa realizada em 1938 impede-nos concluir existir a reserva indígena e, consequentemente, a doação das terras à União. Somente concluindo pela inexistência da reserva é que se poderia ter como válida a celebração, pelo 35 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 116 ACO 312 / BA Estado, de negócio jurídico com as terras indígenas tidas por abandonadas, não incidindo, em relação a elas, o disposto no parágrafo 1º do art. 198 da Carta de 1967 (“§ 1º Ficam declaradas a nulidade e a extinção dos efeitos jurídicos de qualquer natureza que tenham por objeto o domínio, a posse ou a ocupação de terras habitadas pelos silvícolas”). Como o relator, também concluo que a delimitação, ainda que sem o aperfeiçoamento formal do processo demarcatório, pela ausência de sua homologação, não pode ser óbice ao reconhecimento das terras indígenas, sobre elas incidindo a impossibilidade de se ter por válidos atos jurídicos firmados por particulares com o Estado da Bahia. 67. Não posso deixar de observar que a situação fática apresentada nestes autos, quanto ao domínio das terras indígenas, guarda alguma identidade com o caso examinado no Recurso Extraordinário n. 219.983 (Relator o Ministro Marco Aurélio, Tribunal Pleno, unânime, DJ 17.9.1999), que poderia ser considerada afinidade maior do que com a Ação Cível Originária n. 323 ou com o Recurso Extraordinário n. 44.585. Em efeito, no julgamento do RE n. 219.983, após afirmar o Ministro Marco Aurélio a imprestabilidade de precedente invocado pelo Procurador-Geral da República (RE 183.188, Rel. Min. Celso de Mello, Tribunal Pleno, DJ 14.2.1997), considerando o fato de que “o caso concreto que o fez surgir dizia respeito à área demarcada pela FUNAI, cujo ato foi homologado pelo Presidente da República”, o Tribunal, à unanimidade, julgou improcedente a pretensão da União de ver declarada a impossibilidade de usucapião sobre o imóvel localizado em aldeamento indígena extinto, porque a proteção constitucional prevista nas Cartas pretéritas e na atual Constituição não albergaria situações de terras que foram, em tempos idos, ocupadas por indígenas. De se lembrar que desse e de outro precedente julgado no mesmo sentido (RE n. 249.705, Rel. Min. Moreira Alves, Tribunal Pleno, DJ 36 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 117 ACO 312 / BA 1.10.1999) adveio a Súmula n. 650, dispondo que “os incisos I e XI do art. 20 da Constituição Federal não alcançam terras de aldeamentos extintos, ainda que ocupadas por indígenas em passado remoto”. 68. Mas não é possível desconsiderar o entendimento doutrinário e jurisprudencial no sentido de que as terras ocupadas pelos índios certamente não eram devolutas, não havendo falar, portanto, de sua integração ao patrimônio dos Estados. O que anoto é que, sem o aperfeiçoamento do processo demarcatório pela ausência da homologação, situação antes mencionada, a incidência da proteção constitucional depende da comprovação fática da caracterização de determinada área como habitat de certa etnia. 69. O Ministro Eros Grau considerou que a presença indígena numericamente fraca na região, em alguns períodos, teria decorrido “dos esbulhos perpetrados pelo forasteiro”, suficiente para manter o caráter de permanência da posse dos índios no caso aqui cuidado, como assentado, segundo o Relator, na ACO n. 323. De se anotar, contudo, que o esbulho alegado na ACO n. 323 teria ocorrido em área reservada, ou seja, devidamente delimitada em portaria e homologada por decreto, donde a irrelevância para o reconhecimento da condição jurídico-constitucional de ‘terra indígena’ o motivo pelo qual se deu o abandono da área discutida, pois não se poderia afastar o domínio da União naquela situação. Como se infere do que assentado naquele julgamento, somente pela declaração formal do órgão competente, por via administrativa ou judicial, de inexistência dos pressupostos necessários à manutenção da afetação fundiária reverteria o domínio das terras ao Estado, daí a declaração de nulidade dos títulos de propriedade expedidos pelo Estado de Minas Gerais naquele precedente. 37 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 118 ACO 312 / BA 70. A ausência, entretanto, de perfeita adequação do precedente citado ao caso sob exame não retira a exatidão da assertiva do Relator, Ministro Eros Grau, de que a remoção dos índios de suas terras pelos atos de violência não tem o condão de afastar-lhes o reconhecimento da tradicionalidade de sua posse. Esse o entendimento manifestado por este Supremo Tribunal no julgamento do denominado ‘caso Raposa – Serra do Sol’ (PET n. 3.388), tendo o acórdão, no ponto, recebido a seguinte ementa: “11.2. O marco da tradicionalidade da ocupação. É preciso esse estar coletivamente situado em certo espaço fundiário também ostente o caráter da perdurabilidade, no sentido anímico e psíquico de continuidade etnográfica. A tradicionalidade da posse nativa, no entanto, não se perde onde, ao tempo da promulgação da Lei Maior de 1988, a reocupação apenas não ocorreu por efeito de renitente esbulho por parte de não-índios. Caso das ‘fazendas’ situadas na Terra Indígena Raposa Serra do Sol, cuja ocupação não arrefeceu nos índios sua capacidade de resistência e de afirmação da sua peculiar presença em todo o complexo geográfico da ‘Raposa Serra do Sol’” (DJe 24.9.2009). Sobre o tema, o Ministro Carlos Britto, Relator daquele caso, após enfatizar que o intervalo fundiário que se forma entre diversas etnias aborígenes “não é um indiferente jurídico: ele cai sob o regime comum da propriedade privada, ou é automaticamente incorporado aos bens de um certo Estado-membro como terra devoluta, ou se disponibiliza para a criação e instalação de um novo Município” (item 94), asseverou: “95. ... se, à época do seu descobrimento, o Brasil foi por inteiro das populações indígenas, o fato é que o processo de colonização se deu também pela miscigenação racial e retração de tais populações aborígines. Retração que deve ser contemporaneamente espontânea, pois ali onde a reocupação das terras indígenas, ao tempo da 38 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 119 ACO 312 / BA promulgação da Lei Maior de 1988, somente não ocorreu por efeito do renitente esbulho por parte dos não-índios, é claro que o caso já não será de perda da tradicionalidade da posse nativa. Será de violação aos direitos originários que assistem aos índios, reparável tanto pela via administrativa quanto jurisdicional. Para isso é que servem as regras constitucionais da inalienabilidade e da indisponibilidade das terras indígenas, bem assim a imprescritibilidade dos direitos sobre elas. Regras que se voltam para a proteção de uma posse indígena pretérita, visto que a Constituição mesma é que desqualifica a alegação de direito adquirido e em seu lugar impõe o dever estatal de indenizar os nãoíndios como instransponível óbice à tentação hermenêutica de se prestigiar o dogma da segurança jurídica em prejuízo dos índios (indenização, todavia, que somente ocorre ‘quanto às benfeitorias derivadas da ocupação de boa-fé’, nos precisos termos do comando final do § 6º do art. 231 da Constituição)”. 71. É certo que nem a criação de órgão governamental encarregado da defesa dos interesses dos índios (SPI), na República, impediu a gradativa diminuição do espaço fundiário por eles ocupado, seja porque quase nenhuma ação violadora dos direitos indígenas foi eficazmente combatida, seja pela circunstância de terem sido eles entregues à própria sorte em seus contatos com particulares, de resultados quase sempre desastrosos. Pode-se considerar, assim, que a violência em relação aos índios apresenta-se como elemento quase indissociável do processo de ocupação do território nacional, havendo de se concluir, portanto, ser necessário, para o reconhecimento do caráter de permanência da posse indígena em face dessa circunstância, ponderação jurídica, sem o que se poderia chegar a resultados graves em todo o território nacional. Daí ter-se falado, no julgamento da Petição 3.388, de “continuidade suficiente” (Ministro Carlos Britto), ou “presença constante e persistente” (Ministro Menezes Direito), como um elemento imprescindível para a manutenção da posse indígena em situações de esbulho. 39 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 120 ACO 312 / BA 72. Nesses termos, as dificuldades para se concluir, no presente caso, pela condição de reocupação das terras indígenas da área, a partir da ‘Fazenda São Lucas’ em 1982, estão em que há de se reconhecer ter havido afastamento dos indígenas das áreas, conforme comprovado, sem que jamais tenham eles abandonado de todo a região e que a violência contra eles é que conduziu a tal arredamento. Por isso é que acompanho o Ministro Relator para considerar ter havido a persistência necessária para configurar a continuidade suficiente da posse tida por esbulhada. 73. No julgamento da petição n. 3.388 (caso Raposa Serra do Sol), o Ministro Relator mencionava a necessidade de uma “‘chapa radiográfica’ da questão indígena nesse delicado tema da ocupação das terras a demarcar” para se concluir sobre a persistência da presença na área. É do Ministro Carlos Britto, naquele julgamento, a observação de que a fixação de um marco temporal de ocupação evitaria a “fraude da subitânea proliferação de aldeias, inclusive mediante o recrutamento de índios de outras regiões do Brasil, quando não de outros países vizinhos, sob o único propósito de artificializar a expansão dos lindes da demarcação”. Mas tenho como necessário fixar-se nesta concepção da “chapa radiográfica” a possibilidade da continua presença ou não, o que se faz mister para a conclusão do presente caso. 74. Não há dúvida de que o aumento do número de índios na área fez-se mais intenso a partir da decisão da Fundação Autora em afirmar e garantir o movimento de ocupação iniciado na década de 1980. Consta do parecer antropológico apresentado que, em 1759 estimava-se a presença de dois mil e setecentos (2.700) índios em toda a região sul do Estado da Bahia (fls. 4.186). 40 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 121 ACO 312 / BA Após o transcurso de mais de dois séculos de agruras experimentadas pelos índios, pesquisa de campo realizada em 1976 pela antropóloga Maria Hilda Paraíso e mencionada no mesmo parecer técnico do auxiliar do Juízo, apurou “uma população dentro da área da reserva de 14 índios próximos aos postos. Fora da área da reserva, haveria uma população de 32 pessoas. Afastados dos postos, mas na região estariam mais 42 pessoas; fora do Estado da Bahia viveriam 11 pessoas e teriam destino ignorado mais 74 indivíduos, perfazendo um total entre presentes e ausentes de 173 pessoas” (fls. 4.187, vol. XIII). O perito antropológico da presente ação afirmou, como observado antes, a existência de aproximadamente duas mil (2.000) pessoas “residente[s] ou apta[s] a residir na área da reserva” em 1997, considerando, é certo, levantamento dos próprios índios entrevistados no interior da reserva não homologada (fls. 4.188, vol. XIII). O aumento é de mais de dez vezes da população indígena em pouco mais de duas décadas, quase igualando a situação existente em meados do século XVIII. Mas é inegável que a área sempre foi de indígenas em todo o período, não se tendo, nos autos, qualquer manifestação de que, em alguma passagem, tenham eles abandonado ou desaparecido completamente da região, menos ainda por autodeterminação. 75. Outra dificuldade nesta ação seria a de se constatar que a permanência no tempo da situação exposta nos autos teria diminuído a possibilidade de se garantir o que a destinação constitucional de terras aos índios objetivava: “que ali permane[cessem] os traços culturais dos antigos habitantes, não só para sobrevivência [de uma] tribo, como para estudo dos etnólogos e para outros efeitos de natureza cultural e intelectual”, de acordo com a lição do saudoso Ministro Victor Nunes Leal no Recurso Extraordinário n. 44.858. 41 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 122 ACO 312 / BA 76. Mas o Perito Oficial asseverou que “os grupos habitantes atualmente na Reserva Caramuru Paraguaçu mantêm um conjunto de referências que os distinguem dos demais nacionais” (fls. 4.211), embora reconheça, em outra passagem de seu trabalho técnico de 1997, que “[o]s povos ali aldeados gradativamente tiveram que abandonar suas formas tradicionais de exploração dos recursos naturais e adota[r] os padrões impostos por aqueles que passaram a gerir seus destinos” (fls. 4.181). Foi esse, aliás, o motivo apresentado para justificar a dificuldade em constatar a prática de ritos religiosos indígenas quando da elaboração do trabalho mencionado: “As constantes perseguições e consequentes fragmentações que se abateram sobre as diversas etnias que compõem a população indígena da reserva determinou certamente o arrefecimento dos referenciais religiosos originais dessas coletividades” (fls. 4.205). E relata mais adiante: “Em nossa pesquisa de campo, procuramos investigar a presença de crenças e de práticas religiosas entre os moradores da área da reserva. Em uma entrevista com a filha de um Baenã e uma índia Pataxó, ela nos contou que havia momentos em que ela desconfiava que seus pais realizavam cultos na mata, mas que sempre foi impedida de presenciar tais atividades” (fls. 4.204). O auxiliar do Juízo asseverou que “os Pataxós têm práticas religiosas singulares”, citando, com o objetivo de comprovar essa afirmação, os rituais praticados por ocasião do sepultamento do índio Galdino Jesus dos Santos (vítima de crime praticado em 1997, de repercussão nacional e internacional), e, ainda, a celebração do ‘Toré’, “descrito genericamente como uma dança circular que se realiza entoando cânticos” (fls. 4.205). 42 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 123 ACO 312 / BA 77. Quanto à identidade lingüística, consta do laudo mencionado: “A situação lingüística atual, com o recente falecimento de Bahetá, última falante da língua Pataxó, é caracterizada por uma prevalência completa da língua portuguesa, ademais levando em consideração todas as compulsões sofridas pelos índios no sentido de abandonarem seus referenciais culturais. Ainda hoje alguns vocábulos de origem Pataxó são utilizados, para designar objetos marcadamente indígenas como o arco. É possível que com a estabilização das condições de vida os índios venham a desenvolver estratégias para que o idioma possa ser ensinado nas escolas da área indígena, dado que há possibilidade de um aprendizado pelo menos parcial da língua Pataxó, através da cartilha elaborada a partir de conversas com Bahetá” (fls. 4.214). 78. O quadro atual evidencia o efeito das políticas adotados por governos passados em promover o desenvolvimento da região pela produção agropecuária, conforme se infere da seguinte passagem do laudo técnico apresentado pelo perito agronômico da causa: “Apoiando-me nos dados e estimativas de produção acima e verificando que a base econômica dos municípios envolvidos é o setor primário, haja vista que nestes não existem nenhuma indústria de transformação com relevância, podemos então concluir que o montante das receitas auferidas na área questionada correspond[ia, considerada a época de elaboração do trabalho – 1997/98] a 20,75% da receita agropecuária do município de Itaju do Colônia, 45,92% da receita do município de Pau Brasil e 6,09% da receita do município de Camacan, com desdobramentos nas arrecadações de tributos, consumo de bens e serviços, além da distribuição de renda através dos salários pagos aos operários no meio rural (em torno de R$ 807.820,00 para os operários fixo/ano). Assim, o aumento ou diminuição da produção/produtividade no setor primário, além da sua distribuição per capita, s[eriam] os principais fatores para o progresso ou declínio da economia destes municípios” (fls. 4.816 e 4.817, vol. XIV). 43 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal ACO 312 / BA 124 79. Não menosprezo, no ponto, problemas de ordem social apontados pelo auxiliar do Juízo e reproduzidos pelo Ministro Eros Grau em seu voto, que poderão advir da procedência desta ação, ou seja, da perda das terras pelos não-índios pela declaração de nulidade dos títulos de propriedade impugnados: “... posso afirmar que o principal impacto de ordem social com a perda das terras pelos atuais ocupantes será o desemprego, haja vista que foi constatado 478 postos de empregos fixos através dos administradores, vaqueiros e operários de campo, além de cerca de 539 trabalhadores temporários que são contratados em picos de atividade agrícola ou pecuária. Como consequência deste desemprego haverá uma fragilização do ‘tecido social’ através do êxodo de parte destes trabalhadores com suas famílias para as periferias das cidades da região, aumentando a miséria e a marginalidade desta mão-de-obra devido a sua pouca qualificação. De igual impacto será a perda das unidades produtivas que utilizam mão-de-obra predominantemente familiar, pois representam cerca de 37,46% das unidades produtivas levantadas e absorvem cerca de 317 proprietários-operários destas UP’s que possuem características semelhantes ao assalariado acima descrito no que tange a qualificação profissional. Com a perda dos valores oriundos dos salários pagos aos trabalhadores e a renda dos proprietários das unidades produtivas, diminuirá também o mercado de consumo de bens e serviços nas cidades-sede dos municípios envolvidos” (fls. 4.818 e 4.819, dados referentes ao ano de 1997/1998). Daí a assertiva do perito agronômico da causa, no sentido de que “a minimização ou agravamento destes impactos dependerá logicamente da dinâmica imposta pelos novos ocupantes aos bens de produção existentes” (grifos no original, fls. 4.819, vol. XIV). Esses ‘novos ocupantes’ referidos pelo auxiliar agronômico do Juízo seriam aqueles que, de acordo com o perito antropológico, “esperaram 44 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal ACO 312 / BA 125 melhores tempos para retornarem a identidade e afirmarem a sua ligação ancestral com o território”, intenção que seria, segundo aquele perito, observada também em relação aos autodeclarados descendentes dos autóctones ainda residentes em outros Municípios brasileiros (fls. 4.233, vol. XIII). 80. Não acho se possa desconsiderar o acerto da adoção de um marco temporal de ocupação para o exame de questões envolvendo a delimitação de terras indígenas, ainda mais tendo em conta o acréscimo considerável no contingente de pessoas autodeclaradas indígenas nas últimas décadas, conforme constatado em estudo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE (disponível no endereço eletrônico: http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/tendencia_demografi ca/indigenas/indigenas.pdf). Mas no caso dos autos, como posto pelo Ministro Relator, comprovou a Autora que sempre se teve a ocupação, ainda que em menor número, de índios na região demarcada. 81. Preocupa, sobremaneira, as condições na área em litígio, por ter havido a celebração de contratos de arrendamento a aproximadamente três mil (3.000) agricultores e criadores já estabelecidos na região e a própria União, por meio do seu órgão de proteção aos índios, servia para cumprir a política governamental de incorporação dos índios aos hábitos e aos costumes tidos como civilizados. 82. Esse entendimento é reforçado se considerarmos que quando da celebração desses acordos a ordem constitucional já determinava o respeito à posse de terras de indígenas que nelas estivessem, em caráter de permanência, vedada, ainda, a sua alienação (art. 129 da Constituição de 1934, art. 154 da Constituição de 1937 e art. 216 da Constituição de 1946). 45 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 126 ACO 312 / BA E nos termos do Decreto n. 736, em 6.4.1936, cabia ao Arrendador, o Serviço de Proteção aos Índios, promover os atos mais convenientes para impedir que as terras habitadas pelos indígenas fossem consideradas devolutas, demarcando-as, fazendo respeitar, garantir, reconhecer e legalizar a posse dos índios, pelos governos estaduais ou municipais e pelos particulares, até mesmo quanto às posses reconhecidas por força da Lei n. 601, de 18.9.1950, e outras posteriores, mesmo nos casos de extinção dos aldeamentos, provando que o fato de os Governos terem deixado de administrá-los ou de superintendê-los não justificaria que os índios, ou seus descendentes, fossem espoliados de suas terras (alíneas a e c do art. 3º). Em busca da concretização dessas diretrizes, aquele Decreto impedia expressamente “... que os funcionários do Serviço de Proteção aos Índios, ou quaisquer particulares leigos ou religiosos, se torn[assem] parceiros ou possuidores dos bens ou das terras dos índios, entende[ndo]-se por terra dos índios: (...) 3º) as que já lhes [tivessem] sido ou [viessem] a ser reservadas para seu uso, ou reconhecidas como de sua propriedade a título qualquer” (art. 2º, al. g, do Decreto n. 736/1936), sendo, ainda, vedado “... aos serventuários do Serviço de Proteção aos Índios [d]ispor a título qualquer, mesmo pagando arrendamento, de terras de índios, para utilização própria ou estranha ao Serviço de Proteção aos Índios...” (art. 47, item 1, do Decreto n. 736/1936). O mesmo diploma legal ainda estipulava, na impossibilidade de acordo entre os entes federados para a consecução dos objetivos fixados, que o Serviço de Proteção ao Índio requeresse ao Juízo Federal competente medidas cabíveis “para garantir aos selvicolas as suas posses” (art. 3º, al. b, do Decreto n. 736/1936). Apesar da revogação expressa do Decreto n. 736/36 ter ocorrido com a edição do Decreto n. 11, de 18.1.1991, pode-se considerá-lo tacitamente revogado somente com a instituição da Fundação Nacional do Índio pela Lei n. 5.371, de 5.12.1967. 46 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal ACO 312 / BA 127 83. A celebração de contratos de arrendamento com particulares na região discutida evidencia poder ter sido esse um dos motivos pelos quais não se concluiu a homologação da área demarcada em 1938, pois desses atos negociais e dos termos da legislação então vigente pode-se inferir que o próprio órgão federal encarregado da defesa dos interesses dos índios não considerava a totalidade da área demarcada como necessária à afetação indígena. Os documentos juntados aos autos comprovam que as autoridades dos sucessivos governos, federal e estadual, tinham pleno conhecimento de como a questão indígena era conduzida na região, sendo certo que a constatação de afronta aos direitos dos índios sobre as terras por eles permanentemente ocupadas impunha, por disposição legal, a atuação estatal, com a homologação da reserva e a consequente desintrusão dos invasores das terras indígenas, o que, como reiterado, não ocorreu. 84. Observo também que o objetivo da criação da reserva indígena Caramuru-Catarina-Paraguaçu era garantir o avanço da frente agropastoril na região sul da Bahia com o assentamento dos diversos grupos indígenas então existentes, fossem autóctones ou oriundos de aldeamentos extintos situados em outras localidades, conforme se depreende da seguinte passagem do parecer antropológico juntado aos autos: “Assim, podemos dizer, com base nas fontes históricas e etnográficas disponíveis, que os povos indígenas habitantes da área em demanda são os Pataxó, Baenã, Kamakã e Gueren ou Gren, autodenominação dos chamados Botocudo, referidos nas fontes como originariamente habitantes da região. Na área próxima a reserva existiram vários aldeamentos indígenas instalados, em períodos diversos, para submeter as populações autóctones ao controle dos colonizadores por intermédio da catequese religiosa. A medida que através do processo de invasão das frentes de expansão ou como 47 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 128 ACO 312 / BA resultado da política da Coroa Portuguesa e depois do Estado brasileiro esses aldeamentos foram entrando em decadência as populações indígenas sobreviventes foram transferidas para a reserva Caramuru Catarina Paraguaçu, como último espaço de refúgio para esses grupos. Desse modo vieram contingentes de Tupiniquim, Botocudos (Aymoré e Guerén ou Gren) e Kamakã; de Kariri-Sapuyá, oriundos de Santa Rosa; e outros Kamakã e Guerén, reduzidos no aldeamento de Ferradas. (...) Devemos ter claro que a criação da Reserva Caramuru Catarina Paraguaçu vinculou-se à política de estabelecimento de áreas exclusivas para os índios com o intuito de liberar terras para o avanço da frente agro-pastoril que veio a estabelecer as bases da economia regional. Os povos indígenas alocados na reserva agruparam-se em torno dos postos indígenas aí instalados pelo Serviço de Proteção aos Índios – SPI. Obviamente, a convivência em um mesmo território criou condições para o desenvolvimento de articulações entre os diversos grupos habitantes do local. Mas pode-se afirmar com tranqüilidade a manutenção de distinções que repartem os habitantes em quatro etnias: Pataxó Hãhãhãi, Baenã, Kariri-Sapuyá e ‘índios de Olivença’” (fls. 4.175 e 4.176, vol. XIII). 85. Essa circunstância apresenta conceitos distintos sobre as terras discutidas, defluindo, daí, consequências diversas em relação a cada uma delas. Quanto à terra de ocupação efetiva, ou seja, aquela habitada pelos índios de acordo com os usos, costumes e tradições tribais, o reconhecimento do direito à posse permanente não dependeria da conclusão do procedimento administrativo de demarcação, uma vez que a proteção dessas resultaria diretamente de mandamento constitucional de ontem e de hoje. Já a área destinada à ocupação dos grupos indígenas sem esse vínculo imemorial com a terra depende da sua delimitação legal para o 48 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 129 ACO 312 / BA resguardo da posse indígena sobre as terras reservadas. Do contrário, instaurar-se-ia a insegurança jurídica fundiária em todo o território nacional, pois a simples fixação de um grupo indígena em qualquer área bastaria para conferir-lhes a pretensão à defesa da posse. Não por outra razão, atualmente, tem-se o procedimento administrativo para a reserva de terras destinadas à proteção de grupos indígenas, prevista no art. 26 da Lei n. 6.001/73 (área reservada), com rito diferente do aplicado às terras tradicionalmente ocupadas pelos índios, estabelecido pelo Decreto n. 1.775/96, como observa a Funai em sua página eletrônica na internet (link ‘as terras’ em ‘índios do Brasil’ – www.funai.gov.br/index.html, acessado em 27.08.2010). 86. Essa distinção, contudo, não impossibilita a simultaneidade desses dois institutos numa mesma reserva, como se pretendeu fazer em 1938 quanto às áreas objeto da presente ação. Sobre o tema discorreu o Ministro Néri da Silveira no julgamento da ACO n. 278 antes mencionada: “Se é exato, dessa sorte, que se não confundem os conceitos de terras reservadas e de terras ocupadas, nada impede que, ao estabelecer áreas reservadas, nestas, a União possa incluir, desde logo, terras de posse imemorial de tribos indígenas. Ao lado destas, cabível é compreender que, também, se possam destinar à posse e ocupação pelos índios terras devolutas estaduais ou mesmo integrantes do patrimônio particular”. 87. Não parece errado concluir que nem toda a área demarcada administrativamente em 1937/38 (54 mil ha) era de ocupação imemorial. Mas nela a presença dos índios está comprovada nos autos quando e após a demarcação, ainda que em parte tanto advenha de ocupações pelos que foram nela se assentando, o que se comprovou naquele procedimento demarcatório. 49 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 130 ACO 312 / BA 88. Sobre a atuação do Estado da Bahia, aliás, é importante enfatizar que o reconhecimento do domínio privado sobre terra devoluta exigia, pela legislação estadual então aplicável (Lei estadual n. 3.442, de 12.12.1975), que o seu possuidor, assim considerado o ocupante que a beneficiou e continuasse a explorá-la, tornando-a produtiva pelo seu trabalho, comprovasse: a) posse mansa, pacífica e continuada há mais de quinze (15) anos, permitida, para esse fim, a soma do tempo dos antecessores; b) cultura e beneficiamento das terras; e c) inexistência de impedimento ou proibição à sua aquisição (art. 3º na sua redação original). Exemplo da possível configuração dessa situação é a propriedade outorgada pelo Estado da Bahia ao Réu Hermano Mendonça de Souza em 21.7.1978 (título n. 43.383, fls. 3.124, vol. IX), identificada pelo perito topográfico da causa como localizada dentro da reserva não homologada, no Município de Itajú do Colônia e com área de 198ha11a19ca (fls. 5.780, vol. XVIII), tendo o Réu juntado aos autos escritura pública de entrega de benfeitorias e quitação, de 29.12.1965, devidamente registrada no Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Itororó/BA, na qual figurava como outorgado e que tinha por objeto “cerca de 500 tarefas (...) encravadas numa área de terras arrendadas ao Posto Indígena ‘Caramurú’, sob a denominação de ‘Duas Barras’, situada no lugar ‘Ribeirão do Ouro’, do Município de Itajú do Colônia, desta comarca dantes pertencente a este Município, medindo 539 tarefas, conforme contratos números: 142 e 372, (...) devidamente registrados no cartório Imobiliário do 2º Ofício desta comarca, sob os números de ordem 3.126, 3.127, 3.128 e 3.129, os quais já acham-se transferidos para o nome do outorgado, na conformidade do termo de transferência assinado no dia 16 do mês em curso [dezembro de 1965], pelos outorgantes, pelo outorgado e pelo representante daquele posto...” (fls. 3.128-verso). A ausência de informações precisas sobre as circunstâncias pelas quais essas terras foram possuídas pelos vendedores-outorgantes antes 50 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 131 ACO 312 / BA de 1965 (se pela expulsão violenta dos autóctones ou pelo arrendamento efetivado pelo Serviço de Proteção aos Índios em virtude da desnecessária reserva daquela área para abrigar etnias oriundas de outras regiões) impede que se conclua, com a certeza imprescindível pela validade de um título de propriedade pela ausência de índios na mesma. 89. Por isso é que invocou o Ministro Relator, em seu voto, a circunstância de inexistirem títulos de domínio válidos no interior da área discutida, considerado o fato de terem sido emitidos posteriormente à Carta de 1967. 90. A declaração de nulidade dos títulos de propriedade inseridos na área da reserva (pedido desta ação) teria de ter sido precedida de análise individualizada da situação de cada qual. Afinal, estamos a discorrer sobre trezentos e sessenta e duas (362) propriedades identificadas pelo perito agronômico no interior da reserva não homologada, não obstante o perito topográfico tenha identificado cento e oitenta e seis (186) áreas. Entretanto, não houve possibilidade de se identificar, pelos elementos constantes dos autos, os limites das terras tradicionalmente ocupadas, distinguindo-as daquelas que seriam reservadas aos grupos indígenas sem vínculo imemorial com a área, para, a partir daí, concluir em que circunstâncias teria se dado a retração do espaço fundiário protegido pelas ordens constitucionais pretéritas relativamente aos índios. Demonstração disso é que a própria Funai requereu, em 1983, no curso portanto da presente ação, a desistência da ação quanto aos Réus Jener Pereira Rocha e sua mulher, proprietários do imóvel denominado ‘Fazenda São Lucas’, no qual estaria localizada a sede do antigo Posto Indígena Paraguaçu (na região conhecida como ‘Novo Mundo’), ao argumento de que a área não estaria situada na Reserva Indígena Caramuru-Paraguaçu (fls. 717, vol. III), apesar de a própria Funai ter 51 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 132 ACO 312 / BA “acompanhado a ‘reocupação’ daquela propriedade pelos índios em abril de 1982”. Esse pedido de desistência foi indeferido pelo Ministro Moreira Alves em 20.8.1984, em face dos termos das reconvenções dos Réus, nas quais requerido o reconhecimento da validade dos seus títulos de propriedade e a legitimidade de sua posse sobre as áreas discutidas, pelo que não seria injustificada a oposição ao pedido de desistência apresentado pela Funai(fls. 760, vol. III). 91. Tem-se, ainda, a informação da assistente antropológica da Funai de que em 1947 o Posto Indígena Paraguaçu não mais subsistia (fls. 4.324, vol. XIII), o que poderia conduzir à conclusão de inexistência da continuidade suficiente da posse tida por esbulhada, apta a caracterizar a persistência mantenedora da presença indígena na região conhecida como Novo Mundo (local onde está situada a ‘Fazenda São Lucas’) quando da outorga da Emenda Constitucional n. 1, de 1969. Nem há nos autos notícia de ocupação efetiva pelos índios, salvo em tempos imemoriais, na área situada à margem esquerda do Rio Pardo, na região sul da reserva não homologada, onde estaria localizado o Posto Indígena Ajuricaba, originariamente denominado ‘Posto Indígena do Rio Pardo’ (segundo se infere de cópia de mapa de 1930 juntado às fls. 4.345 dos autos), sendo certo que a ausência de qualquer informação sobre as atividades desenvolvidas pelo Serviço de Proteção aos Índios naquele posto indígena não permite conclusão definitiva da área como ‘terra permanentemente ocupada por silvícolas’. Mas também não há elementos nos autos em sentido contrário. 92. A região onde se localizava o Posto Indígena Caramuru, destinado ao recolhimento e à pacificação dos índios que ainda estavam nas matas e à criação de gado, apresenta, segundo os documentos constantes dos autos, indicadores mais firmes da posse indígena 52 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 133 ACO 312 / BA permanente no marco temporal de ocupação fixado para a presente ação. Assim é que, ao responder quesito sobre a localização dos cemitérios indígenas na área discutida, afirmou o perito antropológico em seu laudo oficial: “Sim, existem vestígios claros de cemitério na área do Posto Caramuru, segundo pudemos constatar na nossa visita ao local. (...) Tivemos informações acerca de outros cemitérios na área do Toucinho, Serra da Bananeira, Ourinho e área do Posto Paraguaçu, em nenhum destes locais foi possível fazer a localização dos enterramentos devido ao processo de ocupação dessas áreas com lavouras de cacau e pastos” (fls. 4.201). E ao apontar o local onde habitavam os índios mais velhos da região, afirmou o auxiliar do Juízo: “As zonas das ‘Bananeiras’ e das ‘Águas Vermelhas’ não estiveram habitadas por índios nos últimos vinte anos, tomando como base o ano de 1995, quando foram formulados os quesitos, e recuando até 1975, em função dessas zonas estarem ocupadas por arrendatários, com exceção da família já citada nas ‘Águas Vermelhas’. No ‘Panelão’, o índio Samado dos Santos está instalado com sua família há mais de 20 anos. Na área do Posto Caramuru, a índia Bahetá esteve habitando até o momento do seu falecimento no ano de 1996, apesar das inúmeras pressões que sofreu para deixar a área, aí também permaneceram algumas famílias” (fls. 4.217). Dos autos informações não constam informações precisas sobre em qual, dentre as propriedades questionadas nesta ação, residiriam essas famílias ou estaria situado o cemitério indígena referido. O que se tem é a indicação, em 1998, pelo perito agronômico da causa, de área de exploração de “de 17 ha da Comunidade Indígena Pataxós – Hã-hã-hãe na zona do Colônia, município de Itaju do Colônia” (...) “sem 53 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal ACO 312 / BA 134 expressão em termos de produção comparado com o pólo [das fazendas ocupadas pelos índios em 1997 e localizadas na região do Novo Mundo]” (fls. 4.782-83 e 4.850, vol. XIV). Também o perito topográfico identificou, na plotagem dos títulos impugnados realizada em 2003, área (de 188ha05a01ca) ocupada pelos índios Pataxó, cuja localização coincide, comparando-se os mapas juntados, com o local onde estaria situada a sede do Posto Indígena Caramuru (título n. 85-A). 93. É certo que, quanto a essa área, os documentos constantes dos autos não esclarecem ter estado sob a administração contínua dos órgãos ou entidades de defesa dos índios, pois tem-se, na petição inicial da ação, que aquela propriedade estava vinculada ao Réu Agnaldo Lima da Silva (fls. 26, vol. I). Embora o Estado da Bahia somente tenha outorgado título de propriedade sobre aquelas terras em 14.3.1983 (Título n. 57.337 - fls. 5.593, vol. XVII), tem-se que, ao menos desde 1965 (antes, portanto, do marco temporal de ocupação desta causa), o Réu Agnaldo Lima da Silva detinha posse sobre elas (‘Escritura Pública de Reconhecimento de Terra Indígena’, pela qual foi indenizado por benfeitorias consideradas de boafé). 94. A localização do antigo Posto Caramuru no interior dessa propriedade realça a plausibilidade da tese defendida pela Autora, ao menos quanto ao título relativo a essa área, o que impõe a declaração de nulidade do título de propriedade em nome do Réu Agnaldo Lima da Silva. Até mesmo porque o próprio Réu reconheceu na escritura pública de cessão de benfeitorias a condição de terra indígena sobre a propriedade que ocupava. 54 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 135 ACO 312 / BA Em efeito, consta daquele acordo extrajudicial o seguinte: “O imóvel cujas benfeitorias são ora indenizadas, vem a ser objeto da Ação Cível Originária n. ACO 312-1-BA, movida pela FUNAI contra EDIVALDO CABRAL VALENTIM, o Estado da Bahia e Outros, perante o Supremo Tribunal Federal-STF, visando a declaração de nulidade de títulos de propriedade concedidos a particulares, alcançando o não-índio ora indenizado, em fase de julgamento, o que não importa em obstáculo ou impedimento para o reconhecimento de domínio da União por sua parte e a percepção de indenização administrativamente. As reivindicações legítimas dos indígenas pela retomada da posse e do usufruto de suas terras tradicionais, se contrapondo fortemente à ocupação ou permanência ilegítima do não-índio, caracteriza situação de conflito ou de sua iminência, não comportando em se aguardar solução judicial definitiva e, por outro lado, exigindo a adoção de imediatas medidas pelo Poder Público, que elege a promoção da presente indenização para imediata desintrusão da terra indígena e superação de conflitos. A FUNAI ressalva que a sua deliberação pelo pagamento da indenização se dá pelo seu poder discricionário e conveniência administrativa, não reconhecendo, transferindo ou atraindo para si a obrigação indenizatória, direta, indiretamente ou implicitamente, que permanece originariamente como obrigação do Estado da Bahia, motivada pela emissão ilegal de títulos de propriedade em favor de particulares, se reservando esta Fundação ao direito de ressarcimento do valor da indenização junto àquele Estado-membro, oportunamente, administrativamente ou judicialmente; Que o Outorgante(s), por reconhecer que a referida propriedade está localizada em região de ocupação tradicional indígena, dentro, portanto, dos limites tradicionais da TERRA INDÍGENA CARAMURU/PARAGUASSU, por consequência reconhece também, a nulidade e a extinção dos efeitos jurídicos do mencionado ato de aquisição da propriedade e seu registro imobiliário respectivo, que teve por objeto o domínio, a ocupação e a posse das referidas Terras; Que reconhece, ainda, face ao consenso histórico sobre a Antiguidade de ocupação tradicional 55 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 136 ACO 312 / BA indígena e a situação atual, constante do processo FUNAI/BSB2822/84, o domínio exclusivo da citada terra como pertencente à UNIÃO FEDERAL, face ao estatuído no artigo 20, inciso XI, da Constituição Federal, razão pela qual decidiu em restituir definitivamente a posse direta e o usufruto exclusivo das riquezas naturais e de todas as suas utilidades em favor da Comunidade Indígena PATAXÓ HÃ-HÃ-HÃE, através da FUNAI, na forma dos mandamentos do artigo 231 e seus parágrafos da Constituição Federal e dispositivo pertinentes inserto na Lei n. 6.001, de 19.12.73 – Estatuto do Índio; Que nenhum direito assiste ao Outorgante(s) em pleitear qualquer quantia e a título algum, além da indenização pelas benfeitorias úteis e necessárias implantadas de boa fé na área...” (fls. 6.174). Os mesmos termos constam das centenas de documentos juntados aos autos pela União (do vol. XIX ao vol. XXV), “cópias das escrituras de reconhecimento de terra indígena, de domínio da União e de posse e usufruto indígena, e cópias dos recibos de quitação da indenização das benfeitorias realizadas pelos ocupantes não-índios” (fls. 6.136). 95. Poder-se-ia concluir que a análise da condição jurídicoconstitucional das terras abrangidas por esses títulos e registros estaria prejudicada, pois o Código de Processo Civil dispõe ter-se a resolução de mérito da ação quando o réu reconhecer a procedência do pedido ou quando as partes transigirem (art. 269, incs. II e III). Contudo, a ausência de manifestação do Estado da Bahia, que ingressou na causa na qualidade de litisconsorte passivo principal (fls. 66, 176 e 187, vol. I), impede se retirem desses acordos os efeitos pretendidos pela Funai e pela União. O caráter incindível do provimento jurisdicional postulado apresenta a configuração de um litisconsórcio passivo unitário na relação dos vários réus com o Estado da Bahia, motivo pelo qual o reconhecimento do pedido por alguns, sem a anuência do ente federado, 56 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 137 ACO 312 / BA é inócuo, não produzindo efeitos no processo (v. DINAMARCO, Cândido Rangel; Litisconsórcio, 4ª ed., Editora Malheiros, São Paulo, 1996, n. 48, p. 150), sob pena de a declaração unilateral do réu-litisconsorte servir para definir a situação dominial discutida entre a União e a Bahia. Pelo mesmo motivo, tampouco a intervenção desse ente federado como denunciado, conforme requerido, v.g., pelo Réu Fernandes Pecuária Ltda. – FERPEC na reconvenção apresentada (fls. 1.701 - 1.078), afastaria a necessidade da sua anuência para a solução. 96. Se os efeitos dos acordos celebrados por vários Réus com a Funai/União restringem-se à aceitação dos valores pagos a título de indenização pelas benfeitorias implantadas nas áreas discutidas, pela transferência da posse sobre as mesmas à Fundação Nacional do Índio, sem que isso importe, necessariamente, no reconhecimento da permanência e da tradicionalidade da ocupação indígena - questão de ordem pública que não admite transação, nos termos da Lei Civil de ontem e de hoje (art. 1.035, do Código Civil de 1916, e art. 841, do Código Civil de 2000: “Só quanto a direitos patrimoniais de caráter privado se permite a transação”), é certo que fortalece a tese da Autora no sentido de haver reconhecimento quanto à natureza das terras na área questionada e tida como indígena. Por essa razão é que a condição jurídico-constitucional de terra indígena sobre essas áreas pode autorizar o pleito dos Réus de indenização das terras que não tenham sido objeto de acordo. 97. Pelo exposto, voto conhecendo, em parte, da presente ação declaratória de nulidade, cujo objeto restrinjo aos títulos de propriedade e registros imobiliários referentes a imóveis localizados no interior da área demarcada em 1938 e comprovada nesta ação, e acompanhando o Relator na parte em que 57 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 138 ACO 312 / BA a) julga procedente a ação para reconhecer a condição jurídicoconstitucional de terra indígena sobre a totalidade da área objeto da demarcação feita no final da década de 1930 do século passado e comprovada nestes autos, totalizando 54 mil hectares correspondentes à Reserva Caramuru-Catarina-Paraguaçu, e declarar a nulidade de todos os títulos de propriedade cujas respectivas glebas estejam localizadas na área da Reserva; b) julga improcedentes as reconvenções relativas às áreas referentes a terras localizadas no interior da reserva demarcada em 1938 e que não tenham sido objeto de acordo entre os reconvintes e a Funai, isentando-os, contudo, do pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, ao contrário do Relator, em face da peculiar situação em que os mesmos se põem, decorrentes as suas condutas, incluídas as processuais, de práticas estatais, que lhes outorgaram títulos, em face da legislação vigente inválidos, mas que foram a causa de suas convicções de que estariam respaldados em sua aquisição de bens. É o voto. 58 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2454491. Supremo Tribunal Federal 139 02/05/2012 PLENÁRIO AÇÃO CÍVEL ORIGINÁRIA 312 BAHIA EXPLICAÇÃO A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Leio um aparte do voto do Ministro que ficou como conclusão no julgamento da questão de ordem. Tomar-se-iam os títulos dos réus, verificar-se-ia o perímetro total abrangido pelo conjunto desses títulos, por último, examinar-se-ia se tal perímetro seria terra indígena, para tanto, adotar-se-iam os critérios constitucionais. Efetivamente, a competência da demarcação é da União, o Tribunal não promoverá demarcação da terra, verificaria se o perímetro do conjunto dos títulos dos réus abrangeria, ou não, terra indígena demarcada, nada impede essa identificação judicial para os efeitos de uma decisão final. E afirmou sua Excelência: “Examinarei oportunamente a necessidade de atos de inspeção judicial e colheita de outras provas. Posteriormente, o Ministro Nelson Jobim determinou a realização da plotagem das áreas correspondentes aos títulos da planta de fls. tais, e do mapa juntado pela diretoria da Funai, denominada Terra Indígena CaramuruParaguassú, correspondente à área demarcada em 1938. Na elaboração desse trabalho técnico, o perito topográfico que foi designado observou: "Iniciamos o trabalho no município de Itaju de Colônia, indo em direção aos municípios de Pau-Brasil e Camacã, conforme a planta topográfica determina a área da reserva indígena. Ocorre que, no decorrer dos trabalhos, fomos surpreendidos por um número bastante considerável, cerca de aproximadamente duzentas áreas que estão totalmente fora da área em litígio, não só nos municípios de PauBrasil e Camacã, mas, e principalmente, no município de Canavieiras, tendo já identificado áreas a 140 km da área em litígio. Além dos municípios citados, existem áreas ainda a serem identificadas nos municípios de Itambé, Itapetinga, Santa Luzia, Maraú, Mascote e BelMonte, que estão, aproximadamente, a 150 km da área da reserva, e municípios como Ibotirama, Barra Alcobaça, que estão a mais de 500 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3446492. Supremo Tribunal Federal 140 ACO 312 / BA km, e municípios, como Vitória da Conquista e Brumado, a mais de 200 km da área. A inclusão dessas áreas nos tem causado grandes transtornos, não só quanto à identificação, mas também quanto à aceitação dos antigos proprietários, bem como dos atuais proprietários, que não compreendem como estão envolvidos em um processo de que nunca tiveram conhecimento, e por estarem tão longe da área em questão.' Os trabalhos de plotagem foram concluídos em setembro de 2003, certificando a existência de 247 áreas fora da chamada Reserva Indígena Caramuru-Catarina-Paraguassu, e 186 áreas dentro de seus limites." Como eu disse, são essas áreas, portanto, que eu estou considerando como dentro do objeto fixado inicialmente na petição inicial. E essa vai ser – eu explico de pronto aos Senhores Ministros – minha divergência com o Ministro Eros Grau, porque o Ministro julgou procedente a ação na sua inteireza quanto ao pedido inicial da petição inicial, que era de quase quatrocentos títulos, que o próprio perito designado pelo Supremo Tribunal afirma que não estavam na área que era a reserva demarcada. A área da reserva é de cinquenta e quatro mil hectares, que estão nesses títulos, portanto, nesses cento e oitenta e seis aqui. O Ministro Eros Grau considerou procedente a ação, então está nulo o que estava na área, objeto da demarcação e do litígio, e os que estão fora da área. Eu estou, quanto a esses fora da área, que não são o objeto do litígio, sobre os quais a autora nem teria interesse para ajuizar a ação, extinguindo o processo e, nesse ponto, divergindo. O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Mas ele julgou procedente a ação. Então, no final, nós vamos até chegar à mesma conclusão: cinquenta e quatro mil hectares. Apenas como ele julga procedente a ação e improcedentes todas as reconvenções – e algumas parecem que são de títulos fora da área –, estou circunscrevendo. 2 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3446492. Supremo Tribunal Federal ACO 312 / BA 141 O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Estou dizendo: a área demarcada, que o perito do Supremo entendeu que era de 54 mil hectares, é área indígena e os títulos nela são nulos. O que estiver fora desta área, portanto, e que a Funai indicou sem nem saber quais eram as áreas nem onde se situavam, porque o perito diz, como eu acabei de ler, que alguns estavam a duzentos e quarenta quilômetros da área, quanto a este e a tudo que não estiver nesta área, eu estou extinguindo o processo em julgamento, sem resolução de mérito, porque eu considero que a Funai nem teria interesse de agir. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - Fora do 54, fora desse perímetro. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Fora da reserva. Exatamente. A reserva foi identificada nesse sentido. E quando ele afirma, Ministro Celso, realmente está no voto dele, pareceu-me que havia títulos que estavam fora; ele até repete isso em algumas passagens. Mas ele julgou procedente. O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Se circunscrito à reserva. O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Pois é, então, por isso é que, no final, vou dizer: nós concordamos no ponto. O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. 3 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3446492. Supremo Tribunal Federal ACO 312 / BA 142 A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Eu só fiz a redução, tornei claro. O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Explicitei na parte, mas disse, exatamente, que estou acompanhando o Ministro Eros Grau no ponto. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - Há uma convergência. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Há uma convergência quanto ao reconhecimento da procedência. Eu apenas torno claro para que depois não venham dizer: "Mas esse título estava na petição inicial e não estava na reserva". Então, de uma vez, eu esclareço isso. Mas não há divergência realmente quanto ao conteúdo específico. Até porque a petição é clara: o que se quer restabelecer é a área de reserva demarcada. E nisso estamos de acordo. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) Podemos prosseguir quanto a isso? O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Não, foi ótima a intervenção do Ministro porque estamos de acordo com o Ministro Eros Grau, no ponto específico em que me ponho de acordo. Eu apenas deixei isto, de uma vez, claro: títulos fora, que estejam na petição inicial... O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - Não estão sendo objeto de análise nesse julgamento. 4 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3446492. Supremo Tribunal Federal 143 ACO 312 / BA A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Não estão sendo objeto de análise porque quanto a eles não conheço. O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Não haveria interesse de agir. Mas eu sei que há áreas assim, porque o perito indica isso, a dificuldade da perícia. ### 5 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3446492. Supremo Tribunal Federal 144 02/05/2012 PLENÁRIO AÇÃO CÍVEL ORIGINÁRIA 312 BAHIA ESCLARECIMENTO A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - E aí é que começa a maior parte do conflito, Senhor Presidente, porque, a partir de 60, com todos esses dados, com todos esses documentos, não se considerando a Bahia não ser a proprietária, e por causa da Constituição de 46, passou a expedir títulos, que são os apresentados pelos réus, que afirmam: "Mas eu tenho um título, e um título do Estado." Isso se acentuou na década de 70. Ou seja, já após a inclusão na Carta de 67, de que essas terras de índios eram da União, eram arroladas entre os bens da União. O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Sim. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - A titulação - há uma diferença, aí, interessante - é eliminação física da terra indígena. É diferente do genocídio, que é a eliminação física do próprio indígena. E do etnocídio, que é a eliminação da cultura, da mundividência indígena. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Aqui os índios nunca deixaram, Senhor Presidente, de estar na área. O que eles tiveram foi, no século XVII e XVIII, um número enorme e foram diminuindo. E a partir da década de 50 e 60, diminuíram a tal ponto que, em alguns documentos anexos, chega-se a dizer que os índios assistidos eram em número de trinta, depois em número de quatorze, mas não se tem o total. E eles dizem: "E havia os índios que erravam à cata de um lugar para se arranchar". Por isso o Ministro Eros Grau, quando julgou procedente, afirmou – Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3446493. Supremo Tribunal Federal 145 ACO 312 / BA e eu até faço várias citações do voto de Vossa Excelência – que, quando não há uma mestiçagem, não há uma integração do índio, mas eles são forçados a sair da área, querem o tempo todo voltar, e resistem, e nunca deixaram de ter ali o cemitério, que o nosso perito acentua, afirma a existência, as suas práticas, tudo isso. Diante de todo esse quadro, aqui, não se pode deixar de dizer que tem havido ausência deles em algum momento. Houve uma acentuada diminuição, e, só a partir da década de 80, é que, há de novo, o retorno deles, já de uma forma mais acentuada e com atuação da Funai. O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – A regência é da Constituição de 1967. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Do marco dado pelo Ministro Eros Grau.. O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – A Constituição previa a posse permanente. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Posse permanente. O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - Mas o regime dessa posse não é o da chamada posse civil. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Não. O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - Já que é fundamental. Não é o regime da posse civil A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Exatamente. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - É posse como instituto de direito constitucional. 2 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3446493. Supremo Tribunal Federal 146 ACO 312 / BA A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Constitucional. O fundamento é constitucional. O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – Qual seria a definição de posse? O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - Preservação da sobrevivência biológica e da identidade cultural do grupo indígena. O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – Qual seria a definição? O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - É, exatamente isso. O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – E onde estaria ela? O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - Os usos e costumes indígenas, segundo a mundividência deles, a concepção e prática de vida deles. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - A vontade que se impõe por força de uma titularidade que vem da condição. O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - É ato de disposição do Estado para preservação da raça. O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - Vinculada. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA – Exatamente. 3 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3446493. Supremo Tribunal Federal 147 ACO 312 / BA O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - Inalienável. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Inalienável. O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – Mas a ação visa a declaração de nulidade dos títulos, a partir de uma premissa segundo a qual a Carta de 1967 reconheceu aos indígenas o direito às áreas efetivamente ocupadas. Aí é que está o problema. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Bom, eu continuo, então, meu voto só para.... O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - Se Vossa Excelência permite. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Sim, há vários laudos. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) Quando se fala mundividência indígena... A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Tanto os laudos antropológicos quanto... O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - É preciso entender a realidade indígena, a cultura, a cosmovisão indígena. Eles têm a peculiaridade - embora parece um paradoxo semântico - de estar onde não estão. Ou seja, eles não estão nas áreas sagradas, por exemplo, senão em visitas. Eles não estão permanentemente. O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – Mas estariam em todo o Brasil, Excelência. 4 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3446493. Supremo Tribunal Federal 148 ACO 312 / BA O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - Não, há laudos antropológicos bem fundamentados que retratam esse tipo de mundividência, de usos e costumes que não correspondem aos nossos, correspondem aos deles. E o que a Constituição protege são os usos e costumes deles, dos indígenas, e não os nossos usos e costumes. O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – Posse permanente, a teor da Carta. O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - O que a Constituição de 1967 determinou? Garantiu a posse permanente. Não erigiu a posse factual, nos termos do regime da posse civil, em condição de posse. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - A permanência da posse. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) – Isso. O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - O que a Constituição preceituou é que essas terras são destinadas e garantidas para posse permanente. O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - Ainda que os indígenas já não estejam lá por conta de violência. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) Perfeito. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - E aqui não se pode dizer que, em algum momento, não tenham estado, porque eles podiam perambular. 5 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3446493. Supremo Tribunal Federal 149 ACO 312 / BA O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - Não, estiveram durante muito tempo. 6 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3446493. 150 02/05/2012 PLENÁRIO AÇÃO CÍVEL ORIGINÁRIA 312 BAHIA DEBATE O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - Senhor Presidente, eu ia até suscitá-lo aqui como indagação à eminente Ministra. A ação é dita declaratória - particularmente, acho que é desconstitutiva, ou constitutiva negativa, mas isso não importa -, e parece-me, e Vossa Excelência me corrigirá se eu estiver enganado, que a ação é puramente declaratória no sentido de pronunciar a nulidade dos títulos. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Dos títulos. O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - Há algum pedido cumulado de reintegração de posse, desocupação? Algum pedido? A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Não, não; é taxativo. O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO – Então é problema sério. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Nulidade dos títulos. O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - É, desconstitui o registro, tudo bem. Agora, nós temos um problema factual de desocupação do local, e isso tem de ser objeto de outra demanda, se não há pedido cumulado para esse fim. O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX - É, porque uma coisa é o pedido implícito; outra coisa é a condenação implícita que não é possível. Normalmente, os pedidos são cumulados. Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3253821. 151 ACO 312 / BA O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - Não é possível. Falar em execução de sentença meramente declaratória ou constitutiva negativa... A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Então, eu retiro, porque realmente é só declaratória, exclusivamente. O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - Noutras palavras, o que se poderia fazer aqui é apenas recomendar à União que tome as providências necessárias para a retomada e cuidar se é o caso ou não, de eventual indenização por benfeitorias feitas de boa-fé. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - Não há um pedido do que nós chamamos à época de extrusão ou desintrusão. Não há esse pedido. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Eu também chamo a atenção. É só de declaração, e mais, Ministro. Ótimo Vossa Excelência ter chamado a atenção, porque eu li e vou pedir vênia para reler o que constou do voto do Ministro Nelson Jobim naquela Questão de Ordem em 2002: "O Tribunal não promoveria a demarcação da TERRA. Verificaria se o perímetro do conjunto dos títulos dos RÉUS abrangeria, ou não, TERRA INDÍGENA não demarcada." Na verdade, demarcada, porém não homologada. "Nada impede essa identificação judicial para os efeitos de uma decisão final." Por quê? Porque essa decisão final será meramente declaratória e haverá o procedimento na Funai. Então, aqui, ela é declaratória mesmo, até pela possibilidade de indenização, como lembra Vossa Excelência, que eu acentuei aqui. A SENHORA MINISTRA ROSA WEBER - Senhor Presidente, eu 2 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3253821. 152 ACO 312 / BA só gostaria de colocar uma questão que me surgiu agora, ouvindo o voto da Ministra Cármen Lúcia, que estava propondo, num primeiro momento, um juízo de procedência parcial, ou, eventualmente, uma extinção do processo, sem resolução do mérito no que tange àqueles títulos relativos a imóveis rurais não inseridos na área objeto da demarcação, não homologada, aquela demarcação lá em 1938. O eminente Ministro Celso de Mello rememorou excerto do voto do Ministro Eros, Relator, onde ele diz que ele não reconhecia, não haveria como declarar a ineficácia de títulos que não diziam respeito à reserva indígena. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Ele considerou irrelevante. O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. A SENHORA MINISTRA ROSA WEBER - Ele não atribuía relevância. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Por isso é que eu fiz questão, Ministra, de chamar a atenção para que não ficasse parecendo que, julgando procedente, sem qualquer ressalva, estivesse declarando todos os títulos. A SENHORA MINISTRA ROSA WEBER - Comungo da preocupação de Vossa Excelência. A meu juízo, é procedência parcial, porque tivemos que fazer toda a instrução da ação para concluir que esses títulos não estão inseridos na área da reserva. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Mas aí a gente precisava pensar, porque, se a procedência for parcial, significa rejeição dos outros títulos. 3 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3253821. 153 ACO 312 / BA O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - Está rejeitando a nulidade dos demais títulos. O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Falta interesse de agir da Funai. Ela nem sabia que glebas eram. O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO – O que se tem de ver é se a autora pediu. Se ela pediu nulidade de todos os títulos das pessoas que foram citadas, algumas têm toda razão, porque seus títulos são válidos. A ação é improcedente em relação a eles, e, portanto, é procedência parcial. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - A Ministra Cármen não está afirmando a validade dos títulos. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - O Supremo Tribunal, na sua instrução, na perícia, no laudo antropológico, não cuidou desses outros títulos, nem de dizer que são válidos ou inválidos. O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - Eu sei, por isso mesmo não estão sendo anulados. Portanto, o pedido de anulação desses títulos é improcedente. Esses títulos não estão sendo anulados. O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX - O problema é que há também reconvenções. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - No processo demarcatório pode ser que a Funai resolva até mesmo demarcar uma área superior àquela de 38. O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX - O Ministro Eros Grau foi claro ao dispor o seguinte, parte dispositiva do voto dele: "Julgo procedente a ação para declarar a nulidade de 4 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3253821. 154 ACO 312 / BA todos os títulos de propriedade cujas respectivas glebas estejam localizadas dentro da área da Reserva Indígena CaramuruCatarina-Paraguaçu, todos eles." A minha preocupação é a seguinte: essa é uma sentença declaratória. Com o advento da reforma do Código, a sentença declaratória, qualquer que seja a obrigação de quantia, de fazer ou de entrega, ela é considerada título executivo judicial. Então essa decisão vai ter que passar por uma liquidação por artigos. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - A União vai ter de fazer agora o procedimento demarcatório. Nós só dissemos que esses títulos são nulos. Ela pode demarcar e homologar. O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - É ação para desocupação. Nós só estamos declarando que os títulos são nulos. Só. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - Eu acho que nós estamos decidindo o seguinte - anotei aqui enquanto a Ministra Cármen Lúcia lia: estamos dizendo que determinada área do território lá na Bahia é indígena. Essa área é indígena. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Essa área que foi demarcada em 1938 e agora comprovada pela instrução nestes autos. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - Isso. Então, primeiro, a terra é indígena, nesse perímetro que Vossa Excelência assinalou. Segundo, as propriedades tituladas que estiverem dentro dessa área são nulas, a titulação é nula. Melhor dizendo, nós estamos afirmando: determinada área do território é indígena; segundo, as propriedades tituladas, em parte, estão dentro dessa área indígena; terceiro, sobre esses títulos referentes a propriedades situadas na área indígena recai a direta declaração constitucional de nulidade. Parece-me que é isso. 5 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3253821. 155 ACO 312 / BA A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - É exatamente isso. O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - Exatamente. Agora, quanto às que estão fora, o pedido é improcedente, porque são válidos os títulos. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - Eu não diria válido; eu não conheceria. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Eu preferia não conhecer. O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - Pois é, aí que está o problema: incluiu glebas que não estão abrangidas pela reserva. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - E que o antropólogo designado pelo Supremo chegou a dizer que estava a 240 km da reserva. O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Eles pediram a nulidade... O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - Ainda que eu concordasse com a terminologia de carência, a procedência seria parcial. O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Que é a minha proposta. O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. 6 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3253821. 156 ACO 312 / BA O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) Também me parece isso. O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX - Apenas uma observação: eu verifiquei, aqui do relatório, que a Funai, quando promoveu a ação, citou uma série de pessoas; então, não foi reconhecido, em face dessas pessoas, o direito da Funai. E eu tenho severas dúvidas se isso é carência de ação, eu tenho a impressão de que, na verdade, não se reconheceu o direito material da Funai em relação a determinados proprietários. E aí, eles estariam fora, mas eles não estão fora porque eles eram parte ilegítima, não, porque, teoricamente, eles eram partes legítimas, porque a Funai, não sabendo a extensão da área, promoveu a ação contra todos. Então se a Funai dizer assim: Olha, você está invadindo. Se eles estão ou não invadindo, ele não é parte legitima. O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX - Não tenha dúvida, a lide pode até não ser temerária, mas eu acho que as partes, que não tiveram, contra si, o direito da Funai reconhecido, elas, teoricamente, resistiram legitimamente à pretensão da Funai. Elas têm o direito material delas. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - Não, mas nós não examinamos o mérito da validade desses títulos. O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - Perante a União sim, Ministro. Esses títulos podem ser nulos por outro motivo, não pela causa petendi deduzida da União, esses não são nulos. Então, nesse sentido, a ação é improcedente. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - É por isso que a procedência parcial me parece temerária, porque nós estaríamos afirmando a validade desses títulos. A SENHORA MINISTRA examinamos esses títulos. CÁRMEN LÚCIA - Nós nem 7 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3253821. 157 ACO 312 / BA O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Antes, porém, eu gostaria de esclarecer um dado, só um dado do voto do Relator... O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - Com perdão, mas, como fui eu que suscitei a questão, eu acho que a questão mais grave não é nem essa terminologia, a questão mais grave é que esta decisão carece de exequibilidade, é sentença sem necessidade de execução propriamente dita. O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO – Declaratória, ou melhor, desconstitutiva. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Mas o que eu chamo a atenção é o seguinte: o Ministro Eros Grau julgou procedente, integralmente a ação, mas desconsiderou, embora sem falar – por isso eu fiz questão de levantar a questão aqui –, ele, na verdade, afastou esses títulos, mas julgou inteiramente procedente a ação. É preciso que a gente esclareça isso na nossa decisão. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - Vossa Excelência esclareceu no seu judicioso voto. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - É, mas eu estou dizendo que é preciso saber como vamos concluir quanto ao voto do Ministro, porque em sua parte dispositivo ele é vencedor porque julgou procedente na parte que nós estamos acompanhando. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - A parte 8 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3253821. 158 ACO 312 / BA dispositiva do acórdão. O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - Mas é importante esclarecer, porque quem ficará como Relator, se forem acolhidos esses votos, será o Ministro Luiz Fux. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Exatamente por isso estou chamando a atenção. O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - É isto, e está muito claro. O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. 9 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3253821. Supremo Tribunal Federal 02/05/2012 159 PLENÁRIO AÇÃO CÍVEL ORIGINÁRIA 312 BAHIA DEBATE A SENHORA MINISTRA ROSA WEBER – Senhor Presidente, entendo que, na verdade, não se trata de uma ação declaratória, porque, se declaratória fosse, seria no sentido de declarar que aquela área era indígena. Aí sim, poderia entender, com todo respeito, que se trata de uma ação meramente declaratória. Mas, o que se objetiva – conforme disse o Ministro Cezar Peluso -, na verdade, é uma desconstituição de títulos. Eu leio: “A Fundação Nacional do Índio” - petição inicial, ação originária da competência do Supremo, então vamos julgar como ação originária - “requer a Vossa Excelência, com fulcro no artigo 44, inciso II, do Código de Processo Civil, declarar nulos os títulos de propriedade e registros imobiliários em nome de Jener Pereira Rocha e dos demais nomes de réus, ao final nomeados, e de outros que porventura possuírem idênticos títulos e registros de propriedade incidente sobre a área da Reserva Indígena Caramuru-Catarina Paraguasú, localizada no Sul do Estado da Bahia, nos municípios de Conquista, Itaimbé, Itapetininga, Canasvieira, Itabuna, Pau -Brasil e Itajú da Colônia.” E, ao final: “São réus na presente ação a serem citados por edital” - e aqui nós temos o nome de mais de duzentos. O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. A SENHORA MINISTRA ROSA WEBER - 396 réus. Senhor Presidente, por isso, com todo respeito, tenho dificuldades em julgar a ação totalmente procedente. Embora entendo - e tenha lido no voto do eminente Ministro Eros Grau - que ele compreende sem relevância, mas são réus. Com todo respeito, é uma questão processual. Tenho dificuldades com relação, pelo menos, àqueles réus cujos títulos dizem Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3188688. Supremo Tribunal Federal 160 ACO 312 / BA respeito a imóveis rurais situados fora da área de reserva. E a eminente Ministra Cármen Lúcia destacou que, na verdade, a Funai partiu do pressuposto de que as terras - objeto da demarcação - tinham 36 mil hectares, quando, na verdade, a perícia efetuada demonstrou que elas chegam a mais de 40. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - 54 mil hectares. A SENHORA MINISTRA ROSA WEBER - 54 mil hectares. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - 54.105. A SENHORA MINISTRA ROSA WEBER - Então, há reconvenções de proprietários de terras que estão fora desta área. Por outro lado, penso que dar procedência não seria o mais adequado, peço vênia aos que compreendem em sentido contrário. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Ficar parcialmente procedente. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - Vossa Excelência acha que a ação é desconstitutiva? A SENHORA MINISTRA ROSA WEBER - Entendo que não se declara a nulidade, se decreta a nulidade. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - É desconstitutiva, se decreta a nulidade. O SENHOR MINISTRO JOAQUIM BARBOSA - É, Senhor Presidente, é negativa. A SENHORA MINISTRA ROSA WEBER - É uma constitutiva negativa. 2 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3188688. Supremo Tribunal Federal ACO 312 / BA 161 O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - É, exatamente, desconstitutiva, sem dúvida nenhuma. A SENHORA MINISTRA ROSA WEBER – Desconstitutiva, negativa. O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX - Mas, nessa ação, ficou detectado o que era dentro, o que era fora? O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - Ficou, ficou claríssimo. Isto está claro. O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - O Supremo fez plotagem, fez tudo. O Supremo assumiu a instrução do processo. O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - Temos que julgar improcedente. O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Ela não sabia, tanto que, quando veio a perícia, ela pediu a continuidade da perícia para saber; o Plenário é que disse: "Não, o contrato com perito não era esse". 3 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3188688. Supremo Tribunal Federal ACO 312 / BA 162 O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - É como se alguém propusesse ação reivindicatória, baseada num título, e disputasse dois imóveis distintos: um, compreendido pelo título; e o outro, não. Seria julgada improcedente em relação àquele cujo título era autônomo e válido. O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - Por isso que eu preferia não avançar. O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - Em relação à gleba. O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX - Eu também acho. É isso que eu queria destacar com Vossa Excelência. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Haverá um procedimento, eu insisto, haverá um procedimento de demarcação e esses títulos podem estar em uma área que, como diz o Ministro Nelson Jobim... O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - Em outra área, outra ação. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) -Não vamos assentar a validade dos títulos. O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX - Se a finalidade é a pacificação e que a decisão seja a menos, digamos assim, lacunosa possível, a menos obscura, porque lá há um conflito, uma dúvida, a fórmula utilizada pelo Ministro Eros Grau é uma fórmula que deixa para o plano prático a demarcação do que está dentro, do que está fora. O que eu temo é alterar 4 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3188688. Supremo Tribunal Federal ACO 312 / BA 163 a parte dispositiva do Ministro Eros Grau e nós criarmos aí um estado de perplexidade. Então foi julgado procedente em parte, quem está dentro, quem está fora? O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - Não, mas continua o que ele disse. É só deixar o que ele disse. O que ele diz é claro. O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX - Eu acho que a fórmula que ele utilizou para evitar foi: Julgo procedente a ação para declarar a nulidade de todos os títulos de propriedade cujas respectivas glebas estejam localizadas na área. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) Pronto, eu votaria nisso, eu cingiria a isso. O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX - Eu acho que ele procurou evitar essas especulações, porque... O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX - Ele não diz de quem são essas glebas, porque foram citadas várias pessoas. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Não, mas isso está devidamente afirmado no laudos. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - Na proclamação do resultado, acho que devemos seguir a parte dispositiva do voto do Ministro Eros. O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. 5 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3188688. Supremo Tribunal Federal ACO 312 / BA 164 O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - Mas vamos colher. Eu tenho receio de que, no plano dos fatos, uma proclamação do resultado não muito clara ou meio dúbia leve, por exemplo, ao entendimento de que se índios estiverem eventualmente para além dos 54.105 hectares, eles passarão por um processo de expulsão à força. Eu não entraria nesse mérito. O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - Da decretação de nulidade. A decretação de nulidade ficará adstrita - não é isso? - à titulação... A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Aos títulos referentes às áreas na área demarcada. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - Como o Ministro Eros decidiu e a Ministra Cármen Lúcia confirmou. O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX - Isso não dá ensejo à perplexidade e, na prática, depois, na hora de demarcar... O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - Bem, Ministra Rosa Weber. A SENHORA MINISTRA ROSA WEBER - Senhor Presidente, fico com dificuldade em julgar improcedentes reconvenções que tenham sido ajuizadas justamente por aqueles proprietários cujos imóveis rurais estão fora. Como vou dizer que é improcedente? O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX - Veja o seguinte, Ministra Rosa, se me permite. Na verdade, a utilidade da reconvenção, no caso, seria não conheço o processo -, mas a utilidade deve ter sido para que esses 6 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3188688. Supremo Tribunal Federal 165 ACO 312 / BA proprietários formulassem algum outro pedido, porque, para pedir para não declarar a nulidade das suas glebas, basta a contestação. Essa reconvenção tem um pedido qualquer aí, não pode ser o pedido para não declarar a nulidade das … O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - Aí é que está o problema: alguma coisa temos que dizer em relação a eles. Se dissermos que não pode ser julgada procedente a reconvenção, e se também não podemos dispor que o pedido em relação a eles é improcedente, a situação deles fica incerta. Ou decidimos que em relação a eles o pedido é de improcedência, ou que em relação a eles as reconvenções são procedentes. O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX - Mas as reconvenções não foram para pedir para não declarar o título deles válido, não pode ter sido, porque isso basta a contestação. Para a reconvenção, tem que ter um outro pedido, conexo com o da defesa, com o título da defesa da ação, não sei o que é esse pedido. A SENHORA MINISTRA ROSA WEBER - Ministro Luiz Fux, só para fazer uma observação, para dar continuidade ao pensamento. Talvez não possamos declarar improcedentes as reconvenções por eles ajuizadas, mas talvez possamos extingui-las sem resolução do mérito, dar uma outra solução, porque dizer que elas são improcedentes é o que está sendo proposto. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Não. Isso que eu gostaria de esclarecer a Vossa Excelência. Eu julguei, acompanhando o Ministro Relator, procedente a ação para a declaração de nulidade dos títulos em relação às áreas que estejam na área demarcada. E julgo improcedentes as reconvenções relativas às terras localizadas no interior da área demarcada. Por que concluir assim? Porque a minha primeira proposta, e posso até reajustar, era de não conhecer a ação ou extinguir 7 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3188688. Supremo Tribunal Federal 166 ACO 312 / BA sem resolução, na parte que se referia a títulos que foram arrolados pela Funai, autora, na petição inicial, e que, na instrução do processo aqui no Supremo, ficou claro que estavam fora da área do litígio. Então, o julgamento da improcedência é só quanto a estas áreas que estavam localizadas dentro da área litigada. O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX - Estou vendo aqui num pedaço do relatório que isso é uma questão clara: para o réu pedir que não se acolha o pedido do autor basta a defesa. Isso é claro. Então, a reconvenção deve ter formulado um outro pedido, eu estou vendo aqui que houve um manejo, assim, um pouco irritual da reconvenção. O que eles pediram na reconvenção? Que sejam considerados válidos os seus títulos, e, consequentemente, a posse, e condenando-se, ainda, as autoras a indenizar-lhes perdas e danos. Então essa procedência parcial, ela vai implicar numa modificação completa do capítulo condenatório. O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Acho que talvez sim. O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - Pela improcedência, sim. O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX - Eu tenho dificuldade, Ministro Celso, de admitir que, porque a Funai não tem direitos sobre as duas frentes, eles foram sujeitos ao processo e tiveram que se defender, pela narrativa da petição inicial, eles eram considerados réus. Não havia carência, o que eu chego à conclusão é que a Funai não tem o direito de anular o título deles porque esses títulos não estão dentro da área. Por isso que, talvez, uma contenção nossa nessa divulgação do resultado seja o mais... Se a jurisdição visa à pacificação, eu acho que a solução mais pacificadora seja essa definição limitada, para depois deixar no plano prático que as coisas se... 8 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3188688. Supremo Tribunal Federal ACO 312 / BA 167 O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - Vamos recolher os votos. Pelo que entendi, Ministra Cármen, Vossa Excelência rejeitou a preliminar de impossibilidade jurídica, julgou procedente a ação, julgou improcedente as reconvenções e não conheceu da ação quanto aos títulos fora da área da reserva. A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA – Sim. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) Ministra Rosa Weber, como vota Vossa Excelência? 9 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3188688. Supremo Tribunal Federal 168 02/05/2012 PLENÁRIO AÇÃO CÍVEL ORIGINÁRIA 312 BAHIA VOTO A SENHORA MINISTRA ROSA WEBER - Senhor Presidente, com relação à questão de fundo propriamente dita, eu estou acompanhando, integralmente, o voto do eminente Relator e da Ministra Cármen Lúcia no que diz respeitos aos imóveis rurais situados dentro desta área de reserva indígena, demarcada em 1938. Porque, na minha leitura, e com todo respeito aos entendimentos em contrário, estava aqui até rememorando os termos da Constituição de 1967, aquela questão da posse permanente, e da Emenda Constitucional nº 1/69. E o que diz a Constituição de 1967, no art. 186 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias? O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - Artigo 186: “É assegurado aos silvícolas a posse permanente das terras que habitam e reconhecido o seu direito ao usufruto exclusivo dos recursos naturais e de todas as utilidades nelas existentes.” A SENHORA MINISTRA ROSA WEBER - Ou seja, na minha leitura, a posse não é condição e está garantida a eles, em função de toda a necessidade de preservação da identidade indígena, de toda principiologia constitucional no que tange às terras indígenas. Então, acompanho, integralmente, no sentido de reconhecer - e, aí, com carga declaratória - toda essa área demarcada como terra indígena, como reserva indígena. Entendo necessário decretar a nulidade dos títulos e registros desses imóveis rurais inseridos nesta área demarcada. Via de consequência, com todo respeito, julgo procedente a ação no que tange a todos os réus que tenham seus imóveis rurais, títulos e registros Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3188689. Supremo Tribunal Federal ACO 312 / BA 169 inseridos nessas terras. Mas, com relação aos réus expressamente nominados dentre aqueles quase quatrocentos, eu entendo que o pedido deduzido de decretação de nulidade dos títulos é improcedente, respeitosamente. Senhor Presidente, confesso que tenho alguma dificuldade com relação às reconvenções porque, conforme bem colocou o Ministro Luiz Fux, de fato, bastaria a defesa para que o réu obtivesse um juízo de improcedência, mas, o próprio Ministro Luiz Fux lembrou, a pretensão deduzida nas reconvenções vai além, envolve não só indenização, mas uma declaração de validade dos títulos. Então, de fato – eu não manuseei os autos – não seria o caso de pedir vista numa ação que hoje estamos julgando pelo periculum in mora. No aspecto, me parece, menor, o processo é instrumento de realização do direito material, é o que importa, e está sendo reconhecido aqui. Por óbvio, naquela colocação do Ministro Relator, naquele dispositivo do Ministro Relator, ficando, conforme Vossa Excelência, Senhor Presidente, também destacou, bem explicitado que a procedência é com relação àqueles inseridos na área demarcada, parece que se solucionaria. Senhor Presidente, é como voto. 2 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3188689. 170 02/05/2012 PLENÁRIO AÇÃO CÍVEL ORIGINÁRIA 312 BAHIA VOTO O SENHOR MINISTRO JOAQUIM BARBOSA - Presidente, com relação às glebas inseridas na área a ser demarcada, tal como constatado pelos laudos constantes do processo, eu julgo procedente a ação da Funai. Quanto às eventuais reconvenções, eu julgo-as improcedentes. Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 1968854. 171 02/05/2012 PLENÁRIO AÇÃO CÍVEL ORIGINÁRIA 312 BAHIA VOTO O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - Senhor Presidente, eu vou ser claro para que o senhor Secretário anote o meu voto: com a devida vênia dos votos já proferidos, julgo parcialmente procedente a ação, para pronunciar a nulidade de todos os títulos de propriedade cujas respectivas glebas estejam localizadas dentro da área da Reserva Indígena Caramuru-Catarina Paraguassu, todos eles; e, parcialmente procedente, porque julgo improcedente a ação em relação aos réus cujos títulos têm por objeto glebas situadas fora dessa reserva indígena. Em consequência, julgo carecedores das reconvenções os réus cujos títulos compreendem glebas situadas fora da área da reserva indígena, porque, para afirmação da validez dos seus títulos, perante a causa petendi, basta a improcedência da demanda, porque se declara que a Funai não tem direito de os anular. Em terceiro lugar, julgo, em consequência, improcedentes as demais reconvenções, isto é, daqueles cujos títulos são pronunciados como nulos. E, em consequência, condeno estes réus, cujos títulos são anulados, a pagar os honorários de 10% sobre o valor atualizado da causa, e compensados os honorários dos outros reconvintes, que decaíram da reconvenção. É como voto. Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 1990126. 172 02/05/2012 PLENÁRIO AÇÃO CÍVEL ORIGINÁRIA 312 BAHIA O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – Presidente, começo por fazer justiça ao relator, que já não está compondo este Plenário. O voto do Ministro Cezar Peluso coincide com o de Sua Excelência, e apenas constato que, na redação da parte dispositiva, faltou certo vocábulo – parcialmente – no que se consignou “julgo procedente a ação para declarar a nulidade de todos os títulos de propriedade, cujas respectivas glebas estejam localizadas dentro da área da Reserva Indígena Caramuru-Catarina Paraguassu”, todos eles. Sua Excelência o relator, Ministro Eros Grau, não acolheu o pedido abrangente da Funai. Sua Excelência não julgou procedente o pleito inicial quanto a títulos alusivos a áreas estranhas àquelas que teriam sido levantadas como de ocupação permanente dos indígenas. É preciso deixar isso muito claro, e atribuo mesmo a inexistência do vocábulo "parcialmente" a uma falha de digitação do próprio voto, porque não posso, ante a inteligência de Sua Excelência, o Ministro Eros Grau, vislumbrar adoção, no próprio voto proferido, de uma postura conflitante. Presidente, não estamos aqui a cuidar do resgate, considerada as violências perpetradas nas três Américas – do Sul, Central e do Norte – contra os indígenas, porque seria, até mesmo, impossível o retorno, pela ordem natural das coisas, ao estado anterior, quando os indígenas realmente ocupavam, com exclusividade, as áreas territoriais. Nesta ação, que é declaratória, mas não simplesmente declaratória, também constitutiva negativa, presente o pedido formulado, não se cogitou, até aqui, da segurança jurídica. Não houve uma palavra sequer sobre dois institutos: a decadência e a prescrição. Faço apenas essa observação no voto proferido. Não ocorreu, Presidente, demarcação prévia da área, tanto que o relator originário trouxe o processo em questão de ordem ao Plenário para definir-se a sequência ou não. O Plenário, sem discrepância de votos, admitiu a lide, em que pese à inexistência – deixemos bem claro – da Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2114702. 173 ACO 312 / BA demarcação. Tem-se o envolvimento de área de cinquenta e quatro mil hectares, bem inferior, por sinal, à área relativa ao episódio Raposa Serra do Sol. Presidente, começo explicitando a regência constitucional da matéria. E então colho dado do voto do próprio relator. A regência não é da Carta de 1988, decorre da Carta outorgada de 1967 – e tenho realmente essa Carta como outorgada pelo regime militar. Assentou Sua Excelência, com todas as letras: "21. A presente ação cível originária foi proposta sob a égide” – proteção, portanto – “da Constituição de 1967, com as alterações da EC nº 1/69. Este, pois, o parâmetro a ser utilizado para julgamento do pedido da FUNAI e da União, tomando-se do direito material da época em que proposta para que se possa aferir da nulidade, ou não, dos títulos de propriedade questionados." O que veio com a Constituição de 1967? Um preceito que quer queiramos, ou não – e não podemos atribuir aos vocábulos sentido que não lhes seja próprio –, revela: "Art. 186 É assegurada aos silvícolas a posse permanente das áreas que habitam". A Carta de 1988 aludiu a áreas que ocupam. Portanto, ambos os documentos básicos referem-se ao presente, não ao passado, muito menos ao passado remoto. Continuando a leitura do artigo 186: "(…) e reconhecido o seu direito ao usufruto exclusivo dos recursos naturais e de todas as utilidades nelas existentes." Extraio, como está inclusive no voto, a premissa do relator, o seguinte: 2 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2114702. 174 ACO 312 / BA "22. O texto do art. 198 da CB/67 refere à posse permanente do silvícola." Presidente, também colho do voto a premissa constante do item 31, que é a intermitência da presença dos índios na região e o abandono, até mesmo, da região. Isso está confirmado tendo em conta o que levantou o perito, antropólogo, no que confirmou a existência de algumas "diásporas dos índios". Sigo, Presidente, e vejo que consta mais que teria ocorrido – como ocorreu em relação a praticamente todo o Brasil – a expulsão dos índios. Deixou consignado o perito: “O período de maior êxodo dos índios circunscreve a um lapso de tempo que vai de 1936 a 1969, período portanto de administração do SPI – Serviço de Proteção ao Índio, extinto em 1967 e substituído pela FUNAI a partir deste ano. Nesses 33 anos, em que pese oscilações, os atos de violência e intimidação se multiplicaram e coagiram os índios a deixarem suas posses e migrarem para as cidades e vilas próximas, para Porto Seguro, onde vivem os Pataxós do extremo sul da Bahia, ou mesmo para outros Estados da Federação” [fl. 4.195 – vol. XIII]." Presidente, foi o apurado quanto a esse êxodo que se apontou ocorrido entre 1936 e 1969. Teria cessado, portanto, em 1969. A seguir, no item 36 do voto, Sua Excelência, que teve a oportunidade de examinar os elementos coligidos ao processo – confesso, não a tive, já que o tempo é escasso para cuidar dos processos sob minha relatoria –, deixou consignado: "36. A baixa demografia indígena na região em determinados momentos históricos, principalmente quando decorrente de esbulhos perpetrados pelo forasteiro, não consubstancia" – concluiu Sua Excelência algo que não endosso – "óbice ao reconhecimento do caráter permanente da posse dos 3 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2114702. 175 ACO 312 / BA silvícolas." Surge uma contradição ao princípio do terceiro excluído: ou uma coisa é ou não é. Ou bem se cogita de posse – e posse permanente –, na data em que entrou em vigor a Carta de 1967, ou se afasta essa posse, sob pena de potencializar-se, em muito, a ficção jurídica. Prossigo, ainda no voto de Sua Excelência, quando assevera que: "38. O perito afiançou, por fim, que a área discutida na inicial é adequada ao assentamento dos indígenas, não obstante as sensíveis alterações do ecossistema causadas pela sua ocupação desordenada” – indago: por quem? Pelos indígenas? Não. – “por estranhos." Qual é a importância do fato? Qual é o valor jurídico de se ter a área como adequada ao assentamento dos indígenas? É nenhum, para efeito de julgamento desta ação proposta, repito, a partir do previsto na Carta de 1967, que encerrou, em si, um fenômeno: a posse permanente, à época, da área pelos indígenas. No item 39, consignou Sua Excelência que a perícia antropológica comprovou que a área em litígio consubstancia terra indígena. O Brasil todo consubstanciou, quando da descoberta, terra indígena. Nem por isso podemos pensar na desocupação, para entregar-se o território nacional aos indígenas. Continuo ressaltando que, no item 44 do voto, é assentado: "44. Afirma que os principais impactos de ordem social decorrentes da declaração de nulidade dos títulos de propriedade" – diga-se: títulos outorgados por particulares? Não, títulos outorgados pelo Estado e registrados em cartório – "serão o desemprego e a perda das unidades produtivas familiares." – daqueles que estão lá a explorarem as terras, como, pelo menos assim se sentiam até o ajuizamento da ação, legítimos detentores dessas terras, observadas as formalidades legais, ou seja, títulos e matrículas constantes do registro de 4 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2114702. ACO 312 / BA 176 imóveis – "Alega, porém, que 'a minimização ou agravamento destes impactos dependerá logicamente da dinâmica imposta pelos novos ocupantes (...)" Quem seriam os novos ocupantes? A resposta é única e irrefutável: os indígenas, que não ocupavam, conforme levantado, essas áreas, em 1967. A seguir, versa-se, no item 50: "50. Os documentos relativos aos imóveis dos réus foram juntados aos autos (...) por determinação do Ministro NELSON JOBIM. Títulos de propriedade outorgados pelo Governo do Estado da Bahia" – e o Governo do Estado da Bahia não seria irresponsável a ponto de outorgar esses títulos se nas terras houvesse indígenas – "entre os anos de 1978 a 1984, nos Municípios de Itajú do Colônia, Pau Brasil e Camacan, às seguintes pessoas físicas:" Tem-se títulos, o período é de 78 a 84, outorgados em épocas diversas. A seguir, no item 51, versa outros trinta e dois documentos anexados aos autos pelo Estado da Bahia, e que estariam a consubstanciar: "(...) a outorga de domínio de terras na região e registros de propriedade em cartórios, bem como certificados de cadastramento de imóveis rurais no INCRA (...):" Ressalte-se a menção a esses títulos, a revelarem a transferência das áreas. Segue o voto de Sua Excelência apontando que nenhum desses outros títulos, desses trinta e dois títulos, estariam sendo impugnados nesta ação, ante a área que a Funai indicou como ocupada pelos indígenas. Seriam títulos, portanto, estranhos a essa mesma área. Isso está no item 52 do voto. Prossegue Sua Excelência aludindo a outros títulos. E não se teria, no 5 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2114702. ACO 312 / BA 177 tocante a essas outras áreas, sequer a relação daqueles que as deteriam, que poderiam ser réus nesta ação originária. No item 55, Sua Excelência se referiu a um precedente de Minas Gerais. E admito que, nesse precedente, o Tribunal avançou – e creio que, talvez, ainda não o integrasse, não sei de que data é, penso que está ligado à primeira passagem por aqui do Ministro Francisco Rezek, já que houve duas passagens pelo Tribunal. Simplesmente se proclamou, a meu ver, olvidando-se a regra da Carta que regeria a matéria: "Não podia o Estado, assim, dar as terras a terceiros e promover o registro disso já na segunda metade do século." Isso porque, na primeira metade, as terras teriam sido ocupadas pelos indígenas. E fez referência ao problema da propriedade das terras indígenas, realmente consideradas indígenas – e não acredito que o Estado implemente esbulho relativamente à União –, à propriedade e ao domínio pela União. O Ministro Eros Grau, relator, citou o mestre alagoano Pontes de Miranda, reproduzindo: "Basta a existência dos silvícolas na região para que se operem os efeitos do artigo 198 da Constituição de 1967, na redação da EC 1/69." Continuo aludindo ao fato de haver referência, nos itens 59 e 60 do voto, à situação jurídica notada em 1850, e também notada em 1926, quando editada a Lei do Estado da Bahia nº 1916, nesse último ano. Prossegue Sua Excelência e consigna que: "Na vigência da Carta de 67 as terras ocupadas pelos índios são bens da União (art. 4º, IV), sendo assegurada aos silvícolas a posse permanente." Ou seja, revelada, constatada a posse permanente, a ocupação há épocas pelos indígenas. Essa é a premissa de tê-la como bens da União. Falou-se muito em conflito. Por que se falou em conflito entre os silvícolas e aqueles que ocupam as terras? Porque estes últimos lá estão, lá estavam em 1967. Esses últimos lograram, e confiaram certamente no Estado, os títulos outorgados pelo próprio Estado. Vou adiante e chego ao que decidido por este Plenário. E fui relator no processo autuado sob essa nomenclatura, Recurso Extraordinário nº 219.987. Na oportunidade, foi essa óptica que prevaleceu, porque senão 6 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2114702. 178 ACO 312 / BA não teria redigido o acórdão, fiz ver: “Conclui-se, assim, que a regra definidora do domínio dos incisos I e XI do artigo 20 da Constituição de 1988, considerada a regência seqüencial da matéria sob o prisma constitucional, não alberga situações como a dos autos, em que, em tempos memoráveis, as terras foram ocupadas por indígenas. Conclusão diversa implicaria, por exemplo, asseverar que a totalidade do Rio de Janeiro" – e perderíamos, Ministro Luiz Fux, o nosso maravilhoso Rio de Janeiro – "consubstancia terras da União, o que seria um verdadeiro despropósito." Pronunciei-me – não fiquei isolado no Plenário, como penso que ficarei neste caso, porque era o sistema adotado à época, em que pesem às críticas do nosso mestre José Carlos Barbosa Moreira –, muito embora adentrando o tema de fundo, o mérito da controvérsia, no sentido do não conhecimento do extraordinário. Presidente, diante dessas premissas, para mim inafastáveis, diante da revelação de que, quando da Constituição de 1967, não havia o que requerido por essa Carta para reconhecer-se a posse indígena, ou seja, a existência de indígenas na área ocupada, não posso colocar em segundo plano os inúmeros títulos formalizados, revelando as partes da relação jurídica, que se mostrou harmônica com o arcabouço normativo, pelo Estado da Bahia com os particulares. Confiaram os particulares no Estado da Bahia e permaneceram na área, que não era ocupada por indígenas, e passaram, como estão até hoje fazendo, a explorar essas áreas. Peço vênia à maioria já formada – e creio que não vamos incidir no mesmo erro que incidimos quanto à Raposa Serra do Sol, em que tivemos execução do pronunciamento do Tribunal – para julgar improcedente o pedido formulado pela Funai na inicial desta ação, declarando prejudicadas as reconvenções. É como voto. 7 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 2114702. 179 02/05/2012 PLENÁRIO AÇÃO CÍVEL ORIGINÁRIA 312 BAHIA VOTO O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – Ministro, Vossa Excelência me permite? Mais uma vez terei que cometer uma indelicadeza com Vossa Excelência. É que tenho sessão, agora às 19h, no Tribunal Superior Eleitoral, com relatoria de casos que contam com advogados que não são de Brasília. O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – É a segunda vez em caso importantíssimo que tenho de me ausentar, o que, Presidente, confirma a necessidade, talvez, quem sabe, de algum dia observarmos horários. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - Sem dúvida. O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - Eu acho que em essência é o voto, também, da Ministra Weber, do Ministro Peluso, em essência, me parece que o voto é esse. O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - O mesmo enunciado do voto do Ministro Eros. Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3172409. 180 ACO 312 / BA O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - Carecedoras. O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - Eu acho que em essência também. O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX - Ela se orienta nesse sentido. Ela depois, aqui, falando comigo: esse não conhecimento deriva exatamente disso, quer dizer, na reconvenção, eles pedem a mesma coisa que pediram na defesa, sem necessidade, falta de interesse de agir. Não é? O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX - Acho que é o melhor resultado. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - Eu acho que é também. O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) Contemplado, não é, com os termos em que redigido o voto do Ministro... O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX - Eu tenho impressão de que, no final, todo mundo estava usando a mesma linguagem, não é? No final, acho que acabou o resultado ficando mais ou menos harmônico no sentido de julgar parcialmente procedente. 2 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3172409. 181 ACO 312 / BA O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX - Não atinge àqueles todos. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) Restringe-se, é. Isso. O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - Exatamente. O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - Isso, as reconvenções. O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. O SENHOR MINISTRO reconvenções, exatamente. CEZAR PELUSO - As demais O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - É, exatamente, sem que nossa decisão, esta nossa decisão, implique em juízo técnico, nem de validade, nem de invalidade - não é isto Ministro Cezar Peluso? - dos títulos que ficaram fora dessa área. O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. A SENHORA MINISTRA ROSA WEBER - Seria extinção sem resolução do mérito, se me permite. Seria extinção sem resolução do mérito, na esteira do voto, por carência da ação com relação aos proprietários das glebas que não se encontram nos limites da Reserva. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) -É, sem 3 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3172409. ACO 312 / BA 182 resolução do mérito quanto... Isso. Perfeito. O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - É uma outra questão. O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX - O problema da indenização é o seguinte: é que houve aqueles denominados pedidos pressupostos, cujo acolhimento do posterior depende do acolhimento do anterior. Como eles pediram alguma coisa que não precisava pedir na reconvenção, automaticamente o pedido ... O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - Acabou, ficou prejudicado. O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - Perfeito. Perfeito. 4 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3172409. Supremo Tribunal Federal 02/05/2012 183 PLENÁRIO AÇÃO CÍVEL ORIGINÁRIA 312 BAHIA VOTO O SENHOR MINISTRO AYRES BRITTO (PRESIDENTE) - Apenas vou dizer que também me manifesto na linha dos votos já proferidos, com a ressalva, com o devido respeito ao voto, do voto do Ministro Marco Aurélio. A Constituição de 1967, pelo seu artigo 185, como que antecipa o espírito tutelar e promocional da atual Constituição no que tange à questão indígena, quando diz no artigo 185. O Ministro Peluso retratou muito bem quando falou da semântica da posse, não no sentido ortodoxamente civil, mas no sentido heterodoxo de Direito Constitucional. Diz, aqui, o disposto no artigo: Art. 186. "É assegurada aos silvícolas a posse permanente" - e disse bem o Ministro César Peluso que não é uma posse preexistente, que tinha que ser permanente - "das terras que habitam e reconhecido seu direito ao usufruto exclusivo" - etc. A habitação, aqui, é uma semântica também própria que faz conciliar, ou até que faz sobrepor ao instituto da presença física, o instituto da resistência psicológica. Porque, muitas vezes, os índios não estão ali numa determinada área porque foram escorraçados, mas eles reagem, eles resistem, historicamente, e ficam nas cercanias da terra de que foram, pela violência, expulsos, atestando o seu ânimo de recuperação daquela terra, que não foi abandonada. Porque uma coisa é dizer: todas essas terras foram dos índios. E nós vamos devolver aos índios? Não, aquelas terras que os índios abandonaram, deixaram, espontaneamente, evidentemente que não tem mais a ver com essa proteção constitucional, mas ali onde a permanência do índio não se dá por efeito de um esbulho, de uma violência, de um ato de até muitas Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3101184. Supremo Tribunal Federal 184 ACO 312 / BA vezes de extermínio físico, aí não, o espírito da Constituição não é esse, o espírito da Constituição é ao mesmo tempo tutelar e promocional. Nós sabemos que o tutelar, o protetivo, significa impedir o minus, impedir a redução, o rebaixamento, o descenso. A norma promocional possibilita o plus, o ascenso, a evolução, a afirmação da personalidade e até da cidadania. A Constituição contém normas que são tanto protetivas como promocionais desses segmentos historicamente experimentadores ou padecentes de desvantagens, de humilhações, como o segmento das mulheres, dos negros, dos índios, dos deficientes físicos, dos homoafetivos e assim por diante. Eu também encontrei aqui, Ministro Peluso, ainda no voto de Vossa Excelência, a comprovação testemunhal, documental, por laudo pericial, por estudos antropológicos, de que a área questionada nesse limite dos 54.105 (cinquenta e quatro mil, cento e cinco) hectares, essa área é indígena. E sobre essa área indígena foram expedidos, ilicitamente, inconstitucionalmente, títulos de propriedade, títulos de domínio, são esses títulos que nós estamos aqui a anular. Pronto, me parece que isso resume a questão, no voto de Vossa Excelência, no da Ministra Rosa Weber e de todos os outros, com exceção do Ministro Marco Aurélio. O Ministro Luiz Fux não votou, propriamente, mas emprestou sua valiosíssima colaboração, no plano teórico, do equacionamento jurídico da causa. A questão indígena - eu já concluo - há de ser compreendida num contexto rigorosamente constitucional. A Constituição atual - disse bem o Ministro Celso de Mello - é tão preocupada com a questão indígena, que nem diz: fica assegurado aos índios ou é assegurada a posse ou é outorgado o direito. Não, a Constituição usou de uma linguagem única, não vi em nenhuma outra passagem da Constituição essa linguagem. O que disse a nossa Lei maior? "São reconhecidos aos índios", não são outorgados. A outorga de direitos obedece à lógica do doravante, daqui para a frente; a lógica do reconhecimento, "são reconhecidos", obedece a outro critério, é uma lógica do "desde sempre", quando se reconhece um direito a alguém, mais do que se outorgar, está se proclamando que 2 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3101184. Supremo Tribunal Federal ACO 312 / BA 185 aquele direito pré-existe à própria Constituição: são reconhecidos; isso é muito mais do que são outorgados aos índios. Aí vem sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, que é a mundividência indígena, tudo isso. E diz a Constituição, ainda, no § 2º do artigo 231: "Art. 231 (...) § 2º - As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a sua posse permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes." (...) § 4º - As terras de que trata este artigo são inalienáveis e indisponíveis, e os direitos sobre elas, imprescritíveis. E a Constituição arremata o seu discurso: "§ 6º - São nulos e extintos" - lembrou bem o Ministro Celso de Mello - "não produzindo efeitos jurídicos, os atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse das terras a que se refere este artigo ... “, É que, para o índio, volto a dizer, a terra não é um bem intra commercium, não é um objeto redutível à pecúnia e passível de transação, a terra para os índios é um totem horizontal, é um espírito protetor, é um ente, mantendo com ele, o índio, uma relação umbilical, porque ela carrega consigo, a terra indígena , essa noção de atemporalidade, porque nela, para o índio, estão presentes a ancestralidade, a coetaneidade e a posteridade. Quer dizer, é diferente, por isso que a Constituição proíbe a remoção dos índios de suas terras. Só admite a remoção em caráter excepcional por autorização do Congresso Nacional e por modo temporário, porque o índio tem, na sua terra, um vínculo que nós não conseguimos ter com o nosso patrimônio. O patrimônio nosso, uma casa, uma fazenda, uma conta bancaria, é material; para o índio, é muito mais do que material, é imaterial, é a alma dele que está ali. A terra é uma alma, é um princípio espiritual. Por isso que a semântica da ocupação e da habitação, são palavras referidas pela Constituição, é uma semântica diferenciada, porque é anímica, é psíquica, 3 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3101184. Supremo Tribunal Federal ACO 312 / BA 186 não é simplesmente física. Então, sem compreender essa mundividência indígena encampada pela Constituição, fica muito difícil interpretar os textos jurídicos. O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: CANCELADO. ### 4 Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 3101184. 187 PLENÁRIO EXTRATO DE ATA AÇÃO CÍVEL ORIGINÁRIA 312 PROCED. : BAHIA RELATOR : MIN. EROS GRAU REDATOR DO ACÓRDÃO : MIN. LUIZ FUX AUTOR(A/S)(ES) : FUNDAÇÃO NACIONAL DO ÍNDIO - FUNAI PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL FEDERAL LIT.ATIV.(A/S) : UNIÃO ADV.(A/S) : ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO ASSIST.(S) : COMUNIDADE INDÍGENA PATAXÓ Hà Hà HÃE ADV.(A/S) : PAULO MACHADO GUIMARÃES RÉU(É)(S) : ANANIAS MONTEIRO DA COSTA ADV.(A/S) : PEDRO AUGUSTO DE FREITAS GORDILHO RÉU(É)(S) : ALMIR PINTO CORREIA ADV.(A/S) : ALTAMIRANDO MARQUES RÉU(É)(S) : AGENOR DE SOUZA BARRETO ADV.(A/S) : WHILDE COSTA SOUZA RÉU(É)(S) : JOSINO PINTO CORREIA E OUTRO(A/S) ADV.(A/S) : PEDRO AUGUSTO DE FREITAS GORDILHO RÉU(É)(S) : MANOEL NASCIMENTO CARVALHO ADV.(A/S) : EDVALDO SANTIAGO LIT.PAS.(A/S) : ESTADO DA BAHIA PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DO ESTADO DA BAHIA RÉU(É)(S) : ANTÔNIO RODRIGUES FERREIRA E OUTROS ADV.(A/S) : PEDRO AUGUSTO DE FREITAS GORDILHO RÉU(É)(S) : ANTONIO CARLOS WENSE PINTO ADV.(A/S) : VINICIUS BRIGLIA PINTO RÉU(É)(S) : DIRVAN SILVEIRA FERNANDES E OUTROS ADV.(A/S) : MARCOS JOEL DOS SANTOS RÉU(É)(S) : GUY FERREIRA DE MELLO E OUTROS ADV.(A/S) : MARCELO MENDES S. PATRIOTA Decisão: Retirado de pauta. Presidência da Senhora Ministra Ellen Gracie, Vice-Presidente no exercício da Presidência. Plenário, 19.04.2006. Decisão: Preliminarmente, o Tribunal, por unanimidade, resolveu questão de ordem, proposta pelo Relator, no sentido de admitir na lide, na condição de assistente simples da autora, a Comunidade Indígena Pataxó Hã Hã Hãe, recebendo o processo no estado em que se encontra. Em seguida, após o voto do Senhor Ministro Eros Grau (Relator), rejeitando a preliminar de impossibilidade jurídica do pedido, julgando procedente a ação e improcedentes as reconvenções, pediu vista dos autos o Senhor Ministro Menezes Direito. Ausente, ocasionalmente, na segunda parte da sessão o Senhor Ministro Joaquim Barbosa. Falaram, pela autora, o Dr. Antônio Solmeirão, Procurador Federal representando Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp sob o número 3524044 188 a FUNAI; pela litisconsorte ativa, União, o Advogado-Geral da União, Ministro José Antônio Dias Toffoli; pela assistente da autora, Comunidade Indígena Pataxó Hã Hã Hãe, o Dr. Paulo Machado Guimarães; pelo litisdenunciado, Estado da Bahia, o Dr. Antônio José Telles de Vasconcellos, Procurador do Estado; pelos réus, Ananias Monteiro da Costa e outros, o Dr. José Guilherme Villela e, pelo Ministério Público Federal o Procurador-Geral da República, Dr. Antônio Fernando Barros e Silva de Souza. Ausentes, justificadamente, o Senhor Ministro Gilmar Mendes (Presidente) e a Senhora Ministra Ellen Gracie. Presidência do Senhor Ministro Cezar Peluso (Vice-Presidente). Plenário, 24.09.2008. Decisão: Preliminarmente, o Tribunal, por maioria, acolheu a questão de ordem suscitada pela Senhora Ministra Cármen Lúcia no sentido de dar continuidade, nesta assentada, ao julgamento da ACO 312, vencido o Senhor Ministro Marco Aurélio. Por unanimidade, o Tribunal rejeitou a preliminar de impossibilidade jurídica do pedido. Em seguida, o Tribunal, por maioria, julgou parcialmente procedente a ação para declarar a nulidade de todos os títulos de propriedade cujas respectivas glebas estejam localizadas dentro da área da Reserva Indígena Caramuru-Catarina-Paraguaçu, todos eles, e, em conseqüência, julgadas improcedentes as reconvenções dos titulares desses títulos anulados, carecedores de ação os demais reconvintes, condenados os réus cujos títulos foram anulados a pagarem honorários de 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa e compensados os honorários dos outros reconvintes que decaíram da reconvenção, vencido o Senhor Ministro Marco Aurélio, que julgava improcedente ação e prejudicados os pedidos de reconvenção. Votou o Presidente, Ministro Ayres Britto. Redigirá o acórdão o Senhor Ministro Luiz Fux. Impedido o Senhor Ministro Dias Toffoli. Ausentes, em viagem oficial, o Senhor Ministro Ricardo Lewandowski e, justificadamente, o Senhor Ministro Gilmar Mendes. Não votou o Senhor Ministro Luiz Fux por ter sucedido ao Ministro Eros Grau (Relator). Plenário, 02.05.2012. Presidência do Senhor Ministro Ayres Britto. Presentes à sessão os Senhores Ministros Celso de Mello, Marco Aurélio, Cezar Peluso, Joaquim Barbosa, Cármen Lúcia, Dias Toffoli, Luiz Fux e Rosa Weber. Procurador-Geral Santos. da República, Dr. Roberto Monteiro Gurgel p/ Luiz Tomimatsu Assessor-Chefe do Plenário Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp sob o número 3524044