A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO DO SISTEMA AGRÁRIO COLONIAL AO SISTEMA AGRÁRIO MODERNO: TRANSFORMAÇÕES SÓCIO ESPACIAIS NA AGRICULTURA FAMILIAR EM LAJEADO-RS FRANZ, JULIANA CRISTINA1 Resumo: Este estudo tem o objetivo de compreender a organização e reprodução do sistema agrário colonial, considerando os diversos elementos que conformaram o espaço da agricultura familiar ao longo do processo de colonização no sul do Brasil e as transformações sócio espaciais ocorridas a partir da introdução da modernização na agricultura, configurando o sistema agrário moderno. Toma-se como lócus de estudo o município de Lajeado – RS, a fim de averiguar as interações entre os dois sistemas na atual organização da agricultura familiar. Inicialmente, realizou-se um levantamento bibliográfico sobre a temática da colonização alemã e formação do sistema colonial e sobre a modernização no campo. Posteriormente, realizou-se um estudo de campo e identificou-se que o sistema da agricultura familiar, presente na escala local, apresenta elementos que representam as “continuidades” e outros que simbolizam as “rupturas”, caracterizando o que se denomina de sistema agrário híbrido. Palavras-chave: Agricultura familiar; Transformações sócio espaciais; Sistema agrário colonial; Sistema agrário moderno; Sistema agrário híbrido. Abstract: This study has the objective to comprehend the organization and reproduction of the colonial agrarian system, considering the various elements that shaped the space of family farming along the colonization process in southern Brazil and the socio spatial transformations that happened from the introduction of the modernization in agriculture, setting the modern agrarian system. We took as study locus the municipality of Lajeado, RS, Brazil, in order to ascertain the interactions between the two systems in the current organization of family farming. Initially, we performed a literature review on the issue of German colonization, the formation of the colonial system and the modernization in the field. Later, a field study was performed and we identified that the family farming system, present in the local scale, shows elements that represent the „continuities‟ and others that symbolize the „ruptures‟, characterizing what is called hybrid agrarian system. Keywords: Family farming; Socio spatial transformations; Colonial agrarian system; Modern agrarian system; Hybrid agrarian system. 1 – Introdução O presente trabalho tem o objetivo de compreender a organização e reprodução do sistema agrário colonial, considerando os diversos elementos que conformaram o espaço da agricultura familiar ao longo do processo de imigração e colonização no sul do Brasil, e as transformações sócio espaciais ocorridas a partir da introdução da modernização na agricultura, as quais configuram o sistema agrário moderno. 1 Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal de Pelotas. E-mail de contato: [email protected] 2686 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO 2 – Desenvolvimento O processo de colonização alemã no Rio Grande do Sul teve entre os principais fatores o interesse do governo imperial e provincial no povoamento das áreas meridionais, garantindo assim a posse do território ao sul do Brasil, que era constantemente ameaçado pelos espanhóis. Os imigrantes alemães desembarcaram vindos da Europa, ao longo de diversos períodos. Os primeiros chegaram em 1824 no Vale do Rio dos Sinos, quando ainda não se tinha uma legislação especifica para a imigração (ROCHE, 1969). Em relação ao interesse sobre a colonização no Sul, Seyferth (1990, p.18) expõe que “o interesse pela diversificação da agricultura estimula o povoamento com base na venda de lotes coloniais”. Roche (1969, p.3), ao estudar a colonização alemã no Rio Grande Sul, traz uma nota sobre o emprego do termo colonização que se refere a subordinação do imigrante à colonização, “no caso da colonização alemã entende-se como a exploração de uma região sob a direção do governo brasileiro com a mão de obra originária da Alemanha.” Os imigrantes alemães que se estabeleceram na Província do Rio Grande do Sul, no século XIX, localizaram-se nas áreas de florestas entre o litoral e o planalto, acompanhando os vales dos principais rios, como por exemplo, Sinos, Jacuí, Taquari e Caí, muitas vezes, desde o curso inferior até as nascentes, ficando distante geograficamente das grandes propriedades de luso-brasileiros que criavam gado. Os imigrantes, em sua maioria agricultores, foram instalando nestas regiões de colonização alemã as pequenas propriedades familiares de caráter policultor. Ainda, pelo fato de estarem relativamente isolados em relação às cidades passaram a desenvolver uma rede de comércio em escala local. Em busca de caracterizar as regiões de colonização alemã, Seyferth (1974) descreve: As regiões colonizadas por alemães se caracterizaram principalmente pelo regime de pequenas propriedades policultoras e pelo fato de permanecerem relativamente isoladas, gozando de uma certa autonomia e realizando um comércio em pequena escala, não especializado [...] ( SEYFERTH, 1974, p.29). 2687 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO Seyferth (1990) ainda ressalta que as características principais do sistema de colonização até o final do século XIX foram o isolamento e a homogeneidade étnica das colônias, e só mais tarde são registradas a presença de outras nacionalidades. A formação do sistema agrário colonial, segundo Mertz (2004, p.282), é resultado do projeto de colonização idealizado pela Coroa brasileira e tinha por “objetivo a introdução de trabalhadores livres e brancos com a criação de um espaço de pequenos proprietários de terra no Brasil [...] se constituía em uma alternativa à grande propriedade”. A pequena propriedade representa a unidade básica de produção e consumo no sistema colonial, sendo uma marca fundamental do campesinato. Seu caráter policultor, com base no trabalho familiar, constituem elementos fundamentais para compreender as estratégias de reprodução social e territorial da agricultura familiar até os dias atuais. Além disso, a presença de práticas culturais como a ajuda mútua, também é fundamental para compreender o significado da existência de um “ethos camponês2” (SEYFERTH, 1990). No sistema agrário colonial a venda (ou troca) do excedente agrícola era destinada, principalmente, para o comércio local, para as chamadas “vendas rurais”, que compravam os produtos da colônia e os revendiam em Porto Alegre (capital do estado do Rio Grande do Sul). Em contrapartida, esses estabelecimentos comerciais vendiam os produtos manufaturados, como tecidos e produtos alimentares que não eram produzidos nas colônias, como o sal, açúcar, café, entre outros, os quais eram trazidos da capital. (SCHNEIDER, 1996) Assim, tomando como referência os estudos de Mertz (2004) e Gazolla (2004) busca-se compreender e caracterizar a continuidade do sistema da agricultura colonial e as mudanças introduzidas pelo sistema moderno da agricultura. Buscando identificar tanto as formas de produzir e trabalhar dos agricultores, quanto às relações de sociabilidade e traços culturais, os quais representam as heranças agrárias, e os novos elementos que configuram a organização atual do espaço da agricultura familiar. 2 Esse ethos tem como base a colônia (lote) como um microcosmo, que na medida do possível busca ser o mais autossuficiente possível. A ajuda mútua é uma característica fundamental do ethos camponês. (SEYFERTH, 1990) 2688 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO Mertz (2004) discute o processo de ocupação agrícola no Rio Grande do Sul, tomando por base a teoria dos sistemas agrários, onde os agricultores imigrantes denominados de “colonos3” e seus descendentes desenvolveram um sistema agrário que foi mantido na agricultura do Estado por um período não inferior a 150 anos. A autora toma como referência a produção agrícola colonial que era constituída da fusão dos conhecimentos agrícolas oriundos da Europa, com os conhecimentos e práticas agrícolas da agricultura local dos “caboclos” (fruto da mestiçagem entre o branco e o índio). Seyferth (1990) expõe que o resultado mais significativo da colonização alemã está atrelado ao fato de terem formado uma sociedade rural brasileira diferente da tradicional, na qual não havia lugar para o pequeno proprietário. Enfatiza que, a partir da introdução dos colonos imigrantes nos estados sulinos ocorreu a formação e a consolidação de uma sociedade camponesa: [...] cuja base fundiária é a pequena propriedade policultora trabalhada pela família do proprietário; camponeses que mantêm um estilo de vida próprio, um modo de produção específico, apesar das transformações ocorridas desde o século passado e das pressões do capitalismo. (SEYFERTH, 1990, p.21) Entretanto, desde o início os camponeses estão submetidos às leis de mercado, pois dependem de atividades externas à comunidade. Mas, por mais que o camponês possa se (semi)especializar na produção para o mercado, ele não vai deixar de produzir para o seu consumo produtos variados, não se tornando um monocultor. (SEYFERTH, 1990) Já Müller (1989) realizou um estudo sobre a relação da agricultura com a indústria no Brasil a partir de um viés histórico, indicando as relações entre ambas primeiramente, pelo comércio e comunicações e, posteriormente, pela inserção de tecnologias no campo. Nesse sentido, identificou a formação e consolidação dos complexos agroindustriais – CAI‟S- no cenário produtivo do país. A modernização da O termo colono tem sua origem na administração colonial: “para o Estado, eram colonos todos aqueles que recebiam um lote de terras em áreas destinadas à colonização” (SEYFERTH, 1992, p. 80). Para esta autora (1992, p. 80), “colono é a categoria designativa do camponês... e sua marca registrada é a posse de uma colônia... a pequena propriedade familiar”. Assim, no sul do Brasil, reconhecem-se e são conhecidos como colonos os agricultores descendentes de imigrantes europeus não portugueses que vivem e trabalham na terra em unidade de produção familiar. 3 2689 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO economia esteve associada à expansão urbano-industrial – com a criação do complexo agroindustrial (PÊSSOA, 2007). Medeiros (2007) expõe que as unidades de produção familiar buscam se reproduzir tanto socialmente quanto economicamente, organizando e realizando a produção através da força de trabalho familiar. Entretanto, a modernização transforma, em alguma medida, o sistema agrário colonial, porém, sem romper definitivamente com esse passado, mantendo atualmente características multidimensionais na sua organização espacial. Para entender este processo, Wanderley (2009) defende a necessidade de reconhecer “as rupturas e as continuidades” presentes na agricultura familiar contemporânea. A centralidade da família é o fundamento das continuidades, considerando que são as decisões do grupo familiar que definem as estratégias de produção e reprodução do modo de vida. Este último, ancorado na transmissão do ofício de agricultor ao longo das gerações. Por outro lado, ao sofrer os efeitos do processo da modernização, a agricultura familiar passa por significativas mudanças, desde a diminuição de sua autonomia em relação ao mercado, até o retraimento do círculo da família absorvida pelo processo produtivo, e, principalmente, a alteração da base técnica tradicional. Mas, mesmo diante das mudanças provocadas pelo processo de modernização, o agricultor familiar busca se adaptar as diversas circunstâncias, aliando elementos do sistema colonial com elementos do sistema moderno da agricultura, dando continuidade a sua reprodução no contexto atual. Em relação à industrialização do campo no Brasil, Müller (1981, p.2) afirma que, “nem toda a agricultura brasileira mudou sua base técnico-econômica e nem toda a agricultura que se modernizou o fez por completo”. O processo de expansão da agricultura moderna não foi homogêneo no Brasil. O processo foi seletivo – beneficiou produtos, regiões, produtores e algumas fases do processo produtivo. Assim, acentuaram-se as disparidades regionais, aumentou a concentração fundiária, acelerou o êxodo rural e transformou as relações de trabalho nas áreas rurais. O meio técnico-científico-informacional não se impõe igualmente sobre o território, pois, ao (re)organizar as formas de produção e consumo, acaba por criar novas desigualdades. (PÊSSOA, 2007) 2690 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO Na realidade brasileira é nítido que a modernização da agricultura gerou um crescimento significativo da produção agrícola, mas este aumento não resultou em condição para o bem-estar da população, pois os benefícios desse processo atingiram a sociedade e, particularmente os agricultores, de forma desigual. A implantação e difusão do modelo de modernização no Brasil ocorreu por intermédio da formação dos complexos agroindustriais, e isso gerou uma seleção dos agricultores em condições de adotar o pacote tecnológico e adequar sua produção a indústria, e a exclusão de muitos outros. Este modelo também vem transformando as unidades de produção familiar, principalmente a partir dos anos 1990, quando as agroindústrias se voltaram para a exportação. (MEDEIROS, 2007) A modernização da agricultura acarreta na substituição da agricultura tradicional pela agricultura baseada nas inovações mecânicas, químicas e biológicas, porém, também gera um endividamento por parte dos agricultores que passam a investir mais para produzir e, consequentemente, a perda da autonomia sobre a gestão do trabalho e da produção. Ainda, cabe lembrar os impactos negativos sobre as riquezas naturais (contaminação das águas e do solo, desmatamento, entre outros). (PORTO-GONÇALVES, 2006) 3 – Metodologia No intuito de conciliar os estudos das dinâmicas espaciais com os aspectos temporais, dimensão tempo-espaço, neste trabalho adota-se a concepção analíticometodológica dos sistemas agrários. Mazoyer e Roudart (2009, p.19) afirmam que: “Essa concepção, oriunda da ciência geográfica, considera o sistema agrário como sendo um objeto de análise e observação que é o produto das relações, em dado momento e em dado território, de uma sociedade rural com seu meio”. Inicialmente, realizou-se um levantamento bibliográfico sobre a temática da imigração e colonização alemã, sobre a formação do sistema colonial e sobre a modernização no campo. Essa revisão teórica é fundamental para subsidiar o estudo no município de Lajeado - RS, a fim de averiguar as interações entre os dois sistemas na atual organização da agricultura familiar na escala local. A escolha deste município como recorte espacial deve-se ao fato de este ser considerado uma área de colonização alemã antiga (ROCHE, 1969) e, ao mesmo 2691 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO tempo, por ter absorvido consideravelmente os indicadores da modernização da agricultura. Considera-se neste estudo o estabelecimento agrícola familiar como um sistema básico de análise, entretanto, diverso e dotado de relações/interações, endógenas e exógenas, onde o produtor, sua unidade de produção e sua família constituem as partes centrais da investigação. 4 – Resultados Parciais A colônia de Lajeado foi fundada no ano de 1853, por iniciativa de particulares, mas incentivada pelo interesse do governo provincial em fazer ocupar as áreas devolutas com a instalação de pequenas propriedades (ROCHE, 1969). Já o município de Lajeado (Figura 1) teve sua origem quando se desmembrou do município de Estrela no ano de 1891, pelo ato estadual nº 57, ficando localizado à margem direita do Rio Taquari. (IBGE, 2015) Figura 1: Mapa de Localização do Município de Lajeado no Rio Grande do Sul e no Brasil. Fonte: Do Autor, 2014. 2692 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO Na sua origem, Lajeado se configurava como um município eminentemente rural, com predominância das atividades relacionadas à agricultura familiar. A população era majoritariamente de descendentes da imigração alemã, os quais imprimiram na paisagem agrária local a característica de pequenas propriedades policultoras de caráter familiar. As heranças agrárias ainda são preservadas e reproduzidas até hoje, como o uso do dialeto da língua alemã, os hábitos alimentares e os saberes e práticas sobre os sistemas agrícolas (o “plantar e colher”), entre outros, conformando o modo de vida rural neste espaço. Segundo os dados apresentados pelo IBGE (2010), com base no Censo Demográfico, é possível verificar que de 1970 até o ano de 2010 o município de Lajeado apresentou uma significativa redução na população considerada rural. Enquanto que, em 1970, 68,34% da população municipal era considerada rural, nos dias atuais apenas 0,37% da população é considerada rural, tendo 99,63% dos habitantes classificados como população urbana. Lajeado apresenta esta peculiaridade por ser um município predominantemente urbano, e a grande maioria das propriedades rurais estão localizadas no perímetro considerado normativamente como urbano pela legislação municipal. Estas propriedades dividem e, por vezes, cedem espaço para a infraestrutura urbana que vem se instalando nas proximidades das propriedades rurais (Prefeitura Municipal de Lajeado, 2012). Os imigrantes alemães deram origem ao sistema agrário colonial que tomou como modelo a pequena propriedade familiar não escravista, onde aliavam as atividades agrícolas com o artesanato rural, nas quais reproduziram o “ethos camponês”. Neste sentido, destaca-se a produção agrícola diversificada, principalmente para o autoconsumo e, com a comercialização dos excedentes com mercados locais e regionais. O trabalho, eminentemente familiar, muitas vezes era organizado com a ajuda de vizinhos e parentes, constituindo relações de sociabilidade e de ajuda mútua entre os colonos. A organização do sistema agrário colonial combinou a utilização de práticas de trabalho e técnicas de cultivo do solo já usadas pelos índios e caboclos, com a noção de propriedade privada trazida da Europa e a utilização da terra de forma 2693 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO mais intensiva, baseada na divisão interna do trabalho familiar, própria da economia camponesa. A partir da década de 1950 e 1960, o sistema colonial da agricultura familiar passou a sofrer inúmeras mudanças com a inserção da modernização agrícola e pela intensificação das relações campo-cidade, reduzindo a necessidade de mão de obra no campo e aumentando a produção destinada ao mercado urbano-industrial. A proximidade com o urbano e a disseminação dos meios de comunicação de massa difundiram novas necessidades de consumo, ditas socialmente determinadas e, a relação mais intensa da agricultura com a indústria passou marcar as relações dos agricultores com o mercado. E, por fim, com a difusão e adoção das tecnologias modernas e o fornecimento de matérias primas agrícolas para as indústrias forma-se o chamado complexo agroindustrial- CAI. Entretanto, mesmo com o avanço do processo de modernização, o colono/agricultor familiar busca se adaptar as diversas circunstâncias, aliando elementos do sistema colonial com elementos do sistema moderno da agricultura, dando continuidade a sua reprodução no contexto atual. Por intermédio da revisão bibliográfica realizada ao longo do trabalho, confrontada com aos dados da pesquisa de campo, percebe-se a continuidade da reprodução da agricultura familiar na área de colonização alemã antiga no Rio Grande do Sul, mais especificamente no município de Lajeado-RS, sendo perceptível tanto a presença das permanências quanto das rupturas com o sistema agrário colonial, conforme quadro 1. 2694 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO CONTINUIDADES Pequena propriedade Policultura Mão de obra familiar essencialmente em atividades agrícolas - famílias monoativas Divisão interna do trabalho realizada em relação à posição de cada indivíduo na família Socialização dos filhos no trabalho desde a infância e envolvimento com o trabalho até a velhice Artesanato (pequena Indústria familiar) atrelado à agricultura Ethos camponês – laços de parentesco e de vizinhança – ajuda mútua Hábitos alimentares – batata-inglesa, conservas, embutidos e doces caseiros(schmier,) Uso do dialeto derivado da língua alemã, religiosidade, festas coloniais RUPTURAS Propriedades integradas ao CAI Semi-especialização para o mercado Combinação de trabalho agrícola e não agrícola - famílias pluriativas Escolaridade maior das crianças e adolescentes- busca por outras ocupações de trabalho Necessidades urbanas criadas com a difusão dos meios de comunicação Agroindústrias familiares Proximidade com o urbano e estabelecimento de relações campocidade Hábitos Alimentares locais – a inserção do aipim, da cana de açúcar e do milho na dieta alimentar Identidade cultural híbrida Quadro 1: Continuidades e Rupturas no Sistema da Agricultura Familiar no Município de Lajeado - RS Fonte: Do autor, 2014. Percebem-se os elementos que representam as continuidades e os que simbolizam as rupturas no contexto da agricultura familiar, a simbiose destes na realidade atual na área de colonização antiga, conforma um sistema da agricultura que abrange as características tanto do sistema colonial quanto do sistema moderno. Esse sistema agrário atual denomina-se de híbrido, justamente por combinar características de ambos os sistemas. 5 – Conclusões As famílias agricultoras de Lajeado na busca por sua reprodução social e econômica organizam o trabalho e produzem tanto para o autoconsumo quanto para o mercado, assimilando os elementos da modernização agrícola, entretanto, sem romper completamente com o seu passado colonial. Cabe destacar, que embora a presença da pluriatividade seja registrada desde a instalação das colônias no século XIX, ocorreu, sem dúvida uma expansão 2695 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO na combinação de formas de ocupação da mão de obra familiar na agricultura e fora dela. Assim, esta alternativa é muito comum entre os agricultores familiares, ou seja, a associação de atividades agrícolas com atividades não agrícolas, dentro ou fora do estabelecimento agrícola, por um ou mais membros da família, porém, estes continuam mantendo a sua identidade social e cultural de colono-agricultor. 6 – Referências Bibliográficas GAZOLLA, Marcio. Agricultura Familiar, Segurança Alimentar e Políticas Públicas: Uma análise a partir da produção para auto-consumo no território do Alto Uruguai/RS. 287f. Dissertação de Mestrado. Porto Alegre: UFRGS, 2004. IBGE - INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Lajeado – Histórico. 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