Simulador de casos clínicos como ferramenta de apoio ao ensino médico Juliano Gaspar, Regina Aguiar, Patrícia Teixeira, Eura Lage, Zilma Reis Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais Resumo 1 Introdução: Mudanças significativas no cenário do cuidado em saúde e no perfil pretendido para o futuro médico são irreversíveis e impactam sobremaneira o ensino médico. Neste contexto, os ambientes de simulação em ambientes virtuais, simulam desafios da prática clínica e consideram que as experiências pessoais representam uma importante ferramenta para estimular o aluno. O objetivo é desenvolver um ambiente virtual para Simulação de Casos Clínicos, baseados em casos reais, de complexidade e nível de atenção variáveis, assim como verificar sua eficácia como instrumento de apoio na aquisição de habilidades clínicas em estudantes de medicina. Metodologia: Trata-se de estudo experimental de tecnologia aplicada ao ensino médico. A eficácia da aprendizagem ou aquisição de habilidades será avaliada por comparação de desempenho em testes pré e pós utilização do Simulador de Casos Clínicos. Os testes, preparados pelos professores envolvidos, serão disponibilizados no próprio sistema. Resultados Esperados: Em fase de protótipo, já pode-se documentar casos clínicos reais, de interesse, além do desenvolvimento de sessões de desafio clínico no formato de perguntas, com pistas a partir de relatos, imagens, gráficos, vídeos, seguidos de conteúdos teóricos específicos para apoio à formação de profissionais de saúde. Introdução O ser humano mesmo que potencialmente inclinado a aprender, necessita de estímulos para o que o faça de maneira eficaz (ZEFERINO e PASSERI, 2007). Ao professor atribui-se hoje o papel de condutor do processo de ensino-aprendizagem e ao aluno um papel muito mais ativo na busca pelo saber. São considerados como os grandes desafios básicos da atuais educação: aprender a conhecer, aprender a fazer e aprender a ser (ANTUNES, 2012). Mudanças significativas no cenário nacional do cuidado em saúde, no modelo assistencial e no perfil pretendido para o futuro médico são irreversíveis e impactam sobremaneira o ensino médico. Antes a beira do leito recebendo lições de um professor, agora o aluno vivencia experiências em cenários diversos e em níveis distintos da rede de atenção à saúde (ZEFERINO e PASSERI, 2007). A formação do médico demanda o domínio de habilidades clínicas fundamentais como a de comunicação, a do exame físico, raciocínio clínico e proposição de medidas diagnósticas e plano terapêutico. Por exemplo, o exame físico de um indivíduo por médico é prática considerada, além de custo-efetiva, de fundamental importância para o diagnóstico de doenças, estabelecimento de um plano diagnóstico, terapêutico e de prognóstico, em muitas situações (LEDERLE et al., 1988). No entanto, é preciso mais do que bons livros para que se adquira as habilidades necessárias para realizar o exame físico. Neste contexto, os ambientes de simulação podem contribuir ao permitir um treino orientado repetitivo e individualizado em apoio ao aprendizado nos cenários reais (TRONCON, 2007). A importância da aprendizagem em serviço foi recentemente ressaltada nas novas diretrizes curriculares nacionais de 2014 que ampliam a prática no ensino médico, especialmente no período de estágios em cenários do SUS e prevê uma formação geral, humanista, crítica, reflexiva e ética, com capacidade para atuar nos diferentes níveis de atenção à saúde, preparando-o para uma assistência integral ao indivíduo (BRASIL, 2014). Em ambientes virtuais que simulam desafios da prática clínica e, ao mesmo tempo, consideram as experiências pessoais, é possível estimular o aluno e oferecer também conteúdos teóricos complementares atualizados e de excelente qualidade. Há um reconhecimento da necessidade de adequação na formação dos profissionais de saúde, frente às limitações dos modelos tradicionais, de forma a valorizar outras dimensões e competências para o cuidado que considerem as questões sociais e as relações entre as pessoas, como nas estratégias de ensino problematizadoras (CYRINO e TORALLES-PEREIRA, 2004). Já se reconhece que mesmo o profissional médico atuante traz consigo limitações na execução de algumas tarefas e precisa ser continuamente treinado. Instrumentos que permitam aprimorar habilidades clínicas, que despertem o interesse pelos desafios do raciocínio clínico são de grande valor no ensino. A partir da proposta metodológica de aprendizagem baseada em problemas, o caso clínico real é o ponto de partida que tem por finalidade fazer com que o aluno seja desafiado e, portanto, ativo no processo de aprendizagem, estimulando-o ao estudo dos conteúdos pretendidos. A construção de conhecimentos apoiada na descoberta, em contraponto à simples recepção dos conteúdos tem como premissa a participação ativa do aluno e considera suas experiências e estrutura cognitiva prévia (CYRINO e TORALLES-PEREIRA, 2004). O objetivo é desenvolver um ambiente virtual para Simulação de Casos Clínicos reais, de complexidade e nível de atenção variáveis, assim como verificar sua eficácia como instrumento de apoio na aquisição de habilidades clínicas em estudantes de medicina e profissionais de saúde que deles se utilizarem. Metodologia Trata-se de estudo experimental de tecnologia aplicada ao ensino médico, de caráter multidisciplinar entre as ciências da saúde, da computação e da educação. O desenvolvimento de um software para armazenar casos clínicos reais é o ponto de partida deste estudo. A partir dele, o professores e preceptores que participam do projeto, poderão cadastrar os casos clínicos das mais diversas complexidades de pacientes em atendimento no Hospital das Clínicas da UFMG, seja nas unidades ambulatoriais ou hospitalares compondo os cenários de interesse. Os pacientes serão convidados a participar de forma voluntária do projeto, cedendo de forma anonimizada sua história clínica, incluindo anamnese, exame clínico, exames complementares, sejam eles em relatos ou em formato de som e imagem. Aqueles que aceitarem participar do estudo assinarão um termo de consentimento livre e esclarecido A plataforma desenvolvida, deverá ser ergonômica e autoexplicativa, ensinando os professores, que serão estimulados a documentar casos clínicos reais, de interesse para aprimoramento da aprendizagem dos profissionais de saúde. Exames de imagem como a ultrassonografia, ressonância magnética, 2 eletrocardiograma digital que tenham sido realizados para esclarecimento do caso ou apoio terapêutico poderão ser adicionados ao caso clínico em ambiente virtual. O laudo médico e as imagens serão recolhidas e armazenadas no sistema, ambos anonimizados, porém, vinculados aos casos. Quaisquer outros vídeos, fotos digitais ou digitalizadas, imagens diagnósticas poderão ser incorporadas e armazenadas no repositório de dados. A plataforma de casos clínicos será criada quer para o armazenamento, quer para proporcionar suporte tecnológico para preparação de cursos, grupos de trabalho, disciplinas e apoio ao ensino presencial, gerenciando o acesso dos alunos e professores, os conteúdos, além da avaliação de desempenho. A sua eficácia da aprendizagem ou aquisição de habilidades será avaliada por comparação de desempenho em testes pré e pós utilização do Simulador de Casos Clínicos pelo aluno. Os testes, preparados pelos professores envolvidos, serão disponibilizados no próprio sistema, em ambiente virtual. O resultado do desempenho do treinando no exame pré-teste e pós-teste, realizados de forma anonimizada em sistema digital serão comparados entre si por testes estatísticos específicos. O teste-t de média pareado será utilizado para comparação simples do desempenho pós-treinamento versus pré-treinamento. Além disso, análises univariadas e multivariadas serão empregadas para buscar associação entre o desempenho do treinando e preditores como sexo, idade, formação acadêmica, tempo de formação, efetividade do treino em ambiente virtual. Neste contexto os alunos serão orientados e esclarecidos sobre os termos do projeto e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido preparado para o utilizador do Simulador e Casos Clínicos. Os dados clínicos, sons, imagens e exames serão armazenados de forma anonimizada em uma biblioteca com sede na Faculdade de Medicina da UFMG. Serão exclusivamente utilizados para efetiva realização e obtenção dos resultados científicos aos quais ela se destina, capacitação de profissionais de saúde. O acesso será protegido por senha e estarão sob a responsabilidade do coordenador do projeto. Não haverá envio de qualquer material biológico para o exterior. A participação de quaisquer alunos de cursos de medicina ou médicos que desejem utilizar os tutoriais de ensino desenvolvidos será voluntária. Este estudo foi aprovado pela Câmara do Departamento em Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais e pela Comissão de Ética em Pesquisa (COEP) da UFMG com o parecer número CAAE 38920914.3.0000.5149, constando-se registrado e aprovado também na Diretoria de Ensino, Pesquisa e Extensão do HC-UFMG. Resultados Esperados Ainda em fase de protótipo, já podemos delinear alguns casos clínicos e ver sua aplicação, a princípio em papel, antes do desenvolvimento do ambiente digital do Simular de Casos Clínicos. Exemplicando o funcionamento do simulador de caso clínico, pode-se apresentar: 1. História Clínica Gestante, 26 anos, G2P1A0, casada, dona de casa. Procura assistência pré-natal com 24 semanas e 3 dias de gestação. Queixa-se de pequenas lesões avermelhadas na pele de início 3 há cerca de três meses que aumentam de tamanho se espalham pelo corpo: braços, dorso, pés e mãos incluindo planta e palma e boca. Relata ainda artralgia e fadiga generalizadas. Fez uso de Loratadina conforme prescrição médica. Relata herpes no início da gravidez tratada com Aciclovir® tópico. 2. Exame clínico-obstétrico: Exame geral: afebril, eupneica. Pressão arterial: 105/70mmHg. Medida do útero: 21cm, batimentos cardíacos fetais: 144/minuto. Colo uterino fechado. 3. Ausculta cardíaca: Faça você mesmo, no simulador de sons cardíacos, apresentado na interface digital. Fonte: (CINS, 2015) Figura 1: Simulador de ausculta cardíaca 4. Exame da pele: Analise a figura e busque percebe os achados descritos: Há pápulas de tamanhos variados, de contornos irregulares, por vezes contendo pequena vesícula central com pouca ou nenhuma secreção. Associa edema restrito às lesões. 4 5 Fonte: Fotos da pesquisa Figura 2: Abdome da paciente 5. Questões interativas (Quiz): Qual sua principal hipótese diagnóstica? A. Farmacodermia B. Rubéola C. Sífilis secundária D. Sarampo Qual exame laboratorial você solicitaria para confirmar sua hipótese diagnóstica? A. Hemograma B. VDRL C. Análise de raspado da lesão D. Nenhum, o diagnóstico é estritamente clínico 6. Texto Complementar: Saiba mais sobre sífilis na gestação: http://www.aids.gov.br/pagina/sifilis-na-gestacao Discussão Conforme este modelo, espera-se o envolvimento dos professores do Curso de Medicina da UFMG no apoio ao levantamento e documentação de casos clínicos reais de interesse. Completando o máximo possível o ambiente virtual com a história clínica, evolução, diagnósticos, imagens, exames complementares, sons, vídeos. Desenvolvimento de sessões de desafio clínico em ambiente virtual: apresentação de casos clínicos ilustrados, no formato de perguntas/respostas (Quiz) com pistas a partir de relatos, imagens, gráficos, vídeos, seguidos de conteúdos teóricos específicos para apoio à formação de profissionais de saúde serão desenvolvidos. Referências ANTUNES, C. Como desenvolver as competências em sala de aula. Editora Vozes Limitada, 2012. ISBN 853264208X. BRASIL. RESOLUÇÃO Nº 3, DE 20 DE JUNHO DE 2014. EDUCAÇÃO, C. N. D. e SUPERIOR, C. D. E. Brasília: Diário Oficial da União. Resolução CNE/CES 3/2014: 11 p. 2014. CINS. Centro de Informática em Saúde da Faculdade de Medicina da UFMG: Projetos. 2015. Disponível em: < http://site.medicina.ufmg.br/cins/apoio-a-pesquisa-22/projetos/ >. Acesso em: 23/01/2015. CYRINO, E. G.; TORALLES-PEREIRA, M. L. Trabalhando com estratégias de ensino-aprendizado por descoberta na área da saúde: a problematização e a aprendizagem baseada em problemas. Cadernos de Saúde Pública, v. 20, p. 780-788, 2004. ISSN 0102-311X. Disponível em: < http://www.scielosp.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-311X2004000300015&nrm=iso >. LEDERLE, F. A.; WALKER, J. M.; REINKE, D. B. Selective screening for abdominal aortic aneurysms with physical examination and ultrasound. Archives of internal medicine, v. 148, n. 8, p. 1753-1756, 1988. ISSN 0003-9926. TRONCON, L. E. A. Utilização de pacientes simulados no ensino e na avaliação de habilidades clínicas. Medicina (Ribeirao Preto. Online), v. 40, n. 2, 2007. ISSN 2176-7262. ZEFERINO, A. M. B.; PASSERI, S. Avaliação da aprendizagem do estudante. Cadernos da ABEM, v. 3, p. 39-43, 2007. 6