Coleta e transporte de espécimes clínicos Dalia dos Prazeres Rodrigues, Ph.D Laboratório de Referência Nacional de Cólera e Enteroinfecções Bacterianas Lab. Enterobacterias – Dpto. Bacteriologia IOC/VPSRA/FIOCRUZ [email protected] ou [email protected] Normas de segurança para manuseio de espécimes clínicos Segurança dos profissionais O profissional que efetua o manuseio de espécimes clínicos deve sempre utilizar luvas, jaleco, máscara, óculos e quando necessário proteção do rosto; O espécime clínico deve estar acondicionado em container que permita manter a sobrevivência do agente etiológico e assegure as condições de segurança do profissional; Toda a documentação referente ao espécime clínico deve ser transportado em embalagem selada a parte. Conceitos básicos de biossegurança no manuseio de espécimes clínicos ¾ Material didático de procedimentos de segurança deve ser disponibilizado para todos os profissionais do Laboratório (POPs revisados anualmente); ¾ Todos os espécimes clínicos devem estar acondicionados em containers apropriados, identificação individual por amostra, contendo a parte documento que contenha as informações: - Etiqueta de identificação; - Nome do paciente (completo sem abreviações); - NI (número de registro na origem); - Fonte (sítio de coleta); - Clínico responsável pelo paciente (nome/referência); - Data/hora da coleta – para processamento dentro do prazo; - Diagnóstico clínico presuntivo; - Informação quanto ao uso de antimicrobianos. Conceitos básicos de biossegurança no manuseio de espécimes clínicos Seringas nunca devem ser transportadas com agulhas acopladas; o conteúdo deve ser transferido para tubo esterilizado ou na impossibilidade, remover a agulha e vedar e transportar a seringa em embalagem plástica; Nenhum espécime clínico deve ser manuseado ou processado quando o container de transporte apresentar problemas de extravasamento do espécime. Deverá ser efetuada notificação para o clínico sobre a necessidade de nova coleta quando observadas falhas que não garantam diagnóstico correto; Todas as amostras clínicas devem ser consideradas potencialmente infecciosas Desinfecção da área de manuseio de amostras A desinfecção deve ser realizada obrigatoriamente antes e após o manuseio de qualquer espécime clínico Área de manuseio de amostras Uso de solução alcoólica e sabão bactericida deve ser empregado como rotina para desinfecção das mãos, após qualquer acesso na área de laboratório; Equipamentos de proteção devem ser utilizados sempre que houver necessidade de procedimentos que resultem na produção de aerossóis ou resíduos. Amostras clínicas: principais aspectos a considerar ¾ Espécime a ser coletado; ¾ Tipo de coleta e quantidade de material; ¾ Transporte das amostras; ¾ Critérios para rejeição; ¾ Tipo de análise laboratorial a ser realizada; ¾ Interpretação dos resultados; ¾ Encaminhamento dos resultados; Seleção e coleta de amostras Antes da coleta deve ser feita a seleção correta do sítio que represente a infecção; Áreas de maior contaminação podem apresentar crescimento microbiano que venha a mascarar o isolamento: ¾ urina: microbiota uretral; ¾ sangue: microbiota comensal da pele; ¾ fezes: quantidade, tipo e manutenção. Coleta: volume inadequado pode ofertar resultados falso-negativos. Coleta de amostras clínicas SANGUE : volume para cultura Adultos: 20mL, coletados com seringa, divididos em duas alíquotas para inoculação em dois frascos de meio de cultura. Crianças: Peso Volume total Semeadura Aeróbio Aeróbio Anaeróbio <1,5 kg 1 mL X < 4 kg 1 mL X 4-13 3 mL X 13-25 10 mL X X >25 20 mL X X Anticoagulante (heparina ou EDTA); Sangue: principais cuidados para coleta Desinfecção da superfície dos frascos de cultivo (álcool 70ºGL); Desinfecção do sítio de punção (álcool 70ºGL ou Solução Iodada) em movimentos concêntricos do centro para a extremidade); Transporte de sangue: Temperatura ambiente em prazo ≤2 horas; Refrigerado a 4ºC: com chegada e processamento em prazo inferior a 24h após a coleta; Processamento das amostras de sangue ¾ Coloração pelo método de Gram: não é recomendada devido ao reduzido número de células bacterianas presentes; ¾ Cultivo: inocular em dois frascos, mantendo um em condições aeróbias, efetivar avaliação diária, sendo a primeira após 18 horas; ¾ Incubação metodologia tradicional : todas as culturas de sangue devem ser incubadas a 37ºC e avaliadas por 7 dias; ¾ Automação: monitoramento contínuo, representando excelente alternativa especialmente em laboratórios de elevado fluxo de espécimes. Coleta e processamento para diagnóstico de Salmonella Typhi ¾ ¾ ¾ ¾ ¾ Espécimes clínicos: sangue, coágulo, fezes e urina; Melhores resultados para o isolamento: Sangue: isolamento poderá ser positivo na 1ª semana e raramente após 30 dias; Fezes: 2ª semana (podendo ser observada positividade >50% na 1ª semana) – cultura de fezes oferta melhores resultados do que amostras obtidas através de swab retal Urina: positividade usualmente obtida 3ª semana Soro: extração do sangue coagulado através de ação mecânica ou adição de estreptoquinase; vantagem: titulação de anticorpos (reação de Widal); é necessária a tomada de duas amostras com intervalo de 10-14 dias para avaliar soroconversão; Portadores: diagnóstico a partir de amostras de fezes ou urina. Coleta de fezes Coleta de fezes Durante a fase aguda, antes de iniciar tratamento com antibióticos. O conteúdo duodenal, bile e sangue podem ser utilizados para cultivo, especialmente para pesquisa de portadores de febre tifóide. Conteúdos de colostomia ou ileostomia devem ser recebidos em frascos para transporte de fezes; Swabs retais devem ser priorizados em pacientes com infecção ativa, crianças ou indivíduos com dificuldade de obtenção de amostras. Coleta de fezes I - Fezes de emissão espontânea: Coletar em recipientes de boca larga, limpos e/ou esterilizados, 0,5 a 2g de fezes e quando da presença de sangue ou muco, esta deve ser a porção selecionada. Evitar a coleta de espécimes fecais a partir das roupas do paciente, da superfície de camas e/ou chão. Coleta de fezes II - Especimes retais: Umedecer o swab em solução fisiológica ou água destilada esterilizada; Introduzir o swab na ampola retal do paciente ou comunicante, comprimindo-o em movimentos rotatórios suaves, por toda a extensão da mesma; Processar no período até duas horas e caso não seja possível, introduzir o swab no meio de Cary & Blair . Coleta de fezes III - Coleta de fezes em papel filtro. Utilizar de tiras de papel de filtro, tipo xarope ou mata-borrão, com dimensões de 2,5cm de largura por 6,0cm de comprimento; As fezes diarréicas ou emulsionadas em água, devem ser espalhadas em 2/3 de uma das superfícies do papel, com auxílio de um fragmento de madeira (palito individual); Acondicionar as tiras de papel de filtro em invólucros plásticos após dessecamento natural, efetivando vedação; Manutenção de Salmonella spp. sob esta condição é de 20-30 dias. Exame direto de fezes: importância e Interpretação presuntiva 9 Importante para verificação de piócitos e células mononucleares, indicativos de processo inflamatório. Utilizar solução de azul de metileno de Loeffler, misturado em igual quantidade com as fezes, entre lâmina e lamínula e examinar com microscópio ótico (objetiva de 10X e 40X). 9 A presença de polimorfonucleares é indicativo de síndrome disenteriforme ou colite determinada por patógenos invasivos. 9 Leucócitos, células mononucleares podem predominar em pacientes com febre tifóide. Interpretação presuntiva do exame direto de fezes ¾ Leucócitos, células mononucleares podem predominar em pacientes com febre tifóide. ¾ Nas infecções enterotóxicas não são evidenciados piócitos. Interpretação presuntiva do exame direto de fezes Observação Macroscópica Observação Microscópica Mecanismo de Agressão Microrganismos Suspeitos Sangue Neutrófilos Invasão Salmonella spp, Shigella sp. Sangue, Muco Neutrófilos Citotóxico Salmonella spp, STEC Muco Monócitos Invasão Salmonella Typhi Aquosa Células epiteliais Enterotóxico V.cholerae, ETEC Transporte de espécimes clínicos Transporte entre laboratórios localizados em uma mesma região Todos os espécimes clínicos devem ser processados no prazo de 2 horas, em prazo superior empregar meio de transporte; Em geral espécimes para cultivo bacteriológico não devem ser estocados por período superior a 24 horas; Alguns microrganismos são sensíveis as condições ambientais, devendo ser processados imediatamente (Shigella sp); Todo transporte entre diferentes unidades requerem que sejam atendidas as normas de “acondicionamento e transporte de material infeccioso”. Transporte de espécimes clínicos 9 Utilizar na medida do possível containers plásticos ou de isopor para manutenção por período curto de transporte das amostras; 9 Envolver os isolados ou espécimes clínicos com plástico ou papel e coloca-los em outra embalagem no interior da caixa de transporte; 9 Manter as fichas contendo as informações clínicas e/ou epidemiológicas a parte de espécimes ou amostras bacterianas; 9 Para reutilização dos containers para transporte, efetuar a desinfecção utilizando solução de hipoclorito de sódio (100 ppm); Nunca deve ser esquecido que usualmente o profissional que efetua o transporte não possui conhecimento técnico. Normas para transporte entre diferentes regiões e países Definição de grupos de risco de acordo com a Organização Mundial de Saúde Grupo de risco Características dos microrganismos Exemplos 4 Sempre determinam infecções graves (fácil transmissão, geralmente sem tratamento definido) Vírus Ebola, Y.pestis, vírus de febres hemorrágicas, Mycobacterium em caldo 3 Usualmente causam infecções graves (possibilidade de transmissão e tratamento) Francisella, Brucella, secreção p/cultivo de Mycobacterium, B.anthracis, toxina de C.botulinum, Burkholderia mallei/ pseudomallei, HIV, vírus da hepatite C, toxina estafilocócica Podem determinar infecções graves, menor possibilidade de transmissão (possibilidade de tratamento) Maioria das espécies da família Enterobacteriaceae, bactérias comumente detectadas na rotina laboratorial. Risco extremamente reduzido B.cereus, microbiota normal 2 1 Exemplos de microrganismos que exigem critérios diferenciados de transporte (IATA,2003) UM 2814 (infecções humanas): Vírus Ebola, vírus de febres hemorrágicas, HIV, vírus da hepatite B e C, vírus da varíola, vírus da raiva, Mycobacterium tuberculosis, Francisella tularensis, Brucella abortus, Bacillus anthracis, Clostridium botulinum, Burkholderia pseudomallei/ mallei, Chlamydia psittaci, Y.pestis, Escherichia coli O157, Shigella dysenteriae 1,... UN 2900 (infecções animais): vírus da peste suína, vírus bluetongue, vírus da Newcastle, vírus da Sheeppox , vírus da doença vesicular suína, vírus da estomatite suína, ... Normas para transporte de material de laboratório de acordo com a IATA (2003) Resposta de emergência UN Risco Descrição Tipo de embalagem Quantidade permitida-avião comercial Quantidade permitidaavião carga 2814 Produto infeccioso Humano (líquido) 602 50 mL 4 litros 6L 2814 Produto infeccioso Humano (sólido) 602 50 g 4 kg 6L 2900 Produto infeccioso Animal (líquido) 602 50 mL 4 litros 6L 2900 Produto infeccioso Animal (sólido) 602 50 g 4 kg 6L 3245 GMO Misto 913 Sem limite Sem limite 9L 1845 Gelo seco Misto 904 200kg 200kg 9L 3373 Espécime p/ diagnóstico - 650 4 litros 4 litros 6L Como definir o material para transporte dentro de normas de segurança 650 e 913 Embalagem de proteção tripla, Inclui quatro subclasses distintas: a qual contem: Amostras para diagnóstico; Embalagem primária de metal, plástico Substancias infecciosas; para colocação das cepas/espécimes a Produtos biológicos; qual é mantida inteiramente vedada; Produtos geneticamente modificados. Material que suporte impacto e quando Avaliação das características do produto: necessário, absorvente quando -Confirmação de diagnóstico. Ex. HIV. efetivado transporte de líquido; -Transporte de espécime clínico de Embalagem secundária na qual é paciente sem diagnóstico definido com introduzida a embalagem primária; histórico de viagem a regiões com Embalagem externa confeccionada de patógenos exóticos. material como madeira, papelão ou Encaminhamento de rotina para equivalente que tenha no mínimo 4mm rastreamento de cepas para de espessura; Laboratório de Referência. Etiqueta externa que informe o tipo de Encaminhamento de cepas exóticas risco, destinatário, remetente e se multirresistentes. necessário o profissional de contato; Encaminhamento de reagentes para avaliação de qualidade. Legalidade no transporte de GMO 602 e 650- Exemplo de caixa para transporte de cepas bacterianas Rejeição de amostras clínicas A recepção e processamento de espécimes clínicos selecionados, coletados ou transportados de forma inadequada além de expor a instituição e os profissionais ao descrédito, fornece ao paciente e ao clínico diagnóstico errôneo e consequentemente falhas no tratamento. Todo o Laboratório deve adotar como critério uma política de recepção e rejeição de amostras visando ofertar qualidade e confiabilidade. O resultado deve conter observação sobre as falhas detectadas e orientações corretivas. Rejeição de amostras clínicas Amostras sem identificação ou falhas nas informações: processar somente espécimes obtidos através de procedimento invasivo, solicitando correção do problema; Volume inadequado ou quantidade insuficiente; Transporte por tempo prolongado sem condições adequadas de manutenção; Espécimes duplicados coletados no mesmo dia (exceto sangue); Critérios de rejeição de amostras Espécimes fecais inaceitáveis: Fezes não preservadas coletadas por período superior a 2 horas; Fezes preservadas em meios inadequados (MIF, indicadores como vermelho de fenol); Espécimes coletados em pacientes com uso de antimicrobianos; Swab não acondicionado em meio de transporte; Espécimes múltiplos coletados no mesmo dia. No caso de recebimento de espécimes inaceitáveis comunicar ao remetente, mantendo o material de 4-10ºC até o recebimento de nova amostra. Descarte de material contaminado Descontaminação e descarte de resíduos Todos os laboratórios devem possuir normas bem claras sobre o manuseio e descarte de resíduos; Material potencialmente infeccioso deve ser separado do lixo comum e descartado em embalagens plásticas que contenham indicação de RISCO BIOLÓGICO; Perfuro-cortantes devem ser descartados em containers próprios;