1 A EUTANÁSIA E SUA HERMENÊUTICA CONSTITUCIONAL NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO BRASILEIRO: Marcela Paula Simões1 RESUMO O presente trabalho visa conceituar o instituto da eutanásia, estabelecendo-se distinções em face de outros institutos, tais como a distanásia, a mistanásia e o suicídio assistido. Bem como analisar o instituto supramencionado utilizando-se o enfoque constitucional, à luz do princípio da dignidade da pessoa humana e, infraconstitucionalmente, em face do Código Penal brasileiro vigente. Estabelecendo, por fim, uma percepção de hermenêutica constitucional à prática da eutanásia, em que concluímos com o seguinte questionamento, conforme os ditames do Estado Democrático de Direito brasileiro: Será que a legalização da prática da eutanásia faz-se necessária? Palavras-chave: Eutanásia. Princípio da Dignidade da Pessoa Humana. Dworkin. Alexy. Hermenêutica Constitucional. 1 Graduada em Direito pela PUC Minas – campi Coração Eucarístico – primeiro semestre de 2008. Funcionária pública estadual lotada na 18ª vara cível – Fórum de Belo Horizonte. Endereço de contato: Avenida Augusto de Lima, nº 1453 – AL 313, telefone: (031) 3330-2254. Endereço eletrônico: [email protected]. 2 LISTA DE SIGLAS CR/88 – Constituição da República de 1988 CPB – Código Penal Brasileiro CC/02 – Código Civil de 2002 3 1. INTRODUÇÃO O presente trabalho tem por objetivo precípuo abordar o instituto da eutanásia, bem como analisar os argumentos postos no ordenamento jurídico brasileiro, conforme ditames do Estado Democrático de Direito, no que tange ao princípio da dignidade da pessoa humana. Para tanto, no próximo capítulo, conceituaremos e distinguiremos a eutanásia em face de outras práticas, a saber, a distanásia, a mistanásia e o suicídio assistido. No Capítulo 3, apresentaremos sob o enfoque legislativo o instituto da eutanásia em alguns países da América e da Europa, demonstrando que há países cuja legalização de tal prática se deu mediante legislação, tais como Holanda e Bélgica, bem como há ainda aqueles que proíbem sua prática, tais como Argentina, Portugal e Uruguai. No que tange ao Brasil, já houve várias tentativas legislativas tanto de proibição expressa quanto de legalização da eutanásia ativa, conforme abordaremos oportunamente. Verificamos que a vida é um dos valores inerentes à pessoa humana, em que antigamente era respeitada costumeiramente de acordo com as características culturais de cada sociedade, e não, devido disposição normativa, no entanto, com o passar dos séculos o direito à vida passou a ser reconhecido e protegido como bem jurídico. O Brasil desde 1830 atribui pena de homicídio àquele que a desrespeita, contudo, a garantia ao direito à vida somente foi constitucionalmente considerada pela atual Constituição da República, em seu artigo 5º, caput. (SÁ, 2005) Destarte, demonstraremos no Capítulo 4 o instituto da eutanásia ativa em face do atual Código Penal Brasileiro (CPB), no que tange ao seu artigo 121, §1º, haja vista extrema polêmica quanto à sua aplicação, em que analisaremos se há tipicidade ou não de tal instituto. Após, no Capítulo 5 faremos uma análise do princípio da dignidade da pessoa humana, no que tange seus dispositivos normativos no ordenamento jurídico brasileiro, a saber, artigos 1º, III, 5º, caput, 170, caput, 226, §7º, 227, caput, e 230, caput, todos da Constituição da República de 1988 (CR/88), defendendo a aplicação dos princípios jurídicos mediante a teoria construída por Dworkin, não obstante criticando a visão axiológica posta por Alexy. Por fim, apresentamos no Capítulo 6 uma hermenêutica constitucional dos institutos da eutanásia ativa e passiva face à análise deontológica acima construída do princípio da dignidade da pessoa humana. No qual concluímos com o seguinte questionamento: Faz-se necessária a legalização ou não da prática da eutanásia no Estado Democrático de Direito Brasileiro? 4 2. CONCEITUAÇÃO DA EUTANÁSIA EM FACE DE OUTROS INSTITUTOS Primeiramente, faz-se mister ressaltar que não há qualquer tipo de controvérsia na doutrina pesquisada sobre a possibilidade das práticas abaixo relacionadas serem realizáveis em pessoas saudáveis. Sendo condizentes somente àquelas pessoas em estado terminal e com intenso sofrimento, em que a medicina oferece nenhuma ou ínfimas possibilidades de melhora. Portanto, observamos que a mesma tecnologia que auxilia o homem e prolonga seu tempo de vida, pode ser também um adversário nos casos em que os meios sejam supérfluos, pelo menos para aquele fim específico de salvar ou prolongar a vida com dignidade do paciente. (ROCHA, Cármen, 2004) Ao passo que trouxe esperança para muitos os doentes, também trouxe muito sofrimento àqueles que não possuem diagnóstico passível de mudança. Desta forma, verificamos que a tecnologia pode praticamente, em algumas situações, tornar indefinido o tempo pelo qual uma pessoa mantém-se viva tecnicamente, mesmo com a falência de seus órgãos. Necessário se faz salientar que fantasiamos às vezes e desejamos sempre um final de vida rápido em meio a uma atividade cotidiana ou quem sabe um infarto fulminante enquanto dormimos. Infelizmente isto ocorre em apenas em poucos casos. (VARELLA, 2004) 2.1 Eutanásia O termo eutanásia tem sido utilizado de maneira confusa e ambígua, uma vez que possui conceituação polissêmica, acarretando em sua estigmatização, bem como no crescente medo de sua utilização por parte de diversas pessoas. Tal termo foi criado no século XVII, em 1623, pelo filósofo inglês Francis Bacon, em sua obra “Historia vitae et mortis”, como sendo o “tratamento” necessário e adequado às doenças incuráveis. (CASTRO, 2007) No entanto, diversos doutrinadores apresentam registros históricos em que a prática da eutanásia se deu em épocas anteriores à citação do termo pelo mencionado filósofo, ou mesmo, à atribuição do sentido hoje conferido à referida prática, ao fundamento de que é realizada para persecução de fins político-sociais, tal como a eliminação daquelas pessoas que 5 se mostravam incapazes para o trabalho, e não, o sentido atual de finalização do sofrimento de um doente. (ZAMBONI, 2007) Não obstante, no século XIX, o termo eutanásia era entendido pelos teólogos Larrag e Claret, em seu livro “Prontuários de Teologia Moral”, publicado em 1866, visando caracterizar a "morte em estado de graça", o que consiste em um conceito totalmente diferente ao do atual, o qual será oportunamente apresentado. (GOLDIM, 2004) Conforme a doutrina pesquisada, a eutanásia no que tange à sua evolução histórica nem sempre apresentou conotação negativa. (SÁ, 2005) Desta forma, há diversos conceitos a respeito do tema, conforme exposto a seguir. No que tange ao termo eutanásia, o ilustre doutrinador Eduardo Pinan Y Malvan ensina que a eutanásia corresponde ao ato pelo qual uma pessoa põe fim à vida de outrem que sofre de males decorrentes de sua enfermidade ou, então, que está aleijada, sofrendo assim de dores cruéis. Aquela pessoa age pelo espírito de piedade e humanidade, atendendo solicitações reiteradas. (RODRIGUES, 1993) O doutrinador Ricardo Royo Villanova Y Morales afirma que a eutanásia é a morte doce e tranqüila, sem dores físicas nem torturas morais, que pode sobreviver de um modo natural nas idades mais avançadas da vida, acontecer de um modo sobrenatural como graça divina, ser sugerida por uma exaltação das virtudes estóicas ou ser provocada artificialmente, já por motivos eugênicos, já com fins terapêuticos, para suprimir ou abreviar uma inevitável, longa e dolorosa agonia, porém sendo sempre prévio o consentimento do paciente ou prévia a regulamentação legal. (VILLANOVA Y MOREALES apud RODRIGUES, 1993, p. 50) Já Luis Jiménez de Asúa (1929) entende que a eutanásia consiste na morte na qual alguém proporciona a uma pessoa que padece de uma enfermidade incurável ou muito penosa, e a que tende a pôr fim à agonia excessivamente cruel ou prolongada. Para este autor, eutanásia e homicídio por piedade são termos distintos. Em que o último é exercido pelos membros da família ou amigos desinteressados, no qual se devem analisar os motivos da conduta, isto é, o móbil. Assim, na existência de motivos de piedade em decorrência do grave sofrimento, ao juiz é facultado o perdão judicial, uma vez que a conduta é repudiada legalmente. Já o primeiro é exercido somente pelo médico, uma vez que este não possui intenção de matar o paciente, e sim, aliviar suas dores. Portanto, o móbil nesta conduta se torna irrelevante. Para Hubert Lepargneur (1999, p. 43), a eutanásia é o “emprego ou abstenção de procedimentos que permitem apressar ou provocar o óbito de um doente incurável, a fim de 6 livrá-lo dos extremos sofrimentos que o assaltam ou em razão de outro motivo de ordem ética”. Faz-se importante salientar que para este autor: “Humanizar o sofrimento e a morte é tarefa de todos os tempos, revestida de singular urgência em nossa época, O atual desejo de programação orienta-se antes para assegurar ao principal interessado um fio com dignidade e lucidez, desprovido de sofrimentos prolongados e inúteis”. (LEPARGNEUR, 2002, p. 331). Já o ilustre doutrinador Eros de Moura aborda o tema, diferenciando a eutanásia do homicídio por compaixão, nos seguintes termos: Se formos pensar assim, o homicídio por compaixão será realmente a eutanásia, mas como esta, ficará restrita a sua aplicação à classe médica, que se tornará, então, a privilegiada, a única em que a piedade será redimida, será admissível. Se deixamos as coisas por conta desses confusionistas, pelo que vejo, amanhã a eutanásia transformar-se-á numa cartola mágica [...] Todos os crimes sairão dela. Tudo... (MOURA, 1940, p. 31) Apesar do exposto, seu conceito tido como clássico foi entendido como a retirada da vida daquele ser humano que apresenta deficiência ou doença incurável, bem como daqueles considerados velhos, mediante convicções humanitárias entendidas pela pessoa ou pela própria sociedade, na qual aquele está inserido. (BARCHIFONTAINE, 2002) No entanto, nos dias atuais, o termo da eutanásia tem sido comumente entendido como: [...] a ação médica que tem por finalidade abreviar a vida de pessoas. É a morte de pessoa – que se encontra em grave sofrimento decorrente de doença, sem perspectiva de melhora – produzida por médico, com o consentimento daquela. A eutanásia, propriamente dita, é a promoção do óbito. É a conduta, por meio da ação ou omissão do médico, que emprega, ou omite, meio eficiente para produzir a morte em paciente incurável e em estado de grave sofrimento, diferente do curso natural, abreviando-lhe a vida. (SÁ, 2005, p. 39) Em nosso entendimento, a prática da eutanásia consiste na conduta por meio de ação ou omissão, do médico ou de outra pessoa próxima, a rogo do paciente ou de outrem, isto é, independentemente do consentimento do paciente (sob determinadas situações que oportunamente descreveremos), mediante emprego ou omissão de meio eficiente para produzir a morte deste paciente em estado terminal, cujo estado provoca-lhe grave sofrimento físico ou psíquico. Tal ação ou omissão visa abreviar a vida do mencionado paciente, utilizando-se de sentimentos de piedade, humanidade e compaixão. 7 Desta forma, para que a prática da eutanásia seja considerada legítima, propomos que determinados requisitos que oportunamente demonstraremos sejam respeitados. Podemos assim afirmar que existem dois elementos básicos na caracterização da conduta da eutanásia, a saber, a intenção do agente e o efeito da ação. (SÁ, 2005) Portanto, não há de se falar em semelhança entre as práticas da eugenia2 e as da eutanásia, uma vez que possuem meios e fins diversos. Verificamos na doutrina que os argumentos utilizados pelas pessoas que defendem a prática da eutanásia consistem em: atender a última vontade do paciente em estado terminal, a qual seria morrer com dignidade e a efetividade do principio da autodeterminação da pessoa em decidir quando e como seria sua morte. Posto que os argumentos daquelas pessoas que são contra a mencionada prática são: o dever que o Estado possui de preservação a qualquer custo da vida humana, o qual é entendido como bem supremo, estando obrigado também a promover o bem-estar de todos os cidadãos e, conseqüentemente, evitar situações de risco. Assim, busca-se o prolongamento da vida humana até mesmo quando não há vontade da pessoa, a qual o interesse Estatal prevalece ao particular/individual. Argumenta-se também que, com a legitimidade da eutanásia, poderia ensejar graves abusos. (SÁ, 2005) Isso posto, verificamos que morte liberadora ou libertadora, morte benéfica, l'uccisione pietosa, el homicídio por altruismo o compasion, homicídio piedoso, homicídiosuicídio foram e são variantes empregadas para definir a morte por meio da eutanásia, ou seja, o “homicídio eutanásico”, entendido assim por vários doutrinadores. Segundo um conceito generalizado, o homicídio eutanásico deve ser entendido como aquele que é praticado para abreviar piedosamente o irremediável sofrimento da vítima, a pedido ou não dessa, bem como com ou sem o seu consentimento. (SÁ, 2005) Não obstante a extrema divergência doutrinária quanto à conceituação do termo eutanásia, demonstraremos a seguir algumas das diversas classificações do termo da eutanásia já propostas. Em que, primeiramente, a classificação da eutanásia foi assim proposta na Espanha, por Ricardo Royo Villanova Y Morales, em 1928: Eutanásia súbita: morte repentina, sem nenhuma dor; Eutanásia natural ou fisiológica: morte natural ou senil, resultante do processo natural e progressivo do envelhecimento; 2 “A Eugenia é um termo criado por Francis Galton (1822-1911), que a definiu como o estudo dos agentes sob o controle social que podem melhorar ou empobrecer as qualidades raciais das futuras gerações seja fisica ou mentalmente”. (Eugenia..., 2007) 8 Eutanásia teológica: morte em “estado de graça”, isto é, a morte “por visitação de Deus”; Eutanásia estóica: morte obtida com a exaltação das virtudes do estoicismo, isto é, ao findarem-se os aborrecimentos da vida, visto que para os estóicos, a morte é o fim das dolorosas provas da vida; Eutanásia terapêutica: faculdade dos médicos em propiciar uma morte suave aos enfermos incuráveis e com grave sofrimento, com rápida e não dolorosa agonia; Eutanásia eugênica: supressão de todos os seres considerados inúteis; Eutanásia legal: aqueles procedimentos regulamentados ou permitidos por lei. Também considerada como a regulamentação das formas terapêutica e eugênica, isentando-as de pena. Legalizando, por via de conseqüência, a obrigatoriedade. (GOLDIM, 2003; RODRIGUES, 1993) No Brasil, em 1928, na Bahia, Ruy Santos propôs que a eutanásia fosse classificada em dois tipos de acordo com àquele que executa a ação: Eutanásia-homicídio: quando alguém realiza um procedimento para terminar com a vida de um paciente que se subdividia em eutanásia-homicídio, aquela realizada por médico, e eutanásia-homicídio, aquela realizada por membro da família; Eutanásia-suicídio: quando o próprio paciente é o executante. (JÚNIOR, 2002; GOLDIM, 2003) Mário Ottobrini Costa e Lilian Ottobrini Costa Sucena, em 1931, classificaram a eutanásia em verdadeira e falsa ou pseudo-eutanásia. Em que a primeira seria aquela praticada pelo médico e a segunda constituiria em crime, consistindo nas espécies eugênica, econômica e piedosa. Assim, os adjetivos piedosa, compassiva, caritativa e consensual seriam sinônimos eufêmicos da falsa eutanásia, visando a busca de atenuantes na pena do crime. (RODRIGUES, 1993) Já Licurzi dividiu a eutanásia em três espécies: Morte libertadora: morte benéfica em que o paciente em estado grave ou enfermo pede para abreviar-lhe a vida, tendo em vista os sofrimentos físico e espiritual, não havendo dor; Morte piedosa: morte dada aos moribundos inconscientes ao fim de longas enfermidades e para suprimir terríveis dores; Morte eugênica: morte com finalidade de melhoramento da raça humana. (RODRIGUES, 1993) 9 Polaino-Lorente distingue a eutanásia conforme os fins e os métodos empregados: Agônica: aquela que facilita a morte do paciente sem qualquer sofrimento; Lenitiva: morte que alivia dor física ou a enfermidade incurável; Suicida: morte realizada pelo próprio paciente; Homicida: se subdivide em leve, que consiste na morte por velhice, e eugênica ou econômica, que consiste na eliminação da vida improdutiva; Passiva: compreende a omissão médica ou a interrupção dos meios extraordinários para prolongar a vida do paciente em estado irreversível; Ativa: intervenção direta da vida por meio de medicamentos. (RODRIGUES, 1993) Não obstante, Luis Jiménez de Asúa, em 1942, propôs a existência, a rigor, de apenas três tipos: Eutanásia libertadora: que é aquela realizada por solicitação de um paciente portador de doença incurável submetido a um grande sofrimento; Eutanásia eliminadora: quando realizada em pessoas que mesmo não estando em condições próximas da morte são portadoras de distúrbios mentais. Justificando-se pelo fardo que são para sua família e para a sociedade; Eutanásia econômica: seria a realizada em pessoas que, por motivos de doença, ficam inconscientes e que poderiam sofrer em função da sua doença, ao recobrar os sentidos. (ASÚA, 1929; RODRIGUES, 1993; GOLDIM, 2003) Estas idéias claramente demonstram a ligação que havia naquela época entre a eutanásia e a eugenia. Atualmente, mister se faz ressaltar que segundo os autores José Roberto Goldim e Carlos Fernando Francisconi, a eutanásia será classificada, observando-se o consentimento do paciente: Voluntária: quando a prática da eutanásia é advinda do consentimento, da anuência, da deliberação individual do paciente em estado terminal. Não voluntária: quando o paciente em estado terminal não se pronunciou a respeito da prática da eutanásia, não havendo assim qualquer tipo de anuência ou consentimento deste, porque não possui meios capazes de manifestar sua opinião. Involuntária: quando o paciente em estado terminal se manifestou contra a sua prática, mas mesmo assim, a morte é provocada. (FRANCISCONI e GOLDIM, 97-03) Os mesmos autores, além da classificação acima, também abordam a classificação da eutanásia em ativa, passiva e de duplo efeito, no qual esta última será verificada quando a 10 morte é acelerada como uma conseqüência indireta das ações médicas que são executadas, visando o alívio do sofrimento de um paciente terminal durante a prática da eutanásia passiva. Outra distinção atual e necessária para melhor compreensão do estudo compreende a subdivisão do termo EUTANÁSIA, quanto ao tipo de ação, em: 2.1.1 Eutanásia ativa A eutanásia ativa é também denominada de eutanásia direta ou positiva. No entanto, sua comum denominação corresponde a, simplesmente, eutanásia. Em grego tal termo consiste na mesma assertiva acima descrita, a saber, eu, “boa” e thánatos, “morte”. (BARCHIFONTAINE, 2002; ROCHA, Cármen, 2004) Sua tradução pode ser tida também como “morte apropriada”, morte piedosa, morte benéfica, fácil, crime caritativo ou até, direito de matar. (SÁ, 2005) Segundo Sá (2005, p. 39), o “ato médico tem por finalidade acabar com a dor e a indignidade na doença crônica e, no morrer, eliminando o portador da dor. A preocupação primordial é com a qualidade da vida humana na sua fase terminal.” Constituindo, assim, na conduta da eutanásia ativa, em que se propõe precocemente a morte daquela que se espera, por motivos de compaixão, diante do sofrimento insuportável. Desta forma, concluímos que na eutanásia ativa são imprescindíveis a ação, intervenção, do médico ou de terceiro, com ou sem o consentimento do paciente, para a sua prática, mediante antecipação de um fim inevitável. A eutanásia ativa não só é considerada moralmente condenável, como juridicamente inaceitável, segundo o entendimento doutrinário majoritário. Portanto, a intenção de realizar a eutanásia pode gerar uma ação (eutanásia ativa) ou uma omissão (eutanásia passiva), em que esta última é a não realização de uma ação que teria indicação terapêutica naquela circunstância, conforme descreveremos a seguir. 2.1.2 Eutanásia Passiva 11 A eutanásia passiva também denominada de negativa ou indireta ou ortotanásia consiste na omissão médica, em que há a recusa (não–aplicação) de terapia médica com a qual se prolongaria a vida do enfermo. (BARCHIFONTAINE, 2002) A eutanásia passiva (ortotanásia) quer dizer em grego, orthós, “normal, correta” e thánatos, “morte”. (RODRIGUES, 1993) Segundo Rodrigues (1993), a ortotanásia ou eutanásia passiva pode ser conceituada também como para-eutanásia. Seu conceito consiste no método em que o próprio paciente deixa de tomar a medicação na tentativa de prolongar sua espera pela morte. Assim, ele aceita a chegada da morte e sua condição de incurável, aproveitando seus últimos momentos, se recusando a prosseguir com um tratamento inútil, isto é, consiste na morte natural do paciente. Quanto à eutanásia passiva, há uma condescendência jurisprudencial e em alguns países até mesmo legislativa. (ROCHA, Cármen, 2004) Sendo entendida na maioria da doutrina pesquisada como a atuação correta frente à morte, consistindo na abordagem adequada diante de um paciente que está morrendo. Desta forma, a ortotanásia pode ser confundida com o significado inicialmente atribuído à palavra eutanásia. Outrossim, a ortotanásia poderia ser associada, caso fosse um termo amplamente adotado aos cuidados paliativos adequados prestados aos pacientes nos momentos finais de suas vidas. Assim, deve-se cuidar para que o quadro clínico do paciente siga seu curso natural sem qualquer tipo de impedimento, bem como sem o prolongamento artificial exacerbado da vida. (RODRIGUES, 1993) Bernhard Haring entende que: “Uma coisa é cuidar da vida e prolongá-la, outra é prolongar apenas o processo inelutável da morte, depois que o médico souber claramente ser inútil qualquer tratamento” (HARING apud RODRIGUES, 1993, p. 75) É importante ressaltar que a maioria dos protocolos internacionais garante a prática da eutanásia passiva, isto é, a retirada de medicamentos ou do tratamento médico, mediante o atendimento do paciente com psiquiatras e psicólogos. (DINIZ, 2007) Nos conselhos regionais de medicina, a tendência é de aceitação da eutanásia passiva, exceto em casos esparsos de desentendimentos entre familiares sobre a hora de cessar os tratamentos. A eutanásia passiva é vista pelos médicos como abreviação do sofrimento do doente e da sua família e é comumente praticada por eles hoje no Brasil, apesar de não haver qualquer tipo de registro sobre o tema ou de haver explícita negação por eles sobre a prática. 12 Conforme Sá (2005), alguns médicos defendem somente esse tipo específico de eutanásia, que seria o ato de retirar equipamentos ou medicações que servem para prolongar a vida de um paciente terminal, ao fundamento de que se traduziria como mero exercício regular da profissão. Tal entendimento também corresponde aos de alguns especialistas em bioética. Assim, ao retirar esses suportes de vida, mantendo apenas os analgésicos e tranqüilizantes, espera-se que a natureza se encarregue da morte. Diferente, portanto, da chamada eutanásia ativa, ou simplesmente eutanásia, em que há ação direcionada para matar, como a administração de um veneno. Tal procedimento somente deve ser entendido para os doentes em estado terminal que apresentam quadro clínico irreversível, uma vez que deve haver conhecimento técnico para que não haja qualquer violação aos direitos do paciente. Assim, não pode ser submetido aquele paciente com possibilidade de cura, visto que há renúncia ao tratamento médico por parte deste. Conforme Varella (2004), manter os pacientes em estado terminal em casa, junto ao conforto de sua família e amigos, isto é, aqueles que os amam, é conduta muito mais humana do que simplesmente fazê-los passar internados nos últimos dias de suas vidas. Entendemos que tal método possa ser realizado tanto pelo médico, que acompanha o caso clínico em questão, quanto por parentes próximos, neste último desde que haja acompanhamento médico regular e devido, visto a necessidade de se saber se o paciente pode ou não vislumbrar melhora em seu diagnóstico e via de conseqüência, utilizar-se deste método. Doravante, ao lado de tal subdivisão, surgem outras denominações, conforme exposto a seguir. 2.2 Mistanásia Mistanásia, também denominada de eutanásia social, consiste para Barchifontaine (2002) na decisão tomada pela sociedade e não pelo enfermo. 13 Segundo este autor, mistanásia consiste em grego, mis, “infeliz” e thánatos, “morte”, bem como em “uma verdadeira ‘mustanásia’, morte de rato no esgoto (do grego mus, “rato”).” (BARCHIFONTAINE, 2002, p.289) Já para Leonard M. Martin, além de ser conceituada como eutanásia social, a qual corresponde à morte miserável, fora e antes da hora, abrange três situações: [...] primeira, a grande massa de doentes e deficientes que, por motivos políticos, sociais e econômicos, não chegam a ser pacientes, pois não conseguem atendimento médico; Segunda, os doentes que conseguem ser pacientes, para, em seguida, se tornar vítimas de erro médico; Terceira, os pacientes acabam sendo vítimas de máprática por motivos econômicos, científicos ou sócio-políticos. É a categoria que nos permite levar a sério o fenômeno da maldade humana. (MARTIN apud SÁ, 2005, p. 40). Segundo este autor, a mistanásia não é morte boa, suave ou indolor. 2.3 Distanásia Distanásia denomina-se também de “intensificação terapêutica”, “futilidade terapêutica”, ainda que seja mais correto conceituá-la de “obstinação terapêutica”. Segundo Rodrigues (1993), a distanásia pode ser conceituada de contra-eutanásia. A distanásia, que do grego dis, “mal, algo mal feito”, e thánatos, “morte”, é o antônimo do termo eutanásia, se for tomado o significado literal ou etimológico das palavras quanto a sua origem grega. No qual consiste em atrasar o mais possível o momento da morte usando todos os meios, proporcionados ou não, ainda que não haja esperança alguma de cura, e ainda que isso signifique infligir, ao paciente, sofrimentos adicionais e que, obviamente, não conseguirão afastar a inevitável morte, mas apenas atrasá-la umas horas ou uns dias em condições deploráveis para o enfermo. (BARCHIFONTAINE, 2002) Em outras palavras, a distanásia corresponde à decisão de não renunciar ao denominado excesso terapêutico, ou seja, determinadas intervenções médicas que somente visam prolongar o sofrimento e a espera da morte, tais medidas já são inadequadas à situação que o paciente se enquadra, visto que não proporcionam resultados satisfatórios que se poderiam esperar ou que causam graves danos para ele e sua família. O exagero das práticas médicas que não conduz a qualquer resultado positivo, reiteradamente tentado, visto que é contrário ao princípio da dignidade da pessoa humana, ao 14 passo que “A distanásia, [...], dedica-se a prolongar, ao máximo, a quantidade de vida humana, combatendo a morte como grande e último inimigo”. (SÁ, 2005, p. 39) Para Diniz (2007), a distanásia consiste em um procedimento de “obstinação terapêutica”, em que a morte será lenta e com intenso sofrimento. Tal procedimento é conseqüência do extremo avanço tecnológico, em que tornou possível manter uma pessoa viva mesmo em estado terminal por longos períodos ou até indefinidamente. Desta forma, isto somente é possível com os inúmeros aparelhos de sustentação artificial da vida. Para Barchifontaine (2002, p. 289), distanásia é a “morte afastada, distanciada”. Isto é, corresponde ao “prolongamento artificial da vida, para além do que seria o processo biológico comum: é o “encarniçamento terapêutico”, procurando protelar, custe a que custar, ao máximo a morte biológica.” Por fim, Leonard M. Martin nos ensina que a distanásia erra por outro lado, não conseguindo discernir quando intervenções terapêuticas são inúteis e quando se deve deixar a pessoa abraçar em paz a morte como desfecho natural de sua vida (...). A distanásia, que também é caracterizada como encarniçamento terapêutico ou obstinação ou futilidade terapêutica, é uma postura ligada especialmente aos paradigmas tecnocientífico e comercialempresarial da medicina (...). Os avanços tecnológicos e científicos e os sucessos no tratamento de tantas doenças e deficiências humanas levaram a medicina a se preocupar cada vez mais com a cura de patologias e a colocar em segundo plano as preocupações mais tradicionais com o cuidado do portador das patologias. (MARTIN apud SÁ, 2005, p. 40) Portanto, verificamos que a distanásia corresponde ao excesso de medidas terapêuticas que implica em extremo sofrimento e dor ao paciente, no entanto, tais medidas não conseguem mudar o quadro clínico do paciente ou sequer melhorar seu prognóstico. (DINIZ, 2007) Assim, referimos sempre ao paciente terminal perante a iminência de uma morte inevitável, em que médicos e pacientes devem saber que é lícito conformarem-se com os meios normais que a medicina pode oferecer e que a recusa dos meios excepcionais ou desproporcionados não equivale ao suicídio ou à omissão irresponsável da ajuda devida a outrem. Essa recusa significa apenas a aceitação da condição humana, que se caracteriza também pela inevitabilidade da morte. Contudo, verificamos que a prática da distanásia é utilizada indiscriminadamente nos hospitais brasileiros, ao fundamento de que o direito à vida é bem jurídico indisponível, devendo a sociedade e o Estado lutarem para que ninguém possa rompê-lo, principalmente o próprio indivíduo. Ao argumento de que esse indivíduo deve somente se conformar com a 15 prevalência desse preceito, tido como absoluto, no qual se sobreporia sob todos os outros princípios fundamentais e constitucionais expressos e implícitos na CR/88. 2.4 Suicídio Assistido A eutanásia não deve ser confundida com o suicídio assistido. Assim, Asúa (1929) entende que embora se considere a eutanásia como “direito de morrer sem dor”, ela não pode se confundir, juridicamente, com o verdadeiro “direito de morrer”, que constitui o suicídio. Segundo Diniz (2007), no suicídio assistido o próprio paciente é apenas assistido em sua morte, em que todos os atos para a sua realização são feitos por ele. Já na eutanásia, os atos de preparação e execução da morte do paciente serão realizados por terceiro. O suicídio assistido consiste na morte voluntária, em que a morte não está ligada com a ação ou omissão de terceiros, e sim, somente com a própria vontade do paciente. É a conseqüência de uma ação do paciente, independentemente se esse foi orientado, auxiliado ou apenas observado por terceiros. (SÁ, 2005) Desta forma, entendemos que não pode ser entendida como uma subespécie da eutanásia ativa, tal como entende Sabrina Zamboni, em sua obra Eutanásia: uma análise para o caso concreto. 16 3. ENFOQUE LEGISLATIVO DA EUTÁNASIA EM ALGUNS PAÍSES DO MUNDO Legislativamente, questões a respeito da legalização ou da proibição da prática da eutanásia sempre estiveram presentes em todos os países do mundo. Desta forma, pretendemos a seguir demonstrar tal discussão legislativa em alguns países da América e Europa. Não obstante, salientamos que a discussão sobre a legalização ou não da eutanásia teve seu apogeu em 1895, na época denominada Prússia, quando durante a discussão do seu plano nacional de saúde, foi proposto que o Estado deveria prover os meios para a realização da eutanásia em pessoas que se tornaram incompetentes para solicitá-la. (GOLDIM, 2000) 3.1 Reconhecimento da eutanásia ativa como direito individual Alguns países começaram a “flexibilizar” suas normas em relação à eutanásia, incluída a ativa, uma vez que cada vez mais a biotecnologia pode apurar quais são os casos em que há possibilidade de reversão do quadro clínico daqueles que não. (ROCHA, Cármen, 2004) Doravante, alguns países europeus, tais como Holanda, Bélgica e França, legalizaram a prática da eutanásia ativa mediante promulgação de lei. 3.1.1 Holanda Em 1993, o Parlamento holandês sancionou mediante lei – em que quase legalizou a eutanásia – em que declarava que os médicos poderiam matar seus pacientes, independentemente de solicitação, desde que observados os procedimentos e as restrições estabelecidos pela lei. (DWORKIN, 2003) Entretanto, tal lei impediu que os médicos que a praticassem nestas condições fossem processados, bem como no que tange ao suicídio assistido. (ZAMBONI, 2007) Desde 1997, a Holanda já vivia em situações de tolerância, no que tange à medida. Desta forma, de acordo com Goldim (2003a), já em 1990, o Ministério da Justiça e a Real 17 Associação Médica Holandesas entraram em acordo visando estabelecer procedimento de notificação da prática da eutanásia, tornando-a aceita embora ainda não legalizada, eximindo o médico da acusação de homicídio. Portanto, foram estabelecidos três critérios, a saber, o médico não forneceria atestado de óbito por morte natural, devendo informar à autoridade médica legal a prática da eutanásia ou do suicídio assistido, mediante preenchimento de questionário; a autoridade médica local relataria a morte ao promotor do distrito, em que este analisaria se haveria ou não acusação contra aquela. Contudo, o médico não poderia ser acusado caso seguisse as recomendações estipuladas no julgamento do caso Postma pela Corte de Rotterdam, em 1981, ou seja, necessidade de solicitação para morrer pelo paciente, devidamente informado, mediante decisão voluntária; capacidade mental do paciente, para que a manifestação de vontade fosse válida; desejo de morrer com duração considerável, sofrimento físico ou mental inaceitável ou insuportável; obrigatoriedade de acompanhamento e consultoria prestados por um outro médico. Em 12 de abril de 2000, houve despenalização da prática da eutanásia, inclusive na modalidade ativa, e, por enquanto, corresponde ao único país que modificou os artigos 293 e 294 de seu Código Penal, respectivamente referente ao homicídio cometido a pedido da vítima e à assistência ao suicídio. (ZAMBONI, 2007) Tal lei está em plena vigência e estipula em seu artigo 293, in verbis: “a ação de pôr fim à vida de outrem não é passível de pena na medida em que for realizada por um médico que satisfaça os critérios de minúcia mencionados no artigo 2º (...) e que comunique ao médico legista do município.” (MASCHINO, 2006b) Desta forma, a Holanda foi o primeiro país europeu que reconheceu o direito à prática da eutanásia, mediante aprovação de lei em 10 de abril de 2001, entrando em vigor em janeiro de 2002. (ROCHA, Cármen, 2004) Conforme explicitado acima, para que a prática da eutanásia seja considerada legítima, é necessário o cumprimento de seis requisitos, a saber, o médico deve estar convencido de que o paciente fez seu pedido livremente; não deve haver qualquer perspectiva de melhora; deve apresentar sofrimento insuportável; o médico deve informar ao paciente sobre seu quadro clínico e seu prognóstico; o médico e o paciente, em comum acordo, concluem que não há possibilidade de melhora ou solução clínica; e por fim, um colega independente deste médico deve realizar uma consulta. Somente após o cumprimento de tais requisitos, pode-se praticar a eutanásia, mediante preenchimento de um formulário pelo médico. Tal formulário é a ultima formalidade a ser cumprida. Ao responder cerca de 50 questões, tal formulário é remetido ao delegado de polícia do município que o avalia minuciosamente. (MASCHINO, 2006b) 18 Conforme Goldim (2003a) houve, em 28 de novembro de 2000, uma lei na Holanda que [...] incorpora algumas novas questões, tais como a possibilidade de realizar este tipo de procedimento em menores de idade, a partir dos 12 anos. Dos 12 aos 16 anos a solicitação do paciente deve ser acompanhada pela autorização dos pais. Além dos critérios, já previamente em vigor, mais um foi incluído, o que estabelece que o término da vida deva ser feito de uma maneira medicamente apropriada. Em 11 de abril de 2001 o senado aprovou esta mesma lei. É importante ressaltar que hoje há na Holanda a permissão da prática da eutanásia, ao fundamento da existência de problemas psíquicos ou “simplesmente cansaço existencial muito grande”. (MASCHINO, 2006b) Ou seja, depressão profunda e até, em idosos deprimidos. (ZAMBONI, 2007) Apesar de ter sido legalizada somente em 2001, conforme acima exposto, segundo Zamboni (2007), não houve qualquer tipo de aumento dos casos de adoção da referida medida. 3.1.2 Bélgica No que tange a Bélgica, esta autorizou a prática da eutanásia mediante certas condições, isto é, segundo diretrizes determinadas pelo Comitê Nacional Consultivo de Bioética da Bélgica, após promulgação de uma lei em 16 de maio de 2002 – com vigência somente em 20 de setembro deste mesmo ano. (ROCHA, Cármen, 2004) Regulamentando, por sua vez, o artigo 78 de sua Constituição e definindo em seu artigo 2º a eutanásia como “ato, realizado por terceiros, que faz cessar intencionalmente a vida de uma pessoa a pedido desta.” (ZAMBONI, 2007, p. 131) Algumas condições de maior relevância dispostos na mencionada lei compreendem: Para que o ato do médico que pratica a eutanásia seja considerado legal, o artigo 3º exige que o profissional se tenha assegurado de que o paciente adulto ou menor emancipado tenha plena capacidade e consciência, no momento da realização do pedido, no momento da realização do mesmo; que ele seja ponderado e reiterado, não decorrendo de qualquer pressão externa; que a condição do paciente seja irreversível, caracterizando-se sofrimento físico ou mental constante e insuportável; que tenham sido atendidos todos os procedimentos estabelecidos em lei. (ZAMBONI, 2007, p. 131) 19 A mesma autora nos ensina que há garantia de revogação a qualquer momento do pedido de eutanásia. Faz-se importante estabelecer que, nos termos do artigo 4º da Lei, o paciente adulto ou menor emancipado poderá redigir declaração autorizando a prática da eutanásia pelo médico, nos casos em que houver superveniência de incapacidade. Tal declaração somente será considerada válida se manifestada cinco anos antes do momento em que se configurou a incapacidade. No entanto, a mesma lei, nos termos do artigo 14, estabelece que o pedido e a declaração antecipada em favor do procedimento não obrigam o médico. Este poderá recusar a prática da eutanásia, comunicando ao paciente ou à pessoa de confiança indicada por este, fundamentando sua decisão, sendo que se a recusa for fundamentada em ordem médica, esta deverá ser anotada nos registros médicos do paciente, bem como deverá, mediante requerimento do paciente ou de pessoa de confiança deste, transferir tais registros médicos para outro médico designado por qualquer destes. Já nos termos do artigo 15 desta lei, a morte pela eutanásia deverá ser considerada como morte natural, haja vista a execução de contratos privados de seguros se o paciente submetido à eutanásia os possuía. A legislação belga exclui a possibilidade desta prerrogativa aos menores de 18 anos, bem como garante aos necessitados o direito de requerer e obter do Estado os recursos para que possam vir a ser submetidos ao processo de eutanásia, mesmo não estando o paciente em fase terminal. Hipótese em que, ao contrário do que ocorre em determinados casos, as exigências de atestados médicos e do estado do paciente são desnecessários. (ROCHA, Cármen, 2004) Apesar da existência de projeto de lei belga há alguns anos, somente foi possível a sua promulgação após as eleições de 1999, mediante a formação de um governo de entendimento laico. Tal lei se deu mediante vários debates públicos, amplamente divulgados, com a presença de médicos, juristas e enfermeiros e pesquisas de opinião pública. Com efeito, como a lei não estabeleceu o modo pelo qual deve ser feita a eutanásia, entende-se que o suicídio assistido possa ser praticado. (MASCHINO, 2006b) Goldim (2003b) ensina que A lei belga é mais restritiva que a holandesa. Uma diferença fundamental é a garantia do anonimato presente na legislação belga. Outra é a exclusão da possibilidade de menores de 18 anos solicitarem este tipo de procedimento. Na Bélgica é dada a garantia de que uma pessoa que não tenha recursos possa ter a sua disposição os meios fornecidos pelo Estado para a realização da eutanásia. 20 3.1.3 França Na França, a eutanásia era considerada como crime homicídio voluntário. Em que 24 de junho de 1991, o Comitê Nacional Francês de Ética Médica condenou expressamente qualquer reforma que permitisse aos médicos de praticar a eutanásia por solicitação do paciente. (DWORKIN, 2003) Em 26 de janeiro de 1999, foi apresentado ao Senado francês projeto de lei n.º 166 que visava a despenalização da eutanásia, bem como projeto de lei tendente à legalizá-la, apresentada pela Association Pour la Prévention de L´Enfance Handicapée, no entanto, não obteve êxito. (ZAMBONI, 2007) Em 11 de maio de 2004, o governo da França promulgou uma lei n.º 297, Lei Relativa à Autonomia da Pessoa, ao Testamento Vital, à Assistência Medicalizada ao Suicídio e à Eutanásia Voluntária, que “define o direito de “deixar morrer” doentes incuráveis, com o consentimento dos mesmos”, caracterizando assim a legalização do suicídio assistido e da eutanásia voluntária. Possuindo condições semelhantes à Holanda e à Bélgica, entretanto, são inúmeras as condições impostas3 que, em nosso entendimento, inviabilizam a possibilidade de sua aplicação prática. (EUTANÁSIA..., 2006, ZAMBONI, 2007) Contudo, atualmente, a eutanásia ativa é tida como ilegal punida com o crime de homicídio, bem como o suicídio assistido com o crime de abandono de pessoa em perigo, não tendo reconhecimento legal o testamento vital. (ZAMBONI, 2007) Bem como promulgou uma lei em 12 de abril de 2005, a respeito dos direitos dos doentes terminais, em que verificamos a instituição da eutanásia passiva – recusa ou interrupção do tratamento médico – e da eutanásia indireta – administração de analgésicos para conter a dor e sofrimento, e conseqüentemente, causar a morte. Assim, mediante previsão legal, o paciente deve recusar o tratamento oferecido e para que tal recusa se concretize, deve haver convencimento de dois médicos de que sua decisão é irrevogável. No entanto, se tais médicos interromperem o tratamento, estes deverão ministrar a este paciente cuidados paliativos, conforme artigo 6º da referida lei. Desta forma, deve-se fazer de tudo para que o paciente não exercite tal direito previsto. Tal lei exclui a possibilidade de morte voluntária. (MASCHINO, 2006a) 3 Ver condições impostas pela Lei n.º 297 de 2004, em ZAMBONI, 2007, p. 136-142. 21 3.2 Proibição à prática da eutanásia “Na maioria dos paises europeus, o direito atual não contempla disposições legislativas que viabilizem legalmente os testamentos de vida ou as procurações para a tomada de decisões em questões medicas [...].” (DWORKIN, 2003, p. 254) Desta forma, alguns países da Europa e da América que ainda não legalizaram a eutanásia ativa são: Uruguai, Portugal, Brasil, Argentina, Alemanha, Noruega, Áustria. Em que, no Brasil, “a prática é proibida e o médico deve fazer de tudo para manter o paciente vivo.” (MÉDICO..., 2006) Tal obstinação médica consiste na prática indiscriminada da distanásia, conforme expusemos anteriormente. 3.2.1 Uruguai Em 1934, o Uruguai incluiu em seu Código Penal, em seu artigo 37, a possibilidade da eutanásia ativa através da denominação de "homicídio piedoso". Tal legalização persiste até o presente momento no Estado Uruguaio, in verbis: Art. 37. Del homicidio piadoso: Los Jueces tienen la facultad de exonerar de castigo al sujeto de antecedentes honorables, autor de un homicidio, efectuado por móviles de piedad, mediante súplicas reiteradas de la víctima4. (CÓDIGO PENAL URUGUAIO, 1934) Desta forma, verificamos que tal faculdade somente cabe ao Juiz quando observar três requisitos concomitantemente, a saber, aquele que realizou o procedimento deve ter antecedentes honráveis, deve haver motivo de piedade à vítima e súplicas reiteradas desta. Assim, não há de se falar em autorização à prática da eutanásia ativa e sim, perdão judicial. Outrossim, o artigo 315 do Código Penal Uruguaio de 1934 dispõe sobre a tipificação da prática de prestação de auxilio ao suicídio à vitima, mesmo havendo os requisitos acima mencionados, tornando ilegal a prática do suicídio assistido. 4 Art. 37 – Do Homicídio Piedoso: Os Juízes têm a faculdade de exonerar do castigo, o sujeito de antecedentes honráveis, que pratica homicídio efetuado por motivos de piedade, mediante súplicas reiteradas da vítima. 22 3.2.2 Portugal Portugal em seu Código Penal de 1982, nos artigos 132, 133, 134 e 138, no Título I, Capítulo I – dos crimes contra a vida, faz severas penalizações a respeito à prática da eutanásia. Assim, aborda no artigo 132 a eutanásia eugênica, no artigo 133 e 134 aborda a prática da eutanásia ativa e por fim, no artigo 138 aborda a eutanásia passiva, in verbis: Artigo 132º - Homicídio qualificado 1 - Se a morte for produzida em circunstâncias que revelem especial censurabilidade ou perversidade, o agente é punido com pena de prisão de 12 a 25 anos. 2 - É susceptível de revelar a especial censurabilidade ou perversidade a que se refere o número anterior, entre outras, a circunstância de o agente: a) Ser descendente ou ascendente, adoptado ou adoptante, da vítima; b) Praticar o facto contra pessoa particularmente indefesa, em razão da idade, deficiência, doença ou gravidez; c) Empregar tortura ou acto de crueldade para aumentar o sofrimento da vítima; d) Ser determinado por avidez, pelo prazer de matar ou de causar sofrimento, para excitação ou para satisfação do instinto sexual ou por qualquer motivo torpe ou fútil; e) Ser determinado por ódio racial, religiosos ou político; f) Ter em vista preparar, facilitar, executar ou encobrir um outro crime, facilitar a fuga ou assegurar a impunidade do agente de um crime; g) Praticar o facto juntamente com, pelo menos, mais duas pessoas ou utilizar meio particularmente perigoso ou que se traduza na prática de crime de perigo comum; h) Utilizar veneno ou qualquer outro meio insidioso; i) Agir com frieza de ânimo, com reflexão sobre os meios empregados ou ter persistido na intenção de matar por mais de vi nte e quatro horas; j) Praticar o facto contra membro de órgão de soberania, do Conselho de Estado, Ministro da República, magistrado, membro de órgão do governo próprio das Regiões Autónomas ou do território de Macau, Provedor de Justiça, governador civil, membro de órgão das autarquias locais ou de serviço ou organismo que exerça autoridade pública, comandante de força pública, jurado, testemunha, advogado, agente das forças ou serviços de segurança, funcionário público, civil ou militar, agente de força pública ou cidadão encarregado de serviço público, docente ou examinador, ou ministro de culto religioso, no exercício das suas funções ou por causa delas; l) Ser funcionário e praticar o facto com grave abuso da autoridade. (Redacção da Lei nº 65/98, de 2 de Setembro) Artigo 133º - Homicídio privilegiado Quem matar outra pessoa dominado por compreensível emoção violenta, compaixão, desespero ou motivo de relevante valor social ou moral, que diminuam sensivelmente a sua culpa, é punido com pena de prisão de 1 a 5 anos. Artigo 134º - Homicídio a pedido da vítima 1 - Quem matar outra pessoa determinado por pedido sério, instante e expresso que ela lhe tenha feito é punido com pena de prisão até 3 anos. 2 - A tentativa é punível. Artigo 138º - Exposição ou abandono 23 1 - Quem colocar em perigo a vida de outra pessoa: a) Expondo-a em lugar que a sujeite a uma situação de que ela, só por si, não possa defender-se; ou b) Abandonando-a sem defesa, sempre que ao agente coubesse o dever de a guardar, vigiar ou assistir; 2 - Se o facto for praticado por ascendente ou descendente, adoptante ou adoptado da vítima, o agente é punido com pena de prisão de 2 a 5 anos. 3 - Se do facto resultar: a) Ofensa à integridade física grave, o agente é punido com pena de prisão de 2 a 8 anos; b) A morte, o agente é punido com pena de prisão de 3 a 10 anos. (Redacção da Lei nº 65/98, de 2 de Setembro) (CÓDIGO PENAL PORTUGUÊS, 1982) 3.2.3 Brasil No Brasil, apesar da eutanásia ativa nos Códigos Penais de 1830 e 1890, artigos 196 e 299, respectivamente, não ser mencionada em seus dispositivos legais, capitulavam o suicídio, “que serviria para qualquer julgamento com relação àquela prática”. (RODRIGUES, 1993, p. 125) Art. 196 – Ajudar alguém a suicidar-se ou fornecer meios para esse fim com o conhecimento de causa – pena de prisão de dois a seis anos. Art. 299 – Induzir ou ajudar alguém a suicidar-se, ou para esse fim fornecer-lhe meios com conhecimento de causa – pena de prisão celular por dois a quatro anos. (RODRIGUES, 1993, p. 125) Atualmente, a prática da eutanásia é vista em nosso ordenamento jurídico vigente como homicídio simples, com causa de diminuição de pena, denominado de homicídio privilegiado, devido ao relevante valor moral da conduta, apesar de não haver qualquer dispositivo expresso quanto à conduta. Contudo, houve algumas tentativas de mudanças tanto no Código Penal Brasileiro como também na Constituição da Republica, porém, até o presente momento, nenhuma obteve êxito: [...] a comissão de juristas que trabalhou na elaboração do anteprojeto de reforma do Código Penal (vigente desde 1942) não só incluiu a previsão da eutanásia no artigo 121, como trouxe à baila norma penal explicativa no sentido de classificar como atípica a chamada eutanásia passiva ou ortotanásia. Esta passa a ser entendida como mero exercício regular da medicina. (SÁ, 2005, p. 129) 24 Houve tentativa frustrada de introduzir o §6º ao artigo 121 do Código Penal, pela Subcomissão de Reforma da Parte Especial de 1993, in verbis: §6º - Não constitui crime a conduta de médico que omite ou interrompe terapia que mantém artificialmente a vida da pessoa, vítima de enfermidade grave e que, de acordo com o conhecimento médico atual, perdeu irremediavelmente a consciência ou nunca chegará a adquiri-la. A omissão ou interrupção da terapia devem ser precedidas de atestação, por dois médicos, da iminência e inevitabilidade da morte, do consentimento expresso do conjugue, do companheiro em união estável, ou na falta, sucessivamente do ascendente, do descendente ou do irmão e de autorização judicial. Presume-se concedida a autorização, se feita imediata conclusão dos autos ao juiz, com as condições exigidas, o pedido não for por ele despachado no prazo de três dias. (SÁ, 2005, p. 129) Destaca-se também o Anteprojeto da Reforma da parte especial do Código Penal de 1984, no qual previa no parágrafo único ao artigo 121, isenção de pena para o médico que antecipa a morte inevitável e iminente, com o consentimento da vítima, ou, na sua impossibilidade, de ascendente, descendente, cônjuge ou irmão, a fim de eliminar-lhe o sofrimento, desde que atestada por outro médico, no entanto, não foi aprovado. (ZAMBONI, 2007) Ainda se discute o assunto por meio do projeto de reforma do Código Penal, que se arrasta na Câmara dos Deputados. (FERREIRA, 2005) Ou seja, o Anteprojeto de Lei em 1998 que altera os dispositivos do vigente Código Penal, legislando sobre a questão da eutanásia no artigo 121, mediante a inclusão dos parágrafos 3 e 4, que dispõem: Eutanásia: Parágrafo 3º - Se o autor do crime agiu por compaixão, a pedido da vítima imputável e maior, para abreviar-lhe o sofrimento físico insuportável, em razão de doença grave: Pena - Reclusão, de três a seis anos. Exclusão de Ilicitude: Parágrafo 4º - Não constitui crime deixar de manter a vida de alguém por meio artificial, se previamente atestada por dois médicos, a morte como iminente e inevitável, e desde que haja consentimento do paciente, ou na sua impossibilidade, de ascendente, descendente, cônjuge, companheiro ou irmão. (SÁ, 2005, p. 129-130) Outrossim, há tramitação do projeto de lei n.º 5.058 de 2005, de autoria do deputado Osmânio Pereira, em que regulamenta o art. 226, § 7º, da Constituição da República, dispondo sobre a inviolabilidade do direito à vida, definindo a eutanásia e a interrupção voluntária da gravidez como crimes hediondos, em qualquer caso. Prevendo assim, a eutanásia no parágrafo único acrescido ao art. 122 do Código Penal, sua punição como crime, de forma expressa. (CONGRESSO NACIONAL, 2005) 25 No entanto, em 1996 houve no Senado Federal um projeto de lei n.º125/1996, de autoria do Senador Gilvam Borges, em que estabelecia critérios para a legalização da "morte sem dor", no entanto, este projeto caducou. (SENADO FEDERAL, 1996) Tal projeto previa a possibilidade de que pessoas com sofrimento físico ou psíquico poderiam solicitar que fossem realizados procedimentos que objetivassem a sua própria morte. A autorização para estes procedimentos seria dada por uma junta médica, composta por 5 membros, sendo dois especialistas no problema do solicitante. Caso o paciente estivesse impossibilitado de expressar a sua vontade, um familiar ou amigo poderia solicitar à Justiça tal autorização. (SENADO FEDERAL, 1996) Porém, entendemos que em todos os projetos acima descritos não foram ou são pertinentes, uma vez que não respeitam disposição expressa na Magna Carta Brasileira, com relação à aplicação do princípio da dignidade da pessoa humana, no que tange à proibição da eutanásia, e, uma vez que a possibilidade de legalização do instituto acima somente contemplou as hipóteses de consentimento do paciente, esquecendo-se daquele que apesar de não possuir capacidade de manifestação de vontade atual, em época passada se manifestou a favor da conduta, seja por meio de documento escrito ou não. É importante observar que, no estado de São Paulo, uma lei sancionada, pelo então governador Mário Covas, estabelece que o doente terminal tem o direito de recusar o prolongamento de sua agonia, mediante a recusa do tratamento, e de optar pelo local de sua morte. (FERREIRA, 2005) 3.2.4 Argentina A Argentina, tanto antes quanto após a alteração do Código Penal, em 1967, não há qualquer tipo de disposição referente à eutanásia, permanecendo, no entanto, como crime de homicídio simples, subsumindo-se no disposto do artigo 79, ou homicídio qualificado, nos termos do artigo 80, ou mesmo homicídio em estado de emoção violenta, conforme o artigo 81, inciso I, todos do Código Penal Argentino, não havendo qualquer atenuação de pena pelo fato da conduta ser realizada a pedido da vítima. (ZAMBONI, 2007) Conforme a mesma autora, a legislação argentina não impede que a pessoa competente possa recusar tratamento médico, por considerá-lo prática de distanásia. Tal possibilidade de 26 recusa decorre da Lei n.º 17.132, em seu artigo 19, inciso III, vigente apenas na cidade de Buenos Aires, em que regula o exercício da medicina. Para alguns doutrinadores argentinos, a prática do suicídio assistido se enquadra como crime de instigação ou ajuda ao suicídio, nos termos do artigo 83 do mencionado código. (ZAMBONI, 2007; CÓDIGO PENAL ARGENTINO, 1921) Desta forma, verificamos que a Argentina não admite a eutanásia ativa e passiva, além do suicídio assistido. 3.2.5 Alemanha Na Alemanha, em 1903, o Parlamento da Saxônia recusou a eutanásia. (RODRIGUES, 1993) Atualmente, qualquer tipo de eutanásia é ilegal na Alemanha, mesmo que uma pessoa manifeste seu consentimento sincero, havendo disposição expressa no artigo 216, §1º do Código Penal alemão, mediante a figura da morte a requerimento, “homicídio a pedido”, ou seja, caso privilegiado de homicídio voluntário, com pena privativa de liberdade de seis meses a cinco anos. (RODRIGUES, 1993; ZAMBONI, 2007) No entanto, permite-se a prática do suicídio assistido nos casos em que o paciente expresse seu desejo de morrer e ele mesmo o pratique. (MÉDICO..., 2006; EUTANÁSIA..., 2006) Apesar disso, cada vez mais se encontra tolerante a população alemã no que tange à prática da eutanásia em doentes terminais, “presumivelmente incuráveis, gravemente doentes ou que perderam toda alegria de viver.” (ZAMBONI, 2007, p. 144) Embora, em 1935, entrou em vigor uma lei que concedia aos doentes terminais o direito de colocar um fim aos sofrimentos incontroláveis, no entanto, sua aplicação foi desvirtuada. (ZAMBONI, 2007) Desta forma, iniciou-se o programa nazista de eugenia, delineada por Adolf Hitler, sob o código "Aktion T 4", em que para alguns era entendido como prática indiscriminada da eutanásia. Esta proposta buscava justificar a eliminação de deficientes físicos, portadores de males genéticos, pacientes terminais ou com idade avançada e portadores de doenças consideradas indesejáveis. (GOLDIM, 2000) 3.2.6 Noruega 27 Na Alemanha, Itália, Suíça, Dinamarca, Noruega e Polônia, a eutanásia é classificada não como assassinato intencional, mas como “homicídio a pedido”, e resulta em uma pena mais branda: na Alemanha, por exemplo, aplica-se uma pena de seis meses a cinco anos de prisão, e a motivação é um fator atenuante. Na Dinamarca, ao contrário, a pena é de detenção simples de sessenta dias a três anos. (LYNN TRACY NERLAND apud DWORKIN, 2003, p. 254, n3). Atualmente, a Noruega permite somente a eutanásia passiva a pedido do paciente ou de seus familiares. (EUTANÁSIA..., 2006) A eutanásia ativa é proibida no artigo 235 do Código Penal da Noruega de 1902, em que atenua a pena de quem tira a vida de outrem, por compaixão, que possui doença incurável. (RODRIGUES, 1993; DWORKIN, 2003) 3.2.7 Áustria Na Áustria, em 1934, foi realizado modificações em seu Código Penal, no qual dispõe no artigo 77, a criação da figura da morte por requerimento, com pena privativa de liberdade de seis meses a cinco anos. (RODRIGUES, 1993) Atualmente neste país, a conduta da eutanásia ainda é repudiada. No entanto, a prática do suicídio assistido é permitida nos casos em que o paciente expresse seu desejo de morrer e ele mesmo o pratique. (MÉDICO..., 2006; EUTANÁSIA..., 2006) 28 4. A EUTANÁSIA ATIVA E SUA “TIPICIDADE” NO CÓDIGO PENAL BRASILEIRO VIGENTE A vida é um dos valores inerentes à pessoa humana, em que antigamente era respeitada costumeiramente de acordo com as características culturais de cada sociedade, e não, devido disposição normativa, no entanto, com o passar dos séculos o direito à vida passou a ser reconhecido e protegido como bem jurídico. O Brasil desde 1830 atribui pena de homicídio àquele que a desrespeita, contudo, a garantia ao direito à vida somente foi constitucionalmente considerada pela atual CR/88, em seu artigo 5º, caput. (SÁ, 2005) Atualmente no ordenamento jurídico brasileiro, a maioria da doutrina entende que a eutanásia ativa é considerada crime utilizando-se a tipificação legal disposta no artigo 121, § 1º do CPB, comumente denominado de homicídio privilegiado, para a sua prática na ausência absoluta ou relativa ou em face da anuência do paciente em estado terminal, que apresenta quadro clínico irreversível, o qual pede o fim de sua vida. O Código Penal Brasileiro vigente assim dispõe: Art. 121 – Matar alguém: Pena – reclusão, de 06 (seis) meses a 20 (vinte) anos. Caso de Diminuição de Pena: §1º - Se o agente comente o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena em um sexto a um terço. (CÓDIGO PENAL, 1940, grifo nosso) Conforme o entendimento doutrinário, o tipo acima descrito, em seu §1º, apresenta três tipos independentes entre si de causas de diminuição de pena, a saber, relevante valor social; relevante valor moral; e sob o domínio de violenta emoção. Em que somente nesta última causa é necessária comprovação do elemento temporal, isto é, logo em seguida e da contribuição da vítima compreendendo a injusta provocação da vítima. Não obstante tal entendimento, a prática da eutanásia ativa se enquadraria na causa de diminuição de pena no que diz respeito ao relevante valor moral da conduta praticada, no entanto, em virtude do princípio da legalidade e do ponto de vista hermenêutico, não se funda tal argumentação proposta pela doutrina. 29 Desta forma, de acordo com o princípio da legalidade, ou também denominado princípio da reserva legal5, isto é, princípio hoje fundamental do Direito Penal, tal tipificação não pode ser utilizada para a imputação de crime e de pena à prática da eutanásia ativa, ao fundamento de que o crime acima tipificado deve conter todos os seus elementos descritos no tipo penal, a saber, matar alguém por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, desde que seja logo em seguida a injusta provocação da vítima. Tal princípio está disposto no artigo 5º, inciso XXXIX, da CR/88 e no artigo 1º do CPB, em que corresponde ao enunciado “Nullum crimen, nulla poena sine lege praevia, scripta et stricta”, assim definindo-o, “Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal.” (CÓDIGO PENAL, 1940) Portanto, verificamos que não há de se falar em injusta provocação da vítima, visto que a vítima, ou seja, o paciente em estado terminal, não possui em nenhuma hipótese meios capazes de concretizar a referida injusta provocação, independentemente de esse possuir ou não consciência para o ato, uma vez que seu objetivo primordial consiste em por fim em sua vida o mais rápido possível. Com efeito, é importante salientar que as possíveis “agressões” realizadas pelo paciente não podem ser entendidas como injusta provocação, no que tange a prática da eutanásia ativa, uma vez que o agente deve agir PURA e SIMPLESMENTE na tentativa de aliviar a dor e o sofrimento do paciente, havendo assim intenso sentimento humanitário e piedoso, não consistindo em reação a uma ação sofrida. Outrossim, a prática da eutanásia ativa não tem como elemento característico uma reação praticada em decorrência de uma ação sofrida. No entanto, a conduta praticada será tipificada e qualificada nos termos do artigo 121, §2º do CPB, não caracterizando a prática da eutanásia ativa, nos casos em que o agente for movido por sentimento diverso daquele característico da conduta acima descrito, bem como objetivar fim diverso, a não ser o alívio do sofrimento do paciente. Outra argumentação proposta consiste na estrutura do delito, delineada pela Teoria Jurídica do Delito, em que pauta-se pela presença dos elementos da tipicidade, da ilicitude e da culpabilidade: Tipicidade: é a adequação ou subsunção do caso concreto com o modelo previsto em lei; 5 Mais detalhes a este respeito podem ser encontrados em Prado (2002, p. 111) e Bitencourt (2004, p. 10) 30 Ilicitude: também denominada de antijuridicidade, “é a base do injusto penal” (PRADO, 2002, p. 289), ou seja, é a realização de TODA a conduta descrita pelo tipo penal, salvo aquelas que concorrem com causas de justificação, em que existindo tais causas, uma conduta típica será lícita; Culpabilidade: consiste na reprovabilidade ou não-aprovação pessoal da conduta realizada (ação ou omissão) ilícita e típica. Tais elementos acima descritos formam o tipo penal, que corresponde à “descrição abstrata de um fato real que a lei proíbe (tipo incriminador).” (PRADO, 2002, p. 289) Tal conceito é muito bem delineado por Cézar Bitencourt, que assim dispõe: Tipo é o conjunto dos elementos do fato punível descrito na lei penal. O tipo exerce uma função limitadora e individualizadora das condutas humanas penalmente relevantes. É uma construção que surge da imaginação do legislador, que descreve legalmente as ações que considera, em tese, delitivas. Tipo é um modelo abstrato que descreve um comportamento proibido. Cada tipo possui características e elementos próprios que os distinguem uns dos outros, tornando-os todos especiais, no sentido de serem inconfundíveis, inadmitindo-se a adequação de uma conduta que não lhes corresponda perfeitamente. Cada tipo desempenha uma função particular, e a ausência de um tipo não pode ser suprida por analogia ou interpretação extensiva. (BITENCOURT, 2004, p. 245, grifo nosso) Desta forma, o tipo penal deve conter requisitos para que possa ser imputado a alguém, a saber, o preceito fundamental primário que estabelece que o tipo penal deve dispor uma conduta com todos os seus elementos, também denominados de tipos objetivo e subjetivo. O tipo objetivo é composto de um núcleo (verbo – ação ou omissão) e de elementos secundários ou complementares (ex.: sujeitos – ativo ou passivo; objeto da ação; bem jurídico; nexo causal; resultado; circunstancias de tempo, lugar, meio, modo de execução). O tipo objetivo representa a exteriorização da vontade (aspecto externoobjetivo). É, pois, “o núcleo real-material de todo delito”. (PRADO, 2002, p.293). O tipo subjetivo compreende “o conjunto dos caracteres subjetivos ou anímicos do tipo”, “as circunstâncias que pertencem ao campo psíquico-espiritual e ao mundo de representação do autor”. (PRADO, 2002, p.293 e 295). Com efeito, o tipo subjetivo corresponde aos elementos subjetivos integrantes do tipo, a saber, o dolo e a culpa, bem com suas espécies e modalidades. E o preceito fundamental secundário, em que corresponde à vinculação de uma pena correspondente à conduta praticada. Isto posto, verificamos que aquele que pratica eutanásia ativa, com ou sem consentimento do paciente em estado terminal que apresenta quadro clínico irreversível, não 31 se enquadra em nenhum dispositivo legal penal, uma vez que o preceito fundamental primário do artigo 121 do CPB não abrange objetivamente a conduta da eutanásia. Consistindo em obscuridade legal, isto é, atipicidade da conduta, e impossibilidade de imputação penal àquele que pratica nos moldes que oportunamente descreveremos, para que se possa inibir a conduta criminosa e, simplesmente, se preze a conduta humanitária e piedosa. Portanto, em nosso entendimento, há no tipo penal descrito a exigência da conduta ser logo em seguida a injusta provocação da vítima, além do relevante valor moral, para se ensejar qualquer tipificação da conduta da eutanásia ativa no âmbito penal. Aqueles que defendem a prática da eutanásia como homicídio simples com caso de diminuição de pena – artigo 121, §1º, do CPB – utilizam-se simplesmente de uma adequação do mencionado tipo penal à conduta praticada na eutanásia, isto é, somente há a ocorrência da seguinte parte descritiva do tipo penal analisado: “Se o agente comente o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção”, não havendo, assim, qualquer argumentação jurídica (penalmente aceitável) ao caso, como já foi demonstrado. Não obstante, verificamos que a conduta ilícita que deve ser devidamente enquadrada no tipo penal e não o contrário, para se evitar arbitrariedades legais. Com efeito, deve haver adequação do fato ou da conduta praticada ao dispositivo legal: “A função do tipo é definir delitos. Constatada a adequação do fato à norma penal incriminadora, [...].” (BITENCOURT, 2004, p. 241, grifo nosso). Bem como “Um fato para ser adjetivado de típico precisa adequar-se a um modelo na lei penal, isto é, a conduta praticada pelo agente deve subsumir-se na moldura descrita na lei.” (BITENCOURT, 2004, p. 247, grifo nosso) Por fim, tal adequação poderá operar-se de forma imediata ou de forma mediata, isto é: A adequação típica imediata ocorre quando o fato se subsume imediatamente no modelo legal, sem a necessidade da concorrência de qualquer outra norma, como, por exemplo, matar alguém: essa conduta praticada por alguém amoldase imediatamente ao tipo descrito no art. 121 do CP, sem precisar do auxílio de nenhuma outra norma jurídica. No entanto, a adequação típica mediata, que constitui exceção, necessita da concorrência de outra norma, secundária, de caráter extensivo, que amplie a abrangência da figura típica. Nesses casos, o fato praticado pelo agente não vêm a se adequar direta e imediatamente ao modelo descrito na lei, o que somente acontecerá com o auxílio de outra norma ampliativa, como ocorre, por exemplo, com a tentativa e a participação em sentido estrito. (BITENCOURT, 2004, p. 247, grifo nosso) 32 Faz-se necessário subsumir as condutas reais ao determinado tipo penal, a fim de constatar sua tipicidade ou atipicidade. (PRADO, 2002) Tal conduta é necessária face ao princípio constitucional da segurança jurídica, disposto no artigo 5º, inciso XXXVI, da CR/88. Isto posto, faz-se necessário o seguinte questionamento: É possível a atribuição de pena JURÍDICA à prática da eutanásia ativa? É necessário vislumbrar que não estamos questionando a atribuição de qualquer pena moral advinda da sociedade de modo geral. 33 5. ANÁLISE DO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA Se a vida lhe pertence [...], porque não há de lhe pertencer sua morte, já que esta é parte integrante daquela? MARIA DE FÁTIMA FREIRE DE SÁ Etimologicamente, dignidade do latim dignitas, apresenta conceito “adotado desde o final do século XI, significando cargo, honra ou honraria, título, além de poder ser considerado no sentido de postura socialmente conveniente diante de determinada pessoa ou situação”, de que alguém se faz titular. (ROCHA, Cármen, 2004, p. 34) A mesma autora nos ensina que a partir do século XVIII, a dignidade da pessoa humana passou a ser objeto de reivindicação política, apresentando o mesmo conceito atualmente posto, isto é, referindo-se à condição inerente à própria pessoa humana. A discussão a respeito do principio da dignidade da pessoa humana teve seu apogeu, principalmente, a partir da experiência do holocausto em que se buscava a manutenção da vida humana, não somente que o individuo permanecesse vivo, mas sim que houvesse respeito e garantia do viver com dignidade, uma vez que a história, especialmente no curso do século XX, mostrou a possibilidade de romper com o processo do viver com dignidade sem que houvesse eliminação física, em que necessário se faz entender que a desumanização atinge não somente o indivíduo que sofre a ação, mas, toda a humanidade. O nascimento constitucional do princípio da dignidade da pessoa humana se deu mediante os desastres humanos, principalmente no que tange à Segunda Grande Guerra Mundial, tornando-se matriz no direito contemporâneo em Auchwitz. Após o acontecimento narrado, verificamos que o referido princípio encontra-se expressamente disposto no preâmbulo da Carta das Nações Unidas, em que “nós, os povos das Nações Unidas, resolvidos a preservar as gerações vindouras do flagelo da guerra, que por duas vezes, no espaço da nossa vida, trouxe sofrimentos indizíveis à humanidade, e a reafirmar a fé nos direitos fundamentais do homem, na dignidade e no valor do ser humano, na igualdade dos direitos dos homens e das mulheres, assim como nas nações grandes e pequenas[...]”; no preâmbulo e no artigo 1º da Declaração dos Direitos do Homem, em 1948, feita pela ONU, respectivamente, “considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis constitui o 34 fundamento da liberdade, [...]” e “Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos [...]”; no artigo 1º da Lei Fundamental da República Alemã, de 1949; (ROCHA, Cármen, 2004, p. 35-36) e na primeira parte do artigo 3º da Constituição da República Italiana, de 1947, entre outros ordenamentos. (ZAMBONI, 2007) Desta forma, verificamos que A inserção constitucional dos princípios ultrapassa, de último, a fase hermenêutica das chamadas normas programáticas. Eles operam nos textos constitucionais da segunda metade deste século uma revolução de juridicidade sem precedente nos anais do constitucionalismo. De princípios gerais se transformaram, já, em princípios constitucionais. Em verdade, fora até então a carência de normatividade o entendimento a que se abraçava a Velha Hermenêutica constitucional, doravante a caminho de uma abrogação doutrinária irremediável. (BONAVIDES, 2005, p. 259) Desta forma, constitui-se em princípio fundante do constitucionalismo contemporâneo, inclusive expresso na CR/88, apresentando fundamentos tais como a integridade, intangibilidade e inviolabilidade do homem, não somente do ponto de vista físico, como também em todas as dimensões existenciais. Tal entendimento coloca o ser humano no “centro das atenções” do próprio Estado e é acolhido pelo ordenamento jurídico de uma determinada sociedade, sendo assim aplicado. Portanto, verificamos que tal princípio constitui fundamento dos direitos fundamentais e da própria ordem política, consistindo na base de todas as definições existentes e de todos os meios de interpretações destes direitos fundamentais. Em que Aliás, o princípio da dignidade da pessoa humana tornou-se, então, valor fundante do sistema no qual se alberga, como espinha dorsal da elaboração normativa, exatamente os direitos fundamentais do homem. Esse princípio converteu-se, pois, no coração do patrimônio jurídico-moral da pessoa humana estampado nos direitos fundamentais acolhidos e assegurados na forma posta no sistema constitucional de cada povo. (ROCHA, Cármen, 2004, p. 37) A constitucionalização do princípio da dignidade da pessoa humana modifica, em sua raiz, toda a construção jurídica: ele impregna toda a elaboração do Direito, porque ele é o elemento fundante da ordem constitucionalizada e posta na base do sistema. (ROCHA, Cármen, 2004, p. 38) É o pleno acatamento desse princípio que legitima as condutas, ações e opções estatais. (ROCHA, Cármen, 2004) Entretanto, observamos que não é novo que as constituições traduzam excelentes propostas, mas não sejam capazes de concretizar os projetos de seus povos, em que não há qualquer aplicação da norma posta do ordenamento jurídico local, tal como é o caso do Brasil. 35 Tal situação é verificada, na medida em que, tradicionalmente no Brasil, sustenta-se que a vida humana constitui bem jurídico indisponível de titularidade social e não de titularidade individual, no qual o princípio da indisponibilidade da vida é uma conseqüência dessa afirmação. (SÁ, 2005) No entanto, tal afirmação não deve ser entendida literalmente, uma vez que não há de se falar que a vida é bem jurídico de titularidade social e que o princípio da indisponibilidade da vida apresenta caráter absoluto, “afinal, o igual reconhecimento das liberdades subjetivas a todos abre espaço para também não considerarmos a vida como “bem supremo” e sim como algo disponível [...]” (SÁ, 2005, p. XXV), conforme a seguir descreveremos. 5.1 O princípio da dignidade posto no ordenamento jurídico brasileiro vigente As Constituições brasileiras que antecederam a atual não previam expressamente o princípio da dignidade da pessoa humana. (ROCHA, Cármen, 2004) O princípio da dignidade da pessoa humana está disposto expressamente nos artigos 1º, inciso III, 5º, caput, 170, caput, 226, §7º, 227, caput, e 230, caput, todos da CR/88, no ordenamento jurídico brasileiro vigente. Segundo Bonavides (2005, p. 258), “os princípios, uma vez constitucionalizados, se fazem a chave de todo o sistema normativo”. Em que todo discurso normativo tem que colocar, portanto, em seu raio de abrangência os princípios, aos quais as regras se vinculam. Os princípios espargem claridade sobre o entendimento das questões jurídicas, por mais complicadas que estas sejam no interior de um sistema de normas. (BONAVIDES, 2005, p. 259) Desta forma, o artigo 1º da Constituição da República de 1988 assim dispõe: Art. 1º - A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constituise em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I - a soberania; II - a cidadania; III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo político. (CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA, 1988, grifo nosso) 36 O artigo 1º “[...] veicula princípios indeclináveis como o princípio republicano, o princípio federativo, o princípio do estado constitucional, o princípio da liberdade, o princípio da soberania popular, dentre outros”. (PEREIRA, 2004, p. 279) Assim, verificamos que o texto constitucional traz a dignidade da pessoa humana como fundamento da República Federativa do Brasil. A mesma autora ensina que tal princípio é o legitimador da ordem jurídica, visto que o individuo é o centro do universo jurídico, conforme já descrito. Bem como deve constituir o individuo como objetivo primeiro da ordem jurídica. Concluindo-se, assim, que o Estado existe em função das pessoas e não estas em função do Estado. Não obstante, verificamos que o legislador constituinte inseriu o capítulo dos direitos fundamentais antes da organização do Estado, toda e qualquer ação estatal deve ser aferida em sua legitimidade a partir do ser humano, sob pena de ser inconstitucional e de violar o princípio da dignidade da pessoa humana. Vale dizer, portanto, que o princípio da dignidade da pessoa humana privilegia o individuo, sem, contudo, perder de vista o coletivo. Essa concepção personalista busca conciliar os valores individuais e coletivos, sendo certo que a solução dos conflitos há de ser avaliada em cada caso concreto. Verificamos que a dignidade é, portanto, marco da CR/88, no qual norteia toda a matéria dos direitos fundamentais, bem como a interpretação das normas, impondo limite no exercício dos direitos e dos deveres genéricos no que tange aos direitos próprios e alheios. Por isso, a importância da interpretação conjunta dos dispositivos constitucionais: Daí a importância de se interpretarem os princípios contidos no art. 3º da Constituição da República brasileira acoplados àqueles do art. 1º, em especial ao da dignidade da pessoa humana, de que são emanação e complementação. São estes que impedem a prevalência do pensamento e das práticas individualistas que podem conduzir aos perigos do exagero interpretativo que poderia impedir a concretização desse princípio ao invés de aperfeiçoá-lo em sua dimensão mais humana e integral para todos os homens que compõem a espécie. (ROCHA, Cármen, 2004, p. 40) O princípio da dignidade da pessoa humana refere-se também às dimensões social e política, tendo em vista todos os fundamentos e os objetivos primordiais do Estado 37 Democrático de Direito Brasileiro traduzido pelos artigos 1º, 3º e 5º da CR/88. Desta forma, “cada ser humano tem direito à vida digna em sua condição individual e em sua dimensão sociopolítica, plural, integralizada na espécie.” (ROCHA, Cármen, 2004, p. 17) Outrossim, os artigos 5º, caput, e 170, caput, da CR/88 dispõem sobre tal princípio, de maneira a assegurá-lo concomitantemente ao direito à vida, que a seguir melhor descrevermos, in verbis: Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País, a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes. Art.170 – A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios. (CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA, 1988, grifo nosso) Segundo Galuppo (2002), o princípio da proteção à vida não tem, no Brasil, precedência absoluta e incondicionada sobre qualquer outro princípio, tal como uma leitura literal e apressada do caput do artigo 5º da CR/88, acima transcrito, possa sugerir. Por fim, os artigos 226, §7º, 227 caput, e 230, da CR/88, inseridos no Capítulo VII, dispõem sobre a dignidade da pessoa humana no que tange à família, à criança, ao adolescente e ao idoso, e assim estabelecem: Art. 226 – A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. §7º - Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas. Art. 227 – É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade a à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. Art. 230 – A família, a sociedade e o Estado têm o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhes o direito à vida. (CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA, 1988, grifos nossos) O princípio da dignidade humana consiste em valor unificador dos direitos e das garantias inseridos na CR/88, bem como legitimador dos direitos fundamentais expressos e implícitos. (PEREIRA, 2004) 38 Assim sendo, partindo do pressuposto de que o princípio da dignidade da pessoa humana é o núcleo dos direitos fundamentais individuais, isto é, conteúdo de caráter primordial, o sistema jurídico deve considerá-lo como ponto de partida para toda e qualquer solução de conflito. Pode-se afirmar que a dignidade humana é princípio informador e conformador do direito pátrio. A dignidade deve permanecer inalterada qualquer que seja a situação em que a pessoa se encontre, constituindo, em conseqüência, um mínimo (não passível de modificação) que todo estatuto jurídico deve assegurar. Em nossa Constituição, a referência aos direitos invioláveis está intimamente conectada ao reconhecimento da dignidade da pessoa. Se esses direitos são inerentes à pessoa, como efetivamente o são, seu respeito é obrigatório tanto pelo Poder Público quanto pelos cidadãos. (PEREIRA, 2004, p. 280) Faz-se necessário salientar que os direitos fundamentais devem ser aplicados e analisados conjuntamente, uma vez que é inquestionável a sua indivisibilidade, visto que sem qualquer deles, não há de se falar em efetividade plena dos direitos do indivíduo. Não obstante, são imodificáveis, nos termos do artigo 60, §4º, inciso IV, da CR/88, ou seja, não podem ser abolidos, inclusive por qualquer tentativa posta por emendas constitucionais. Desta forma, Sá (2005, p 49) nos mostra que além do princípio da dignidade da pessoa humana, há necessidade de observar o princípio da igualdade que, “além de ser base dos direitos individuais, constitui fundamento para todos os direitos humanos, isto é, nos artigos 3º, IV, artigo 5º, I e XLII, XXX, XXXI, XXXII do artigo 7º e 14 da CR/88”. Tal princípio deve ser entendido na seguinte perspectiva: tratar os iguais igualmente e os desiguais na medida da sua desigualdade. “Como será possível tratar uma pessoa sã assim como uma pessoa que sofre de doença em estado terminal? Será que ambas devem ter os mesmos direitos e garantias? O direito fundamental à vida, neste caso deve ser oponível erga omnes?” A mesma autora afirma que a liberdade e a dignidade são valores intrínsecos à vida, em que o último não deve ser considerado bem supremo e absoluto acima do primeiro, sob pena do amor natural pela vida se tornar em idolatria. A vida deve ser encarada de tal forma que seja devolvida a dignidade perdida aos pacientes terminais, uma vez que aparelhos de alta tecnologia lhes prolongam a vida em estado vegetativo ou irreversível. Portanto, podemos afirmar que o princípio da dignidade da pessoa humana, conforme os artigos supracitados, abrange todas as pessoas independentemente da faixa etária ou em 39 qualquer estado ou situação em que se encontrem, uma vez que tal princípio é garantidor pleno dos direitos fundamentais constitucionais. Desta forma, tal entendimento absoluto e supremo deve ser visto e aplicado com ressalvas, uma vez que há o crescimento de inúmeros questionamentos tais como: viver bem é viver muito? Viver bem é viver não importe em quais condições? Viver bem é viver sem se importar com a vontade da própria pessoa que tanto deseja algo essencial à sua existência e à sua dignidade? 5.1.1 Direito à vida digna Conforme vimos acima, nos termos dos artigos 5°, caput e 170, caput, da CR/88, o princípio da dignidade da pessoa humana deve ser analisado concomitantemente com o direito à vida, estabelecendo assim o direito à existência digna. Desta forma, observamos que A dignidade como principio constitucional é de toda a existência, não apenas do viver humano. [...]se impõe como norma de que não se pode escusar qualquer pessoa e que estende os direitos e os deveres da vida para além do indivíduo. O direito à existência digna abrange o direito de viver com dignidade, de ter todas as condições para uma vida que se possa experimentar segundo comportamentos públicos e privados, de fazer as opções na vida que melhor assegurem à pessoa a sua realização plena. (ROCHA, Cármen, 2004, p. 26, grifo nosso) “Toda pessoa humana é digna. Essa singularidade fundamental e insubstituível é ínsita à condição do ser humano, qualifica-o nessa categoria e o põe acima de qualquer indagação.” (ROCHA, Cármen, 2004, p. 32) Tal como o direito à vida é assegurado como um dos direitos fundamentais de primeira geração (ou dimensão), a dignidade humana, como conteúdo daquele reconhecido e garantido constitucionalmente no Estado Moderno, também estaria assegurada desde os primeiros tempos de sua formação. (ROCHA, Cármen, 2004) Assim não se considera, entretanto, porque, naquele primeiro momento, a formulação jurídico-normativa atribui caráter meramente formal aos direitos elencados nos documentos constitucionais a eles referentes. O direito à vida, expresso ou não, nos textos fundamentais nos quais ele se articulava, garantia a intangibilidade do existir (não da existência) mais que a garantia da vida em sua configuração ampla e, especialmente, em sua condicionante humana plena, íntegra e 40 intangível, que é dada exatamente pela dignidade. (ROCHA, Cármen, 2004, p. 33, grifo nosso) O uso da expressão existência digna “é o reconhecimento do sistema à dignidade humana como valor intrínseco do ser humano por esta mesma condição, tornando-se de obrigatório acatamento, respeito e cumprimento o princípio, seja pelo Estado, seja por particulares.” (ROCHA, Cármen, 2004, p. 88) Portanto, entendemos que a dignidade da pessoa humana é inerente à vida, correspondendo ao direito pré-estatal. Em que se pode afirmar que [...] ainda que um dado sistema normativo não concebesse, em sua expressão, a dignidade humana como fundamento da ordem jurídica, ela continuaria a prevalecer e a informar o direito positivo na atual quadratura histórica. Mais ainda: pode-se mesmo acentuar que a dignidade da pessoa humana contém-se explícita em todo sistema constitucional no qual os direitos fundamentais sejam reconhecidos e garantidos, mesmo que não ganhem nele expressão afirmativa e direta. [...] é considerada como direito fundamental, tida como centro de direitos, igualmente esta é aceita como base de todo o ordenamento e incluído como pólo central emanador de conseqüências jurídicas. (ROCHA, Cármen, 2004, p. 30-31, grifo nosso) Assim, também corresponde ao entendimento de Castro (2007, p. 280), quanto à indissociação do conceito do princípio da dignidade da pessoa humana da concepção do direito à vida, em que “o princípio da dignidade humana é o fio condutor dos direitos fundamentais nestes tempos de tantos avanços das coisas e das técnicas e de tantos riscos das investidas e investimentos feitos em detrimento do viver justo, que é pelo que lutam os homens de todos os tempos.” Não obstante, Júnior (2006) e Sá (2005) compartilham do mesmo entendimento de que a vida não pode ser entendida somente do seu ponto de vista biológico, mas também sob uma perspectiva em relação aos direitos fundamentais, mediante interpretação do princípio da dignidade da pessoa humana. Destarte, é preciso garantir o direito à vida concomitantemente à sua qualidade e à sua dignidade. Segundo Cármen Rocha (2004), o direito à vida compreende o direito à integridade física, no qual há o direito de não ter suas integridades física e psíquica lesadas, direito ao patrimônio genético, direito à vida privada e à intimidade, direito à honra e à imagem, dentre outros juridicamente tutelados pelo sistema jurídico. Contudo, o direito de viver dignamente estende-se, além desses acima mencionados, ao direito à saúde, à educação, à cultura, ao meio ambiente equilibrado, aos bens comuns da humanidade, portanto, ao direito em relação às dignidades e às liberdades. Assim, considerando o direito à vida digna, o sistema jurídico 41 deve contemplar o direito à morte nos casos em que não há condições de dignidade da pessoa humana. A mesma autora nos ensina com brilhantismo que: A Constituição da República Brasileira de 1988 refletiu não apenas o quanto o constitucionalismo contemporâneo conquistara, erigindo a dignidade da pessoa humana em princípio axiológico (quase dogma constitucional) insuperável, fundante e unificador em torno de seu significante do sistema jurídico, como, mais ainda, ampliou o seu conteúdo e a sua aplicação, repetindo a formula relativa à pessoa e, ainda, a obrigação de lhe dar cumprimento no sentido de estar na base da humanidade, quer dizer, não se contendo tão-somente quanto ao indivíduo, mas referindo-se à dimensão social e política do ser humano, de cada um e de todos. Daí por que antes se observou que a expressão do princípio da dignidade da pessoa humana (expressa no artigo 1º, inciso III, da CR/88) não se contém apenas naquele dito, mas tem ali o seu ponto de partida, espraiando-se em novas possibilidades com a previsão de necessário atendimento ao que é direito da humanidade, contemplando-se nela até mesmo direitos de gerações futuras. (ROCHA, Cármen, 2004, p. 73) Não estamos falando em extinção da vida digna, mas sim, o fim do sofrimento de uma vida sem dignidade. Cármen Rocha (2004, p. 74) entende que “a ética é pensada e exposta para a vida. Como dela cogitar para o que seria a ética para a morte?” Desta forma, a morte deve ser encarada como um direito fundamental assim como o direito à vida o é no constitucionalismo contemporâneo. Contudo, apesar do direito de morrer ser uma garantia constitucional explicitamente disposta no ordenamento jurídico brasileiro, é necessário ressaltar que tal direito na prática se torna inócuo, uma vez que a sociedade de modo geral teme de todas as formas o acontecimento da morte. Desta forma, pouco a pouco, a morte deixa de ser um acontecimento natural do curso da vida e passa a ser assim uma doença, em que é necessário combatê-la de todas as formas possíveis: [...] a morte não é mais proibida porque podemos travesti-la; ela não é mais impura, já que podemos tocá-la; não é mais sagrada já que podemos rir dela. E não somente podemos tocá-la, mas podemos desafiá-la com todas as técnicas de próteses, enxertos, bancos de órgãos, prolongação por meio da obstinação terapêutica (ou excesso de cuidados – conotações menos emotivas e passionais), a reanimação, a criônica (congelamento do corpo): partindo do princípio de que a morte é uma doença repugnante que é preciso curar [...]. (BARCHIFONTAINE, 2002, p. 284) Destarte, a eutanásia não deve ser entendida como o contrário da vida, mas sim uma alternativa entre o direito à vida digna e a morte. (ROCHA, Cármen, 2004) Portanto, se o princípio não for assim tratado, o indivíduo deixa de ser sujeito de direitos e de deveres, tal como dispõem os artigos 1º e 2º do Código Civil de 2002 (CC/02), 42 no que tange a possibilidade de decidir o seu destino e suas vontades e passa, simplesmente, a ser mero objeto passivo de uma série de condicionamentos e vontades alheias. Apesar de que, atualmente, a morte e a vida estão sendo entendidas de forma equivocada e não, como um direito individual inerente à condição humana, em que Por ora, a morte já não é só da pessoa. E a vida, esta nunca foi mesmo só do vivente. Hoje, a morte cumpre um plano. Ou um processo. Desapega-se do sujeito em seu processar e com isto alongeia-se do moribundo. Ele, às vezes, arrasta-se nas mãos dos outros. Sua vida não é sua. Nunca é. A morte é que titularizava verdadeiramente a vida do sujeito. E nem ela é mais assim. As unidades de terapia sussurram sobrevida que se arrasta segundo as condições de cada um. Perversas, às vezes, elas falam a língua do dinheiro. (ROCHA, Cármen, 2004, p. 13-14) Pelo exposto, para melhor entendermos como se deve proceder a aplicação do princípio da dignidade da pessoa humana no caso concreto no que tange à prática da eutanásia, descreveremos a seguir a teoria deontológica de Ronald Dworkin, que melhor ilustra o disposto acima. 5.2 Aspecto deontológico do princípio da dignidade da pessoa humana mediante utilização da teoria de Dworkin A fase do pós-positivismo correspondeu “aos grandes momentos constituintes das últimas décadas do século XX.” (BONAVIDES, 2005, p. 264) Tal fase reconheceu a normatividade dos princípios em grau constitucional, juspublicístico, e não meramente civilista, em que atribuiu e reconheceu novo ângulo de positividade definitiva aos princípios, a saber, como direito, em que uma das valiosas contribuições foi por parte dos juristas Ronald Dworkin e Robert Alexy. Com efeito, Dworkin ao reconhecer princípios como direito rejeita três dogmas da doutrina anterior, isto é, da fase do positivismo, a saber, o primeiro consiste na distinção entre o Direito de uma comunidade e os demais padrões sociais (social standars) aferidos por algum test na forma de regra suprema (master rule). O segundo – prossegue – referente à doutrina da discrição judicial – a “discricionariedade do juiz”. E, finalmente, o terceiro, compendiado na teoria positivista da obrigação legal, segundo a qual uma regra estabelecida de Direito – uma lei – impõe tal obrigação, podendo ocorrer, todavia, a hipótese de que um caso complicado (hard case), em que tal lei não se possa achar, inexistiria a obrigação legal, até que o juiz formulasse nova regra para o futuro. E, se a aplicasse, isto configuraria legislação ex post facto, nunca o 43 cumprimento de obrigação já existente. (DWORKIN apud BONAVIDES, 2005, p. 265) Os positivistas defendem teorias semânticas, no qual entendem as questões de direito como de fatos, em que divergências só acontecem quando os intérpretes não compartilham o mesmo critério do uso das palavras. (SÀ, 2005) Desta forma, a teoria de Dworkin tem como objetivo conceituar o que são princípios jurídicos e como devemos aplicá-los na análise do caso concreto, como a seguir demonstraremos. Primeiramente, Dworkin entende que as normas jurídicas compreendem os princípios e as regras, estes são fontes do Direito. Assim, as regras positivamente postas e os princípios têm caráter deontológico, isto é, dever-ser, bem como vinculante, ou seja, impõem uma obrigação legal. Em que a diferença entre eles seria o caráter de orientação oferecido por cada um à aplicação no caso concreto, portanto, uma distinção lógica. Dworkin é defensor da teoria em que as condições de aplicação das normas não são prédeterminadas. Afirma também que há três questões a serem solucionadas na análise do caso concreto, que são as questões de fato, de direito e ligadas à moralidade. Sendo as questões de direito, isto é, qual norma deve ser aplicada, a mais controvertida, uma vez que os intérpretes divergem quanto ao seu fundamento, objeto da interpretação e não, de forma empírica, criticando assim os positivistas. Portanto, para Dworkin, os princípios têm caráter “aberto” em face da sua eficácia interpretativa ao caso concreto. Tais princípios são modelos que devem ser observados, uma vez que é exigência da justiça ou da imparcialidade ou de qualquer outra forma de moralidade. Em que são independentes entre si e haverá concorrência entre tais princípios no momento da aplicação. Portanto, nos casos de colisão de princípios o que ocorre é a não-aplicação (nãoadequação) de um deles no caso concreto, haja vista que sua validade sempre deve ser observada. Assim, há necessidade de encontrar aqueles racionalmente plausíveis, visto que para haver exceção de um em detrimento do outro no caso concreto faz-se necessária a devida fundamentação. Não obstante, a colisão não importa em exceção entre princípios, uma vez que abstratamente sempre haverá exceção de aplicação de um princípio face ao outro. 44 Princípios contrários não pressupõem invalidade do princípio não aplicado, nem seria exceção daquele que foi aplicado ao caso concreto em face da sua adequação. Isto posto, os princípios proporcionam uma ampla descrição e justificação da estrutura jurídica, política e moral da comunidade. Já as regras imputam um resultado específico, na medida em que descrevem situações pré-determinadas. Compreendendo tudo ou nada (all or nothing). Faz-se necessário salientar que as regras podem ser afastadas caso não haja atendimento a um princípio face ao caso concreto, sem a perda de sua validade. Na colisão entre regras, há eliminação de uma delas ou o estabelecimento de cláusulas de exceção. Portanto, uma delas será tida como inválida e a outra como válida, em que as mencionadas exceções seriam necessárias para se verificar o real âmbito de incidência das regras. Já os casos difíceis, hard cases, correspondem àqueles em que nenhuma regra disposta estabelece uma decisão. Os casos difíceis devem ser solucionados pelos argumentos de princípios e não pelos políticos. Os argumentos de princípios, isto é, referentes a direitos, sempre prevaleceram aos argumentos políticos, uma vez que os últimos estabelecem metas coletivas, já os primeiros visam garantir e assegurar direitos individuais. Assim, Dworkin entende que mesmo nos casos difíceis haverá sempre uma solução cabível, mediante a utilização de um princípio específico como fundamentação em sua decisão. Faz-se mister ressaltar que o princípio escolhido não consiste em um artifício metafísico, mas algo que é construído argumentativamente de acordo com as práticas sociais e jurídicas da sociedade. Dworkin fala que uma decisão fundamentada em princípios é difícil de ser refutada. Visto que não há de se falar em criação de normas jurídicas, ato discricionário do juiz, uma vez que este deve construir argumentativamente suas decisões, mediante interpretação dos argumentos apresentados, bem como o ordenamento jurídico é formado não somente por regras jurídicas, mas também por princípios. A necessidade de justificação quanto à aplicação principiológica decorre da noção de legitimidade de todo o Direito. Em que o juiz tem o dever de descobrir o direito e não de inventá-lo. Buscando-se sempre uma decisão justa. Não obstante, o julgador deve entender o direito positivado tal como um esforço, na tentativa de sempre desenvolver o sistema jurídico básico proposto. 45 No âmbito da aplicação, Heloísa Rocha (2004) fala que coerência consiste na justa aplicação do direito no caso concreto, mediante aplicação adequada de um determinado princípio. Por fim, afirma que toda decisão é munida de caráter principiológico, bem como cada caso é um hard case, uma vez que é único e não passível de repetição no mundo jurídico. Devendo o juiz alcançar uma única resposta para tal caso concreto, observando-se o desenrolar do próprio processo concretamente. Para Dworkin (2003), a dignidade da pessoa humana é um direito imperativo, no qual a sociedade deve utilizar todos e quaisquer recursos para assegurá-lo. 5.3 Crítica à visão axiológica de Alexy Tal como Dworkin, Alexy afirma que as normas jurídicas compreendem os princípios e as regras, uma vez que, enquanto normas, são comandos normativos. Primeiramente, Alexy afirma que a teoria de Dworkin não estabelece uma distinção adequada entre princípios e regras. Passando a distingui-los da seguinte maneira: princípios seriam “comandos de otimização” que deveriam ser cumpridos no maior grau possível, isto é, no grau máximo, levando-se em consideração a possibilidade fática e jurídica de sua realização de acordo com o caso concreto. Correspondendo, segundo Júnior (2006, p. 176) não ao “[...] código binário, mas sim gradual, já que seriam comandos de otimização perante circunstâncias fáticas e em consideração a questões jurídicas: podem ser mais ou menos cumpridos de acordo com a lei da ponderação.” Tal preferência, para Cruz (2004, p. 173), corresponde ao custo/benefício efetuado pelo julgador no caso concreto. “Esse procedimento seguramente centrar-se-ia na noção de proporcionalidade, na qual a adequação, a necessidade e a ponderação propriamente dita interagiriam de forma sistêmica.” Para o mesmo autor (2004, p. 173), “[...] por outro lado, no instante em que a ponderação de valores implicava a criação de uma regra de aplicação, não só para o caso concreto, mas para com todos os outros que se assemelhavam jurídica e faticamente, Alexy identificava como qualitativamente idênticas as funções jurídica e legislativa [...].” Portanto, o Poder Judiciário passa a ter função concorrente à legislativa, “[...] na condição de guardião dos valores éticos da sociedade, cristalizados na Constituição.” 46 Os princípios não possuem pretensão de exclusividade, em que seu significado se desenvolve mediante o processo “[...] tanto de complementação quanto de limitação recíprocas e eles precisam de princípios subordinados e valorações particulares com conteúdo material independente para sua realização concreta.” (ALEXY, 2005, p. 36) “O aplicador deve-se orientar em um sentido juridicamente relevante de acordo com valorações moralmente corretas.” (ALEXY, 2005, p. 40) Podendo-se afirmar que os princípios são utilizados em face da sua adequação ou não ao caso concreto. Assim, os princípios são razões prima facie, não contendo mandados definitivos. Só têm existência no caso concreto. Para ele, os princípios são relativamente gerais, indeterminados, ao fundamento de que não se referem às possibilidades da realidade ou normatividade, não se aplicando de modo pleno em todas as situações fáticas. Os princípios, assim, possuem campo de incidência impreciso ou indeterminado. Princípios conflituosos não podem ser aplicados simultaneamente ou pelo menos no mesmo grau ou intensidade. Não há necessidade de utilização de cláusulas de exceção nos princípios e de declaração de invalidez do princípio não aplicado. Portanto, um cede lugar ao outro princípio, diante do caso concreto. Utilizando-se a dimensão de peso e não de validade, tal como acontece com as regras. Peso, para Alexy, tem o mesmo significado de hierarquia entre princípios de acordo com o caso concreto, mediante procedimento de ponderação. Tal aplicação é condicionada, na medida em que o julgador deve racionalizar a ponderação, expondo suas razões de preferência. Assim, Alexy tenta controlar a subjetividade do julgador (juiz). A colisão de princípios, denominada de incompatibilidade da aplicação dos princípios, não os torna inválidos, independente, portanto, da validade ou não de outras normas que possuem o mesmo grau. Assim, somente princípios válidos podem colidir. Tal incompatibilidade dispõe acerca da aplicação de princípios que resultam em soluções contraditórias. Em caso de colisão de princípios com outros direitos ou bens coletivos, os princípios são passíveis de restrição, no entanto, sempre havendo sua realização em grau máximo. Portanto, não há de se falar em cumprimento ou não do princípio, na medida em que há ponderação entre os princípios conflitantes. Faz-se mister ressaltar que princípios não podem ser confundidos com valores, visto que os últimos “são inerentes ao nível axiológico, [...].” (SÁ, 2005, p. 121) Assim, o valor 47 é embutido genuinamente de axiologia, enquanto o princípio é espécie das normas jurídicas, em que essas estão no campo do dever-ser. Afirma que toda colisão de princípio corresponde a uma colisão de valores, mas o contrário não pode ser afirmado. Assim, a ponderação jurídica propriamente dita compreende unicamente a ponderação de princípios, nunca de valores. Já as regras seriam comandos de determinação e não de otimização, sendo assim, mandados definitivos, razões definitivas, em que serão aplicados mediante a regra do tudo ou nada, no qual somente uma regra poderá ser aplicada. Eventuais conflitos devem ser resolvidos mediante os critérios de hierarquia, especialidade e temporalidade. Para as regras, é necessária a sua validade, em que possuem existência em abstrato. Portanto, as regras podem ser cumpridas (aquelas tidas como válidas em sua integral disposição) ou não, isto é, poderão ser cumpridas ou descumpridas. Assim, em casos de conflitos, uma delas será declarada como inválida e eliminada do ordenamento jurídico ou deverá haver cláusula de exceção, para que não exista mais tal conflito. A distinção entre colisões de regras e de princípios consiste no modo de solução do conflito quanto à sua aplicação. As regras não se regulam na própria aplicação, tal como acontece no caso dos princípios. Não obstante, estabelece a existência de regras de prevalências, as quais independentemente das situações do caso concreto devem ser preferidas em detrimento das demais, em que serão aplicadas abstratamente em caráter definitivo. Alexy, portanto, adota um paradigma procedimental, uma vez que “[...] ao sustentar basicamente a proteção aos direitos fundamentais ao aspecto dialógico do discurso e à racionalidade do ‘princípio da proporcionalidade’.” (CRUZ, 2004, p. 164-165) Por fim, Alexy afirma que não há possibilidade de conceber um sistema jurídico somente na existência de regras, uma vez que haveria inúmeras lacunas que impossibilitaria a resolução dos casos. Bem como um sistema jurídico somente de princípios, uma vez que o sistema seria extremamente aberto e indeterminado, abalando-se a segurança jurídica. Não obstante, entende-se que não existe uma única resposta ao caso concreto, visto que a realidade somente poderia se aproximar da idealidade, em que nunca será ideal. Portanto, a teoria alexyana permite afirmar que há possibilidade de resolver questões jurídicas tal como se fossem questões de ponderação de comandos de graduação e não determinantes. 48 Contudo, Alexy também afirma que as normas, sendo princípios ou regras, devem ser sempre cumpridas, uma vez que possui caráter normativo, possuindo conteúdo deontológico. Há em sua teoria uma renúncia implícita à busca da justiça ensejada pelos princípios em detrimento da segurança jurídica, mediante adoção do procedimento ligado à metodologia jurídica. (GALUPPO, 1999) 5.3.1 Conclusão Primeiramente, para Alexy, os princípios seriam “comandos de otimização” que deveriam ser cumpridos no maior grau possível, levando-se em consideração as possibilidades fática e jurídica de sua realização. Portanto, a possibilidade de graduação dos princípios, quer dizer que estes não podem ser entendidos como normas jurídicas, uma vez que guardariam semelhança com o conceito de valor que, por excelência, expressam preferibilidade de uma sociedade. Os valores são entendidos como um agir teleológico relativo, mediante codificação gradual, necessitando de ponderação, indicando comportamentos aceitável e recomendável. Assim, os princípios devem ser entendidos como um agir obrigatório, deontológico de validade, mediante codificação binária, em que pressupõe obrigatoriedade universal. Ao passo que somente pelas normas apresentarem conteúdo axiológico, tal como os princípios, não quer dizer que são valores. Faz-se mister ressaltar que há presença de conteúdo axiológico, não quer dizer que possuirá conceituação axiológica. Em que valores são priorizados e não aplicados, já os princípios são aplicados. Assim, afirma Cruz (2007, p. 279) que “[...] o Direito opera sob um código binário que o faz distinto da noção de gradualidade inerente aos valores.”, sob perda da legitimidade do Direito, ou seja, a lei de ponderação concebe uma visão axiológica do Direito. Verificamos também que o que é preferível para uma determinada sociedade pode não o ser para outra diversa. Segundo Júnior (2006, p. 175), o conceito de princípios enquanto valores acarreta uma transmutação do código do Direito, “[...] em vez que se perguntar o que é devido, ou não, passa-se a perguntar o que é mais ou menos ‘interessante’/‘importante’ naquele caso, o que 49 sem dúvida destoa de uma perspectiva capaz de assumir a racionalidade e sustentabilidade, pois, de tal decisão.” Normas jurídicas têm caráter obrigatório e universal, por que os princípios também não os teriam, haja visto que são espécies delas? Conforme Cruz (2004, p. 164), o problema consiste na medida em que o critério de ponderação de valores exige que todos os direitos fundamentais sejam relativizados, inclusive o princípio da dignidade da pessoa humana. “Assim, não haveria um núcleo absoluto/intangível de valores fundamentais [...].” Alexy entende que os princípios absolutos não podem ser colocados na relação de ponderação face a outros princípios, no entanto, se admitirmos isso, a realização e a aplicação deste princípio não conheceria qualquer limite jurídico, sob pena de inviabilizar a estrutura normativa conforme ditames do Estado Democrático de Direito. Portanto, Cruz afirma (2007, p. 296) que Alexy “[...] abandona qualquer perspectiva lingüístico-pragmática legada pela hermenêutica como analítica existencial [...] Logo se perdem até mesmo as condições de possibilidade para o conhecimento, que dirá então das condições de validade do mesmo.” Os princípios podem ser contrários em sua aplicação, mas nunca poderão ser contraditórios, bem como não podem se desvincular aos ditames da Constituição, sob pena de inviabilidade do próprio sistema jurídico e respectiva inconstitucionalidade principiológica. Verificamos também que, apesar de alguns princípios apresentarem alto grau de generalidade, não se pode afirmar que eles se formam por um processo de generalização crescente. O que consiste em dizer que a generalidade não é um critério adequado de distinção. (GALUPPO, 2002) Por fim, Galuppo (2002, p. 198) esclarece que “a concorrência entre os princípios constitucionais revela uma característica fundamental da sociedade em que existe um Estado Democrático de Direito: não é possível hierarquizar os princípios constitucionais, porque todos eles são igualmente valiosos para a auto-identificação de uma sociedade pluralista.” 50 6. HERMENÊUTICA CONSTITUCIONAL NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO BRASILEIRO A multiplicidade de fatores individuais que interagem com os mecanismos mediante os quais a doença de instala e progride num organismo é de tal ordem de complexidade, que jamais existirão dois casos iguais nem duas pessoas que respondam de forma idêntica ao mesmo tratamento. Além disso, enquanto um diagnóstico pode ser firmado com base em sinais, sintomas e resultados de exames, dados concretos, acessíveis até os principiantes, prognósticos exigem não só conhecimentos teóricos, mas vivência clínica, para ser vislumbrados com um mínimo de precisão. DRÁUZIO VARELLA Conforme já vimos, as práticas de eliminação do sofrimento em pacientes em estado terminal não podem ser utilizadas naqueles que possuem possibilidade de cura atual ofertada pela medicina, sob pena de serem violados dispositivos constitucionais e infraconstitucionais do ordenamento jurídico brasileiro. Portanto, seu cabimento somente se dá naqueles pacientes que não possuem qualquer perspectiva de melhora de seu diagnóstico, em que sua enfermidade causa-lhe extremo sofrimento. Segundo Sá (2005), deve-se entender que os pacientes em estado terminal, na maioria dos casos, apresentam dependência física e devem ser representados ou assistidos em sua vida civil, conforme o caso concreto, em que não possuem qualquer tipo de autonomia, uma vez que máquinas substituem órgãos, realizando inúmeras funções, as quais sem elas sequer sobreviveriam um único dia. A mesma autora afirma que a questão da dignidade das pessoas que não possuem capacidade de responder por si mesmas ou tal capacidade é restrita ou debilitada concerne na grande controvérsia atual. Portanto, defendemos uma hermenêutica constitucional em face da prática da eutanásia, ou seja, uma aplicabilidade em cada caso concreto dos princípios fundamentais, conforme já exposto. Para tanto, verificamos a necessidade do cumprimento dos requisitos que a seguir descreveremos, bem como de propositura de ação na via judiciária para a sua viabilização, mediante acompanhamento do caso por um membro do Ministério Público, face a sua investidura na função de múnus público, conforme artigos 127, caput, e 129, caput, e incisos II e IX da CR/88, in verbis: 51 Art. 127 - O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. Art. 129 – São funções institucionais do Ministério Público: II – zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia; IX – exercer outras funções que lhe forem conferidas, desde que compatíveis com sua finalidade, sendo-lhe vedada a representação judicial e a consultoria jurídica de entidades públicas. (CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA, 1988) 6.1 Eutanásia ativa Na eutanásia ativa tais requisitos são: Atestado dado por número mínimo de médicos (mínimo 3) de que o paciente se encontra em estado irreversível, uma vez que não há qualquer possibilidade de cura ofertada pela medicina atual; Tal número mínimo de três médicos é necessário para que não haja qualquer interferência subjetiva do profissional à análise do caso. A possibilidade de cura ofertada pela medicina deve ser atual para aquela doença que o paciente em estado terminal sofre, sob pena de nenhum direito fundamental posto na CR/88 ser realmente efetivado, no momento devido, isto é, a espera da cura causará violação de tais direitos de modo irreparável ao indivíduo. Tal espera tem como fundamento o pretexto da busca e da expectativa de uma possível ou provável, mas incerta, suposta, cura àquela doença atualmente tida como incurável, além do fundamento a respeito do avanço da biotecnologia em favor das doenças tidas como incuráveis. Sofrimento insuportável e constante, físico ou mental; Consentimento expresso e escrito do paciente anterior a irreversibilidade do quadro, isto é, uma espécie de testamento (tal requisito não é imprescindível, mas se existente, deverá ser analisado conjuntamente com os demais); Contudo, entendemos que tal consentimento expresso e escrito anterior pode ser suprimido, não sendo assim, imprescindível em face da impossibilidade de aplicação prática. Verificamos que quase todas as pessoas não fazem qualquer tipo de testamento prévio, no qual contempla a hipótese de possibilidade de prática da conduta eutanásica, quando há superveniência de doença incurável e irreversível que impossibilite a manifestação da vontade plena e sem vícios. 52 Segundo Varella (2004), tal testamento não é feito, uma vez que aquelas pessoas se recusam a pensar que poderão algum dia precisar dele para efetivar seus direitos constitucionais ou são demasiado supersticiosos ou sensíveis para assinar um documento em que pedem para morrer, bem como Poucos eventos na vida são capazes de isolar alguém como a progressão de uma doença fatal. Por mais empatia que a desventura do outro possa despertar, expormonos à insegurança, depressão, estados de animo contraditórios e crises de ansiedade de quem está ciente do seu fim é experiência tão angustiante que inventamos um milhão de subterfúgios para evitá-la. Lidar de perto com a perspectiva da morte alheia nos remete à constatação de nossa própria fragilidade. (VARELLA, 2004, p. 116) Manifestação de vontade do paciente após a irreversibilidade do quadro clínico, que será atestado por psicólogos, mínimo de três, em que o acompanharão por período determinado, para se saber se tal paciente em estado terminal não sofre de depressão ou se sua manifestação possui qualquer tipo de vício de consentimento, desde que o paciente seja informado sobre o seu diagnóstico e o seu prognóstico detalhadamente. Tal período variará de acordo com a necessidade desta equipe de profissionais em apresentar seu atestado, no entanto, não poderá ser excessivo, de acordo com o caso concreto, fixada pelo juiz, para não almejar qualquer tipo de violação constitucional aos direitos do paciente. Tal manifestação deve ser feita pelo paciente quando tem capacidade atestada de manifestação e de discernimento ou caso haja impossibilidade deste, deverá ser feita pelos familiares e por amigos próximos, além de documentos, se possível, e testemunhas que esclareçam a respeito de suas convicções e de suas crenças compatíveis com a conduta requerida. Tal requisito é imprescindível. Assim, ensina Dworkin (2003, p. 64) no que tange aos pacientes em estado de inconsciência permanente ou também em estado de coma, denominado de “vegetativo persistente”: Aqueles pacientes inconscientes, ainda que muitos pacientes em estado vegetativo persistente consigam abrir e movimentar os olhos, e os centros superiores de seus cérebros foram permanentemente danificados, tornando-se impossível qualquer retorno à consciência. São incapazes de qualquer sensação ou pensamento. Tais familiares e amigos próximos manifestarão quanto à vontade induvidável deste paciente antes da superveniência do estado terminal, de que ele queria a prática da eutanásia e 53 não mudou de opinião em nenhuma oportunidade, no que tange às suas crenças, aos seus credos ou à sua religião. 6.2 Eutanásia passiva No ordenamento jurídico brasileiro não há dispositivo expresso quanto à possibilidade da prática da eutanásia passiva, fazendo-se interpretação quanto aos princípios e aos direitos constitucionais postos na CR/88, tal como da prática da eutanásia ativa. Portanto, entendemos que a eutanásia passiva consistirá em prática legal desde que respeitado o consentimento do paciente em estado irreversível, verificando-se se este possui discernimento para a livre manifestação, mediante análise e acompanhamento de médicos e psicológicos, cujo número mínimo seja de três cada. Quanto aos menores de dezoito anos se submeterem à eutanásia passiva, estes devem apresentar capacidade de discernimento atestada pelos médicos conforme exposto acima. Tal situação deve ser analisada por médicos e por psicólogos para validarem a opinião manifestada, a fim de que haja plena aplicação do princípio da dignidade da pessoa humana, expresso como fundamento do Estado Democrático de Direito Brasileiro, conforme artigo 1º da CR/88. Faz-se necessário distinguir que uma pessoa que possui dezessete anos não dorme relativamente incapaz e, aos dezoito anos, acorda plenamente capaz. A capacidade para a mencionada conduta deve ser entendida como capacidade de discernimento, correspondendo a uma situação gradual, progressiva, o que não acontece da noite para o dia. Vale ressaltar que o disposto nos artigos 3º, 4º e 5º do CC/02 consiste na incapacidade ficta daqueles menores de 18 anos, não analisando o grau de discernimento individualizado por impossibilidade legislativa de prever todos os casos que por ventura podem acontecer, isto é, impossibilidade da norma casuística. Ressaltando-se, portanto, que os pais ou responsáveis legais do paciente menor de dezoito anos em estado irreversível, que não possui pleno discernimento para a conduta, mas queira realizar a eutanásia passiva, poderão se manifestar a respeito, em virtude da sua condição de representantes ou assistentes, desde que haja acompanhamento de outros três médicos, atestando que o estado em que se encontra o menor é irreversível, não havendo 54 tratamento disponível atualmente que reverta seu diagnóstico, portanto, há a impossibilidade de melhora do quadro clínico. Estes números mínimos de três médicos e de três psicólogos são necessários para que não haja qualquer tipo de interferência subjetiva por qualquer um deles. Assim, tais atestados são necessários para garantir que a interrupção do tratamento seja válida, bem como que este não esteja interrompendo um tratamento com possibilidades de cura atual e palpável no âmbito da medicina. Vale salientar que o fundamento do requisito da impossibilidade de cura atual na medicina já fora explicitado acima. 55 7. CONCLUSÃO Após apresentarmos várias conceituações e classificações sobre a prática da eutanásia, entendemos que o melhor conceito consiste na conduta por meio de ação ou de omissão, do médico ou de outra pessoa próxima, a rogo do paciente ou de outrem, isto é, independentemente do consentimento do paciente (sob determinadas situações), mediante emprego ou omissão de meio eficiente para produzir a morte deste paciente em estado terminal, cujo estado provoca-lhe grave sofrimento físico ou psíquico. Tal ação ou omissão visa abreviar a vida do mencionado paciente, utilizando-se de sentimentos de piedade, humanidade e compaixão. Há, portanto, dois elementos básicos na caracterização da conduta da eutanásia que consistem na intenção do agente e no efeito da ação. Assim, a eutanásia ativa consiste na ação e a eutanásia passiva consiste na omissão. Tal conceito não deve se confundir com outros institutos já apresentados, tais como a distanásia, a mistanásia e o suicídio assistido. Verificamos que a eutanásia ainda não é reconhecida como direito constitucional individual no Brasil, sendo sua prática proibida ainda em muitos outros países, tais como Portugal, Uruguai, Argentina, Áustria, Noruega e Alemanha. Apesar de determinados países tais como Holanda, Bélgica e França já terem reconhecido tal prática em suas legislações como um direito individual. Com efeito, apesar de inúmeros países ainda não tenham reconhecido a eutanásia como direito fundamental individual, a seguinte reflexão faz-se necessária, conforme Maschino (2006b): “O direito de morrer em dignidade é fundamental, humanamente compreensível, socialmente aceitável, politicamente defensável. Portanto, onde está o problema?” Analisamos que, no âmbito penal, a eutanásia ativa não pode ser considerada como crime, nos moldes do artigo 121, §1º do CPB, sob a denominação de homicídio privilegiado, tal como compreende o entendimento doutrinário, haja vista a incompatibilidade do instituto com o disposto no princípio da legalidade, conforme os artigos 5º, inciso XXXIX, da CR/88 e 1º do CPB, concomitante com uma interpretação do tipo penal, a respeito das causas de diminuição de pena, não obstante a estrutura do delito, conforme a Teoria Jurídica do Delito. Desta forma, não há de se falar em injusta provocação da vítima, visto que o agente deve agir PURA e SIMPLESMENTE na tentativa de aliviar a dor e o sofrimento do paciente, 56 havendo assim intenso sentimento humanitário e piedoso, não consistindo assim em reação a uma ação sofrida. No âmbito constitucional, o direito à vida não deve ser entendido como bem jurídico indisponível e absoluto de acordo com o disposto nos artigos 1º, inciso III, 5º, caput, 170, caput, 226, §7º, 227, caput, e 230, caput, todos da CR/88, uma vez que tal direito deve ser analisado indissociavelmente com o princípio da dignidade da pessoa humana, prevalencendo assim a existência digna do indivíduo. Portanto, o princípio da dignidade da pessoa humana no que tange à prática da eutanásia corresponde ao fundamento do Estado Democrático de Direito Brasileiro, em que o indivíduo deve ser o “centro das atenções” do Estado Democrático de Direito, não podendo haver prevalência dos interesses coletivos e dos aspectos morais impregnados na sociedade sobre aquele. Os princípios jurídicos, tal como o princípio da dignidade da pessoa humana, devem ser analisados ao caso concreto sob o ponto de vista deontológico, isto é, do dever-ser, proposto pelo jurista Ronald Dworkin, uma vez que estes correspondem às espécies das normas jurídicas, que podem ser escritos ou não, expressos ou implícitos no ordenamento jurídico. Portanto, entendemos que os princípios jurídicos, explícitos ou implícitos, são não absolutos, ao fundamento de que não apresentam soluções previamente concebidas, são dotados de validez, vigência e de caráter normativo, determinante, geral, fundamental ao sistema jurídico e à garantia da pluralidade da sociedade contemporânea, obrigatório e nãoprogramático (isto é, dimensão concretizadora, em que a positividade de sua aplicação é direita e imediata). Não obstante, apresentam grau de generalidade e de indeterminação, visto a sua impossibilidade de hierarquização, o que necessita de concretização e análise no caso concreto, possuindo, portanto, eficácia interpretativa. Bem como apresentam funções interpretativa e integrativa das leis, ao passo que integram e orientam a hermenêutica das leis, suprindo-lhes obscuridade e ausência normativa. Desta forma, entendemos que a solução diante do Estado Democrático de Direito Brasileiro, no que tange aos conflitos de princípios em um determinado ordenamento jurídico, consiste na tentativa de aplicação coerente do máximo de princípios dispostos para a solução do caso concreto, mediante racionalização do problema. Não obstante, deve-se buscar sempre a imparcialidade no momento da fundamentação e na aplicação das normas jurídicas. 57 Verificamos que não se pode negligenciar a qualidade de vida do individuo nem privilegiar a dimensão biológica deste, uma vez que viver bem e dignamente não consiste necessariamente em viver muito. Face a esse entendimento, defendemos uma hermenêutica constitucional à prática da eutanásia, isto é, uma aplicação principiológica, em que é necessária propositura de ação na via judiciária, mediante acompanhamento do membro do Ministério Público, além de cumpridos determinados requisitos já mencionados. Tal propositura objetiva a aplicabilidade do direito à vida concomitantemente com o princípio da dignidade da pessoa humana, haja vista a sua indissociabilidade. Destarte, analisamos que a legalização da prática da eutanásia não é necessária, haja vista expressa disposição principiológica no ordenamento jurídico brasileiro. Bem como uma proibição expressa a respeito do tema, causaria inconstitucionalidade desta norma, ao fundamento de que os direitos fundamentais são cláusulas pétrias, sendo assim, imodificáveis, nos termos do artigo 60, §4º, inciso IV, da CR/88. Contudo, apesar de demonstrarmos que a prática da eutanásia é garantida em nosso ordenamento jurídico como direito constitucional individual inerente a todos os indivíduos, decorrente dos direitos fundamentais conforme já exposto, verificamos que por motivos morais e éticos inerentes à cultura e à sociedade brasileira, principalmente marcada pelas convicções da religião Católica Apostólica Romana, tal interpretação principiológica se torna inócua e, em nosso entendimento, violadora de direitos fundamentais individuais expressos na Constituição vigente. RÉSUMÉ Ce travail objective les concepts sur le institut de la euthanasie, en train de fixer les distinctions en semblant d´autres instituts, comment la distanasie, la mistanasie et le suicide aider. Y compris, nous avons analiser le institut de la euthanasie em train de utilizer devant la Constituicion de la Republique, sur le principe de la dignité et, devant le Code Pénal Brésilien actuel. Alors, nous avons présenter une interprétation constitutionnel de cette pratique, oú nous résoudrons au suivant questionnement : Il sera necessaire la légalisation de la euthanasie ? Mots clés: Euthanasie; Principe de la Dignité de la Personne; Dworkin; Alexy; Interprétation Constitutionnel. 58 REFERÊNCIAS ALBUQUERQUE, Paulo Antônio de Menezes. Robert Alexy. In: BARRETTO, Vicente de Paulo (coord.). Dicionário de Filosofia. São Leopoldo, Rio Grande do Sul: Ed. Unisinos e Rio de Janeiro: Ed. Renovar, 2006, p. 33-36. ALEXY, Robert. 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