Caso clínico Rev. Medicina Desportiva informa, 2012, 3 (1), pp. 6–7 Avulsão da tuberosidade anterior da tíbia no atleta jovem Dr. Norberto Silva, Dr. André Sarmento, Dr. Rui Rocha, Dr. Pedro Lourenço, Dr. Carlos Granadeiro Serviço de Ortopedia e Traumatologia CH Vila Nova e Gaia / Espinho EPE Resumo Abstract As fracturas avulsivas da tuberosidade anterior da tíbia são raras. Até 1990 apenas foram descritas cerca de 150. A quase totalidade destas lesões ocorre em adolescentes do sexo masculino, durante actividades desportivas. Watson-Jones discutiu-as com algum detalhe. Desde cedo surgiu o receio de poderem levar a complicações tardias como encerramento precoce da fise e alterações degenerativas secundárias do joelho. Existe uma predominância pelo lado não dominante ainda por explicar. É tema de debate que a doença de Osgood-Schlater possa predispor para este tipo de lesão. Trata-se de uma patologia com resultados clinicos excelentes desde que se consiga uma boa redução da fractura. Fracture-avulsions of the anterior tibial tuberosity are a rare finding. Until 1990, only around 150 cases were reported. Almost all of these lesions occur on male teenagers during athletic activities. Watson-Jones studied and discussed this pathology in some detail. It occurs predominantly on the non-dominant side. It’s argued that Osgood-Schlater disease may be a predisponing injury. Excelent results are expected as long as an anatomic reduction is achieved. Palavras-chave Keywords Tuberosidade anterior da tíbia; Avulsão; Atleta jovem. Anterior Tibial Tuberosity; Avulsion; Young athlete. Introdução A fractura avulsiva da tuberosidade anterior da tíbia (TAT) é uma entidade nosológica rara, tendo sido, até 1990 descritas apenas cerca de 1505. Watson-Jones estudou-a e discutiu-a com algum detalhe, tendo, inclusive, proposto um sistema de classificação (1955)5, posteriormente melhorado por Ogden18. A quase totalidade destas lesões ocorre em adolescentes, do sexo masculino (≈98%) 2,6,7,11,12,14,15,17,19 durante actividades desportivas que envolvem salto, principalmente durante a fase de carga excêntrica no apoio4,9,13. A avulsão da TAT ocorre quando a tracção do ligamento patelar excede a capacidade de resistência combinada da fise, anel pericondral e periósseo adjacente. Existem 2 mecanismos de lesão: contracção violenta do quadricípete contra uma tíbia imóvel ou flexão passiva do joelho contra um quadricípete contraído. Clinicamente, estes doentes apresentam-se habitualmente com um quadro de dor, derrame articular do joelho e impotência funcional 6 · Janeiro 2012 www.revdesportiva.pt acentuada. A capacidade de extensão está geralmente abolida, excepto nas fracturas tipo IA. O diagnóstico é confirmado radiograficamente. Figura 1. Classificação de Watson-Jones Fig 2: Classificação de Ogden Esta patologia deve ser diferenciada da frequente doença de Osgood-Schlatter. Esta é uma lesão crónica da porção anterior da TAT sem envolvimento da fise8, cuja base anatomo-fisio-patológica não está bem esclarecida e é tema de discussão. A apresentação clínica é também diferente: agravamento gradual de queixas álgicas bem localizadas, típicas de patologia de sobre-uso. Existe algum debate acerca da possibilidade da doença de Osgood-Schlatter poder predispor para a fractura avulsiva da TAT1.. Material e Métodos Os autores descrevem o caso de um adolescente de 14 anos que se apresentou no SU do Centro Hospitalar e Vila Nova de Gaia/E spinho [CHVNG/E EPE] na sequência de acidente desportivo durante a prática de Basquetebol. Segundo informação do paciente, terá apoiado mal o pé esquerdo ao tocar o solo após um salto, sentindo uma dor intensa e súbita no joelho que provocou a sua queda imediata. À entrada no SU apresentava derrame articular do joelho esquerdo, dor bem localizada e incapacidade para a marcha e para a extensão activa do joelho. Após estudo radiográfico com incidências de face e perfil do joelho diagnosticou-se fractura avulsiva da TAT tipo 2B, segundo a classificação de Ogden. O paciente foi submetido a redução aberta e osteossíntese no mesmo dia, conseguindo-se uma redução adequada. Foi utilizada uma via de abordagem para-patelar externa e na osteossíntese foi usado um parafuso de esponjosa 3,5 mm. Após cirurgia para redução cruenta e osteossíntese com um parafuso, o paciente ficou imobilizado com tala gessada posterior durante 4 semanas, a que se seguiu programa de reabilitação orientado por Especialista de Fisiartria do CHVNG/E EPE. atravessam a superfície articular da tíbia proximal. Bibliografia Figura 3. Radiografia de Perfil Joelho Figura 4. Incidência de Face Joelho esq (notar patela em posição anormalmente alta menor densidade óssea na região da TAT) Figura 5. Radiografia de controlo pós-operatório De salientar que o paciente não apresentava antecedentes de doença de Osgood-Schlatter. Resultados O paciente recuperou rapidamente o arco completo de mobilidade do joelho e retomou o nível de actividade prévio à lesão. Reiniciou a prática desportiva aos 4 meses pós-operatório e mantém-se a jogar Basquetebol sem queixas desde então (1 Ano e 6 Meses de seguimento). Não surgiram complicações descritas na literatura como: pseudartrose, “patela baja”, calcificação do tendão patelar, e/ou instabilidade do LCA. para fracturas avulsivas da TAT. Mas esta suspeita não está cientificamente comprovada, apesar de parecer existir uma associação14. Outro ponto de discussão é a necessidade de extracção de material de osteossíntese após consolidação da fractura. Uma das complicações mais frequentes após o tratamento cirúrgico desta lesão é a proeminência provocada pela cabeça do(s) parafuso(s) usados na osteossíntese. Este problema pode ser contornado, escarificando a região da inserção do parafuso. No entanto, este gesto técnico pode fragilizar ainda mais a tuberosidade, podendo provocar a fragmentação do foco de fractura e tornar uma fractura de fácil tratamento, com um prognóstico excelente, num problema bem mais difícil. Discussão Conclusões O caso descrito enquadra-se nos dados epidemiológicos, etiopatogénicos e clínicos descritos na bibliografia existente. A maior frequência, desta patologia, em adolescentes do sexo masculino pode estar associada à maior força muscular e agressividade associadas ao sexo masculino e ainda ao encerramento mais tardio das fises5. Epidemiologicamente existe uma predisposição para estas lesões ocorrerem no membro inferior não dominante, cirscuntância para a qual não existe uma explicação científica adequada5. Determinar o mecanismo fisiopatológico deste achado epidemiológico poderia ajudar a desenvolver formas de prevenção da lesão. Existem alguns relatos na bibliografia que sugerem a doença de Osgood-Schlatter como factor predisponente Apesar de rara, a fractura avulsiva da TAT é a lesão traumatica fisária da região do joelho com melhor prognóstico. O tratamento conservador tem indicações limitadas, reservando-se para o tratamento de fracturas do tipo IA de Ogden. A grande maioria beneficia de tratamento cirúrgico com redução aberta e osteossíntese. A opção da técnica de osteossíntese fica ao critério do cirurgião (resultados excelentes estão descritos com diferentes técnicas como sutura intra-óssea, fixação com fios de Kirschner, parafusos corticais/esponjosos com ou sem anilha). O factor de prognóstico mais importante é a qualidade da redução do foco, assumindo particular importância nas fracturas do tipo III de Ogden que 1. Beaty JH, Kumar A. Fractures about the knee in children. Journal of Bone and Joint Surgery American 1994;76:1870-1880 2. Bolesta MJ, Fitch RD. Tibial tubercle avulsions. 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