O belo e a arte como imitação Ronaldo Nezo | Estética da Comunicação I A beleza fascina o homem ocidental desde a Grécia até o Renascimento. Na Grécia, apogeu da idéia de beleza se centrou no corpo humano. Mas por que será que esse ideário de beleza se dá a partir da Grécia? A consciência de liberdade alcançada pela polis grega; A razão autônoma passa a ditar a lei. A arte platônica de beleza pressupõe a arte clássica. Platão entendia que a arte tinha leis invariáveis e essenciais – ou formas eternas. Platão era um crítico frente à arte, sobretudo em dois pontos: o problema da imitação e no da educação. Imitação: Platão divide a realidade em dois universos distintos: o inteligível e o sensível. O primeiro contém as formas puras, as essências e o fundamento da existência dos seres do segundo. Assim, tanto os seres da natureza quanto os homens são cópias sensíveis de modelos originais inteligíveis. Imitação: É a partir disso que Platão faz sua crítica à arte. Cada ser particular participa das ideias (a participação é a relação entre o todo e as partes) sem se confundir com elas, que são, pois, absolutas. O mundo é uma cópia do real e esse afastamento do verdadeiro já é uma Dessemelhança, ainda que natural. Entretanto, Platão julga a arte como imitação, capaz de enganar, uma vez que a realidade sensível já é uma imitação do inteligível. A arte afasta ainda mais do real, pois imita a cópia. A imitação da cópia é o que Platão chama de Simulacro, que introduz uma desmedida maior do que a própria existência do mundo natural. Por isso Platão rejeita a arte em seu estado ideal, querendo, com isso, substituir a Poesia pela Filosofia. • Imitação: Aristóteles e Platão entendem a arte como uma imitação da realidade. Apenas a filosofia teria a capacidade de atingir o real; o filósofo, não o artista, poderia contribuir para a construção de um conhecimento verdadeiro. Em Platão, o filósofo é aquele que saiu da caverna, não foi iludido pelo sensorial ao perceber apenas as sobras dos seres verdadeiros. A verdade platônica estaria em um mundo primordial das idéias perfeitas. Todos e tudo teriam origem neste mundo. É na passagem do mundo das idéias, espiritual, para o corpóreo, o mundo da vida, que esqueceríamos tudo. O processo de conhecimento no platonismo se dá pela atividade mental, pelo pensamento racional. As sensações e emoções fornecem a doxa, o conhecimento falso, baseado na aparência. • Educação: o tema da educação se mistura com a questão da relação entre o bem e o bem moral. • [...] a boa qualidade do discurso, da harmonia, da graça e do ritmo dependem da qualidade do caráter • [...] a educação pela música é capital, porque o ritmo e a harmonia penetram mais fundo na alma e afetam-na mais fortemente [...].7 Platão é moralista e considera que a arte tem que subordinar-se ao bem da educação moral da juventude. Este bem consiste na concordância entre nossas paixões e a razão. Os movimentos das ações e paixões humanas podem imitar-se, mediante ritmos, no canto e na dança. Mas nem todos os ritmos correspondem a uma atitude correta do espírito. Por isso é necessário selecionar o tipo de harmonias que podem admitir-se na escola. Somente merece considerar-se bela a harmonia que produz prazer a um homem virtuoso. E igualmente é aceitável a literatura que produz atitudes corretas diante da vida (p.17). • Platão não desdenha os poderes da arte, em última instância, porque também não desdenha os poderes da sensibilidade. Nada que chegue aos olhos e ouvidos dos mais jovens é inofensivo no processo de formação de suas almas. Por isso, após legislar sobre as partes da música, no livro III da República, partindo do princípio de que há um nexo intrínseco entre o tipo de música e o tipo de caráter, virtuoso ou vicioso. A pedagogia, em sentido rigoroso como a “condução das crianças”, é questão cara a Platão por ser a instância capaz de operar sobre o círculo conservador da tradição cultural, pelo qual cada um educa os demais e é por eles educado – vale dizer, serve de modelo para a imitação dos demais e os imita. Colorindo, sonorizando, perfumando a circunstância da criança, se lhe molda o caráter de modo correspondente, pois ela há de imitar o que vê, ouve, sente. Platão tenta sempre apresentar a beleza como uma potência cósmica de primeira ordem. Ele relaciona a beleza com aquilo que produz prazeres autênticos, e inclui cores, formas belas, sons. As formas simples são o objeto fundamental do desfrute estético. A idéia fundamental é que a natureza mais íntima da alma é atraída para a beleza. Existe uma força que atrai o homem, por exemplo, para um corpo belo. PLOTINO Resgata a concepção de um “Uno” originário. No processo de criação, a alma seria o ente primeiro ligado – ou com parentesco – com o Uno. Concebe a própria natureza como uma imitação das idéias. Plotino diz que a arte imita a natureza, mas que a arte se eleva para aquelas idéias que dão o ser à natureza. Já para Tomás de Aquino, a beleza ou a formosura mesma é Deus, que se comporta como causa primeira de toda coisa bela. O belo e o bom são a mesma coisa no sujeito, porque se fundam sobre a mesma coisa, a saber, sobre a forma, e por isto o bem é louvado como formoso. Mas se diferenciam pela razão. Pois o bom propriamente se refere ao apetite, já que é o bem que todas as coisas apetecem; e por isto tem razão de fim, pois o apetite é como certo movimento para a coisa. O belo, ao contrário, se refere à força cognoscitiva*, pois se chamam belas as coisas que, vistas, agradam (p.24). *Cognoscitiva – capacidade de entender, compreender algo A beleza em Tomás de Aquino é, por fim, uma contemplação desinteressada. Ele introduz elementos não discutidos até então: - concepção de claridade (coisas têm que ter cor nítida); - belo agrada pela simples presença; não é aspiração nossa. Kant e Tomás de Aquino não defendem posições muito contrárias. O que Kant estabelece de diferente é o que ele denomina de juízo estético. Uma rosa, por exemplo... Sua forma produz um prazer. Isto origina o quê? Um juízo estético (a rosa é bela). Em Tomás de Aquino o mesmo conceito será dito como um juízo teleológico porque essa mesma rosa tem uma finalidade e a natureza teria trabalhado para produzir sua beleza. Kant escreveu três críticas: a Crítica da Razão Pura, a Crítica da Razão Prática e a Crítica do Juízo. A crítica kantiana do juízo se refere à capacidade de sentir prazer ou desgosto e, em geral, à dimensão do sentimento humano. O juízo estético é sempre um juízo que cria a norma. A norma, em Kant, tem uma base científica. - qualidade: o juízo estético é a capacidade de julgar acerca de um objeto por meio de uma satisfação ou insatisfação inteiramente desinteressadas. Ou seja, o gosto estético é um prazer desinteressado. - quantidade: o belo é o que agrada universalmente. O juízo estético baseia-se num sentimento, e não em conceitos. • - relação: é algo percebido sem representação alguma do fim ou utilidade. • Isso significa que no objeto belo temos a impressão de que se cumpre uma finalidade, mas não sabemos que finalidade é a que ali se cumpre. • - modalidade: o belo é aquele que sem nenhum conceito se reconhece como objeto de uma satisfação necessária. E o que faz isso? Ou seja, o que possibilita que entendamos que o objeto é belo para todos? A resposta se situa na perspectiva transcendental. A idéia de que todos desenvolvam uma atividade espontânea de entendimento – criatividade e imaginação. Para Kant, no juízo estético se produz uma concordância plena da natureza com nossas faculdades cognoscitivas e, por isso, experimentamos agrado. O prazer produzido pelo belo é conseqüência da comunicabilidade universal. A intenção da natureza se mostra coerente com nossa intenção cognoscitiva. O PROBLEMA DA IMITAÇÃO A arte possui relação intrínseca com o momento de sua produção. Para os gregos, deveria imitar a natureza. Já noutros momentos da história, trata-se de uma mímese da própria sociedade, da natureza humana. Os gregos interpretavam o belo e a arte como imitação (mímese) do eterno na natureza. O conceito de imitação torna-se mais plausível em uns gêneros que em outros. Ex: a escultura toma como modelo imagens naturais. Arquitetura toma da natureza, por exemplo, a duplicidade de peso e suporte, a simetria, a proporção... E a música? Reproduz certos sons naturais e dá expressão aos sentimentos do homem, que é um ser natural. Na época moderna, o poder do natural (e da beleza) dá lugar, pouco a pouco, à ação histórica do homem. Isso indica, à primeira vista, que a arte se desliga da idéia de imitação. Aristóteles atribui uma função moral à arte – não rompe com a vinculação platônica entre arte e educação. Aristóteles não tem problemas em legitimar a representação artística. Ele diz que todas as artes consistem em imitações. Em Aristóteles, a arte é definida como a “faculdade de produzir (criar) o verdadeiro como reflexão”. Aristóteles diz que a arte não plagia o que está dado, mas reflete de forma criadora (imaginativa) aquilo que os homens são. A obra do poeta, por exemplo, não consiste em dizer-nos como as coisas são, senão tal como têm podido ser ou devessem ser. Na tragédia, um aspecto interessante, segundo o filósofo, é que a fábula é apontada como algo que trata de problemas universais. Por isso, gera empatia no público (dor, tristeza, paixões etc). Cada artista reproduz aspectos parciais, já que o modelo não é concreto, mas idealizado (o homem pode vir a ser). Durante a Idade Média, a arte vai reproduzir a realidade social da época – a nobreza, a cavalaria e o cristianismo. A partir do Renascimento se tomará cada vez mais consciência de que a produção artística é uma criação subjetiva e não uma mera reprodução da natureza. Para os teóricos do Renascimento existem normas superiores ao sujeito e ao objeto que regulam o processo de criação artística. Mas o pensamento fica nisso? – Não. Por exemplo, antes do Barroco, temos um movimento chamado Maneirismo. O que faz o maneirismo? Reaciona as normas fixas – é contra as regras matemáticas. Prevê liberdade absoluta para o artista. De acordo com alguns maneiristas, Deus deu a capacidade ao espírito humano para produzir uma ordem mental independentemente do mundo sensível. Arte não é uma cópia imitativa da natureza, mas sim um processo de sublimação da mesma. O modelo elaborado subjetivamente é superior aos modelos naturais. O mundo exterior é valorizado agora como fonte de inspiração e estímulo de pensamento. Mas enquanto isso acontece, começa a desenhar-se um novo horizonte - com a valorização do inconsciente humano. Isso vai ganhar força no Surrealismo, no impressionismo. O marxismo simpatiza com a concepção realista da arte. Marx compartilha a reação contra o idealismo e não é a favor da arte como um reino ideal ou abstrato. Lukacs vai sustentar que o autor literário tem de defender uma tese – tese esta que represente a realidade. Para concluir - A arte representa ou expressa sensivelmente a natureza (subjetiva/objetiva) num certo grau de universalidade. (...) Inclusive quando o artista representa uma figura exterior, deixa nela o selo de sentimentos e atitudes interiores. Lições de Estética Filosófica, Hélio Hartmann https://sites.google.com/a/webhumanas.net/www/plat%C3%A3o,a rist%C3%B3teleseapoesiadehomero http://www.revistaviso.com.br/pdf/Viso_1_LuisFelipeBRibeiro.pdf