acórdão - Ministério Público

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Nº 70049790009
2012/CÍVEL
INCIDENTE DE INCONSTITUCIONALIDADE DO
ARTIGO 9º DA LEI MUNICIPAL Nº 8.133/98, DE
PORTO ALEGRE, QUE CRIOU A EPTC, EMPRESA
PÚBLICA DE TRANSPORTE E CIRCULAÇÃO.
EMPRESA PÚBLICA COM PERSONALIDADE DE
DIREITO PRIVADO SOB A FORMA DE ECONOMIA
MISTA. POSSIBILIDADE DE DELEGAÇÃO DA
FISCALIZAÇÃO E APLICAÇÃO DE SANÇÕES.
INEXISTÊNCIA DE VEDAÇÃO CONSTITUCIONAL.
EMPRESA FORMADA EXCLUSIVAMENTE COM
CAPITAL PÚBLICO, TENDO COMO ACIONISTAS O
MUNICÍPIO DE PORTO ALEGRE E O DMLU,
AUTARQUIA MUNICIPAL, O QUE REFORÇA A SUA
NATUREZA PÚBLICA. MATÉRIA JÁ APRECIADA
PELO ÓRGÃO ESPECIAL EM CASO ANÁLOGO, O
QUE DISPENSA A SUSCITAÇÃO DE NOVO
INCIDENTE.
Por força do artigo 8º da Lei 8133/98, a municipalidade
de Porto Alegre foi autorizada a constituir e organizar
uma empresa pública, a EPTC, com as atribuições de
ser o órgão executivo e rodoviário do município, para o
exercício das atividades descritas no artigo 24 da
Constituição Federal, nos termos do que permite o
Código de Trânsito Brasileiro, o que foi feito, por força
da norma citada, dispondo, em seu artigo 9º, que a
personalidade da EPTC será de direito privado, o que
não é vedado, bastando, apenas, que a empresa seja
criada por lei, em atenção ao comando contido no
artigo 5º, II, da Constituição Federal, o que foi
observado no presente caso.
A EPTC, empresa de economia mista que tem
participação acionária do município de Porto Alegre e
do DMLU, autarquia municipal, com capital societário
exclusivamente público, circunstância que reforça,
ainda mais, a natureza pública da EPTC, repito,
constante no artigo 8º da Lei 8133/98, embora sob a
forma de economia mista, para o exercício de
atividade estatal.
Precedente do Órgão Especial julgando, de forma
unânime, improcedente ADIn proposta contra a EBTC
de Bagé, o que demonstra a improcedência de novo
incidente.
INCIDENTE JULGADO IMPROCEDENTE. UNÂNIME.
ARGUIÇÃO
INCONSTITUCIONALIDADE
DE
ÓRGÃO ESPECIAL
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COMARCA DE PORTO ALEGRE
COLENDA 22A CAMARA CIVEL
PROPONENTE
GILSON FINKLER
INTERESSADO
EMPRESA
PUBLICA
DE
TRANSPORTE E CIRCULACAO S A
EPTC
INTERESSADO
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes do Órgão Especial
do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em julgar improcedente o
Incidente de Inconstitucionalidade.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes
Senhores
DESEMBARGADORES
MARCELO
BANDEIRA
PEREIRA
(PRESIDENTE), DANÚBIO EDON FRANCO, ARMINIO JOSÉ ABREU
LIMA DA ROSA, ARNO WERLANG, MARCO ANTÔNIO RIBEIRO DE
OLIVEIRA, NEWTON BRASIL DE LEÃO, SYLVIO BAPTISTA NETO,
FRANCISCO JOSÉ MOESCH, LUIZ FELIPE BRASIL SANTOS, OTÁVIO
AUGUSTO DE FREITAS BARCELLOS, VOLTAIRE DE LIMA MORAES,
GUINTHER SPODE, ALEXANDRE MUSSOI MOREIRA, ANDRÉ LUIZ
PLANELLA VILLARINHO, CARLOS CINI MARCHIONATTI, NEREU JOSÉ
GIACOMOLLI, UMBERTO GUASPARI SUDBRACK, PAULO ROBERTO
LESSA FRANZ, GLÊNIO JOSÉ WASSERSTEIN HEKMAN, TASSO CAUBI
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SOARES DELABARY, JORGE LUIZ LOPES DO CANTO E EDUARDO
UHLEIN.
Porto Alegre, 13 de agosto de 2012.
DES. CARLOS EDUARDO ZIETLOW DURO,
Relator.
RELATÓRIO
DES. CARLOS EDUARDO ZIETLOW DURO (RELATOR)
Trata-se de incidente de inconstitucionalidade suscitado, por
maioria, pela 22ª Câmara Cível deste Tribunal, tendo por objeto o artigo 9º
da Lei 8.133/1998, de Porto Alegre por entender que os atos de fiscalização
e aplicação de sanções no trânsito não podem ser delegados aos
empregados de sociedade de economia municipal
O Ministério Público manifesta-se pela improcedência do
incidente
de
inconstitucionalidade
pela
inexistência
de
vedação
constitucional para a delegação, trazendo à colação precedente do Órgão
Especial do Tribunal de Justiça.
É o relatório.
VOTOS
DES. CARLOS EDUARDO ZIETLOW DURO (RELATOR)
Eminentes colegas. Ao ser analisada a apelação cível
interposta,
diante
do
pedido
formulado
de
declaração
de
inconstitucionalidade do artigo 9º da Lei Municipal 8.133/98, proferi o
seguinte voto contrário à suscitação do incidente de inconstitucionalidade,
salientando que a matéria já havia sido apreciada pelo Órgão Especial
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anteriormente, em acórdão da relatoria do eminente Des. Vasco Della
Giustina, onde, por unanimidade, foi julgada improcedente a ADIn nº
70006499776, onde, com a seguinte fundamentação, ora reproduzida,
decidi:
“Inicialmente, deve se observado que, por força do artigo 8º da
Lei 8133/98, a municipalidade de Porto Alegre foi autorizada a constituir e
organizar uma empresa pública, a EPTC, com as atribuições de ser o órgão
executivo e rodoviário do município, para o exercício das atividades
descritas no artigo 24 da Constituição Federal, nos termos do que permite o
Código de Trânsito Brasileiro, o que foi feito, por força da norma citada,
dispondo, em seu artigo 9º, que a personalidade da EPTC será de direito
privado, o que não é vedado, bastando, apenas, que a empresa seja criada
por lei, em atenção ao comando contido no artigo 5º, II, da Constituição
Federal, o que foi observado no presente caso.
Não obstante a existência de divergência doutrinária acerca da
possibilidade de delegação de atividade estatal para empresa privada, no
caso, economia mista, deve ser considerado que esta tem participação
acionária do município de Porto Alegre e do DMLU, autarquia municipal, com
capital societário exclusivamente público, circunstância que reforça, ainda
mais, a natureza pública da EPTC, repito, constante no artigo 8º da Lei
8133/98, embora sob a forma de economia mista, para o exercício de
atividade estatal.
A questão já foi apreciada no Órgão Especial, no julgamento da
Adin nº 70006499776, em 27/12/2004, tendo como Relator o Des. Vasco
Della Giustina, onde, por unanimidade, ao analisar a delegação de poderes
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para a da EBTC de Bagé, com personalidade jurídica de direito privado
similar a EPTC, foi afastada a inconstitucionalidade, com a seguinte ementa:
ADIN. LEI Nº 3.761/2001, DO MUNICÍPIO DE BAGÉ,
QUE DISPÕE SOBRE A CRIAÇÃO DA "EMPRESA
BAGEENSE DE TRANSPORTE E CIRCULAÇÃO" EBTC - E AUTORIZA O EXECUTIVO MUNICIPAL A
CONSTITUÍ-LA E ORGANIZÁ-LA, PREVENDO A
OBRIGAÇÃO
DE
AS
EMPRESAS
CONCESSIONÁRIAS
DO
SERVIÇO
DE
TRANSPORTE COLETIVO RECOLHEREM, EM
FAVOR DAQUELA, ATÉ 3% DO TOTAL DA SUA
RECEITA TARIFÁRIA, BEM COMO RECURSOS
PARA A OPERAÇÃO E FISCALIZAÇÃO DO
SISTEMA MUNICIPAL. LEGITIMIDADE ATIVA DA
PROPONENTE. DELEGAÇÃO DO EXERCÍCIO DA
FISCALIZAÇÃO E IMPOSIÇÃO DE SANÇÕES POR
EMPRESAS PÚBLICAS MUNICIPAIS. LEGALIDADE.
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA QUE NÃO VEDA A
DELEGAÇÃO DO PODER DE POLÍCIA A
ENTIDADES DE ADMINISTRAÇÃO INDIRETA, COM
NATUREZA JURÍDICA PRIVADA, DESDE QUE
REGULADA
POR
LEI.
MODALIDADE
CONTEMPORÂNEA DA ATUAÇÃO DO PODER
PÚBLICO.
EXIBE-SE,
TODAVIA,
INCONSTITUCIONAL O ART. 31 DA CITADA LEI,
QUE OBRIGA AS CONCESSIONÁRIAS DO
SERVIÇO DE TRANSPORTE COLETIVO DO
MUNICÍPIO A RECOLHEREM, MENSALMENTE, EM
FAVOR DAQUELA EMPRESA, A IMPORTÂNCIA DE
ATÉ 3% DO TOTAL DA SUA RECEITA TARIFÁRIA.
DETERMINAÇÃO DESSA ORDEM FERE O ART.
145, II, COMBINADO COM SEU § 2º (QUE EXIGEM
SEJAM OS SERVIÇOS RELATIVOS ÀS TAXAS
DIVISÍVEIS, PARA COBRANÇA QUANTIFICADA DE
SEUS USUÁRIOS, NÃO PODENDO ESTAS, VIA DE
CONSEQÜÊNCIA, TER BASE DE CÁLCULO
PRÓPRIA DE IMPOSTOS, NO CASO, DO ISS,) BEM
COMO O ART. 150, II, (QUE, POR FORÇA DO
PRINCÍPIO
DA
ISONOMIA,
VEDA
SEJA
DISPENSADO
TRATAMENTO
TRIBUTÁRIO
DESIGUAL ENTRE TODOS OS FISCALIZADOS),
AMBOS DA CF/88 E APLICÁVEIS AOS MUNICÍPIOS
POR FORÇA DOS ART. 8º, E 140 DA CARTA
ESTADUAL. AÇÃO JULGADA PARCIALMENTE
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PROCEDENTE. (Ação Direta de Inconstitucionalidade
Nº 7006499776, Tribunal Pleno, Tribunal de Justiça do
RS, Relator: Vasco Della Giustina, Julgado em
27/12/2004)
Reproduzo parcialmente a fundamentação do ilustre Relator,
em face da pertinência ao tema:
“A temática concernente aos artigos 11 (finalidade da
empresa pública cuja criação foi autorizada) e 9°
(possibilidade de prestação de serviços de outra
natureza) tem a ver, em última análise, com a mesma
tese da inicial: a indelegabilidade dos misteres
exclusivos da Administração Direta, da atividade
pública primária.
“Entende-se que a presente ação não prospera, neste
passo.
“A doutrina tradicional, isso é inegável, sempre
entendeu que o poder de polícia, por constituir
atividade típica de Estado, não poderia ser exercido
por particulares.
“Nesse sentido, Diogo de Figueiredo Moreira Neto
preleciona:
‘Em regra, cabe ao próprio Estado, em
seus desdobramentos políticos e
administrativos, executar as atividades
de
Administração
Pública.
Tão
volumosa e diversíficada é, porém, esta
tarefa demandada de um Estado
contemporâneo, que passou a ser
comum a transferência a entidades
privadas dos encargos de execução,
mediante instrumentos jurídicos de
delegação.
‘A doutrina considera que certas
atividades são, todavia, indelegáveis: as
denominadas atividades jurídicas do
Estado, que lhe são próprias e impostas
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como condição necessária de sua
existência. As demais delegáveis são as
chamadas
atividades
sociais
ou
impróprias que são cometidas ao
Estado na medida em que ao legislador
pareçam úteis à sociedade, embora não
sejam fundamentais a sua preservação.
No campo do poder de polícia, só há
atividades próprias (em ‘Curso de
Direito Administrativo’, Forense, 1996,
p. 86).
“Com a Lei nº 9.503/97, que criou o novo Código
Brasileiro de Trânsito, o assunto voltou à tona, em
vista da delegação, em alguns municípios, do
exercício da fiscalização e da imposição de sanções a
pessoas jurídicas de direito privado. Em Porto Alegre,
criou-se a Empresa Pública de Transporte e
Circulação (EPTC), com atribuição de fiscalização do
trânsito no âmbito local.
“O debate empolgou a doutrina, que se debruçou
sobre a matéria não poucas vezes. Diógenes
Gasparini, por exemplo, sustenta que "o exercício do
poder de polícia de trânsito pelos Municípios terá de
ser feito por seus órgãos ou por suas entidades, na
forma de fundações ou autarquias, todos pessoas
jurídicas de direito público, submetidas aos princípios
constitucionais
da
legalidade,
impessoalidade,
moralidade e publicidade, dentre outros (em ‘Novo
Código de Trânsito: Os municípios e o policiamento’,
publicado em Revista de Direito Administrativo n.o
212, p. 184). Em seguida, conclui incisivamente:
‘Claro está que permitir à administração
indireta, às sociedades anônimas, às
pessoas jurídicas de díreito privado,
enfim, aos particulares, ainda que
parcialmente, utilizarem-se do poder de
polícia de trânsito, que é poder de
império do Estado, cuja sanção é
unilateral, externa e interventiva, para
aplicar e arrecadar multas que
reverterão em lucros ou dividendos a
esses mesmos particulares, não pode
ser legal e jamais será considerado
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honesto, moral e ético. Pelo contrário,
tratar-se-á de autêntica aberração
contra a qual a Sociedade precisa ficar
alerta, tendo em vista que interessados
nesse abuso não faltam.’ (op. cit., p.
185).
“Na mesma linha, Luciano Martins Mattos de Souza
preleciona que será permitida ‘a delegação a
entidades componentes da administração indireta,
desde que tenham personalidade jurídica de direito
público e criadas para tal fim’ (em ‘Da impossibilidade
de delegação das atividades de trânsito a particulares’,
publicado em Revista do Ministério Público do Estado
do Rio de Janeiro nº 98, p. 193).
“No
entanto,
apesar
desses
respeitáveis
posicionamentos, não parece que a Constituição
Federal tenha, em algum momento, vedado a
delegação do exercício do poder de polícia. A
exigência é que tal atividade seja regulada por lei, até
mesmo por força do disposto no art. 5°, II, da
Constituição Federal, mas, uma vez existente ato
normativo com origem parlamentar, nada impede que
a entidades da administração indireta seja atribuída
competência para tal atividade.
“O
entendimento
diverso
parece
levar
a
conseqüências extremadas o mero reconhecimento da
existência de atividades típicas de Estado, sem que se
preste atenção a modalidades contemporâneas de
atuação do Poder Público, em que até mesmo a
cooperação com a sociedade civil organizada e a
iniciativa privada vem sendo desenvolvida. Se assim é,
com mais razão se haverá de acolher a possibilidade
de entidades privadas, mas criadas pelo Estado,
atuarem em atividades primárias deste.
“José dos Santos Carvalho Filho, por exemplo, não
vislumbra nenhum problema na delegação do
exercício de poder de polícia a entidades da
administração indireta com natureza jurídica privada,
desde que seja feita ‘por lei formal’ (em ‘Manual de
Direito Administrativo’, Lumen Juris, 1999, p. 52).
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“No mesmo sentido, parecer foi emitido por Eugênio
Noronha Lopes (publicado em revista de Direito da
Procuradoria-Geral do Estado do Rio de Janeiro
39/281).
“José Afonso da Silva, analisando a situação da
Empresa Metropolitana de Planejamento da Grande
São Paulo S/A (EMPLASA), entidade paraestatal que
exercia poder de polícia ambiental, conclui que ‘nada
impede que, mediante lei especial, se outorgue à
Empresa competência nessa matéria diretamente ou
por decreto devida e especificamente autorizado
naquela lei’ (parecer publicado em Revista de Direito
Administrativo 132/241). Cuida o autor da evolução
que o conceito de poder de polícia vem tendo,
principalmente com o incremento da ação
intervencionista estatal. Aponta também inúmeras
entidades paraestatais que, no Brasil, já vinham
exercendo tal atividade, por delegação, sem qualquer
questionamento (EMBRATUR, BNH, ECT...).
“Também Hely Lopes Meirelles tratou da questão da
delegação de poder de polícia ambiental, no caso, à
Companhia de Tecnologia e Saneamento Ambiental,
sociedade por ações criada pelo Estado de São Paulo.
Conclui o renomado autor que, sendo a delegação
vertida em lei, nada impede o exercício de poder de
polícia por entidade paraestatal (em ‘Estudos e
Pareceres de Direito Público’, v. VI, Malheiros, 1982,
p. 261/277).
“Celso Antônio Bandeira de Mello chega, inclusive, a
sustentar a possibilidade de que ‘certos atos materiais
que precedem atos jurídicos de polícia’ sejam
praticados por particulares em decorrência de simples
contratos de prestação, como ocorre na fiscalização
de normas de trânsito mediante equipamentos
fotossensensores pertencentes a empresas privadas
não estatais (em ‘Curso de Direito Administrativo’,
Malheiros, 2002, p. 714).
“Vê-se, assim, que a questão é tormentosa. Contudo,
é de reconhecer-se a primazia do Poder Legislativo na
concretização da Constituição.
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“Com efeito, a Constituição, vazada, na maioria das
vezes, através de princípios, é caracteristicamente
aberta, já que não apresenta sentidos ‘congelados’
que impeçam a atuação conformadora do Poder
Legislativo. “Desde que preservados, no plano
material, o conteúdo essencial dos direitos
fundamentais e o significado mínimo de base dos
enunciados normativos, há que ser respeitada a
deliberação parlamentar.
“Nesse sentido, a precisa lição de Hans Peter
Schneider:
‘Sólo cuando una disposición de los
poderes públicos infringe la Constitución
'a primera vista', 'de modo recognoscible
para todo hombre', 'abiertamente',
'inequivocamente',
'sin
duda',
es
declarada anticonstitucional. En todos
los demás casos, los órganos
controlados pueden apelar a la
presunción de 'corrección funcional' a su
favor.’ (em ‘Democracia y Constitución’,
Madrid,
Centro
de
Estudios
Constitucionales, 1991, p. 204)
“Não parece que a Lei Fundamental brasileira
contenha dispositivo que ampare a pretensão da
proponente,
o
representante,
mesmo
que
indiretamente. Havendo lei tratando da delegação, e
sendo o surgimento da EBTC autorizado, pela via
legislativa, pelo próprio Município, que é quem cria a
empresa em última análise, não se vislumbra risco aos
princípios da moralidade e da impessoalidade, nem
afetação de atividades típicas de Estado.“
Havendo decisão do Órgão Especial a respeito do tema similar,
entendo desnecessária nova análise sobre o tema porque inexistente
qualquer fato relevante a autorizar a modificação do entendimento havido no
julgamento da Adin em questão, perfeitamente aplicável ao presente caso.
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Não obstante a posição do Egrégio STJ, referido no voto que
encaminha a suscitação do incidente, a matéria é constitucional e é cediço
que o controle da constitucionalidade não é feito pelo STJ e sim pelo STF,
observado o caso.
A relação jurídica dos empregados da EPTC, por sua vez, em
nada altera a questão, podendo os mesmos exercer suas funções
normalmente, em situação similar a de funcionários estatutários que não
adquiriram a estabilidade constitucional, que igualmente podem exercer o
atividade fiscalizatória, como, por exemplo, na área fiscal ou ambiental,
aplicando as respectivas sanções, sem que a falta de estabilidade importe
em qualquer nulidade, não sendo o ponto , no meu sentir, relevante da
questão.
Por final, importante referir que a matéria já foi analisada
judicialmente em relação à EPTC, em sede de ação popular, julgada
improcedente, sentença confirmada pela 4ª Câmara Cível, Relator Des.
Araken de Assis:
ADMINISTRATIVO. TRÂNSITO. PODER DE POLÍCIA.
DELEGAÇÃO À EMPRESA PÚBLICA. POSSIBILI
DADE. PRINCÍPIO DA MORALIDADE. AUSÊNCIA DE
OFENSA. 1. Não padece de nulidade a sentença que,
apreciando os fundamentos de fato e de direito
alegados pelas partes, julga a lide sem desbordar dos
seus limites. Preliminar rejeitada. 2. Em que pesem as
divergências doutrinárias a respeito, a Constituição
Federal não veda a delegação do poder de polícia a
entidades integrantes da Administração Indireta, desde
que regulada por lei. Dessa forma, não é
inconstitucional o art. 10 da Lei 8.133/98, do Município
de Porto Alegre, que conferiu o poder de polícia em
matéria de trânsito à Empresa Pública de Transporte e
Circulação EPTC. Ausência de ofensa ao princípio da
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moralidade, decorrente do fato de que o êxito e o
progresso da atividade econômica da empresa privada
depende da existência e do aumento das infrações,
em virtude do óbvio fato de que a ausência de
infrações de trânsito, cumprindo os motoristas a lei,
conduziria à liquidação da empresa. Em lugar de
pregar a extinção da empresa encarregada do poder
de polícia de trânsito, parece melhor insistir que todos,
sem exceção, precisam cumprir as normas de trânsito,
submetendo-se ao império da lei. Na ação popular o
autor somente responde pelos ônus da sucumbência
se comprovada má-fé (art. 5º, LXXII, CF/88). 3.
APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. (Apelação
Cível Nº 70017122581, Quarta Câmara Cível, Tribunal
de Justiça do RS, Relator: Araken de Assis, Julgado
em 22/11/2006)
Desta forma, tratando-se de atividade delegada com amparo
em norma, consoante visto, exercida por empresa de economia mista com
capital exclusivamente público, observada sua composição acionária, não há
qualquer nulidade no artigo 9º da Lei 8133/98 do município de Porto Alegre,
razão pela qual voto no sentido de não suscitar o incidente de
inconstitucionalidade em questão. “
Em face disto, não há como se acolher o presente incidente,
pelos
motivos
expostos,
razão
pela
qual,
inexistente
qualquer
inconstitucionalidade no artigo 9º da norma municipal referida, julgo
improcedente o presente incidente e, após o respectivo trânsito em julgado,
devem os autos retornar à Câmara de origem para a continuidade do
julgamento de mérito porque decidida a questão constitucional suscitada, à
qual o órgão fracionário não dispunha de competência para dirimir.
É como voto.
DES. GLÊNIO JOSÉ WASSERSTEIN HEKMAN (REVISOR) - De acordo
com o(a) Relator(a).
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DES. UMBERTO GUASPARI SUDBRACK – De acordo com o Relator.
DES. JORGE LUIZ LOPES DO CANTO – De acordo com o ínclito Relator,
pois compartilho do mesmo entendimento quanto à matéria em análise.
DES. ARMINIO JOSÉ ABREU LIMA DA ROSA – Estou acompanhando o
Eminente Relator, permitindo-me transcrever parte do voto que proferi na AC
nº 70047233663:
“Por certo, o tema relativo à legitimação da EPTC, quanto à
aplicação de multas de trânsito, afigura-se perdifícil, suscitando inquietações
doutrinárias e, modo especial, jurisprudenciais.
Desde logo, como muito bem posto na contestação, há de se
estabelecer nítida distinção entre a EPTC e a BHTRANS, entidade a que se
refere o julgamento do RE nº 817.534-MG, MAURO CAMPBELL
MARQUES.
É que a empresa mineira tem permissão, pela lei que a instituiu (Lei
Municipal nº 5.953/91), de participarem de seu capital entidades de direito
privado da administração indireta (art. 4º, § 1º, II) e, com isso, inerente
atração ao lucro, o que foi realçado no julgamento do Superior Tribunal de
Justiça (veja-se o item 6 da ementa).
Enquanto isso, a EPTC não pode possuir, por disposição legal,
qualquer participação de particulares na constituição de seu capital social,
integrado apenas pelo Município de Porto Alegre e pelo Departamento
Municipal de Limpeza Urbana.
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Aliás, não por outra razão tem sido reconhecida a sua imunidade
tributária, seja quanto a tributos estaduais, como federais, como se vê da
AC nº 70036781946, PEDRO LUIZ RODRIGUES BOSSLE, de cujo voto
retiro a seguinte parte:
“Conforme se vê da Lei Municipal nº 8.133/98 (fls. 47/59) e da
Assembléia Geral de Constituição (fls. 60/71), a EPTC é uma empresa
pública que tem por acionistas exclusivamente o Município de Porto Alegre
e o Departamento Municipal de Limpeza Urbana, que é uma autarquia
municipal, tendo por objetivo a “operação, controle e fiscalização do Sistema
de Transporte Público e de Circulação – STPC, em especial a fiscalização
do trânsito e a gestão da Câmara de Compensação Tarifária – CCT do
serviço de transporte coletivo”.
Exsurge dos documentos juntados às fls. 221/236 (da ação de
repetição de indébito) que a União tem reconhecido a imunidade recíproca
em relação à requerente, em face do desempenho de serviço público em
situação de monopólio econômico.
Diante disso, considerando que o serviço prestado pela EPTC é
eminentemente de interesse público, executando atividades puramente
administrativas, possível a aplicação da imunidade tributária recíproca, o
que implica a não incidência do IPVA sobre os veículos de propriedade da
empresa pública.”
Por isso, a compreensão de ser a sua personalidade jurídica de
direito privado destinada, especificamente, a relações jurídicas distintas
daquela derivada do exercício do poder de polícia do trânsito, que é a sua
razão essencial de existir (art. 10, Lei Municipal nº 8.133/98), submissa esta
ao regramento do direito público, permite aceitar-se a legitimação da
atuação fiscalizatória e sancionatória da EPTC.
Com o que, ao exercerem tal atividade, seus agentes estão dotados
da presunção de legitimidade peculiar aos agentes públicos no exercício de
função pública.
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Aliás, o mesmo apelante já teve apreciada situação absolutamente
idêntica, na AC nº 70045719382, DENISE DE OLIVEIRA CEZAR, cujos
fundamentos permito-me transcrever:
“A questão já foi submetida à Segunda Câmara Cível, que desproveu
o agravo n. 70038333126 (fls. 101-189):
Esta Corte possui entendimento no sentido de que a EPTC, muito
embora tenha personalidade jurídica de direito privado, possui competência
para fiscalizar, autuar e aplicar medidas administrativas em razão do
cometimento de infrações de trânsito, investida que está no exercício de
poder de polícia administrativa. Nesse sentido:
APELAÇÃO CÍVEL Nº 70030060859, SEGUNDA CÂMARA CÍVEL,
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS, RELATOR: ARNO WERLANG,
JULGADO EM 25/11/2009
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO.
MULTA DE TRÂNSITO. EPTC. PRESCRIÇÃO QÜINQÜENAL.
OCORRÊNCIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MAJORAÇÃO.
NÃO CABIMENTO.
1. Os Municípios estruturados para a execução das normas de
trânsito, ainda que o façam através de empresas privadas, exercem
competência delegada pela União de executar a fiscalização do
trânsito, autuar e aplicar as medidas administrativas cabíveis por
infração de circulação, estacionamento e para as previstas no
Código Nacional de Trânsito. E o fazendo, atuam investido no
exercício regular do poder de polícia, eminentemente de caráter
público, regulado por normas jurídicas de direito público, e não do
Direito Civil, inclusive no que concerne à prescrição.
2. Transcorridos mais de cinco anos entre a ciência do ato
administrativo e o ajuizamento da demanda, queda prescrita a
pretensão da parte autora, consistente na desconstituição do
procedimento que levou à aplicação da penalidade.
3. Confirmada a sentença, não há falar em majoração da verba
honorária. APELAÇÃO DESPROVIDA.
APELAÇÃO CÍVEL Nº 70026249235, VIGÉSIMA PRIMEIRA
CÂMARA CÍVEL, TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS, RELATOR:
LISELENA SCHIFINO ROBLES RIBEIRO, JULGADO EM
24/09/2008
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO.
INFRAÇÃO DE TRÂNSITO.
1 - Pedido de restituição sem, entretanto, fazer pedido expresso de
anulação do procedimento administrativo na petição inicial.
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2 - O ônus da prova de que não cometeu a infração (uso do cinto de
segurança), no caso, é do apelante, porquanto o AIT série n.
812898, ainda que sem a assinatura do infrator, faz prova, por si só,
do cometimento da infração descrita no art. 167 do CTB.
3 - A assinatura do auto de infração é recomendada pelo CTB, mas
não é imprescindível. A autuação em flagrante apenas documenta a
presença no local ou vale como notificação do cometimento da
infração e não para fins de defesa.
4 - A EPTC, quando aplica multa pela prática de infrações de
trânsito, desenvolve típica atividade pública, consistente no exercício
do poder de polícia administrativa, submetendo-se ao regime
jurídico-administrativo.
5 - Os empregados da EPTC, independentemente de serem
estatutários ou celetistas, são servidores públicos e seus atos gozam
de presunção de legitimidade, como todos os atos administrativos.
RECURSO DESPROVIDO.
APELAÇÃO CÍVEL Nº 70021798293, VIGÉSIMA SEGUNDA
CÂMARA CÍVEL, TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS, RELATOR:
MARIA ISABEL DE AZEVEDO SOUZA, JULGADO EM 28/10/2007
APELAÇÃO CÍVEL. ADMINISTRATIVO. PRESCRIÇÃO. AÇÃO.
INFRAÇÃO DE TRÂNSITO. NULIDADE. SANÇÃO. PRESCRIÇÃO.
EMPRESA PÚBLICA.
1. A polícia administrativa do trânsito é atividade pública típica
submetida ao regime jurídico administrativo. As sanções aplicadas
pela prática de infrações ao trânsito são disciplinadas pelas normas
de direito público.
2. A EPTC - Empresa Pública de Transporte e Circulação - é
sociedade anônima criada pelo Município de Porto Alegre que tem
por objeto o exercício do poder de polícia do trânsito confiado aos
Municípios pelo Código Nacional de Trânsito. Conquanto tenha
personalidade de direito privado, a polícia administrativa do trânsito
executada pela EPTC submete-se às normas de direito público, não
se aplicando as normas do Código Civil.
3. O prazo da prescrição da ação para desconstituição de multa
administrativa aplicada por infração ao trânsito e repetição do valor
pago é de cinco anos. Precedentes do STJ. Decorridos mais de
cinco anos a contar do encerramento do processo administrativo que
impôs a penalidade, é de ser reconhecida prescrição. Cabia ao autor
comprovar causa interruptiva ou suspensiva da prescrição. Negado
seguimento ao recurso por ato do Relator. Art. 557 do Código de
Processo Civil.
Quanto à hierarquia funcional e aos poderes do autuador da infração
é expressa também a legislação ao atribuir a competência para a autuação
ao agente da autoridade, que poderá ser policial militar ou servidor civil,
estes estatutários ou celetistas, ao dispor no art. 280, § 4º, que:
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O agente da autoridade de trânsito competente para lavrar o auto de
infração poderá ser servidor civil, estatutário ou celetista ou, ainda, policial
militar designado pela autoridade de trânsito com jurisdição sobre a via no
âmbito de sua competência.
Ao agente de trânsito, é dada a competência para fiscalizar e lavrar o
auto de infração de trânsito. A ele, portanto, não compete a aplicação da
penalidade decorrente da infração, mas somente a notificação da autuação
de infração de trânsito nas hipóteses de flagrante.
Cabe exclusivamente à autoridade de trânsito julgar o auto de
infração lavrado pelo agente, para, posteriormente, aplicar a penalidade
correspondente.
Consequentemente, submetida a empresa às normas de direito
público, uma vez que investida no exercício de polícia administrativa de
trânsito, seus atos gozam de presunção de legitimidade.”
TODOS OS DEMAIS DESEMBARGADORES VOTARAM DE ACORDO
COM O RELATOR.
DES. MARCELO BANDEIRA PEREIRA - Presidente - Arguição de
Inconstitucionalidade nº 70049790009, Comarca de Porto Alegre: "À
UNANIMIDADE,
JULGARAM
IMPROCEDENTE
O
INCIDENTE
DE
INCONSTITUCIONALIDADE."
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