ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA JCSJ Nº 70032456105 2009/CÍVEL RECURSO DE APELAÇÃO. ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. DEVER DO ENTE PÚBLICO, CONSOANTE A DISPOSIÇÃO CONSTITUCIONAL EXPRESSA AO ASSEGURAR O DIREITO À VIDA E À SAÚDE COMO GARANTIAS FUNDAMENTAIS, DE ACORDO COM A RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA (ART. 196 DA CF/88). RECURSO DE APELAÇÃO DESPROVIDO. APELAÇÃO CÍVEL SÉTIMA CÂMARA CÍVEL Nº 70032456105 COMARCA DE VIAMÃO E.R.G.S. .. M.P. .. M.V. .. APELANTE APELADO INTERESSADO ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos. Acordam os Magistrados integrantes da Sétima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, EM DESPROVER O RECURSO DE APELAÇÃO. Custas na forma da lei. Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores DES. RICARDO RAUPP RUSCHEL (PRESIDENTE E REVISOR) E DES. ANDRÉ LUIZ PLANELLA VILLARINHO. Porto Alegre, 28 de outubro de 2009. DR. JOSÉ CONRADO DE SOUZA JÚNIOR, Relator. 1 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA JCSJ Nº 70032456105 2009/CÍVEL RELATÓRIO DR. JOSÉ CONRADO DE SOUZA JÚNIOR (RELATOR) Trata-se de recurso de apelação interposto pelo ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL contra a sentença que, nos autos da ação de rito ordinário, ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO em favor de G. S. R., jovem com 14 anos à época dos fatos, portador de dependência química, determinou que o Estado do Rio Grande do Sul e o Município de Viamão providenciem a internação do jovem em Hospital/Clínica e ou fazenda terapêutica conveniada com a rede SUS ou na ausência de leito ou vaga, a internação em Clínica/Hospital e ou fazenda terapêutica particular as expensas dos requeridos, para tratamento de drogadição. Em suas razões, o Estado alegou ser parte ilegítima para figurar no pólo passivo da presente demanda. Informou que o usuário de álcool ou drogas devera primeiro ser submetido a tratamento de desintoxicação a nível ambulatorial. Citou a descentralização do SUS. Argüiu que é de competência do Município o tratamento pleiteado, e, caso este não disponha de Hospital Psiquiátrico, deve fazer o encaminhamento do paciente à central de leitos do Município de referencia. Requereu o provimento do recurso. Foram ofertadas contra-razões. A douta Procuradoria de Justiça opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso de apelação. Registre-se, por fim, que foi cumprido o comando estabelecido pelos artigos 549, 551 e 552, todos do CPC. É o relatório. VOTOS DR. JOSÉ CONRADO DE SOUZA JÚNIOR (RELATOR) 2 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA JCSJ Nº 70032456105 2009/CÍVEL Estou em desprover o recurso de apelação. Inicialmente, tenho que o documento juntado à folha 12 comprova a necessidade do tratamento pleiteado por parte do ora apelado. Quanto a ilegitimidade passiva argüida, entendo que compete à União, aos Estados e aos Municípios o resguardo dos direitos fundamentais relativos à saúde e à vida dos cidadãos, conforme regra expressa do art. 196 da Constituição Federal. Da mesma forma dispõe, claramente, a Constituição Estadual, em seu art. 241, que a saúde é direito de todos e dever do Estado e dos Municípios. A obrigação para o tratamento da saúde é tanto do Estado quanto do Município, ainda que fosse o tratamento fornecido pelo SUS, o qual o Estado (lato sensu) integra. A descentralização é característica deste Sistema (art. 198, I, da C.F.), tornando todos os entes responsáveis pela obrigação. A Carta Federal é expressa ao assegurar o direito à vida, e o direito à saúde como Garantias Fundamentais, sendo direito de todos e dever do Estado. De se destacar, que tais normas prescindem de outras na sua aplicação, consoante se vê da disposição do parágrafo 1º, do art. 5.º, de que “as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata”. Não é demasiado lembrar que qualquer norma protetiva da Fazenda Pública, em cotejo com norma e garantia fundamental prevista constitucionalmente, não se sobrepõe. Ao contrário, os direitos à vida e à saúde prevalecem ante qualquer outro valor, igualmente afastada qualquer tese relativa à falta de previsão orçamentária, necessidade de processo licitatório e, por conseqüência, violação do princípio fundamental de separação de poderes. 3 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA JCSJ Nº 70032456105 2009/CÍVEL Nesse sentido, julgados do egrégio Superior Tribunal de Justiça, verbis: “ADMINISTRATIVO. SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS). FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERATIVOS. RECURSO QUE NÃO LOGRA INFIRMAR OS FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA. “1. Sendo o Sistema Único de Saúde (SUS) composto pela União, Estados-Membros, Distrito Federal e Municípios, impõe-se o reconhecimento da responsabilidade solidária dos aludidos entes federativos, de modo que qualquer um deles tem legitimidade para figurar no pólo passivo das demandas que objetivam assegurar o acesso à medicação para pessoas desprovidas de recursos financeiros. “2. Mantém-se na íntegra a decisão agravada quando não infirmados seus fundamentos. “3. Agravo regimental improvido.” (AgRg no Ag 886.974/SC, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, SEGUNDA TURMA, julgado em 20.09.2007, DJ 29.10.2007 p. 208) “PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. ART. 544 DO CPC. MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA ATO DE SECRETÁRIO DE ESTADO DE SAÚDE. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. REQUISITOS LEGAIS. PREENCHIMENTO. REEXAME PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 07/STJ. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS NECESSÁRIOS PARA O TRATAMENTO DE HEPATITE CRÔNICA POR VÍRUS C. ARTIGO 196 DA CF/88. DIREITO À VIDA E À SAÚDE. DEVER DO ESTADO. LEGITIMIDADE PASSIVA. “1. Ação objetivando a condenação da entidade pública ao fornecimento gratuito dos medicamentos necessários ao tratamento de Hepatite Crônica por Vírus C. “2. Assentado o acórdão recorrido que: ‘O medicamento 'Interferon Peguilado Alfa 2a ou Alfa 2b' e 'Ribavirina', foi receituado pelo médico (...), conforme documentos de fls. 23/32-TJ, que atestam ser o medicamento mais eficaz para o tratamento do impetrante. Registra, ainda, o conceituado 4 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA JCSJ Nº 70032456105 2009/CÍVEL especialista, que nos últimos meses a doença do Impetrante 'vem evoluindo com lesão hepato celular intensa', motivo esse da indicação da medicação sub judice, como melhor resposta o quadro clínico do paciente (...) Por conseguinte, resta patente o direito líqüido e certo do Impetrante e fundado receio de dano irreparável ao paciente pela não entrega dos medicamentos necessários ao combate da sua doença’, não cabe ao STJ conhecer do recurso. As questões que levam à nova incursão pelos elementos probatórios da causa são inapreciáveis em sede de recurso especial, consoante previsto na Súmula 7/STJ. “3. O exame do preenchimento dos pressupostos para a concessão da tutela antecipada previstos no artigo 273, deve ser aferido pelo juiz natural, sendo defeso ao STJ o reexame desse pressuposto de admissibilidade, em face do óbice contido na súmula 07/STJ. “4. Precedentes jurisprudenciais: (REsp 505729/RS, Ministro Relator Felix Fischer, 5ª Turma, DJU 23/06/2003; REsp 190686/PR, Ministro Relator Franciulli Netto, 2ª turma, DJU 23/06/2003;MC 2615/PE, Ministro Relator Francisco Falcão, 1ª Turma, DJU 19/08/2002;AGA 396736/MG, Ministro Relator Felix Fischer, 5ª Turma, DJU 25/02/2002; REsp 373775/RS, Ministro Relator Fernando Gonçalves, 6ª Turma, DJU 01/07/2002; REsp 165339/MS, Ministro Relator Jorge Scartezzini, 5ª Turma, DJU 05/03/2001;AGA 199217/SP, Ministro Relator Luiz Vicente Cernicchiaro, 6ª Turma, DJU 17/02/1999) “5. O Sistema Único de Saúde-SUS visa a integralidade da assistência à saúde, seja individual ou coletiva, devendo atender aos que dela necessitem em qualquer grau de complexidade, de modo que, restando comprovado o acometimento do indivíduo ou de um grupo por determinada moléstia, necessitando de determinado medicamento para debelá-la, este deve ser fornecido, de modo a atender ao princípio maior, que é a garantia à vida digna. “6. Configurada a necessidade de recorrido ver atendida a sua pretensão, posto legítima e constitucionalmente garantida, uma vez assegurado o direito à saúde e, em última instância, à vida, sendo certo que a saúde, como de sabença, é direito de todos e dever do Estado. “7. A União, o Estado, o Distrito Federal e o Município são partes legítimas para figurar no pólo passivo nas 5 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA JCSJ Nº 70032456105 2009/CÍVEL demandas cuja pretensão é o fornecimento de medicamentos imprescindíveis à saúde de pessoa carente, podendo a ação ser proposta em face de quaisquer deles. Precedentes: REsp 878080 / SC; Relatora Ministra ELIANA CALMON; SEGUNDA TURMA; DJ 20.11.2006 p. 296; REsp 772264 / RJ; Relator Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA SEGUNDA TURMA; DJ 09.05.2006 p. 207; REsp 656979 / RS, Relator Ministro CASTRO MEIRA, DJ 07.03.2005. “8. Agravo regimental a que se nega provimento.” (AgRg no Ag 842.866/MT, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 12.06.2007, DJ 03.09.2007 p. 127) No entanto, consoante pondera o eminente Des. Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, em inúmeros julgados nesta Corte: "(...) cabe a cada ente público buscar o ressarcimento cabível dentro do próprio sistema público de saúde. Ou seja, se os protocolos apontam que o fornecimento de determinado serviço, medicamento ou alimento especial é de responsabilidade de outro ente público, que não está sendo demandado, cabe ao demandado buscar o repasse dos valores gastos ou, então, promover a cobrança administrativa (ou mesmo judicial) junto ao ente público obrigado, consoante os convênios e protocolos que orientam o sistema público de atendimento à saúde, que é o SUS - SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE." Ante o exposto, nego provimento ao recurso de apelação. É o voto. DES. RICARDO RAUPP RUSCHEL (PRESIDENTE E REVISOR) - De acordo com o(a) Relator(a). DES. ANDRÉ LUIZ PLANELLA VILLARINHO - De acordo com o(a) Relator(a). 6 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA JCSJ Nº 70032456105 2009/CÍVEL DES. RICARDO RAUPP RUSCHEL - Presidente - Apelação Cível nº 70032456105, Comarca de Viamão: "NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO DE APELAÇÃO. UNÂNIME." Julgador(a) de 1º Grau: ANDREA MARODIN FERREIRA HOFMEISTER 7