CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO VERSUS SAÚDE Ana Djéssika Vidal Residente de Gestão Hospitalar – Economia [email protected] CRESCIMENTO ECONÔMICO X DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO Algumas correntes econômicas, por algum tempo, divergiram quanto à definição conceitual de desenvolvimento. Confundiram crescimento com o desenvolvimento e então, passaram a atribuir a necessidade premente da existência de crescimento para a ocorrência de desenvolvimento. Outras, por sua vez, separaram o crescimento do desenvolvimento econômico. No século XX, no tocante a discussão entre desenvolvimento econômico e crescimento econômico, contudo a preocupação maior por parte dos economistas era em tratar do tema crescimento econômico, devido busca incessante de poder econômico ou militar da época; sem o mínimo interesse em acrescentar melhorias na qualidade de vida de suas populações, mesmo em nome da segurança e subsistência para a estabilidade do sistema econômico. (NALI, 1993). A partir da Grande Depressão Americana e, com muito mais ênfase, depois da Segunda Guerra Mundial, o tema desenvolvimento econômico ganhou força, exigindo uma maior presença e ações dos governantes, na busca de política voltada ao combate do desemprego e redução da crise cíclica que afetava a economia como um todo e, principalmente, apresentar soluções para as diferenças econômicas e sociais existentes entre os países ricos e os pobres, classificados como subdesenvolvidos. (MAGALHÃES, 1998). Crescimento Econômico Pode-se conceituar crescimento econômico como o aumento da capacidade produtiva da economia (produção de bens e serviços). É definido basicamente pelo índice de crescimento anual do Produto Nacional Bruto (PNB), per capita. O crescimento de uma economia é indicado também pelo aumento da força de trabalho, pela receita nacional poupada e investida e pelo grau de aperfeiçoamento tecnológico. (Carlos Escóssia - 2009) Desenvolvimento Econômico O desenvolvimento econômico de um país ou estados-nação é o processo de acumulação de capital e trabalho, incorporados de progresso técnico, que leva ao aumento da produtividade, dos salários e do padrão médio de vida da população. O aumento das rendas aqui, reflete numa nova situação econômica e social: a melhoria da qualidade de vida da população. Visa atender diretamente o objetivo fundamental das sociedades modernas – o bem estar – e, apenas de forma indireta os outros quatro objetivos almejados pelas sociedades – segurança, liberdade, justiça social e proteção do ambiente. Pode haver crescimento da renda per capita sem desenvolvimento econômico, mas esse é um caso raro envolvendo economia de tipo enclave e doença holandesa. Excluídos esses casos, o desenvolvimento econômico sempre se caracterizou por aumento da renda per capita e por melhoria dos padrões de vida. Doença Holandesa A doença holandesa é um fenômeno decorrente da existência de commodites em quantidade abundante que geram vantagens comparativas ao país exportador e, segundo os mecanismos de mercado, podem levá-lo a se especializar na produção destes bens e não se industrializar ou terminar se desindustrializando, o que inibiria o processo de desenvolvimento econômico. O que ocorre é que a demanda externa por um determinado produto pressiona a taxa de câmbio do país exportador, aumentando o valor da moeda local e tornando menos competitivos os outros produtos de exportação do país, a caracterizando como uma falha de mercado de externalidades negativas. Somente quando a doença holandesa for neutralizada o mercado estará apto a tornar a taxa de câmbio de mercado próxima do equilíbrio e, assim, alocar eficazmente os recursos e encorajar, novamente, o investimento e a inovação. Doença Holandesa Ocorrência de Casos: • Arábia Saudita, Venezuela e outros países subdesenvolvidos → ela sempre existiu e impediu a industrialização e, portanto, o desenvolvimento econômico, como é o caso de muitos países produtores de petróleo; • Holanda → a forte demanda por gás natural aumentou o valor da moeda holandesa em relação ao dólar, em consequência todos os demais produtos de exportação ficaram em situação de desvantagem competitiva nos mercados mundiais e os produtores, para manter a competitividade, tiveram de conviver com margens de lucros mais baixas ou ter a probabilidade de aumento do preço em dólar e vender menos. Economia de Enclave Economia de enclave se trata de um modelo econômico onde, em um mercado globalizado, as atividades se localizam em regiões pertencentes a países em desenvolvimento, possuindo alta concentração de capital e tecnologia estrangeira, porém se destinam para exportação e não há integração com o mercado local. A região da economia de enclave se Enquanto a economia que o rodeia: caracteriza: •Existe baixo nível de emprego •O nível de emprego é elevado (desemprego) •Os salários são altos •Baixos salários •Tecnologia moderna •Tecnologia obsoleta •A força de trabalho é hábil •Baixo uso de mão de obra qualificada •Investimento de capital estrangeiro •Empresas com baixo investimento de elevado capital •Todo capital gerado é remetido para o país de origem RELACIONANDO SAÚDE Diferentemente da perspectiva do crescimento econômico, que vê o bem-estar de uma sociedade apenas pelos recursos ou pela renda que ela pode gerar, a abordagem de desenvolvimento humano procura olhar diretamente para as pessoas, suas oportunidades e capacidades. A renda é importante, mas como um dos meios do desenvolvimento e não como seu fim. É uma mudança de perspectiva: com o desenvolvimento humano, o foco é transferido do crescimento econômico, ou da renda, para o ser humano. A relação entre estado da saúde e crescimento econômico pode ser pensada através de pelo menos dois canais mais importantes: da relação entre o estado de saúde médio da economia e o estoque de capital humano, e através da presença de externalidades em saúde. Primeiro caso: Introdução do capital humano no modelo de crescimento econômico de Solow por Mankiw, Romer e Weil (1992). Para esses autores o capital humano é entendido basicamente como escolaridade e as diferenças desse fator seriam responsáveis pelas diferenças na renda per capita. Então, para incorporar o estado de saúde médio da economia ao modelo de crescimento tem-se o relacionado com o estoque de capital humano. As conclusões dessa relação são similares às do modelo MRW, ou seja, países com maiores níveis de saúde teriam maior renda per capita de equilíbrio e maior taxa de crescimento. O estado de saúde, como parte do estoque de capital humano, altera diretamente a capacidade produtiva dos trabalhadores. Contudo, o “estoque” de saúde dos indivíduos diminui ao longo do tempo (Taxa de Depreciação do Estoque de Capital Humano), sendo de maior intensidade ou menor, dependendo do nível tecnológico da sociedade que permite a introdução de novos tipos de cuidados e medicamentos, do acesso aos serviços médicos, do perfil demográfico (distribuição etária e por sexo), dos hábitos de vida e consumo, entre outros. Segundo caso: O fator saúde pode afetar o crescimento econômico através da presença de externalidades em saúde, introduzidas pelos modelos endógenos de crescimento. O mais relevante para tal discussão é o modelo de Lucas (1988). Essas externalidades estão presentes na medida em que o nível de saúde individual depende não só do próprio estado de saúde do indivíduo, como também do estado de saúde médio da sociedade, que é afetada por doenças transmissíveis, doenças evitáveis por saneamento básico, doenças evitáveis por vacinação. Esse efeito é mais presente principalmente em países menos desenvolvidos, nos quais se observa uma relação estreita entre o estado de saúde e pobreza. O aumento do PIB torna um país mais rico, mas se as condições de vida das pessoas, incluindo seus níveis de saúde, não melhoram, o país não se torna desenvolvido. Nesse sentido, o crescimento do volume de riquezas, medido pelo PIB, não é suficiente para produzir bem-estar social (Luiz Eugenio Portela Fernandes de Souza, ex-presidente da ABRASCO, 2012). Richard Wilkinson e Kate Pickett divulgaram extensa documentação para comprovar, no livro The Spirit Level, que a riqueza média de uma nação, medida pelo produto interno bruto, tem pouco impacto sobre uma longa lista de males sociais, enquanto a forma como essa riqueza é distribuída, em outras palavras, o nível de desigualdade social, influi profundamente na dispersão e intensidade dos males. Por exemplo, Japão e Suécia são países administrados de maneira muito diferente; a Suécia é um grande Estado de bem-estar social, enquanto o Japão oferece pouquíssimos programas de previdência social. O que os une, todavia, é uma distribuição relativamente equitativa da renda, e, portanto, uma defasagem pequena entre o padrão de vida dos 20% mais ricos e dos 20% mais pobres da população. Mais importante ainda é que nesses países há menos “problemas sociais” que em outras sociedades altamente industrializadas (Zygmunt Bauman). A maioria dos economistas clássicos diz que a saúde de uma população melhora quando a economia melhora. Mas o que a OMS aponta é que a saúde não é só consequência do desenvolvimento: é um requisito para ele. Com saúde, vive-se mais, falta-se menos ao trabalho, ao estudo, então produz-se mais, e a economia ganha (Morel C., 2010). Saúde como fator do desenvolvimento impacta sobre: • Produtividade e renda; • Qualidade do meio ambiente; • Estado nutricional e aprendizagem; • Teoria do Capital Humano. Saúde como consequência do desenvolvimento é efeito de: • Hábitos alimentares e educação; • Saneamento e meio ambiente; • Renda e pobreza; • Tecnologia médica; • Transição demográfica e epidemiológica. Circularidade entre renda e saúde Melhores condições de saúde Investimentos públicos e privados em saúde Melhor arrecadação pública e renda familiar Regularidade de trabalho e educação Maior produtividade, capital humano Renda e saúde estão correlacionados, mas não se sabe onde começa o círculo virtuoso. Abrangência dos programas de saúde na América Latina Como deveriam ser: Como são: • Ajustados de acordo com as prioridades epidemiológicas de cada nível de desenvolvimento e regulação de tecnologia; • Conceitos de integralidade incompatíveis com a realidade epidemiológica e necessidades de financiamento, com baixa regulação de tecnologia; • Baseados em estratégias custo efetivas com efeitos de longo prazo (promoção, prevenção); • Entregues através de instituições eficientes e efetivas e financiados de forma progressiva; • Baseados em uma filosofia de direito coletivo que proteja as prioridades definidas no orçamento. • Priorizam estratégias curativas com programas incompletos de promoção, prevenção e saúde pública; • Entregues por instituições pouco eficientes e de forma fragmentada; • Baseados em práticas de direito que permitem processos jurídicos para a apropriação individual dos recursos públicos, aumentando a regressividade. INDICADORES E ÍNDICES Índice de Gini É um dado estatístico utilizado, mais comumente, para avaliar o grau de concentração de renda em determinado grupo, isto é, medir o grau de desigualdade que há em uma sociedade. Ele consiste em um número entre 0 e 1 (ou 0 e 100), onde 0 significa uma situação de perfeita igualdade e 1 uma situação de desigualdade máxima. Limitações: • os dados informados nem sempre são precisos e referem-se a um período relativamente curto ao longo do ano, o que diminui o seu grau de precisão; • os dados são obtidos a partir de um fornecimento voluntário por parte dos governos e agências de pesquisa, de forma que, conforme os diferentes interesses, as informações podem apresentar distorções; • esse dado não verifica a potencialidade de crescimento da população mais rica em face da população mais pobre e vice-versa, apresentando apenas informações “estáticas”. Contudo, esse índice é importante no sentido de fornecer uma melhor noção da desigualdade existente no mundo, além de promover a abertura necessária para medidas de inclusão de renda e melhorias nas condições de vida da parcela mais pobre da população. Índice de Gini O cálculo do índice de Gini se baseia na chamada Curva de Lorenz. Essa curva mostra como a renda (eixo y) varia em função da população (eixo x). • Cálculo: 𝑎 𝑎+𝑏 Reta de Total Igualdade Curva de Lorenz Proporção Acumulada de Renda Proporção Acumulada de População Índice de Gini Rendimento Médio Mensal: → 10% mais pobre: R$256 → 10% mais ricos: R$7.154 → 1% mais rico: R$20.364 Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2015/11/1705824desigualdade-cai-em-2014-com-alta-de-renda-dos-mais-pobres-diz-ibge.shtml IDH IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) é um índice que serve de comparação entre os países, com objetivo de medir o grau de desenvolvimento econômico e a qualidade de vida oferecida à população. Mede o desenvolvimento humano por meio de três componentes básicos: esperança de vida ao nascer; expectativa de anos de estudo; média de anos de estudo (da população até o momento); e renda nacional bruta per capita (toda a renda do país dividida pelo número total da população). Vai de 0 (nenhum desenvolvimento humano) a 1 (desenvolvimento humano total). Quanto mais próximo de 1, mais desenvolvido é considerado o país. Apesar de ampliar a perspectiva sobre o desenvolvimento humano, o IDH não abrange todos os aspectos de desenvolvimento. Democracia, participação, equidade, sustentabilidade são alguns dos muitos aspectos do desenvolvimento humano que não são contemplados no IDH. IDH Fonte: Relatório de Desenvolvimento Humano 2015 - O Trabalho como Motor do Desenvolvimento Humano, PNUD. IDH Evolução do IDH 1990-2014 O Brasil acumula trajetória constante de crescimento do IDH. De 1990 a 2014, o crescimento foi 24,2%, o maior no período entre os países da América do Sul. O Brasil se encontra em 13º entre os 15 melhores IDHs da América Latina. Fonte: Relatório de Desenvolvimento Humano 2015 - O Trabalho como Motor do Desenvolvimento Humano, PNUD. IDH IDH-D – Índice de Desenvolvimento Humano Ajustado à Desigualdade O IDH-D leva em conta a desigualdade social, na distribuição do desenvolvimento econômico, em relação aos três componentes. Nesse quesito o Brasil fica abaixo da média da América Latina (0,570) e da média dos países de seu grupo, os de alto nível de IDH (0,600). Não existe um ranking mundial levando em conta o IDH-D porque, de acordo com o PNUD, parte dos países não têm dados suficientes para elaborar esse índice. Fonte: Relatório de Desenvolvimento Humano 2015 - O Trabalho como Motor do Desenvolvimento Humano, PNUD. Indicadores de Saúde Taxa de Mortalidade Infantil: é de fundamental importância para avaliar a qualidade de vida, pois, por meio dela, é possível obter informações sobre a eficácia dos serviços públicos, tais como: saneamento básico, sistema de saúde, disponibilidade de remédios e vacinas, acompanhamento médico, educação, maternidade, alimentação adequada, entre outros. Fonte: Relatório de Desenvolvimento Humano 2015 - O Trabalho como Motor do Desenvolvimento Humano, PNUD. De maneira geral, os dados referentes ao Brasil são positivos. Em relação ao Índice da Pobreza Multidimensional, que tem como base saúde, educação e qualidade de vida, o Brasil chegou a 2,9% - dados de 2013 - da população (3,1% em 2012), o que mostrou que o país continua avançando em relação a suas políticas sociais. Contudo, o ritmo dos avanços sociais ainda é lento. Mesmo que o país esteja inserido na categoria “alto desenvolvimento humano” a desigualdade social ainda é elevada, tendo grande variação em seus níveis de desenvolvimento. A Coordenadora do RDH no Brasil, Andrea Bolzon, avaliou que a crise ainda não tinha tido impacto significativo no IDH do país, mas disse que era possível que isso acontecesse caso a recessão econômica se agravasse e perdurasse por mais anos. Vídeo 200 países, 200 anos, 4 minutos https://www.youtube.com/watch?v=Qe9Lw_nlFQU Referências BRESSER-PEREIRA, Luiz Carlos; NAKANO, Yoshiaki. Uma estratégia de desenvolvimento com estabilidade. Revista de economia política, v. 22, n. 3, p. 146-177, 2002. BRESSER-PEREIRA, Luiz Carlos; MARCONI, Nelson; OREIRO, José Luís. A doença holandesa. ________. Globalização e competição: por que alguns países emergentes têm sucesso e outros não. Rio de Janeiro: Elsevier, p. 141-171, 2009. DE ARAÚJO, José Duarte. Saúde e desenvolvimento econômico: atualização de um tema. Revista de Saúde Pública, v. 9, n. 4, p. 515-528, 1975. FIGUEIRÊDO, Lízia; NORONHA, Kenya Valeria; ANDRADE, Mônica Viegas. Os impactos da saúde sobre o crescimento econômico na década de 90: uma análise para os estados brasileiros. Texto para discussão, n. 219, 2003. PNUD. O trabalho como motor do desenvolvimento humano. Relatório do Desenvolvimento Humano, 2015. Links de Notícias: http://www.valor.com.br/brasil/4355666/brasil-melhora-idh-em-2014-mas-cai-uma-posicao-no-ranking-mundial http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/12/151214_idh_brasil_onu_avanca_cai_ms http://www.jb.com.br/economia/noticias/2015/12/14/dados-de-indice-que-avalia-pobreza-sao-positivos-diz-secretario/ http://brasil.estadao.com.br/noticias/geral,brasil-fica-em-75-no-ranking-do-idh--atras-do-sri-lanka,10000004754 http://noticias.uol.com.br/internacional/ultimas-noticias/2015/12/14/desigualdade-no-brasil-tiraria-26-do-idh-e-deixaria-paisabaixo-de-vizinhos.htm Acesso em 14/04/16.