Capítulo 10: Ideologias

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Capítulo 10: Ideologias
1. Conceito geral de ideologia
 Conjunto
de ideias, crenças ou opiniões sobre algum ponto
sujeito a discussão.
 PARA REFLETIR:
Os partidos políticos estabelecem as bases ideológicas que
fornecem as diretrizes de ação a seus filiados e políticos em
exercício, daí a importância da fidelidade partidária.
Você saberia identificar entre os partidos atuais aqueles que
tendem para o liberalismo e os que se orientam pelo
socialismo?
Há ainda simpatizantes do comunismo? O que seriam os
partidos chamados “de centro” e de “extrema direita”?
2. Ideologia: sentido restrito
O termo “ideologia” foi criado no século XIX por Destutt de
Tracy, filósofo e político francês, para designar uma “ciência das
ideias”.
 Foi com Marx e Engels que o conceito se tornou mais conhecido,
ao advertirem sobre a necessidade de levar em conta o
conhecimento ilusório, que mascara os conflitos sociais.
 Na concepção marxista de ideologia, prevalece ao sentido
negativo de instrumento de dominação de uma classe sobre outra.

3. Conceito marxista de ideologia
ALIENAÇÃO – para Marx, a alienação manifesta-se na vida do operário quando
o produto do seu trabalho deixa de lhe pertencer.
 Ao vender sua força de trabalho, não mais decide sobre o salário, o horário e o
ritmo de trabalho; e por ser comandado de fora, perde o centro de si mesmo,
tornando-se “alheio”, “estranho” a si próprio, portanto alienado.
 Esse estado de coisas é típico de sociedades divididas em classes, em que
predomina a separação entre o trabalho manual e o intelectual.
 Marx explica que a ideologia impede a tomada de consciência da alienação.
Assim, a coesão social é mantida sem o recurso à violência física.

Caracteristícas da ideologia
É interessante observar que a ideologia não é uma mentira que a
classe dominante inventa para subjugar a classe dominada, porque
inclusive os que se beneficiam dos privilégios estão impregnados por
ela, e também eles se convencem da verdade dessas ideias.
 Características da ideologia:
a) Naturalização
Consiste em aceitar como naturais situações que na verdade resultam
da ação humana.
Exemplo: afirmar que sempre existiram pobres e ricos, sendo
impossível mudar esse estado de coisas.

b) Universalização
Os valores da classe dominante são estendidos aos que a ela se submetem.
Exemplo: a empregada “boazinha” não discute salário nem reclama se
trabalha além do horário.
c) Abstração e aparecer social
A universalidade das ideias e dos valores resulta de uma abstração, ou seja, as
representações ideológicas não se referem ao concreto, mas ao aparecer
social.
A sociedade “una e harmônica” é portanto uma abstração, porque, ao
analisarmos concretamente as relações sociais, descobrimos a divisão em
classes e os conflitos de interesses.
Exemplo: é difícil contestar que “o trabalho dignifica”. É verdade, bem
sabemos que o trabalho é condição de nossa humanização, mas essa
afirmação é ideológica quando consideramos apenas a ideia de trabalho,
independentemente da análise da situação concreta e histórico-social em
que de fato é realizado.
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d) Lacuna
Ocultação de algo que não pode ser explicitado, sob
pena de desmascarar a ideologia.
Por isso ela é ilusória, não no sentido de ser “falsa” ou
“errada”, mas por ser uma aparência que oculta a
maneira pela qual a realidade social foi produzida.
Exemplo: ao dizer que o salário paga o trabalho,
podemos identificar uma lacuna quando, analisando a
gênese do trabalho assalariado, descobrimos a maisvalia.
c) Inversão
O que seria a origem da realidade é posto como produto e vice-versa: o
que é efeito é tomado como causa.
Exemplo:
Se o filho de operário não melhora o padrão de vida, a explicação
ideológica atribui o insucesso à incompetência, falta de força de vontade
ou indisciplina. É verdade que não se pode desprezar as diferenças entre
os indivíduos, mas pelo enfoque ideológico, o sucesso depende apenas da
competência pessoal, sem levar em conta as dificuldades decorrentes da
divisão de classes.
É como se imaginássemos uma corrida em que alguns começam bem na
frente dos outros apenas porque nasceram em berço privilegiado.
4. A ideologia em ação
Espaços em que a ideologia é veiculada e onde ela poderá ser mais
facilmente identificada e criticada.
As histórias em quadrinhos
 Os quadrinhos são um fenômeno característico da cultura de
massa.
 Como toda produção cultural, os quadrinhos encerram
ambiguidade: ao mesmo tempo que servem à consciência, podem
servir à alienação; tanto levam ao conhecimento como à
escamoteação da realidade; tanto podem ser criativos como
alienantes.

Publicidade e mídia
A publicidade, por meio de competentes agências e suas criativas
campanhas, divulga a variedade e a qualidade do que é produzido pelo
mercado.
 As pessoas são levadas a comprar muito mais do que necessitam,
pressionadas por desejos artificialmente estimulados.
 A publicidade não vende apenas produtos, mas também ideias.
 Outro espaço possível de ação ideológica são meios de comunicação
de massa, como jornais, revistas, rádio, tevê, internet.
 Às vezes, fatos que deveriam ser divulgados são intencionalmente
ocultados dos cidadãos.

5. O discurso não ideológico.
A ação e o pensamento nunca são totalmente determinados pela
ideologia.
 Sempre haverá espaço para a crítica e fendas que possibilitam a
elaboração do discurso contraideológico.
 Cabe ao discurso não ideológico identificar as distorções e
procurar demonstrar como elas foram produzidas historicamente.
 Além disso, deve restabelecer a relação entre a ação e a reflexão, a
fim de não esclerosar cada uma delas como procedimentos e
verdades definitivos.

6. Outras concepções marxistas de ideologia
 Nos
escritos de Marx, o conceito de ideologia
manteve o sentido negativo de conhecimento
distorcido da realidade social.
 A ideologia adquiriu um sentido positivo como
conjunto de ideias elaboradas pelo proletariado e
que expressam seus interesses, em contraposição à
visão de mundo da classe dominante. É assim que
Lênin refere-se à “ideologia comunista”.
Gramsci e a hegemonia
O filósofo italiano Antonio Gramsci (1891-1937) reelaborou o
marxismo.
 Sem negar a dominação, fortaleceu a concepção de um proletariado
atuante na luta para assumir seus próprios valores, estratégia para
evitar a submissão.
 Para saber mais:
Gramsci foi um dos fundadores do Partido Comunista Italiano em
1921.Em 1926 foi preso durante o regime fascista de Mussolini e
morreu em 1937, uma semana após ter sido libertado. Cadernos do
cárcere, obra em seis volumes, escrita na prisão, foi publicada
postumamente e influenciou o comunismo europeu.

Para Gramsci, em um primeiro momento a ideologia tem a função
positiva de atuar como cimento da estrutura social.
 Quando incorporada a senso comum, ajuda a estabelecer o
consenso, conferindo hegemonia a uma determinada classe, que
passará a ser dominante.
 Com o consentimento da classe subalterna, forma um sistema
orgânico articulado por uma cultura comum, difundida pelas
instituições.
 As ideologias são orgânicas e historicamente necessárias quando
“organizam as massas humanas, formam o terreno sobre o qual os
homens se movimentam, adquirem consciência de sua posição,
lutam etc”.

Habermas: ciência e ideologia
Jürgem Habermas relacionou ciência, técnica e ideologia para
compreender como a consciência tecnocrática do mundo atual
impõe-se em nome da economia e da eficiência.
 Habermas distingue o agir instrumental da ação comunicativa:
O agir instrumental diz respeito ao mundo do trabalho. Nesse setor
aprendemos a desenvolver habilidades baseadas em regras segundo o
que Habermas chama de “agir racional-com-respeito-a-fins”.
Desse modo, na economia, o valor é o dinheiro; na política, o poder; na
técnica, a eficácia.

O agir comunicativo refere-se ao mundo da vida e baseia-se nas
regras da sociabilidade.
Pela comunicação livre de dominação, as pessoas procuram chegar
ao consenso, ao entendimento mútuo (diálogo), expressando
sentimentos, expectativas, concordância e visando ao bem-estar de
cada um.
Trata-se do modo que deveria reger as relações em esferas como
família, comunidades, organizações artísticas, científicas, culturais
etc.
O problema surge quando a racionalidade instrumental estende-se
para outros domínios da vida pessoal nos quais deveria prevalecer
a ação comunicativa.
A intromissão da ação instrumental em outros domínios
da vida empobrece a subjetividade humana e as relações
afetivas, pois não se avaliam as ações por serem justas ou
injustas, mas se são eficazes.
As ações orientam-se pela competição, pelo individualismo,
pela busca do rendimento. Desse modo, a ciência e a
técnica tranformam-se em instrumento ideológico.
A saída não está em recusar a ciência e a técnica, mas em
recuperar o agir comunicativo naqueles espaços em que
ele foi “colonizado” pelo agir instrumental.
Ricoeur: interpretação e ideologia
Em outra direção, Paul Ricoeur analisa os filósofos Marx, Nietzsche e
Freud – “mestres da suspeita”, como os denominou-, pensadores que
suspeitaram das ilusões da consciência.
 Ao deparar-se com a noção marxista de ideologia como instrumento
de cominação de uma classe sobre outra, critica-a porque o “homem
da suspeita” pensa estar isento da deformação ideológica que
denuncia, como se dissesse: “a ideologia é o pensamento de meu
adversário; é o pensamento do outro. Ele não sabe, eu, porém sei”.
 O conceito de ideologia perde o seu caráter depreciativo e assume
um aspecto positivo de conhecimento possível.

7. Questionamento e conscientização
A ideologia está presente no cotidiano.
 Os produtos culturais, os bens e serviços à nossa disposição, as
instituições, como escolas, fábricas, igrejas, imprensa falada e escrita
etc., podem ser instrumentos de alienação quando nos passam a
ilusão de que as desigualdades sociais, econômicas, políticas e
culturais são naturais e que portanto não podemos mudá-las.
 Contudo, aqueles espaços em que a ideologia se manifesta são os
mesmos que possibilitam aprender, refletir e mudar.
 É pelo esforço de conscientização, pela abertura ao
questionamento que identificamos a ideologia.

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