Um morcego sem sonar Faz 50 anos que descobrimos que os morcegos possuem um sofisticado sistema de sonar. Parece muito tempo, mas estes animais desenvolveram a capacidade de eco locação faz mais de 50 milhões de anos, 49 milhões de anos antes dos humanos surgirem no planeta. Os morcegos são mamíferos peculiares pois além de possuírem sonares são os únicos capazes de voar. Faz anos que os cientistas debatem se o sonar teria surgido antes das asas ou se o vôo teria precedido o aparecimento do sonar. É o tipo da discussão que parece falta de assunto, afinal não é fácil especular, quanto mais descobrir, o que ocorreu 50 milhões de anos atrás, em uma época em que sequer os macacos existiam. Mas agora um grupo de paleontólogos, auxiliados por estudantes do ensino secundário, resolveram a questão. O sistema de eco locação depende de três componentes: a capacidade de emitir pulsos sonoros bem definidos, um sistema auditivo capaz de identificar e captar as ondas sonoras refletidas pelos objetos e um cérebro sofisticado. Quanto mais longe o objeto maior o tempo necessário para as ondas chegarem no objeto, serem refletidas, e finalmente serem captadas pelo ouvido. Este sistema não funciona sem um cérebro capaz de calcular a distância do objeto a partir do tempo que o eco leva para chegar ao ouvido e ainda determinar de que direção vem o eco. Com estas informações o morcego é capaz de localizar objetos com tal precisão que alguns morcegos são capazes de capturar insetos em pleno vôo. De todos estes sistemas o único que tem alguma chance de ser preservado por 50 milhões de anos é a enorme cóclea, uma estrutura óssea, parte do ouvido interno, extremamente desenvolvida em todos os morcegos conhecidos. É esta cóclea enorme que permite ao morcego captar os sons refletido pelos objetos. Em 21 de agosto de 2003, na Mina de Finney em Wyoming nos EUA, uma senhora chamada Bonnie Finney (deve ser da família dos proprietários da mina) coletou um fóssil bem preservado de uma criatura que parecia ser um morcego. Os paleontólogos que estudaram o fóssil determinaram que a formação geológica em que o morcego foi preservado tem pelo menos 52 milhões de anos. Este novo morcego foi denominado de Onychonycteris finneyi. Onycho, porque possui unhas em todos os dedos e finneyi em homenagem a sua descobridora. O fato de ter asas e garras indica que provavelmente o morcego se locomovia utilizando as quatro patas quando não estava voando. O mais interessante é que o Onychonycteris finneyi possui uma cóclea pequena, do tamanho encontrado na maioria dos mamíferos que possuem ouvidos “normais”, incapazes de eco locação. Este resultado foi confirmado comparando medidas de cócleas de centenas de esqueletos de morcegos, tanto fósseis quanto contemporâneos (provavelmente foi aí que os estudantes ajudaram). A falta de uma cóclea desenvolvida indica que este morcego não possuía sonar, mas como ele era capaz de voar, os cientistas concluíram o sonar surgiu em morcegos que já eram capazes de voar. O incrível é como a partir de um único fóssil é possível imaginar o que teria ocorrido faz mais de 50 milhões da anos. Mas talvez o mais importante é que dezenas de jovens tiveram o prazer de fazer uma descoberta científica. Mais informações em: Primitive early eocene bat from Wyoming and the evolution of flight and echolocation. Nature vol. 451 pag. 818 2008 Fernando Reinach ([email protected])