Página 1 de 10 ENERGIA EM MOVIMENTO 1. Transferências e transformações de energia em sistemas complexos. 1.1. Aproximação ao modelo da partícula material Um automóvel é um sistema termodinâmico muito complexo, mas quando se pretende analisar o seu movimento não se consideram as alterações de energia interna. Consideram-se somente as quantidades de energia útil e dissipada associadas ao movimento, isto é, o automóvel é descrito como um sistema mecânico. Um sistema mecânico, em que não se consideram quaisquer efeitos térmicos, pode, em certas situações, ser representado por um só ponto, o centro de massa. Um corpo rígido – um sólido indeformável – em que as posições relativas das partículas que o constituem são constantes, quando em movimento de: - translação, pode ser representado pelo seu centro de massa pois todos os seus pontos têm a mesma velocidade. - rotação em torno de um eixo, não pode ser representado pelo seu centro de massa, visto que os pontos pertencentes ao eixo estão parados e à medida que se afastam deste a velocidade aumenta. Assim um sistema em movimento de translação pode ser representado por um ponto, o centro de massa. Pode ser representado como uma partícula material, com massa igual à do corpo e com posição e velocidade do centro de massa. Questão Considere as seguintes situações e indique se é válido representar cada um dos sistemas pelo seu centro de massa. (A) Um pião a rodar em torno do seu eixo longitudinal. (B) A Terra ao descrever a sua órbita aproximadamente elíptica em torno do Sol (C) Um comboio em manobras numa estação. (D) Uma bola de ténis em movimento, após ter abandonado a raquete. Sugestão de resposta. (A) No estudo do movimento de rotação não é válido representar o pião pois um ponto não roda. Além disso, a velocidade das partículas constituintes do pião aumenta à medida que a sua distância ao eixo de rotação aumenta, logo, não pode ser representado pelo seu centro de massa (B) Como o diâmetro da Terra é desprezável em relação às dimensões da trajectória que descreve no seu movimento de translação em torno do Sol, pode ser representada pelo seu centro de massa. (C) Dado que as dimensões do comboio não são desprezáveis em relação às dimensões da trajectória por ele descrita durante as manobras, não é válido representá-lo pelo seu centro de massa. (D) Caso se pretenda descrever, apenas, o seu movimento de translação (dimensões da bola/distância percorrida) é válido representá-la pelo seu centro de massa; mas caso se pretenda também analisar o movimento da bola em torno do seu eixo, não é correcto representá-la pelo seu centro de massa. Dra. Graça Silva Página 2 de 10 1.2 - Transferência de energia como trabalho A quantidade de energia transferida para um sistema que envolva forças e movimentos é medida pelo trabalho realizado pelas forças nele aplicado. Mas o trabalho, W, de uma força, e, consequentemente, a variação de energia de um corpo, ∆E, depende da força, F , e do deslocamento do seu ponto de aplicação, r . A variação da energia de um corpo, quando sobre ele actuam várias forças, é igual à soma dos trabalhos realizados por todas as forças. Repare nas situações apresentadas nas figuras seguintes: r r C B A Em A, a ∆Ec0J, a força e o deslocamento têm a mesma direcção e sentido. Em B, a ∆Ec0J, a força e o deslocamento têm a mesma direcção e sentidos contrários. Em C, a ∆Ec=0J; a força é perpendicular ao deslocamento. Conclusão O trabalho realizado por uma força constante, deslocamento, r , é positivo e é dado por; F , que actua sobre um corpo na direcção e sentido do W=Fd O trabalho realizado por uma força, F , que actua sobre um corpo na direcção e sentido oposto ao do deslocamento é negativo e é dado por: O trabalho realizado por uma força, deslocamento é nulo: W=–Fd F , que actua sobre um corpo com direcção perpendicular à do W = 0J A unidade do trabalho é o joule (J), no sistema SI. Um joule é o trabalho realizado por uma força constante de intensidade um Newton, que actua na direcção e sentido do deslocamento, quando o seu ponto de aplicação se desloca de um metro. 2. Trabalho realizado pela resultante das forças que actuam sobre um sistema A variação da energia de um corpo, quando sobre ele actuam várias forças, é igual à soma dos trabalhos realizados por cada uma delas. Dra. Graça Silva Página 3 de 10 2.1- Trabalho realizado por uma força constante não colinear com o deslocamento Para determinar o trabalho tem que se decompor em duas componentes: uma com a direcção do Fx , deslocamento, perpendicular, Fy . responsável trabalho realizado, e a outra que lhe é normal ou pelo DECOMPOSIÇÃO DA FORÇA r Y d X Repare que o trabalho realizado pela componente vertical é nulo, pois é perpendicular ao deslocamento, logo, o trabalho realizado pela força é igual ao trabalho realizado pela componente Fx , que se designa por força eficaz, Fef , ou seja, Fx Fef . Assim, tem-se: W = Fef × d Mas Fef = F cos, logo W = F cos d Esta expressão permite calcular o trabalho realizado por uma força constante qualquer que seja a sua direcção em relação ao deslocamento. Repare que: Se 0º≤<90º, então cos>0, logo o trabalho realizado pela força é positivo e designa- -se por trabalho potente ou motor. A força contribui para o movimento e apresenta a máxima eficácia quando =0º,pois cos0º=1. Se = 90º, como cos90º=0, então o trabalho é nulo. Se 90º≤<180º, cos<0, então o trabalho realizado pela força é negativo e designa-se por trabalho resistente. A força opõe-se ao movimento do corpo e apresenta a máxima eficácia na realização de trabalho resistente para =180º, pois cos180º= -1. Dra. Graça Silva Página 4 de 10 Determinação gráfica do trabalho realizado por uma força constante O trabalho realizado por uma força pode ser calculado a partir de gráficos de valor da força versus (vs) valor Fcos (N) Fcos (N) do deslocamento. Fe f. W>0 d 0 0 d x x W<0 Fe f. A área1 representa o trabalho realizado pela força eficaz, Fef . Se o trabalho é motor ou potente o seu valor é positivo, e é igual à área contida entre Fef e o eixo do xx, que está acima deste eixo, até ao valor d. Se o trabalho é resistente o seu valor é negativo, e é igual à área contida entre Fef e o eixo do xx, que está abaixo deste eixo, até ao valor d. O bloco C encontra-se sobre uma superfície horizontal, de força de atrito desprezável, preso a um fio inextensível que passa pela gola de uma roldana e ligado a um motor eléctrico, de rendimento 80%, como se mostra na figura ao lado. O motor esteve ligado durante 10,0s enrolou 20,0m de fio e o bloco experimentou uma variação de energia mecânica de 174J. a- A intensidade da força exercida pelo fio sobre o bloco. b- A potência da força referida na alínea anterior. c- A potência eléctrica consumida pelo motor. d- O rendimento deste processo de transferência de energia. 1 A = Fefd (calcula-se o trabalho através da área do rectângulo) Dra. Graça Silva Página 5 de 10 2.2- Trabalho realizado por várias forças que actuam sobre um sistema Se, sobre um corpo, actuar mais do que uma força, a alteração da sua energia é igual ao trabalho total realizado por todas as forças. Desde que o corpo se comporte como uma partícula material, isto é, desde que possa ser representado pelo seu centro de massa, o trabalho total pode ser determinado por um dos processos: 1. O trabalho total é a soma dos trabalhos realizados individualmente por cada força. Wtotal = W( F1 ) + W( F2 ) + ..... + W( Fn ) 2. O trabalho total é igual ao trabalho realizado pela resultante das forças. FR = F1 + F2 +.....+ Fn e Wtotal = W ( FR ) Wtotal = FR cos d Concluindo: O trabalho realizado pela resultante das forças que actuam sobre um corpo em movimento de translação é igual à soma dos trabalhos realizados por cada uma das forças. 2.2.1. Trabalho realizado sobre um corpo que se desloca ao longo de um plano inclinado Considere-se um bloco de massa m, que parte do repouso do topo de um plano inclinado, de comprimento d e altura h, e que se desloca d ao longo deste com força de atrito desprezável. h Repare-se que a reacção normal da superfície sobre o bloco não realiza trabalho – é perpendicular ao deslocamento. O peso ao definir um ângulo com a direcção do movimento deve ser decomposto segundo a direcção tangente à trajectória, a direcção perpendicular, componente tangencial, Px (componente tangencial), e Py . A componente normal do peso, Py , não realiza trabalho, mas a sua Px , a força eficaz, é a responsável pela variação da velocidade do bloco. O trabalho total realizado pelas forças que actuam sobre o bloco, no deslocamento de A a B, é igual ao trabalho realizado pela força eficaz, Px . WAB = Px d Como Px = P cos e P = mg então: WAB = m.g.d.cos Dra. Graça Silva Página 6 de 10 h Mas cos = d WAB = mgh OBS: = 90º + Logo, cos = - sen Subida Exemplo: Uma empresa de transportes e mudanças utiliza uma rampa para carregar móveis e mercadorias para os seus veículos. Um funcionário da empresa ao empurrar um móvel de 900N exerce, paralelamente à superfície de apoio, uma força constante de 320N. Tendo em atenção os dados que constam na figura ao lado considerando desprezável a força de atrito, determine: a- O trabalho realizado pelo peso do móvel ao longo da rampa. b- A energia transferida pelo funcionário para o móvel desde o solo até ao interior do veículo de transporte. c- O trabalho realizado por todas as forças que actuam sobre o móvel. Obs: Atenção às forças 2.2.2. Trabalho realizado pelas forças dissipativas (exemplo, força de atrito) O trabalho realizado pela força de atrito é um trabalho resistente. A força de atrito é responsável pela diminuição da energia mecânica do sistema. Ela actua sempre no sentido contrário ao do deslocamento. Dra. Graça Silva Página 7 de 10 O trabalho da força da força de atrito é dado pela expressão: W ( Fa ) = - Fa × d A força de atrito é uma força dissipativa que traduz a nível macroscópico as complexas interacções que, a nível microscópico, se manifestam entre as minúsculas rugosidades das superfícies em contacto. A ENERGIA DE SISTEMAS EM MOVIMENTO DE TRANSLAÇÃO 1. Lei do trabalho-energia ou teorema da energia cinética O trabalho realizado pela resultante de todas as forças que actuam sobre um sistema é igual à variação da sua energia cinética - Lei do Trabalho-Energia W ( Px ) =∆Ec A energia cinética é dada pela expressão: Ec = 1 m v 2 (relembrar……) 2 Logo 1 vf, valor da velocidade final 1 W ( F ) = m v f2 m v i2 R 2 2 vi, valor da velocidade inicial m, massa do corpo W ( FR ) = 1 m v f2 v i2 2 2. LEI DA CONSERVAÇÃO DA ENERGIA MECÂNICA 2.1- Energia potencial gravítica (desprezando a força de atrito) AB = h ou h = hf - hi hf De B → A AC = d ∆Ep= W ( F ) W ( F ) = F ∆h, mas P = F F p d W(F )=-W( p) W ( p ) = - p ∆h hi Como p=mg F = mg Dra. Graça Silva Página 8 de 10 Então ∆Ep = mg(hf - hi) Esta expressão permite saber a variação de energia potencial gravítica. É comum definir o nível do solo (altura nula) como a posição a que corresponde a energia potencial gravítica nula. Pelo que, para qualquer outra posição de altura h se tem: ∆Ep = Ep,f - Ep,i Ep,f – 0 = mg(h-0) Ep,f = mgh Conclusão A energia potencial gravítica para um corpo de massa, m, é tanto maior quanto maior for a altura a que se encontra (o referencial é a superfície da Terra). Sugestão Para verificar os seus conhecimentos, considere o trajecto AC . Que conclusões tira? 2.2.Trabalho realizado pelo peso de um corpo Queda de um corpo de uma altura h (A→B) O trabalho realizado pelo peso de um corpo, durante uma qualquer mudança de posição, é simétrico da variação da energia potencial gravítica. W ( P ) = p (hf - hi) W ( P ) = mg(hf - hi) A W ( P ) = mghf – mghi W ( P ) = Ep,f – Ep,i mghi mghf Posição inicial, hi=0 h Posição final, hf =h B Assim, W( P ) = - ∆Ep Subida de um corpo W(F )=-W(P ) W ( F ) = mg (hf - hi) W ( P ) = - mg (hf - hi) Logo, W ( P ) = - ∆Ep hf hi Conclusão O trabalho realizado pelo peso de um corpo, durante uma qualquer mudança de posição, na subida, é simétrico da variação da energia potencial gravítica. Dra. Graça Silva Página 9 de 10 2.3. Trabalho realizado pelas forças conservativas e não conservativas e conservação da energia mecânica B O trabalho realizado pelo peso durante a subida é: W P mg h h O trabalho realizado pelo peso durante a descida é: W P mg h A Repare que o trabalho realizado pelo peso de A a B é simétrico do realizado de B a A, donde se concluiu que o trabalho total é nulo: WP AB A WP AB WP B A WP AB A 0 J Uma força é conservativa quando: O trabalho realizado é independente da trajectória, depende apenas das posições inicial e final. O trabalho realizado é simétrico da variação da energia potencial. O trabalho realizado ao longo de uma trajectória fechada é nulo. Mas, e de acordo com a Lei do Trabalho-Energia, o trabalho realizado pela resultante de todas as forças que actuam sobre um sistema, conservativas e não conservativas, é igual à sua variação de energia cinética. W ( FR )=∆Ec W ( Fcons ) + W ( Fncons ) = W ( FR ) Logo, W ( Fcons ) + W ( Fncons ) = ∆Ec Caso não actuem forças não conservativas ou caso o seu trabalho seja nulo, então: W ( Fcons ) = ∆Ec e como W ( Fcons ) = - ∆Ep tem-se: ∆Ec = - ∆Ep ⇔ Ec,f - Ec,i = Ep,f - Ep,i, Ec,f + Ep,f = Ec,i + Ep,i, Em,f = Em,i e ainda ∆Em = Em,f - Em,i, Dra. Graça Silva Página 10 de 10 então Em = 0J. Esta expressão traduz a Lei da Conservação da Energia Mecânica: Num sistema conservativo, um sistema em que o trabalho da resultante das forças é igual apenas ao das forças conservativas, a variação de energia mecânica é nula, ou seja, há conservação de energia mecânica. 3. VARIAÇÃO DA ENERGIA MECÂNICA E CONSERVAÇÃO DA ENERGIA Considerar um sistema em que actuam forças não conservativas, forças que quando realizam trabalho, este depende da trajectória. Assim, num percurso fechado o trabalho nunca é nulo, a energia mecânica não se conserva (∆E ≠ 0). 3.1. Trabalho realizado pelas forças não conservativas W ( Fcons ) + W ( Fncons ) = ∆Ec Como, W ( Fcons )= - ∆Ep Então: - ∆Ep + W ( Fncons ) = ∆Ec W ( Fncons ) = ∆Ec + ∆Ep e como ∆Ec + ∆Ep = ∆Em W ( Fncons ) = ∆Em O trabalho das forças não conservativas é igual à variação de energia mecânica. A força de atrito e a resistência do ar são exemplos de forças não conservativas. Estas forças que dificultam o movimento, ao actuarem em sentido contrário ao do deslocamento, realizam trabalho resistente, que se traduz por uma diminuição da energia mecânica do sistema. Dra. Graça Silva