Nó no vergalhão - Relatório Bienal

Propaganda
Cliente: Anefac
Veículo: América Economia Brasil
Data: 23 de outubro/2014
Editoria:
Pág.:
Nó no vergalhão
Brasil
Setores da construção civil e imobiliário dão sinais de desaceleração. Governo lança pacote para
estimular o crédito e conseguir melhores indicadores macroeconômicos
Trabalhadores da construção civil: PIB do setor em queda
Motor da economia e da geração de empregos, a construção civil foi um dos principais algozes ou
vítimas – dependendo da ótica – do estado de recessão técnica em que o país se encontra
atualmente. Enquanto o Produto Interno Bruto (PIB) teve queda de 0,6% no segundo trimestre, na
comparação com o mesmo período de 2013, o setor desacelerou 2,9%. Só não foi pior do que a
indústria, que caiu 3,4% de abril a junho deste ano. O motivo: alta nos preços dos materiais e do
custo de mão de obra, além da desaceleração na venda de imóveis. O estoque encalhado das
principais construtoras já brasileiras estaria beirando R$ 30 bilhões, segundo relatório do banco JP
Morgan.
Foi o suficiente para, além de colocar ingredientes no caldo eleitoral do momento, acender uma luz
bastante fluorescente no governo. Na tentativa de reanimar o setor e também a economia, o
Ministério da Fazenda anunciou, no fim de agosto, algumas medidas para estimular o mercado
imobiliário – coirmão da construção civil – e ainda injetar mais recursos na praça, a fim de obter
números menos ruins no contexto das eleições. Afinal, pior do que más notícias na economia são
maus ventos relacionados ao sonho dos brasileiros – a casa própria.
A maior parte do minipacote prometido, que tem seis medidas (veja no quadro ao lado), será
implementado por meio de Medidas Provisórias ainda neste mês. Outras terão de ser aprovadas pelo
Conselho Monetário Nacional (CMN), mas, segundo o ministério, deverão ser liberadas ainda em 2014.
A principal delas é a criação de uma nova fonte de financiamento para o mercado, chamada de
covered bonds, ou Letras Imobiliárias Garantidas (LIG). São títulos privados que serão emitidos pelos
bancos e terão isenção de Imposto de Renda e dupla garantia, com cobertura da instituição
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financeira emissora e carteira imobiliária separada dos demais ativos do banco, caso a instituição
seja liquidada. Investidores estrangeiros também poderão comprar o papel.
O novo título será um complemento às Letras de Crédito Imobiliário (LCI), que hoje movimentam
cerca de R$ 100 bilhões, segundo o Ministério da Fazenda. “Esse papel tem vantagens em relação à
LCI porque tem mais garantias e está dentro dos padrões internacionais, o que permite que a
poupança estrangeira passe a financiar a aquisição de imóveis no Brasil”, disse o ministro Guido
Mantega no dia do anúncio do minipacote.
Atualmente, a maior fonte dos recursos para o crédito imobiliário é a caderneta de poupança. Com o
boom das vendas de imóveis, sobretudo em 2010, quando o PIB da construção civil cresceu 11,6% –
4,1 pontos acima do PIB nacional, que foi 7,5% –, iniciou-se uma discussão sobre se haveria recursos
capazes de manter o setor longe de uma bolha imobiliária. Na época, os recursos concedidos pelo
Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE) para o financiamento imobiliário atingiram alta
de 65%, na comparação com 2009, segundo a Associação Brasileira das Entidades de Crédito
Imobiliário e Poupança (Abecip).
Mais calor nessa discussão foi colocado pouco antes do lançamento dessas medidas, quando a
captação líquida da poupança atingiu o menor patamar para meses de agosto desde 2006, segundo o
Banco Central. Os depósitos superaram os saques em R$ 518 milhões. Naquele ano foram R$ 280
milhões. E mais: neste ano, em abril, a captação chegou a ficar negativa (mais saques do que
depósitos) em R$ 736 milhões, o que não ocorria desde fevereiro de 2012, de acordo com a Abecip.
No acumulado do ano até julho, a captação líquida da poupança estava em R$ 11,2 bilhões, acenando
uma recuperação e alta de 15% se comparado com o mesmo período de 2013. Entretanto, para alguns
especialistas, ainda que o crédito imobiliário continue crescendo, o volume é muito baixo se
compararmos com outras economias. “Há países em que a relação do crédito com o PIB chega a
80%”, observa Miguel de Oliveira, da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração
e Contabilidade (Anefac). Caso do Reino Unido, em que essa proporção chegou a 82% em 2012. Na
América Latina, o Chile é o país com o maior volume de crédito em relação ao PIB, com 19%. No ano
passado, essa relação, no Brasil, chegou a 8,5%.
Para o diretor executivo da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc), Renato
Ventura, apesar de importante, o principal problema do setor não é de funding [financiamento].
“Outras questões, como a burocracia, a produtividade, a segurança jurídica e a previsibilidade, são
fundamentais”, afirma.
No quesito redução da burocracia, outra medida anunciada pelo ministro da Fazenda foi bastante
aplaudida pelo setor: uma espécie de “Renavam” (Registro Nacional de Veículos Automotores) para
imóveis. A ideia aqui, segundo afirmou Guido Mantega, é “reduzir a necessidade de fazer um
‘périplo’ em diversos cartórios”, em busca das certidões negativas, aquelas que comprovem que o
bem está juridicamente apto para a venda. Atualmente, são necessárias certidões de pelo menos dez
cartórios. “Estamos dando mais um passo para tornar esse processo mais seguro para o agente
financeiro, que, em um ambiente de maior previsibilidade e segurança, tenderá a colocar cada vez
mais recursos no financiamento habitacional, reduzindo os custos desse crédito e alongando os
prazos”, comemora Oliveira, da Anefac.
NO CARNÊ
Ainda fazem parte do minipacote medidas que estimulam não apenas o setor imobiliário, mas
também o mercado geral de crédito e que poderão injetar R$ 16 bilhões na economia, segundo o
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Ministério da Fazenda. Serão liberados até 3% dos recursos da caderneta de poupança aplicados no
mercado imobiliário para serem usados em operações de crédito, de qualquer finalidade, que tenham
imóveis quitados como garantia, chamados de home equity.
O crédito consignado privado também deverá ser estimulado: o tomador poderá autorizar a
instituição financeira a debitar o valor da prestação no mesmo momento em que o salário é
depositado na conta corrente. Hoje, a empresa desconta a parcela do salário do empregado e repassa
o dinheiro ao banco que concedeu o empréstimo num momento posterior.
O governo facilitou ainda a tomada de bens móveis (carros, caminhonetes, caminhões, ônibus,
tratores e máquinas) pelos bancos em caso de inadimplência. O tomador do empréstimo poderá
autorizar diretamente a recuperação do bem financiado em caso de inadimplência, dispensando
ações na Justiça. Segundo Mantega, essa mudança será feita por meio de emenda a projetos de lei
em tramitação no Congresso e permitirá que os bons pagadores consigam financiamentos com juros
mais baixos e maior segurança jurídica.
A equipe econômica também decidiu simplificar a recuperação tributária de crédito em atraso. As
instituições financeiras não precisarão mais entrar na Justiça para pedir a dedução de tributos
referentes a prejuízos com empréstimos em inadimplência. A medida beneficiará operações de
crédito de qualquer modalidade sem garantia de até R$ 100 mil e operações com garantia de até R$
50 mil. Acima desses valores, continua a necessidade de pedido judicial.
A despeito de todo o esforço para estimular a construção civil, a previsão inicial de crescimento do
setor da construção de 2,5% em 2014 foi revisada para baixo, ficando entre zero e 1%, segundo
divulgou a Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC). O Sindicato da Construção Civil de
São Paulo (Sinduscon-SP) é um pouco mais otimista. Segundo Eduardo Zaidan, vice-presidente da
entidade, o crescimento poderá ficar entre 1% e 1,5% neste ano. “O mercado está estável. Em
construção civil, o curto prazo não influencia. O que é influenciável é a tomada de decisão tanto
para novos empreendimentos quanto para compra por parte dos consumidores. E estas estão
paralisadas agora porque é um momento delicado, de eleições”, comenta.
Para o economista, as medidas tomadas pelo governo são bem-vindas, mas não é a salvação para o
setor. “Tudo começa e termina no bolso. O governo quer melhorar a percepção das famílias de que a
economia vai bem, para que decidam pelo crédito, mas, no caso do mercado imobiliário, a decisão
será tomada se o brasileiro tiver confiança de que não vai perder o emprego”, avalia.
Se depender da confiança da população, os R$ 30 bilhões em imóveis encalhados contabilizados pelo
JP Morgan poderão seguir sem negócios: pesquisa elaborada pela Fundação Instituto de Pesquisas
Econômicas (Fipe), em parceria com o portal Zap, revelou que as intenções de investimento em
imóveis caíram de 48%, no primeiro trimestre, para 34%, no segundo trimestre, o menor porcentual
desde o início de 2013, quando o levantamento começou a ser realizado.
Some-se a isso ainda o fato de os brasileiros estarem mais endividados, sobrando pouco espaço no
orçamento para comprometer-se com a compra da casa própria. Segundo a Serasa Experian, a
inadimplência do consumidor aumentou 17,2% em agosto em comparação com o mesmo mês de 2013
e foi a maior alta desde junho de 2012.
Enquanto isso, o déficit habitacional no país beira 6 milhões de moradias, segundo o último
levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). E as previsões não são das
melhores, como mostra pesquisa da Fundação Getulio Vargas: até 2022, essa necessidade de novas
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moradias poderá ultrapassar 23 milhões caso não seja construído em torno de 1,8 milhão de novos
imóveis por ano.
Se depender do ritmo dos programas habitacionais, como o Minha Casa, Minha Vida, do governo
federal, que construiu 1,7 milhão de moradias em cinco anos, essa projeção poderá virar realidade
caso estímulos como os do pacote anunciado não venham acompanhados de crescimento da economia
do país. E isso, por enquanto, está em compasso de espera.
O QUE PROMETEM OS CANDIDATOS
A habitação sempre ganha destaque nos programas de governo em época eleitoral. No caso dos
candidatos Dilma Rousseff e Aécio Neves não é diferente. A primeira não coloca o tema como item
específico em sua plataforma, mas destaca a continuação do programa Minha Casa, Minha Vida,
lançado em 2009. O projeto financia moradias para famílias com renda de até R$ 5 mil por mês, a
juros mais baixos do que os cerca de 11% dos financiamentos imobiliários tradicionais. A candidata
tem dito em seus comícios que vai construir 3 milhões de unidades habitacionais a partir de 2015.
Pelo programa, 1,7 milhão de moradias já foram entregues, de um total de 3,4 milhões contratadas.
Pouco antes do início oficial da campanha, Dilma anunciou, em julho, a terceira fase do Minha Casa,
Minha Vida. Ela e ministros escalados comandaram a entrega simultânea de 5.460 residências em 11
cidades, distribuídas em sete estados e no Distrito Federal. Aécio Neves afirma, em seu programa de
governo, que criará um Plano Nacional de Habitação, com a promessa de que manterá e ampliará o
Minha Casa, Minha Vida. O plano traz 18 diretrizes, mas não cita números nem detalha como será
executado. A apresentação do projeto afirma ser a habitação uma das prioridades do
candidato, caso seja eleito. Um dos destaques, segundo tem dito em pronunciamentos,
serão moradias construídas de maneira sustentável, além do desenvolvimento de
programas específicos para idosos e pessoas portadoras de deficiências. O candidato também
promete fortalecer o Conselho Nacional de Cidades, com a criação de uma Câmara Técnica
Específica, que, segundo ele, seria a representação dos estados, municípios e sociedade civil no
plano.
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