Ciclo menstrual normal A menstruação é um sangramento genital periódico e temporário que manifestase aproximadamente a cada mês, iniciando-se com a menarca e terminando com a menopausa. Ciclo menstrual: é o conjunto de eventos endócrinos interdependentes do Sistema Hipotálamo-Hipófise-Ovário (SHHO) e as modificações fisiológicas no organismo que são conseqüentes a esses eventos, visando a preparação para o coito e a gravidez. Dois processos reprodutivos principais ocorrem durante cada ciclo: - 1) Maturação e liberação de um óvulo - 2) preparação do útero para receber um embrião, caso haja fertilização. Características e terminologia do sangramento menstrual O fluxo menstrual é composto por sangue proveniente dos capilares e arteríolas, e também da camada funcional do endométrio. Não há formação de coágulos, porque esse sangue não contém fibrinogênio. Os “coágulos” informados pelas pacientes são agregados de hemácias, substância mucóide, mucoproteínas e glicogênio, formados na vagina (NÃO HÁ DEPÓSITOS DE FIBRINA). A duração do ciclo é determinada pela velocidade e qualidade do crescimento e desenvolvimento folicular e varia entre uma mulher e outra e entre um ciclo e outro. Média: - sangramento menstrual de 3 a 7 dias. Volume: 30 a 80 mL por dia. - intervalo entre ciclos: 24 a 35 dias. Um ciclo nesse padrão é chamado normal ou eumenorréico. Variações: - hipermenorréia: sangramento prolongado ( + que 8 dias) - menorragia: sangramento em quantidade excessiva ( + que 80mL) - hipomenorréia: duração < 3 dias e/ou volume < 30mL. - polimenorréia: ciclos curtos ( freqüência < 24 dias) - oligomenorréia: ciclos longos ( intervalos > 35 dias). Componentes funcionais do ciclo menstrual Interação hipotálamo- hipófise- ovário e útero. O ovário é responsável pela ritmicidade do ciclo – relação de feedback entre secreção ovariana e o eixo hipotálamo- hipófise. Hipotálamo: Os núcleos arcuados no hipotálamo médio-basal são os principais reguladores do ciclo. Seus neurônios produzem o Hormônio Liberador de Gonadotrofinas (GnRH), que tem meia-vida curta, é imediatamente transportado para a hipófise anterior e exerce papel obrigatório no controle da secreção de gonadotrofinas. O hipotálamo é influenciado por sinais extrínsecos e intrínsecos ao SNC e está sujeito ao controle do ovário ( feedback ou retroação). O próprio GnRH controla sua produção agindo no hipotálamo através da retroação de alça ultracurta. Hipófise: O GnRH age nas células gonadotróficas basofílicas da hipófise anterior, estimulando-as a sintetizar e secretar Hormônio Luteinizante (LH) e Hormônio Folículo Estimulante (FSH). Os hormônios esteróides, como o estradiol e a progesterona, ou fatores ovarianos não- esteróides, como a inibina, são moduladores da secreção de LH e FSH. A secreção de LH é essencialmente caracterizada por um pico no meio do ciclo menstrual. A secreção de FSH caracteriza-se por aumento na fase folicular inicial, platô na fase lútea e acentuada elevação na fase lútea tardia. As gonadotrofinas (LH e FSH) são secretadas de forma pulsátil ( devido a secreção pulsátil de GnRH), com freqüência e amplitude que variam de acordo com a fase do ciclo (em resposta ao feedback dos esteróides no hipotálamo e hipófise). As gonadotrofinas exercem retrocontrole sobre a produção do GnRH pelo hipotálamo – feedback em alça curta: - gonadotrofina ↑ = ↓ inibe produção de GnRH (feedback - ) - gonadotrofina ↓ = ↑ hipotálamo (feedback +) Ovários: Os ovários têm duplo papel, produzir gametas e secretar hormônios, que é desenvolvido pelo folículo de Graaf, unidade funcional básica do ovário. Os principais hormônios ovarianos são: estradiol, estrona, androsteneriona, testosterona e progesterona, alem dos peptídeos gonadais. O estradiol e a progesterona (principais hormônios esteróides) se ligam a receptores específicos no núcleo de células-alvo principalmente nos ovários, no útero, na vagina e nas mamas. Estradiol: tem ação no desenvolvimento endometrial e folicular, além da promoção do pico de LH no meio do ciclo. Progesterona: ação na manutenção do arcabouço endometrial e retroação negativa sobre a secreção hormonal hipotalâmica. A secreção ovariana exerce influência sobre a secreção de gonadotrofinas, através de feedback sobre hipófise e hipotálamo (retroação de alça longa), que ocorre da seguinte maneira: - estrogênio: até determinados níveis inibe a produção de FSH e LH na hipófise (feedback neg.). Em níveis mais elevados, passa a estimular a produção de GnRH pelo hipotálamo e a hipófise, que produz o pico de LH (feedback pos.). A transição de supressão para estimulação à produção de LH ocorre enquanto os níveis de estradiol se elevam durante o meio da fase folicular. - progesterona: tem ação inibitória no hipotálamo e ação positiva na hipófise. - inibina: ação inibitória sobre o hipotálamo, em associação ao estrogênio, suprimindo a produção de FSH. É o feedback negativo. Útero: A parede uterina tem 3 camadas: a serosa (+ externa), o miométrio e o endométrio ( + interna e que possui 2 componentes anatômicos: o estroma e as glândulas). Histologicamente, há 3 camadas no endométrio: -profunda ou basal: não responde aos hormônios ovarianos -média ou esponjosa: é a maior e reage intensamente aos estímulos hormonais -superficial ou compacta: inclui o colo das glândulas e o epitélio superficial. As alterações produzidas pelos hormônios manifestam-se nas camadas esponjosa e compacta, que são eliminadas na menstruação, e por isso são chamadas funcionais. A camada basal não é eliminada e garante a renovação do endométrio para o próximo ciclo. As fases do ciclo ovariano: O ciclo menstrual é dividido em 3 fases: a fase folicular, a ovulação e a fase lútea. FASE FOLICULAR: Estende-se do 1° dia da menstruação até o dia do pico de LH, no meio do ciclo (entre o 10° e 14° dia), inclusive. Também chamada de fase proliferativa, seu resultado final é o desenvolvimento folicular e, comumente, um único folículo maduro viável. Fases do crescimento folicular: Folículo primordial: primeiro estágio do desenvolvimento folicular, consiste em um oócito paralisado na prófase meiótica, envolto por uma camada única de células da granulosa. Eles crescem e sofrem atresia durante toda vida da mulher, inclusive na gravidez, infância, perimenopausa ou períodos de anovulação. A fase inicial do crescimento folicular envolve respostas que não dependem da regulação hormonal e sim de um mecanismo próprio do ovário. Ao final deste estágio, o oócito apresenta plena capacidade de completar a meiose. Além disso, as células da granulosa tornam-se cubóides e formam junções com o oócito que permitem a troca de nutrientes. Folículo primário: com a multiplicação das células da granulosa o folículo primordial torna-se primário. Ocorre a diferenciação, independente da estimulação hormonal, das células do estroma em teca interna e teca externa. Nesta fase, o folículo tem padrão de crescimento limitado e pode sofrer rápida atresia a menos que o grupo de folículos responda a uma elevação do FSH, impulsionando seu crescimento. O declínio na produção de estradiol e inibina, que ocorre na fase lútea do ciclo anterior, permite a elevação do FSH. Folículo pré-antral: com o crescimento acelerado pelo FSH, o folículo tem um oócito maior, envolto por uma membrana, a zona pelúcida. A partir dessa fase o crescimento passa ser dependente das gonadotrofinas hipofisárias. As células da granulosa passam a produzir estrogênio e pouco androgênio (que é substrato para a produção de estrogênio) e progestagênio. Tanto a produção de estrogênio quanto a proliferação das células da granulosa e o crescimento folicular são estimulados pelo FSH. Para ter sucesso no desenvolvimento, o folículo precisa ser capaz de converter o androgênio em estrogênio, pois em um microambiente muito androgênico, o folículo sofre atresia. Folículo antral: a presença de estrogênio e FSH ocasionam a produção e acúmulo de líquido folicular nos espaços intercelulares da granulosa, formando uma cavidade e dando origem ao folículo antral. Na presença de FSH, o estrogênio (que promove proliferação granulosa e crescimento do oócito) predomina nesse líquido e , na ausência de FSH, predomina o androgênio ( que promove degeneração do oócito). Sistema de duas células, duas gonadotrofinas: nos folículos pré-antrais e antrais, os receptores para o LH estão presentes apenas nas células da teca e os receptores para o FSH apenas nas células da granulosa. Em resposta ao LH, as células da teca produzem androgênio, a partir do colesterol. O androgênio é transportado às células da granulosa e lá é convertido em estrogênio, através da aromatização induzida pelo FSH. A granulosa é incapaz de produzir androgênio. A resultante conversão de um microambiente androgênico em estrogênico, essencial ao desenvolvimento folicular, é dependente da crescente sensibilidade do folículo ao FSH, mediada pelo próprio FSH e pela crescente influência do estrogênio. A seleção do folículo dominante: a conversão em um folículo com microambiente estrogênico seleciona este folículo e o destina a ovular. Esta seleção ocorre entre o 5° e o 7° dia do ciclo e é resultado de duas ações estrogênicas: 1) interação local com o FSH, exercendo influência positiva em sua ação; 2) e retroação negativa em nível de hipotálamo-hipófise na produção de FSH, que serve para remover o suporte de gonadotrofinas dos outros folículos. A diminuição da produção de FSH na hipófise leva À diminuição da ação desse hormônio nos outros folículos e conseqüente formação de um microambiente androgênico em cada um deles. Ou seja, a retroação negativa do estrogênio sobre o FSH serve para inibir o desenvolvimento de todos, menos do folículo dominante. O desenvolvimento desse folículo continua dependente do FSH e por isso ele possui maior numero de receptores para FSH e maior ação local do FSH que os outros folículos, uma maneira de compensar os níveis decrescentes de FSH no plasma. Além disso, a vascularização da teca aumenta a medida que o folículo dominante cresce. No final do desenvolvimento antral, o FSH induz o aparecimento de receptores de LH nas células da granulosa para que o folículo responda melhor ao pico de LH no meio do ciclo, responsável pela ovulação. Inibina e ativina: são peptídeos sintetizados pelas células da granulosa, em resposta ao FSH. A primeira é um importante inibidor da secreção de FSH. Já a ativina estimula a liberação do FSH pela hipófise e aumenta sua ação no ovário. Folículo pré-ovulatório: nessa fase, as células da granulosa tornam-se maiores e as da teca muito vascularizadas. O oócito prossegue na meiose, quase completando a divisão reducional. Há uma produção cada vez maior de estrogênio, atingindo seu pico cerca de 3 dias antes da ovulação. O pico de LH ocorre um dia depois do pico de estradiol. O LH promove luteinização das células da granulosa no folículo dominante, levando à produção de progesterona. A progesterona age positivamente na hipófise, contribuindo para a elevação do FSH e do LH observada no meio do ciclo. As células de teca dos folículos em atresia, sob ação do LH, aumentam a produção de androgênio, que em concentrações elevadas no plasma, estimula a libido da mulher, aumentando a freqüência de relações sexuais no período pré-ovulatório. FASE OVULATÓRIA: Somente o folículo que atinge seu estágio final de maturação é capaz de se romper. O marcador fisiológico mais importante da aproximação da ovulação é o pico de LH do meio do ciclo, que ocorre de 32 a 36 horas antes da ovulação e é precedido por um aumento acelerado do nível de estradiol (que é produzido pelo folículo préovulatório). Dessa maneira, o folículo produz seu próprio estímulo ovulatório (↑ estradiol → ↑LH → ovulação). No momento da ovulação, dentro do folículo dominante ocorre 3 fenômenos principais: Recomeço da meiose I: o oócito permanece no estagio diplóteno da meiose I até a onda de LH, quando é retomada a meiose e ele se torna apto para a fertilização. O oócito passa da prófase I para a metáfase I e ocorre a extrusão do primeiro corpúsculo polar na metáfase II. A meiose só se completa após a penetração do espermatozóide e a liberação do segundo corpúsculo polar. Luteinização: um pequeno aumento da produção de progesterona ocorre 12 a 24 horas antes da ovulação. Ele induz a onda de FSH e LH pelo aumento do feedback positivo do estradiol na ação desses hormônios. Sem o aumento pré-ovulatório de progesterona não há pico de FSH e LH. Porém, com sua elevação progressiva, a progesterona passa a exercer feedback negativo sobre o LH, terminando com o seu pico. Além disso, ela também aumenta a distensibilidade da parede folicular. Ovulação: desde a fase folicular há um acúmulo de prostaglandinas E e F e produção de plasminogênio que ativam colagenases que irão digerir o colágeno da parede do folículo, facilitando a liberação do oócito. As Plg E e F , junto com o LH, também promovem a contração das células musculares da parede folicular, já enfraquecida, levando à extrusão do oócito (ovulação). Além disso, ocorrem alterações importantes no fluxo sangüíneo do ovário. Vários mediadores produzidos e liberados o ovário promovem o aumento do fluxo sangüíneo intrafolicular e da permeabilidade capilar. Após a rotura folicular o óvulo é apreendido pelas fimbrias tubárias. FASE LÚTEA: Uma vez liberado o oócito, a estrutura dominante passa a se chamar corpo lúteo. As células da granulosa aumentam de tamanho que acumulam em vacúolos um pigmento amarelado chamado luteína. O incremento vascular local favorece o aporte de LDL colesterol, substrato na síntese de progesterona. É conhecida a necessidade de estrogênio para a síntese de receptores de progesterona no endométrio. O estrogênio da fase lútea é necessário para que ocorra as alterações induzidas pela progesterona no endométrio após a ovulação ( fundamentais para a implantação do embrião). A cada pulso de LH existe um aumento da concentração de progesterona. Esses pulsos de LH são maiores no inicio da fase lútea e diminuem gradativamente., favorecendo a atuação de fatores que levam a luteólise, na fase lútea tardia. Se a gravidez acontece, o HCG mantém o funcionamento do corpo lúteo até que ocorra a esteroidogênese placentária. No período lúteo intermediário, a inibina faz um pico na circulação e suprime a secreção de FSH pela hipófise, quando são atingidas os níveis mais baixos desse hormônio. Ao final da fase lútea, a regressão do corpo lúteo leva à queda do estradiol, progesterona e inibina, o que permite a elevação do GnRH e do FSH, recomeçando todo o processo. AS FASES DO CICLO ENDOMETRIAL Na fase folicular ou proliferativa do ciclo, o aumento de estrogênio provoca a reconstrução e o crescimento do endométrio. (Na fase anterior, a descamação menstrual provocou a perda tecidual que será reconstituída). As glândulas são a porção do endométrio mais responsiva ao estrogênio. De estreitas e tubulares, com epitélio colunar baixo, elas passam a alongadas e pouco tortuosas, com pseudo-estratificação do epitélio. O componente estromal evolui de celular denso para breve período de edema e, finalmente, um sincício frouxo. Todos os componentes tissulares (glândulas, estroma e endotélio) têm pico de proliferação do 8° ao 10° dia do ciclo. Há aumento de mitoses e o endométrio passa de 0,5 para 3,5 a 5 mm. Isso ocorre principalmente na camada funcional do endométrio. Nessa fase de crescimento endometrial há ainda o aumento de células ciliadas e microvilosas, responsáveis pela mobilização e distribuição de secreções endometriais durante a fase secretória. No inicio da fase lútea a taxa de crescimento endometrial diminui e o endométrio atinge a espessura máxima (8 a 10 mm). O numero de receptores de progesterona está alto graças ao estímulo estrogênico, e ela (progesterona) provocará modificações no endométrio, produzindo uma resposta secretora. As glândulas endometriais tornam-se tortuosas e aumentam seu lúmen, passando a secretar grande quantidade de muco nutritivo e preparando-se para a implantação. Na fase lútea tardia, o estroma desenvolve características de reação decidual prémenstrual, com grande infiltrado de linfócitos e aspecto edematoso.