Qual a especificidade da fé cristã - Band-m4

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Qual a especificidade da fé cristã?
Embora geralmente a fé seja vista como uma religião, porque
trata da relação com esse Absoluto a que se chama Deus, esta
noção não se revela muito útil para a captar no seu carácter
único. Será ela então uma espiritualidade? Sim, no sentido em
que oferece um caminho pessoal e vivido de aprofundamento
do sentido da existência. Contudo, este caminho não é deixado
somente à discrição do indivíduo, não é feito de elementos a
pegar ou largar ao sabor dos seus próprios caprichos. É uma
peregrinação nas pisadas de Cristo, e coloca forçosamente o
peregrino em relação com todos aqueles que estão no mesmo
caminho.
A fé cristã será então uma vida comunitária? Esta definição
tem o grande mérito de corresponder à vida dos primeiros
cristãos de acordo com o Novo Testamento. É ainda preciso
acrescentar que esta vida partilhada está longe de ser uma
simples convivialidade humana, mas mergulha as suas raízes
em Deus, porque é essencialmente participação na sua
própria Vida, uma Vida que é Amor e portanto Vida para os
outros. Esta vida comunitária é por natureza inclusiva,
universal, a sua irradiação atinge virtualmente todo o ser
humano. Neste sentido, as fronteiras da comunidade cristã
não estão traçadas de uma vez para sempre; elas acabam por
se confundir com o conjunto da família humana,
inclusivamente de toda a criação.
Na sua essência, a fé em Jesus Cristo pode definir-se como a
oferenda em acto de uma comunhão universal em Deus. Antes
de mais, longe de ser uma obra humana, é essencialmente
uma oferta ou um convite vindo da parte de Deus. Já era esse
o caso no Israel antigo: esse povo devia a sua identidade não a
critérios geográficos ou genealógicos, mas à escolha gratuita
de um Deus misterioso e transcendente. Com a vinda de Jesus
Cristo, isso amplia-se ainda mais. Nele, por impensável que
isso possa parecer, é a própria Fonte da vida que vem ao
nosso encontro.
Se a fé cristã é uma oferta vinda do lado do Absoluto, o papel
dos seres humanos é essencialmente de acolher este convite e
de lhe responder. Não lhes compete a eles definir-lhe os
contornos. E se Deus chama através de Cristo para uma
partilha de vida, para uma comunhão, este convite dirige-se
então à dimensão mais pessoal do ser humano, procurando
despertar nele uma liberdade. Outras tantas razões pelas
quais uma tal oferta está nos antípodas da coacção. Toda a
tentativa de a impor por meios coercivos, abertos ou subtis, é
absolutamente estranha à sua natureza.
Além disso, a mensagem cristã é uma oferenda em acto, ou
seja um convite real e não teórico. Tal como Jesus transmitiu o
essencial da sua mensagem através da sua vida dada até à
morte numa cruz, o discípulo faz da sua existência a
mensagem a transmitir. No cristianismo não há dicotomia
possível entre a doutrina e a prática, sob pena de se esvaziar
da sua substância. Pelo contrário, a doutrina é idêntica à
prática, porque se trata nos dois casos de uma comunhão com
Deus e entre os humanos. Se os cristãos não praticam o amor
fraterno, se as Igrejas vivem na indiferença ou na
concorrência mútua, a sua pregação permanece
necessariamente letra morta.
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