Capítulo 2 “Ética, sobrevivência e coesão social”

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Eduardo Giannetti – Vícios privados, benefícios públicos?
Capítulo 2
Ética, sobrevivência e coesão social
O que garante a coesão interna de um agrupamento humano e impede que ele
se desmanche ou degenere em caos e guerra?
Qual o papel do respeito às normas morais de conduta na sobrevivência
humana?
A obediência a normas de comportamento é indispensável para a vida em
comunidade.
Engenharia econômica – hipóteses comportamentais altamente simplificadas
instauraram uma distância entre ética e análise econômica.
Protágoras
A espécie humana sobreviveu graças a sua
capacidade para a vida comunitária, que só se
tornou possível com o desenvolvimento das
virtudes morais da “consciência” e da “justiça”.
Consciência – senso de vergonha e modéstia que
refreia os instintos dos indivíduos.
Justiça – capacidade de discernimento ético saber o que é permitido ou não do ponto de vista
moral.
Essas virtudes foram conquistadas pela
humanidade ao longo do tempo e precisam ser
aprendidas de novo por cada geração. A conduta
moral não é um dom original, mas algo que
precisa ser adquirido e que pode até ser corrigido
Esse aprendizado se assemelha à assimilação da
linguagem (não sabemos dizer quem nos ensinou
e, embora ninguém tenha nascido com ela, todos
possuem algum domínio).
“Até mesmo o homem mais depravado que foi
criado numa sociedade regida por leis é um
homem justo, um especialista nessa esfera,
quando o comparamos com homens sem
educação, ou tribunais, ou leis, ou qualquer tipo
de coerção para forçá-los a ser bons.”
Aristóteles
O discernimento moral é condição necessária para
a constituição da polis.
O perímetro da polis estabelece o limite da
independência humana – suas preocupações com
segurança e satisfação de necessidades diminuem,
podendo o homem desenvolver sua natureza
política.
“O homem é por natureza destinado a viver na
polis.”
Bertrand Russell chama de “otimismo ético”
aristotélico – Aristóteles acredita na importância
cientifica das causas finais. Os homens desejam
viver a melhor vida possível. Possuem um impulso
natural para viver em sociedade, pois mesmo
quando não precisam de ajuda mútua se
beneficiam da ação política (a polis é o resultado
de um “impulso natural” aliado a um “interesse
comum”).
Protágoras e Aristóteles
Pontos em comum:
- A vida em comunidade requer que existam crenças morais comuns e normas
publicamente aceitas, retratando o que é aceito ou não. Sem isso a ordem social não
poderia existir
- A ética viabiliza a vida comunitária e, indiretamente, todos os benefícios práticos e
espirituais que ela traz para o homem.
Pontos conflitantes:
Grau de adesão dos homens às crenças e normas que tornam a ordem social coesa.
Aristóteles – acredita que há indivíduos que não compartilham da moralidade comum
(escravos e bárbaros). Existe o “homem isolado” que é o pior dos seres, é incompleto. No
entanto é uma exceção e, por isso, não constitui uma ameaça. Acredita, também, no
otimismo ético (homens possuem um impulso natural para viver em sociedade).
Protágoras – o processo de surgimento e consolidação da vida comunitária é conflituoso.
Marcado pela injustiça e violência generalizada. A consciência e a justiça não são
naturais do homem. O aprendizado da moral é resultado da necessidade de
sobrevivência num mundo hostil.
Lucrécio
Se a ética tornou possível a passagem do homem primitivo para a sociedade prépolítica, foi também a fragilidade da adesão a ela que acabou levando, por meio de um
processo extremamente conflituoso e violento, ao surgimento da sociedade política.
Homens primitivos - viviam completamente isolados. Agiam de modo a favorecer suas
vontades.
Sociedade pré-política – os homens primitivos se agruparam em famílias e estabelecem
relações entre elas. A ética aparece como fator de sobrevivência e coesão social. As
necessidades e a ambição humana eram limitadas. O aperfeiçoamento da linguagem e as
novas possibilidades de vida e consumo despertaram nos homens a ambição. O
surgimento dos primeiros governantes generalizou a competição por poder. Com isso
rompeu-se o acordo moral que sustentava a sociedade e teve inicio o processo de
aprendizado que levou ao nascimento da sociedade política.
Transição da pré-política para a política – “Cada homem busca para si próprio o poder e
o comando” gerando instabilidade, violência e anarquia.
Sociedade política – Existe um código de leis de caráter compulsório (as pessoas o
respeitam devido a um sistema de punição. São guiadas pelo medo).
Assim como na visão de Protágoras não há nenhuma garantia teológica
sustentando a ordem social.
Hobbes
Nega a possibilidade de conhecimento ético, isto é, conhecimento seguro e
universal sobre o que é certo ou errado. Os julgamentos morais são subjetivos. Não
existe um padrão ético universal e inquestionável.
Os homens chegarão a um consenso por meio da política. “É a autoridade, não a
verdade, que faz a lei”.
“Estado de natureza” – é uma condição de conflito endêmico, insegurança e
instabilidade radical. “O homem é o lobo do homem”.
O medo da morte violenta fez com que os homens abrissem mão de suas
liberdades individuais.
Existem dois caminhos, ambos impulsionados pelo medo, para a constituição do
poder soberano diante do qual os homens saem do “estado de natureza”:
Via da subjugação (força) – pela força natural o soberano impõe o poder sobre os
demais. Que aceitam por o temerem. (Ex: guerras, um pai sobre seus filhos)
Via da política (acordo) – o medo dos demais faz com que um grupo eleja um soberano
para, por ele, ser protegido.
“Qualquer governo é melhor que ausência de governo”
“Contrato social” – mito pedagógico para mostrar o processo altamente
conflituoso de surgimento da comunidade política.
Como não há um acordo sobre o que é certo ou errado a autoridade do poder
soberano é moral, por isso não existe vida em comunidade harmoniosa.
Montesquieu
Há verdades, como as da ética, que não basta serem ditas, mas é preciso fazer
que interessem e sejam sentidas.
“O mito dos trogloditas” – ao elegerem um rei para governá-los os homens
abdicam da interação perfeitamente harmoniosa e deixam de perseguir o máximo moral
para viverem apenas dentro do mínimo moral.
Conclusões:
A valorização excessiva ao conhecimento científico (cientificismo - crença de
que existem respostas científicas para perguntas que a ciência não tem como
formular) diminui as possibilidades de reflexão do homem.
A ciência busca conhecer o mundo observável, objetivo, enquanto a ética busca
não aceitar a realidade como ela é e sim aquilo que pode ser diferente do que é.
Para os adeptos mais extremados do neolítico moral (“do ponto de vista moral
vivemos ainda na era neolítica”) o avanço da ciência é uma das causas desse suposto
retrocesso da humanidade.
Entre todos os autores citados no capítulo existe o consenso da crença na
necessidade de um poder soberano, figura capaz de garantir o respeito às normas,
tornando a vida em sociedade estável.
Diferenças em relação ao grau de adesão interna dos indivíduos às normas de
conduta:
Modelo hobbesiano – a adesão é praticamente nula. O acordo moral é imposto de fora
e de cima para baixo pelo soberano. A decisão tomada pelo representante do Estado
não pode ser contestada.
Visão aristotélica – a adesão é praticamente unitária. O que move as pessoas não é o
medo ou a autoridade externa e sim um impulso natural de sociabilidade e um
interesse prático comum.
O autor (Eduardo Giannetti) acredita que a adesão dos indivíduos não pode, no
entanto, ser nula, pois sem o mínimo de adesão a ordem social não poderia existir.
“Uma sociedade constituída de egoístas irrefreados se espatifaria em pedaços”.
Esse grau pode ser atribuído a três fatores básicos:
Submissão – adesão à norma se dá por força da ameaça de sanção externa dos
infratores. Baseada na escolha racional, um mecanismo claramente insuficiente para
dar conta concordância às normas de comportamento.
Identificação - adesão motivada pelo exemplo e pelo desejo de conquista ou manter a
boa opinião dos demais. A moralidade cívica parece depender de uma rede de
sentimentos morais baseada na necessidade psicológica de cada um obter a aprovação
e a opinião favorável de terceiros (e de si próprio) para aquilo que faz.
Internalização – decisão de acatar a norma com base numa reflexão ética. Pode ser
visto como uma vitória dos “interesses constitucionais” (preferências com respeito às
regras ou ao ambiente institucional em que escolhemos viver) sobre os “interesses
operacionais” (preferências com respeito às possibilidades de ação a cada momento,
considerando as restrições existentes).
A função da moralidade das leis é assegurar a coexistência relativamente
pacifica entre os indivíduos coordenando suas vontades. A grande questão é saber o
que determina a maior ou menor adesão dos indivíduos em cada situação.
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