PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 1ª

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PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 1ª REGIÃO
APELAÇÃO CÍVEL Nº 1999.34.00.006094-8/DF
Processo na Origem: 199934000060948
RELATOR(A)
RELATOR(A)
APELANTE
ADVOGADA
APELANTE
PROCURADOR
APELADOS
APELADO
PROCURADOR
REMETENTE
:
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DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA PRUDENTE
JUIZ FEDERAL MOACIR FERREIRA RAMOS (CONV.)
CLAUDIO VITOR FRAVIANO DA CRUZ
MARTHA HELENA TOBIAS DA SILVA
UNIÃO FEDERAL
HÉLIA MARIA DE OLIVEIRA BETTERO
OS MESMOS
FUNDAÇÃO NACIONAL DE SAUDE - FUNASA
ANTENOR PEREIRA MADRUGA FILHO
JUÍZO FEDERAL DA 5ª VARA - DF
RELATÓRIO
O EXMO. SR. JUIZ MOACIR FERREIRA RAMOS (RELATOR
CONVOCADO):
Cuida-se de recursos interpostos contra sentença proferida pelo Juízo da
5ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal/DF, que, nos autos da ação
de indenização movida por CLÁUDIO VITOR FRAVIANO DA CRUZ contra a UNIÃO
FEDERAL e a FUNDAÇÃO NACIONAL DE SAÚDE, objetivando a reparação dos
danos morais sofridos em razão de erro no resultado de exame sangüíneo, que
concluiu ser o apelante soropositivo, julgou procedente o pedido condenando as rés
ao pagamento da indenização por danos morais no valor de R$ 60.000,00 (sessenta
mil reais) corrigidos monetariamente desde a citação, bem assim em custas
processuais e honorários advocatícios, fixados estes no valor de R$ 300,00
(trezentos reais).
Em suas razões recursais (fls. 198/201), sustenta o apelante que
os honorários advocatícios foram fixados em valor irrisório, sem observância do art.
20, §§ 3º e 4º, do CPC, não se levando em consideração a complexidade da matéria
e o zelo despendido pelo causídico na defesa do executado. Requer o provimento do
recurso, para que a sentença seja reformada no que tange aos honorários
advocatícios, fixando-os em percentual compreendido entre o mínimo de 10% e o
máximo de 20% do valor da condenação.
Em suas razões recursais de fls. 203/209, sustenta a União Federal que
não houve nexo de causalidade entre o serviço público prestado pela Fundação
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Criado por Rejane Cristina
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Nacional de Saúde-FNS e o evento danoso, eximindo o Estado de qualquer
responsabilidade, e que as provas existentes nos autos são insuficientes para
legitimar a sua condenação. Aduz, ainda, que não pode ser responsabilizada pelo
preconceito sofrido pelo autor através de seus familiares e empregador. Por fim,
alega que o valor dos danos morais fixados pela juíza a quo afiguram-se
exorbitantes, tendo em vista que o autor, sendo carpinteiro, percebia um salário não
superior a R$ 373,00 (trezentos e setenta e três reais) por mês, conforme tabela
colhida da internet . Requer, pois, o provimento do recurso para a reforma integral da
sentença monocrática recorrida, com a conseqüente inversão do ônus da
sucumbência.
Com as contra-razões de fls. 213/215 e também por força da
remessa oficial, subiram os autos a este egrégio Tribunal.
Este é o relatório.
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Processo na Origem: 199934000060948
RELATOR(A)
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ADVOGADA
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PROCURADOR
APELADOS
APELADO
PROCURADOR
REMETENTE
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DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA PRUDENTE
JUIZ FEDERAL MOACIR FERREIRA RAMOS (CONV.)
CLAUDIO VITOR FRAVIANO DA CRUZ
MARTHA HELENA TOBIAS DA SILVA
UNIÃO FEDERAL
HÉLIA MARIA DE OLIVEIRA BETTERO
OS MESMOS
FUNDAÇÃO NACIONAL DE SAUDE - FUNASA
ANTENOR PEREIRA MADRUGA FILHO
JUÍZO FEDERAL DA 5ª VARA - DF
VOTO
O EXMO. SR. JUIZ MOACIR FERREIRA RAMOS (RELATOR
CONVOCADO):
I
A d. Juíza Federal sentenciante utilizou-se dos seguintes motivos para
decidir a matéria que lhe foi submetida à apreciação, verbis:
“Trata-se de ação ordinária de indenização proposta por CLÁUDIO
VITOR FRAVIANO DA CRUZ contra a UNIÃO FEDERAL E A
FUNDAÇÃO NACIONAL DE SAÚDE – FNS, objetivando indenização
por danos morais.
O autor alega que foi internado por diversas vezes no Hospital João
Barros Barreto, em meados de 1992, sendo que em uma dessas
ocasiões ficou alojado na ala de aidéticos.
Em dezembro de 1992, quando submetido a exame de sangue, foi
constatado que o autor era portador do vírus HIV, e, após receber
tratamento médico, foi encaminhado para o Centro de Referência para
continuidade do tratamento.
Sustenta que daí por diante ficou abalado emocionalmente e
financeiramente, já que em razão de tal fato perdeu o emprego de
carpinteiro em um parque de diversões, passando a enfrentar toda
espécie de preconceito e discriminação próprios dos portadores de tal
doença.
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Salienta que em 1996, vindo a Brasília foram requeridos novos
exames nos quais ficou constatado que o autor não era portador do vírus
da AIDS.
Diante das conseqüências advindas do erro no exame, requer
indenização por danos morais em montante a ser fixado por
arbitramento.
Juntou procuração e documentos.
Devidamente citada, a União contestou o feito argüindo, em
preliminar, sua ilegitimidade passiva ad causam, e, no mérito, a
ausência de prova de que o autor não é portador do vírus da AIDS.
Da mesma forma, a Fundação Nacional de Saúde contestou
alegando a necessidade de desconsideração dos exames apresentados
pelo autor, a prescrição do direito pleiteado, ausência de valor da causa,
e, no mérito, a improcedência do pleito inicial diante da inércia do autor
em repetir os exames realizados.
Durante a especificação de provas, foi apresentado exame do autor.
Memoriais apresentados pelo autor às fls. 174/176, pela União às fls.
179/183 e pela FNS às fls. 184/188.
É o relatório.
DECIDO.
(...)
MÉRITO
O autor pretende indenização por danos morais advindos de erro no
resultado de exame que o considerou portador do vírus HIV.
Ressalta-se, em primeiro lugar, que não há se falar em ausência de
prova quanto ao fato de que o autor não é portador do HIV, uma vez que
os documentos de fls. 24, 25 e 26, a despeito de não se encontrarem
totalmente preenchidos, ostentam presunção de veracidade, o que é
corroborado pelo exame atual juntado durante a instrução do feito, às fls.
170.
(...)
A responsabilidade civil do Estado é tema incontroverso consagrado
na Constituição Federal de 1998, em seu art. 37, § 6º, onde se vê a
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teoria do risco objetivo, ou simplesmente responsabilidade objetiva, cuja
caracterização independe de prova da culpa ou de ilicitude do ato
praticado, bastando a demonstração do nexo de causalidade entre
evento danoso e atos da Administração.
Assim, para demarcar o contorno da obrigação de indenizar, na
hipótese, basta a demonstração do nexo de causalidade entre os atos
dos prepostos das rés e o dano sofrido pelo autor, o qual, in casu,
consubstancia-se no reconhecimento errôneo de ser o mesmo portador
do vírus HIV.
Não se pode questionar as conseqüências advindas da ciência de ser
portador de um mal incurável. A ausência de expectativa de vida, melhor
dizendo, a certeza da morte e o abandono social conferindo ao doente
dessa categoria, que pode ser traduzido em medo, descaso e aferição
de comportamento leviano do acometido são bastantes para delinear o
sofrimento suportado pelo mal comportamento das rés.
Além disso, como se ainda fosse possível piorar a situação, é público
e notório o preconceito relativamente a portadores do vírus HIV, tendo a
imprensa noticiado constantemente abusos que muitas vezes ocorrem
até mesmo pelo desconhecimento da doença.
Não há como se afastar o prejuízo sofrido pelo autor, impondo-se, por
conseguinte, a obrigação do Estado de agir para minorar tal situação. Na
hipótese, por ser impossível restabelecer o status quo ante, devem as
rés, por intermédio de indenização, compensar a dor sofrida pelo
suplicante, sendo que referida recompensa não pode servir de
enriquecimento ilícito do autor, tampouco, deve servir de insignificante
punição para aqueles que cometeram a falta.
O autor era carpinteiro, portanto, pessoa de parcos recursos que
ficou durante quatro anos privado de trabalhar buscando melhora de vida
para si e para os seus.
Assim, sendo, entendo suficiente a importância de R$ 60.000,00
(sessenta mil reais), para o fim retromencionado, por importar em renda
anual equivalente a R$ 15.000,00 (quinze mil reais), ressaltando que as
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rés poderão utilizar da ação de regresso contra os causadores do dano
em discussão.
Com essas considerações, JULGO PROCEDENTE o pedido
formulado por CLÁUDIO VITOR FRAVIANO DA CRUZ contra a UNIÃO
FEDERAL e a FUNDAÇÃO NACIONAL DE SAÚDE para condenar as
rés ao pagamento de R$ 60.000,00 (sessenta mil reais)a título de danos
morais, valor esse que deverá ser corrigido monetariamente até o efetivo
pagamento, desde a citação.
Custas processuais e honorários advocatícios pelas rés, os quais fixo em
R$ 300,00 (trezentos reais)para cada uma.” (fls.190/195).
***
Não procede a assertiva da União Federal de que não há nexo causal
entre o ato praticado pela FNS e o dano sofrido pelo autor.
Os documentos de fls.03/04 convencem no sentido de que o dano moral
sofrido pelo autor decorreu da ciência do resultado dos exames hemotológicos
elaborados pelo Hospital João de Barros Barreto, vinculado ao Ministério da Saúde.
De acordo com o art. 37, § 6º, da Constituição Federal, é objetiva a
responsabilidade da União para reparar os danos provocados pelos seus agentes
aos particulares, bastando, apenas, a demonstração do nexo causal entre o ato
praticado e o dano sofrido, o qual foi cabalmente demonstrado, no caso destes autos.
A jurisprudência atual de nossos tribunais, inclusive a do Superior
Tribunal de Justiça, cristalizou-se no sentido de não se aplicar quaisquer limites
previstos em leis esparsas na fixação ou quantificação do dano moral, sendo certo
que, para tanto, se deve levar em conta o nível sócio-econômico do autor e o porte
econômico do réu.
Recomenda-se, ainda, que o arbitramento seja feito com moderação,
proporcionalmente ao grau de culpa, devendo o juiz orientar-se pelos critérios
sugeridos pela doutrina e pela jurisprudência, valendo-se de sua experiência e bom
senso, atento às peculiaridades de cada caso, para que não se configure
enriquecimento ilícito por qualquer das partes.
A União Federal afirma que a indenização fixada acarretaria no
enriquecimento indevido do autor, pois perceberia uma remuneração mensal de
apenas R$ 373,00 (trezentos e setenta e três reais).
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O dano moral não pode ser mensurado apenas pelos prejuízos materiais
sofridos pelo autor durante o interregno que imaginou ser portador de moléstia
incurável.
Com efeito, como bem salientou a il. Juíza sentenciante, a dor sofrida
pelo autor em ter o resultado positivo ao teste do vírus HIV é comparada, nos dias
atuais, à própria sentença de morte, causando descaso por parte da sociedade e de
familiares, que, em razão do desconhecimento da doença, afastam-se e discriminam
seus portadores.
O valor da indenização deve, pois, reparar o constrangimento, a dor e o
sofrimento por ele vividos.
É, pois, razoável o valor de R$ 60.000,00 (sessenta mil reais) fixados na
sentença, não representando valor exorbitante, que não possa ser suportado pelas
rés, mormente pelas circunstâncias fáticas aqui reproduzidas.
No tocante à fixação da verba honorária, a irresignação do autor merece
prosperar em parte, tendo em vista que, na hipótese dos autos, a sua fixação deve
obediência ao disposto nas alíneas “a”, “b” e “c” do § 3º, do artigo 20, do CPC,
competindo ao juiz atentar para os critérios ali elencados, dentre eles, o grau de zelo
do profissional, a natureza e a importância da causa. Impõe-se, pois, que a verba
honorária seja fixada na razão de 10% sobre o valor da condenação.
Com essas considerações, nego provimento à apelação da União
Federal e à remessa oficial e dou provimento à apelação do autor, elevando a verba
honorária para o percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação.
Este é meu voto.
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