INFLUÊNCIA DA VARIABILIDADE TEMPORAL NO POTENCIAL FITORREMEDIADOR DA EICHHORNIA CRASSIPES EM AMBIENTES NATURAIS M. Y. F. CÂMARA1, L. E. S. PINTO1, F. B. A. de FREITAS1, F. G. H. S. PINTO2, A. G. D. SANTOS2 e D. F. F. MARTINS1 1 2 Universidade Federal Rural do Semi-árido, Câmpus Caraúbas. Universidade do Estado do Rio Grande do Norte, Departamento de Química. E-mail para contato: [email protected] RESUMO – A fitorremediação vem se destacando bastante na área de recuperação ambiental por ser um processo promissor de descontaminação. Por este motivo, o presente trabalho teve como objetivo determinar o potencial fitorremediador da Eichhornia crassipes presente no rio Apodi/Mossoró em relação aos teores de alguns elementos utilizando a técnica de Fluorescência de Raio-x, e ainda verificar a influência da variabilidade temporal nos resultados obtidos. Foram realizadas duas coletas, nos meses de junho e julho, contendo amostras de água da bacia hidrográfica do Rio Apodi/Mossoró e de macrófitas aquáticas, no trecho do rio que corta a cidade de Mossoró. A partir dos resultados obtidos, apenas para os elementos como Br, Ca, Fe, K, Mn, Rb, S, Si, Sn, Cl, P, Ti, Zn e Cu foram calculados o fator de translocação e biacumulação. Assim, com base nos fatores de translocação e bioacumulação a espécie estudada apresentou um grande potencial para ser utilizada como agente fitorremediador em ambientes eutrofizados de todos os elementos quantificados, em função das concentrações acumuladas no seu tecido, o qual são influenciados significativamente pela temporalidade. 1. INTRODUÇÃO A crescente poluição do solo e de águas superficiais e subterrâneas, provocado por meio de resíduos sólidos urbanos, passou a ser motivo de diversos estudos em todo o mundo, principalmente nos países mais industrializados, dado ao reconhecido potencial poluidor e o grande volume gerado diariamente (SOUSA; ROESER; MATOS, 2002). Com essa problemática, faz-se necessário utilizar de técnicas para descontaminação destes ambientes, as quais precisam aliar eficiência, simplicidade nas manutenções, menor tempo demandado e um baixo custo. Assim, surge o interesse pela biorremediação, caracterizada como uma técnica que tem por objetivo descontaminar o solo e a água por meio da utilização de organismos vivos, como microrganismos e plantas (PIRES et al., 2003). Dentro da biorremediação, a fitorremediação é uma das técnicas mais estudadas que se tornou alvo de diversas pesquisas de interesse público e científico (BADR; FAWZY; AL-QAHTANI, 2012). Segundo Tavares (2009) a fitorremediação se refere ao uso de plantas na descontaminação de ambientes poluídos, principalmente com metais pesados e poluentes orgânicos, reduzindo os teores desses elementos a níveis seguros à saúde humana, além de contribuir também na melhoria das características físicas, químicas e biológicas destas áreas. Dentre algumas plantas utilizadas na fitorremediação, destaca-se a Eichhornia crassipes, pertencente à família Pontederiaceae, conhecida popularmente como aguapé. É considerada como uma planta perene, fixa ou flutuante, com caule estolonífero, curto, e com raízes numerosas, pendentes e plumosas (POTT e POTT, 2000 apud PALMA-SILVA et al., 2012). A Eichhornia crassipes apresenta até 1000 kg/há dia de produtividade (COELHO, 1994), é uma planta promissora, que tem a capacidade de fixar em seus tecidos nutrientes em quantidades superiores às suas necessidades, bem como elementos químicos estranhos ao seu metabolismo (DENÍCULI et al., 2000). Neste contexto, o presente trabalho teve como objetivo determinar o potencial fitorremediador de macrófitas aquáticas da espécie Eichhornia crassipes presentes no rio Apodi/Mossoró em relação aos teores de alguns elementos utilizando a técnica de Fluorescência de Raio-X e também verificar a influência da variabilidade temporal nos resultados obtidos. 2. METODOLOGIA Os métodos de análises utilizados seguiram a recomendação da metodologia descrita do Manual de análise química de solos, plantas e fertilizantes da EMBRAPA (1999) e Standard Methods of APHA (2006), os quais são descritos a seguir. Foram realizadas duas coletas, durante os meses de junho e julho do ano de 2015, em um ponto localizado no trecho do Rio Apodi/Mossoró que corta a cidade de Mossoró - RN. Foram coletadas água e macrófitas aquáticas da espécie Eichhornia crassipes. As amostras de água foram coletadas, devidamente etiquetadas, colocadas em uma caixa de isopor e conduzidas para o laboratório para posterior análise. As plantas aquáticas foram coletadas aletoriamente, independente da idade ou tamanho e foram armazenadas em sacos plásticos e conduzidas para o laboratório da UFERSA para a limpeza e o tratamento prévio. Para as amostras de macrófitas aquáticas, fez-se uma separação entre as folhas (limbo + pecíolo) e a raízes, lavadas com água da torneira e enxaguadas com água deionizada. Após este processo, elas foram colocadas em bandejas separadas e levadas para a estufa com circulação forçada de ar a 70ºC para o processo de desidratação até atingirem peso constante. Depois de secas, foram trituradas separadamente, usando um liquidificador com lâminas de aço inoxidável e peneiradas para a homogeneização dos tamanhos das partículas. Em seguida foram calcinadas em uma mufla, por 3 horas à temperatura de 550ºC. Após isso, as cinzas foram armazenadas em frascos plásticos tampados, devidamente limpos e secos, e encaminhadas para a análise de metais por Fluorescência de Raio-X. Para a análise de metais na água, as mesmas foram submetidas ao processo de digestão ácida de acordo com o método 3005 A da Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos (USEPA). Depois de feita a digestão, o digerido foi filtrado e diluído com água deionizada, a um volume conhecido para posterior análise. Preparado 100 mL da solução, a mesma foi levada à estufa, à 105ºC, para a secagem completa da água e obtenção dos sais sólidos. Estes, por sua vez, foram encaminhados para a análise de metais por Fluorescência de Raio-X. Para todas as amostras foram utilizadas um sistema em duplicata, tanto para a água quanto para as plantas aquáticas. Os fatores de Translocação e Bioacumulação foram calculados através das Equações 01 e 02 descritas a seguir. FT=CF/CR (01) Onde: FT= Fator de translocação; CF= Concentração dos elementos nas folhas; CR= Concentração dos elementos nas raízes. FB=CT/CA (02) Onde: FB= Fator de bioacumulação; CT= Concentração total dos elementos nas plantas (folhas+ raízes); CA= Concentração dos elementos na água. 3. RESULTADOS A partir da análise feita pela técnica de Fluorescência de Raio-X (FRX), nas amostras de água, folha e raiz, foram quantificados cerca de 27 elementos que estão dispostos na Tabela 1. Diversos fatores podem ter colaborado para esses resultados, como ações antropogênicas, geologia local, estações climáticas e variáveis ambientais da água. De acordo com os resultados obtidos para a água nos dois meses considerados, é possível constatar que todos os elementos quantificados no mês de junho foram também quantificados no mês de julho, com exceção dos elementos Zn e Cu que foram quantificados somente neste último. É possível observar ainda que, de forma geral, houve uma variação nos valores determinados, mostrando que há uma influência sazonal em cada um dos parâmetros medidos. Isso ocorre, especialmente, em função da dinamicidade na composição de ambientes naturais influenciados por questões climáticas e antropogênicas características da região (MARTINS et al., 2011). Observando os resultados obtidos para as folhas e raízes da Eichhornia crassipes, é possível dividir todos os elementos quantificados em 4 grupos – macronutrientes, micronutrientes, elementos benéficos e elementos tóxicos. Tabela 1 – Concentrações dos elementos pela técnica de FRX CONCENTRAÇÕES DOS ELEMENTOS FB Br Água do Rio Junho Julho (%) (%) 0,392 0,674 Folha Junho Julho (%) (%) 0,058 0,050 Raiz Junho Julho (%) (%) 0,294 0,056 Junho (%) 0,196 Julho (%) 0,901 Junho (%) 0,897 Julho (%) 0,157 Ca 66,927 66,518 31,407 26,202 23,924 21,091 1,313 1,242 0,827 0,711 Fe 1,369 5,023 0,138 0,123 b 7,691 6,674 0,018 0,018 5,719 1,353 K 9,628 8,623 30,904 35,368 11,991 16,223 2,577 2,180 4,455 5,983 Mn 0,219 0,336 0,499 0,487 12,925 17,969 0,039 0,027 61,297 55,010 Rb 0,043 0,056 0,023 0,023 0,019 0,026 1,216 0,902 0,953 0,874 S 13,107 9,347 0,694 0,703 5,329 5,350 0,130 0,131 0,459 0,648 Si 7,054 7,086 1,125 0,880 16,244 10,170 0,069 0,087 2,462 1,560 Sr 1,080 1,560 0,132 0,118 0,040 0,059 b 3,300 2,000 0,159 0,113 Cl 0,000 0,000 29,980 30,566 11,572 14,832 2,591 2,061 - - P 0,000 0,000 4,741 5,394 4,717 4,236 1,005 1,274 - - Ti 0,000 0,000 0,016 0,018 0,451 0,196 0,034 0,090 - - Zn 0,000 0,328 0,010 0,020 0,038 0,017 0,267 1,212 - 0,111 Al 0,000 0,000 0,000 0,000 4,911 2,618 0,000 0,000 - - Cu 0,000 0,320 0,033 0,015 0,000 0,000 0,033 - - 0,047 V 0,000 0,000 0,000 0,000 0,069 0,000 0,000 - - - Y 0,000 0,000 0,000 0,000 0,001 0,001 0,000 0,000 - - Zr 0,000 0,000 0,000 0,000 0,003 0,002 0,000 0,000 - - As 0,000 0,000 0,000 0,000 0,003 0,000 0,000 - - - Cr 0,000 0,000 0,000 0,000 0,008 0,009 0,000 0,000 - - Eu 0,000 0,000 0,000 0,000 0,212 0,000 0,000 - - - Ni 0,000 0,000 0,000 0,000 0,002 0,000 0,000 - - - Pd 0,000 0,000 0,000 0,000 0,005 0,000 0,000 - - - Ba 0,000 0,000 0,000 0,000 0,000 0,476 - 0,000 - - Ag 0,000 0,133 0,000 0,000 0,000 0,000 - - - 0,000 Nd 0,000 0,000 0,000 0,036 0,000 0,000 - - - - Lu 0,000 0,000 0,000 0,000 0,000 0,000 - - - - Analito FT A Figura 1 apresenta os macronutrientes presentes nas amostras de folhas e raízes da macrófitas em estudo. É possível observar que os elementos Ca, K e P apresentaram maiores concentrações nas folhas. Este comportamento é totalmente explicado em função da essencialidade dos mesmos para o desenvolvimento das plantas (MARTINS et al., 2011). Dentre os macronutrientes, somente o enxofre não apresentou uma concentração mais alta nas folhas. Esse elemento (S) constitui uma fonte significativa de poluição atmosférica biogênica e antrópica e, consequentemente, podem ser culpados por danos ambientais, incluindo participação na deposição ácida (CRUZ e CAMPOS, 2008). O elemento de maior concentração nas raízes foi o Ca. Isso explica-se devido ao fato desse elemento também se apresentar em grande quantidade na água do rio. O alto percentual de Cálcio, está associado a questões geológicas e características calcárias da região. Resultados semelhante foi encontrado também na literatura por Martins et al. (2008a; 2008b) no leito do rio, na mesma localidade. Figura 1 – Concentrações dos macronutrientes no tecido vegetal da E. crassipes. Os micronutrientes estão dispostos nas Figuras 2 e 3. O elemento que apresentou uma maior concentração nas folhas durante os dois meses foi o Cl, onde esse elemento não foi quantificado na água do rio, juntamente com o Ni, o que mostra a capacidade de bioacumulação da planta. Já os elementos como Mn, Fe, Zn, apresentaram em maiores quantidades nas raízes, fato totalmente explicado em função da essencialidade dos mesmos ao desenvolvimento da planta e, ainda, em função das quantidades encontradas na água. Observa-se também que o cobre foi quantificado somente nas folhas e o níquel, nas raízes, comportamentos explicados em função da quantidade dos mesmos no ambiente de cultivo das plantas e da própria necessidade dos elementos para o desenvolvimento das mesmas. Figura 2 e 3 – Concentrações dos micronutrientes no tecido vegetal da E. crassipes. Na Figura 4 foram evidenciados os elementos classificados como benéficos, dentre eles, temos o Si e Al. O Silício apresentou em maior quantidade nos dois meses, em relação ao Alumínio. Este elemento também apresentou uma quantidade significativa na água do rio. Segundo Lazzerini e Bonotto (2014), as águas superficiais e as de aquíferos rasos possuem concentrações e teor de silício influenciado pela temperatura atmosférica, presença de CO2, sílica livre nos solos, salinidade, matéria orgânica, tempo de contato e distância percorrida, a que se explica esse teor. O alumínio não apresentou teor na água durante o período de coleta, mas nas raízes teve uma quantidade significativa, esse valor já era esperado, pois esse elemento é o cátion mais abundante na crosta terrestre, com participação na estrutura de vários minerais primários (FAQUIN, 2005). Destaca-se ainda, que as maiores concentrações destes elementos se encontram nas raízes, em função da pequena necessidade para o desenvolvimento das plantas. Desta forma, o processo de translocação das raízes para as folhas é dificultado. Figura 4 – Concentrações dos elementos benéficos no tecido vegetal da E. crassipes. Nas Figuras 5, 6 e 7 são apresentados os valores das concentrações dos elementos tóxicos. Que são caracterizados os que não se enquadram como um nutriente ou elemento benéfico, e mesmo em concentrações baixas no meio, podem proporcionar um alto potencial maléfico, acumulando-se na cadeia trófica e diminuindo o crescimento podendo levar à morte do vegetal (FREITAS et al., 2006). Elementos como o Br, Rb, Sr, e Ti apresentaram valores nas folhas e raízes nos dois meses de coleta, já os outros, apresentaram valores ou somente nas raízes, ou somente nas folhas. Observa-se também que todos os elementos quantificados foram com concentrações baixas, sendo menores que 1%. Com relação aos fatores de translocação e bioacumulação, quando esses parâmetros apresentam valores maiores que 1, há uma indicação da elevada taxa de absorção do elemento, no caso do fator de bioacumulação, e sua preferência em se acumular na parte aérea, quando se trata do fator de translocação. Os elementos como Br, Fe, Mn, S, Si, Ti, Zn, Al, Cu, V, Y, Zr, As, Cr, Eu, Ni, Pd apresentaram os valores do fator de translocação abaixo de 1. Para o enxofre, um macronutriente, esperava-se que apresentasse um comportamento diferente, ou seja, apresentasse em maior quantidade nas folhas, no entanto, pode ser explicado devido ao processo metabólico das plantas. Com relação ao fator de bioacumulação, percebe-se que os elementos como Si, Fe, K, Mn, apresentaram valores maiores que a unidade. Assim, pode-se afirmar que a planta apresenta facilidade em bioacumular esses elementos em seu tecido vegetal. Deve-se destacar ainda que, embora o manganês seja um micronutriente, a Eichhornia crassipes apresentou um elevado fator de bioacumulação no seu tecido vegetal. Torna-se bastante evidente ainda a influência temporal nos fatores de translocação e bioacumulação calculados. Em um espaço temporal de 1 mês, é possível constatar mudanças significativas nos valores calculados. Fatores como a ação antropogênica e a dinamicidade natural na composição de ambientes aquáticos, provavelmente, exerceram influência significativa no comportamento apresentado. Figura 5, 6 e 7 – Concentrações dos elementos tóxicos no tecido vegetal da E. crassipes. 4. CONCLUSÃO Desta forma, pode-se concluir que a Eichhornia crassipes apresentou altas concentrações de elementos em sua biomassa quando coletada em ambiente natural. Em geral, os macronutrientes se apresentaram em maiores concentrações nas folhas, enquanto os micronutrientes apresentaram-se em quantidades maiores nas raízes, um comportamento já esperado em função da essencialidade dos mesmos ao desenvolvimento das plantas. Assim, com base nos fatores de translocação e bioacumulação a espécie estudada apresentou um grande potencial para ser utilizada como agente fitorremediador em ambientes eutrofizados de todos os elementos quantificados, em função das concentrações acumuladas no seu tecido, o qual são influenciados significativamente pela temporalidade. 5. REFERÊNCIAS ARAÚJO, J. B. S.; PINTO FILHO, J. L. de O. Identificação de fontes poluidoras de metais pesados nos solos da Bacia Hidrográfica do Rio Apodi/Mossoró/RN, na área urbana de Mossoró-RN. Revista Verde, Mossoró, v.5, n. 2, p. 80-94, 2010. BADR, N.; FAWZY, M.; AL-QAHTANI, K. M. Phytoremediation: An Ecological Solution to Heavy-Metal-Polluted Soil and Evaluation of Plant Removal Ability. 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