“Trabalhar junto”.

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Steinbruch, Benjamin. “Trabalhar junto”. São Paulo: Folha de São Paulo, 21 de agosto de 2001. Jel: E,
I
Trabalhar junto
Benjamin Steinbruch
Confirmou-se na semana passada, com novos números, a triste percepção de que a economia caminha
muito mal. A forte desaceleração da produção industrial fez com que o Produto Interno Bruto caísse
quase 1% no segundo trimestre em relação ao anterior. Foi a primeira queda do PIB desde 1998.
É interessante colocar isso em números nominais. Significa que a produção brasileira de bens e serviços
diminuiu cerca de R$ 11 bilhões no trimestre. Não é difícil imaginar o que significa isso em termos de
consumo, empregos e bem-estar para os brasileiros.
Nem era preciso esperar os números do IBGE para saber o que se passa com a economia. Quem trabalha
no setor produtivo sente tudo na pele. A inadimplência está altíssima, a produção entrou em férias e as
vendas praticamente não existem. Se isso não é sinal de que a recessão já bate às nossas portas, então o
que é?
Nesse cenário, ao olhar para as empresas, o que se vê?
Vêem-se prejuízos por toda a parte nos balanços semestrais. Só escaparam dos maus resultados as
instituições financeiras, beneficiadas pela desvalorização do real em relação ao dólar, o mesmo efeito que
castigou as indústrias e o setor de serviços.
Vêem-se cancelamentos de investimentos programados no início do exercício. Pesquisa da Simonsen e
Associados indica que pelo menos US$ 5 bilhões anteriormente anunciados já foram postergados. A crise
de energia acabou exigindo das empresas pesados investimentos para garantir geração própria e que,
passada a crise, se tornarão inúteis. Esse desvio de recursos antes programados para a ampliação do
parque produtivo certamente vai comprometer o crescimento futuro da economia.
A estabilidade conseguida com o Plano Real foi uma grande vitória. Ninguém discute isso, mas e daí?
Vamos continuar conformados com o clima de recessão, sem perspectivas de aumento de emprego? Ou
vamos acordar para uma nova realidade, que é a da estabilização com crescimento?
É perfeitamente possível impor essa nova realidade. O professor Delfim Netto, em artigo na Folha, na
semana passada, descreveu a privilegiada situação do Estado de Mato Grosso. Lá, em parceria com o
setor privado, o governo estadual reduziu o ICMS em 75%, desde que os empresários da pecuária e da
agricultura se comprometessem a cuidar da qualidade da produção, do aumento do emprego e da
conservação de recursos naturais. O resultado foi um espetacular crescimento da produção e
produtividade de soja, algodão e carnes. O Estado não perdeu receitas com isso. Ao contrário, alcançou o
equilíbrio nas suas contas.
Mato Grosso é um bom modelo, por ser corajoso. O liberalismo à brasileira, que tem ojeriza a
empreendedores, não vai nos levar a lugar nenhum. O governo e os brasileiros têm de se orgulhar dos
empreendedores e trabalhar com eles. Deles depende o aumento da produção em todos os setores, a
geração de empregos e o equilíbrio na balança comercial.
No momento em que a recessão bate à porta, deveríamos ter pressa em trabalhar todos juntos: governo,
empreendedores e trabalhadores. Sem medo de criar incentivos para setores que possam estimular
exportações e trazer dólares para o país. Sem medo de tocar a reforma tributária e reduzir impostos para
melhorar a competitividade interna e externa da produção, criar empregos e atenuar as desigualdades
sociais.
Na semana passada, finalmente, o presidente da República falou em medidas para a "retomada rápida" do
crescimento e sugeriu ao Banco Central uma "sintonia fina" na taxa de juros. Bom sinal. O trabalho é
difícil e requer planejamento e perseverança. Ninguém fará isso por nós. Nem o Banco Mundial, nem o
FMI, nem a comunidade financeira internacional. Terá de ser "made in Brazil".
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