Texto 2 - Os sofistas: da filosofia da natureza à filosofia moral “Meu ofício – dizia o epitáfio de Trasímaco –é a sophia” “Eu [ Protágoras] afirmo, sim, que a verdade é exatamente como eu escrevi; que cada um de nós é medida das coisas que são e que não são: mas há uma diferença infinita entre homem e homem e, justamente por isso, as coisas aparecem e são para um de um modo, para outro de outro. E estou longe de negar que existam a sapiência e o homem sábio, mas, antes, chamo sábio aquele que, transformando aquilo pelo que em nós certas coisas aparecem e são más, consiga fazer que estas mesmas coisas apareçam e sejam boas....Recorda o que já dissemos antes, que ao enfermo os alimentos parecem e são amargos, ao sadio, ao contrário, são e parecem agradáveis. Mas daí não é lícito inferir que destes dois, um seja mais sábio do que o outro - pois isso não é possível -, e nem se deve dizer que o enfermo, porque tem tal opinião, é ignorante, e é sábio o sadio porque tem opinião contrária; antes é preciso mudar um estado no outro, porque o estado de saúde é melhor. E assim também na educação, é preciso transformar o homem de hábitos piores em homem de hábitos melhores”( Platão, Teeteto, 166) “E não quer dizer com isso que, tal como as coisas individuais me aparecem, tais são para mim, e tais a ti, tais para ti, porque és homem como eu sou homem?... mas não acontece às vezes que, soprando o mesmo vento, um de nós sente frio e o outro não? e um sente pouquíssimo, e o outro muito?... E então, como chamaremos este vento: frio ou não-frio? Ou deveremos acreditar em Protágoras, que para quem sente frio é frio, para quem não sente, não é?”(Platão, Teeteto,l51-2) “Uma dupla ordem de raciocínios se faz na Grécia, pelos cultores da filosofia, em torno ao bem e ao mal. Alguns sustentam que o bem é uma coisa, o mal, outra; outros, ao contrário, que são a mesma coisa; o que para alguns seria bem, para outros é mal; e para o mesmo indivíduo, seria ora bem, ora mal. Quanto a mim, eu me aproximo destes homens; e buscarei as provas na vida humana...Creio que se pedíssemos a todos os homens que reunissem em um montão as coisas que cada um deles julgar feias,e, depois, que tomassem desse montão as coisas que cada um julgar belo, não ficaria nenhuma , mas entre todas tirariam todas. E assim não defino o que é o bem, mas empenho-me em ensinar isto, que o bem e o mal não são a mesma coisa, mas que cada um dos dois pode ser um ou outro” (Raciocínios duplos, I, III) “A palavra é uma grande dominadora que, com pequeníssimo e sumamente invisível corpo, realiza obras diviníssimas, pois pode fazer cessar o medo e tirar as dores, infundir a alegria e inspirar a 1 piedade... O discurso, persuadindo a alma, obriga-a, convencida, a ter fé nas palavras e a consentir nos fatos... A persuasão, unida à palavra, impressiona a alma como quer... O poder do discurso com respeito à disposição da alma é idêntico ao dos remédios em relação à natureza do corpo. Com efeito, assim como os diferentes remédios expelem do corpo de cada um diferentes humores, e alguns fazem cessar o mal, outros a vida, assim também entre os discursos alguns afligem e outros deleitam, outros espantam, outros excitam até o ardor os seus ouvintes, outros envenenam e fascinam a alma com persuasões malvadas”(Górgias, Elogio de Helena,8,l2-4) Fragmentos extraídos de: MONDOLFO, Rodolfo. O Pensamento Antigo. São Paulo: Mestre Jou, 1971, v.1 Leituras complementares: GÓRGIAS. Tratado do não-ente/ Elogio de Helena. Cadernos de Tradução-USP, São Paulo, n.4, p.11-19, 1999. HADOT, Pierre. Os sofistas do século V. In:____. O que é a filosofia Antiga? São Paulo: Loyola, 1999. KERFERD, G. B. O movimento sofista. São Paulo: Loyola, 2003. REALE, Giovanni. História da Filosofia Antiga. São Paulo: Loyola, 1993. p.177-241 REALE, G.; ANTISERI, D. A sofística e o deslocamento do eixo da pesquisa filosófica do cosmo para o homem. In: ____. História da Filosofia. Filosofia Pagã e Antiga. São Paulo: Paulus, 2003, cap.3, p.74-90. ROBINET, Jean-François. Sócrates e os Sofistas. In: ____. O tempo do pensamento. São Paulo: Paulus, 2004. 2