O documento da CNBB A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil lançou sua nova campanha da fraternidade. A desse ano é sobre o desemprego. O título é “sem trabalho...por que?” É um tema candente. Não só aqui, em qualquer parte do mundo. O desemprego é de fato um problema, talvez o maior de todos na atualidade. Num país já em recessão, com economia em queda, globalizando-se, enfrentando a automação de diversos setores não é fácil gerar empregos. É claro que se deve falar, botar o dedo na ferida, mas é preciso também apresentar alternativas viáveis, meios concretos na busca de novos empregos. A CNBB apresenta alguns. Uns possíveis e outros nem tanto. A redução da jornada de trabalho e de horas extras é um que poderia emplacar. Mas não aceita outros. Ela é contra, por exemplo, a flexibilização da legislação trabalhista. Seria mais interessante deixar para os trabalhadores decidirem. Pode ser uma alternativa em momentos de crises agudas. O documento da CNBB (me baseio numa matéria da Folha de S.Paulo) mostra que no Brasil o setor financeiro foi o mais afetado pelo desemprego, que 147.233 postos de trabalho foram perdidos. É verdade. Mas como competir com o computador? Antes tinha-se um monte de bancários para fazer um certo serviço. Hoje é feito por uma máquina e com muito mais eficiência. Como recuperar esses empregos? Diz também que o setor industrial perdeu 16% dos trabalhadores e que a indústria automobilística poderá reduzir seus empregos em mais 30% até o ano 2000. Fruto, sabemos, da automação nesses setores. O documento também diz que “a produtividade aumentou em média 10,2%”. Ou, em outras palavras, menos gente e mais produtividade. O que vai preferir o capitalista? A CNBB sugere o aumento da cota de importação de 150 dólares para 500 dólares para ajudar os sacoleiros. É um equívoco. Gera emprego para uns, mas outros perdem pela competição do importado do Paraguai. E não é só isso. A longo prazo no Mercosul deve desaparecer esse tipo de atividade. Seria prejudicial ao Paraguai. Ele nunca se industrializaria. E quando chegar a tarifa externa comum para todos do Mercosul aquele tipo de comércio não fará mais sentido. Alguém da CNBB disse que o ajuste fiscal “é inaceitável”. Não sei não. Se não houver equilíbrio nas contas do governo a vaca toda vai para o brejo e quem mais vai sofrer é o pobre que é, no fundo, o objetivo da defesa da Igreja Católica. Ao mesmo tempo que alguém argüi contra o ajuste fiscal 2 o documento propõe que “deve haver equilíbrio fiscal entre receita e despesa”. Não entendi direito as duas posições. O documento não é explicitamente a favor de Itamar Franco mas defende o ponto de vista do ex-presidente de que não se pode pagar dívida sem cuidar de outras atividades de Estado. Não quero crer que ela pregue o calote e o confronto. A Igreja deve saber que uma crise política e federativa atrapalharia ainda mais a economia. O pobre sofrerá mais, é a conclusão. Propõe a taxação de grandes fortunas. É uma boa idéia. Mas antes isso já foi proposto no Congresso e não foi em frente. Alega-se que a arrecadação seria baixa e a nova taxação poderia estimular evasão de divisas. É a favor de que se taxe em 0,25% o capital especulativo. É interessante mas não depende só do Brasil. Tem que convencer o G-7. Gostaria de ver, talvez já no próximo ano porque agora é que é o momento, uma campanha da CNBB para o controle dos gastos públicos, base de praticamente todos os males do país. Com um título tipo “acerto das contas públicas...por que não?” A Igreja está no Brasil por 500 anos. Conhece a nossa história. Sabe que sempre que precisamos enfrentar esse mal, recuamos. A Igreja poderia é propor uma espécie de colchão social, de ajuda aos mais pobres durante o enfrentamento desse mal maior. E não teremos crescimento sustentado, sem sobressaltos, sem crises repetitivas, se não enfrentarmos de uma vez por todas o descalabro das contas públicas nos três níveis. Se formos buscar as raízes de outras crises a maioria tem como base o absurdo das contas do setor público. Enfim, o documento da CNBB mostra-se contra as regras do liberalismo econômico, não caminha pelo centro, é mais pela esquerda(seja lá o que isso signifique hoje). Alfredo da Mota Menezes escreve às terças feiras para A Gazeta. Email: [email protected] Setembro de 1998