CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO 1 FONE: ( 011 ) 3017-9300 - FAX: (011) 3231-1745 http : / / www . cremesp . org . br Rua da Consolação, 753 - Centro 01301-910 São Paulo - SP CONSULTA Nº 107.779/16 Assunto: Realização de parto cesárea a pedido da parturiente, sem indicações clínicas ou obstétricas para tal. Deve o plantonista fazê-lo? Relatores: Conselheiro Krikor Boyaciyan e Dr. Temístocles Pie de Lima, Membro da Câmara Técnica de Ginecologia e Obstetrícia. Ementa: Levando-se em conta o princípio de autonomia do profissional médico, devidamente explicitada nos incisos VII e VIII do Capítulo I do Código de Ética Médica (Resolução CFM 1.931/09), não há que se falar em obrigatoriedade, quando da solicitação para que seja realizado um parto abdominal, frente à inexistência de elementos técnicos que assim o exijam. Tal afirmação não perde seu valor, mesmo com a edição da Resolução CFM 2.144/16, tendo em vista que, em seu Art. 2º, ela permite a adoção dessa conduta “a partir da 39ª semana de gestação” e, por conseguinte, abre espaço para que o procedimento seja realizado dentro de um prazo de vários dias. No entanto, caso já existam sinais e sintomas inequívocos de trabalho de parto ou de que o prolongamento da prenhez possa trazer riscos ao binômio materno-fetal, acreditamos que o profissional não poderá mais eximir-se da responsabilidade estabelecida naquela norma. O consulente Dr. M.T.I., questiona o CREMESP quanto à responsabilidade de um médico obstetra, atuando em pronto socorro conveniado ao Sistema Único de Saúde (SUS), de interromper através de um parto cesáreo, uma gestação com idade superior a 39 semanas, tendo como indicação única a demanda da própria gestante. PARECER A análise das razões e dos artigos que compõem a Resolução CFM 2.144/16, permite identificar alguns pontos que, a nosso ver, são CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO 2 FONE: ( 011 ) 3017-9300 - FAX: (011) 3231-1745 http : / / www . cremesp . org . br Rua da Consolação, 753 - Centro 01301-910 São Paulo - SP fundamentais para que possamos responder à presente Consulta. O primeiro deles, expresso no Art. 1º daquela norma, é o reconhecimento de que, todas as gestantes, mesmo que por razões nem sempre claras e após devidamente informadas quanto aos riscos dessa opção, têm o direito de optar por um parto abdominal, mesmo quando não houver indicação de natureza técnica para esta conduta. Nesse sentido, coube aos legisladores proteger os direitos do recém-nascido quando, no Art. 2º da mesma Resolução, eles estabeleceram a idade gestacional mínima, a partir da qual é possível praticamente neutralizar qualquer risco de imaturidade. Já o segundo ponto é a questão da autonomia do profissional médico que, tal como evidenciado nos incisos VII e VIII do Capítulo I do Código de Ética Médica, bem como nos Arts. 31 e 33 do Capítulo V do mesmo diploma ético, pode recusar-se a prestar serviços que contrariem os ditames de sua consciência, executando-se aí as situações de urgência e emergência. Sendo assim, respondendo à questão inicial, acreditamos que, mesmo na ausência de outro profissional que possa ser acionado para atender à demanda oferecida pela gestante, o médico plantonista poderá recusar-se a atendê-la, após excluir eventuais indicações de natureza técnica. Todavia, em se tratando não mais de uma gestante, mas sim de uma parturiente, é nosso parecer que estará configurada a natureza, no mínimo urgencial desse atendimento, fato que exigirá do obstetra o cumprimento da solicitação sobre a via de parto. Mais ainda, acreditamos que essa mesma obrigação será aplicável nos casos em que, apesar de não existirem elementos mínimos para configurar um trabalho de parto, existam circunstâncias que favoreçam a ultimação da gravidez, tal como a ruptura precoce de membranas. Por fim, não acreditamos que a origem da paciente seja capaz de alterar as propostas acima descritas. Desse modo, quando a paciente estiver hospitalizada, tal como aventado pelo consulente em seu segundo questionamento, a conduta da equipe médica deverá respeitar os mesmos princípios já colocados. RESOLUÇÃO CFM Nº 2.144, DE 17 DE MARÇO DE 2016: Diário Oficial da União; Poder Executivo, Brasília, DF, 22 jun. 2016. Seção I, p.138 É ético o médico atender à vontade da gestante de realizar parto cesariano, garantida a autonomia do médico, da paciente e a segurança do binômio materno fetal. O CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA, no uso das atribuições conferidas pela Lei nº 3.268, de 30 de setembro de 1957, alterada pela Lei nº 11.000, de 15 de dezembro de 2004, regulamentada pelo Decreto nº 44.045, de 19 de julho de 1958, embasado no exposto acima: CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO 3 FONE: ( 011 ) 3017-9300 - FAX: (011) 3231-1745 http : / / www . cremesp . org . br Rua da Consolação, 753 - Centro 01301-910 São Paulo - SP CONSIDERANDO que o alvo de toda a atenção do médico é a saúde do ser humano, em benefício da qual deverá agir com o máximo de zelo e o melhor de sua capacidade profissional; CONSIDERANDO que no processo de tomada de decisões profissionais, de acordo com os ditames da sua consciência e as previsões legais, o médico deve aceitar as escolhas de seus pacientes relativas aos procedimentos diagnósticos e terapêuticos por eles expressos, desde que adequadas ao caso e cientificamente reconhecidas; CONSIDERANDO que o médico pode alegar autonomia profissional e se recusar a praticar atos médicos com os quais não concorda, ressalvados os casos de risco de morte do paciente, devendo sempre que possível encaminhá-lo para outro colega. CONSIDERANDO que é vedado ao médico deixar de informar ao paciente o diagnóstico, o prognóstico, os riscos e os objetivos do tratamento, salvo quando a comunicação direta possa lhe provocar dano, devendo, nesse caso, fazer a comunicação a seu representante legal (Art. 34 do CEM); CONSIDERANDO que é vedado ao médico deixar de obter consentimento do paciente ou de seu representante legal após esclarecê-lo sobre o procedimento a ser realizado, salvo em caso de risco iminente de morte (Art. 22 do CEM); CONSIDERANDO, finalmente, o decidido na sessão plenária do Conselho Federal de Medicina realizada em 17 de março de 2016, resolve: Art. 1º É direito da gestante, nas situações eletivas, optar pela realização de cesariana, garantida por sua autonomia, desde que tenha recebido todas as informações de forma pormenorizada sobre o parto vaginal e cesariana, seus respectivos benefícios e riscos. Parágrafo único. A decisão deve ser registrada em termo de consentimento livre e esclarecido, elaborado em linguagem de fácil compreensão, respeitando as características socioculturais da gestante. Art. 2º Para garantir a segurança do feto, a cesariana a pedido da gestante, nas situações de risco habitual, somente poderá ser realizada a partir da 39ª semana de gestação, devendo haver o registro em prontuário. CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO 4 FONE: ( 011 ) 3017-9300 - FAX: (011) 3231-1745 http : / / www . cremesp . org . br Rua da Consolação, 753 - Centro 01301-910 São Paulo - SP Art. 3º É ético o médico realizar a cesariana a pedido, e se houver discordância entre a decisão médica e a vontade da gestante, o médico poderá alegar o seu direito de autonomia profissional e, nesses casos, referenciar a gestante a outro profissional. Art. 4º Esta resolução entra em vigor na data da sua publicação. CARLOS VITAL TAVARES CORRÊA LIMA Presidente do Conselho HENRIQUE BATISTA E SILVA Secretário-Geral CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA: CAPÍTULO I PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS VII – O médico exercerá sua profissão com autonomia, não sendo obrigado a prestar serviços que contrariem os ditames de sua consciência ou a quem não deseje, excetuadas as situações de ausência de outro médico, em caso de urgência ou emergência, ou quando sua recusa possa trazer danos à saúde do paciente. VIII – O médico não pode, em nenhuma circunstância ou sob nenhum pretexto, renunciar à sua liberdade profissional, nem permitir quaisquer restrições ou imposições que possam prejudicar a eficiência e a correção de seu trabalho. CAPÍTULO V RELAÇÃO COM PACIENTES E FAMILIARES É vedado ao médico: Art. 31. Desrespeitar o direito do paciente ou de seu representante legal de decidir livremente sobre a execução de práticas diagnósticas ou terapêuticas, salvo em caso de iminente risco de morte. CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO 5 FONE: ( 011 ) 3017-9300 - FAX: (011) 3231-1745 http : / / www . cremesp . org . br Rua da Consolação, 753 - Centro 01301-910 São Paulo - SP Art. 33. Deixar de atender paciente que procure seus cuidados profissionais em casos de urgência ou emergência, quando não haja outro médico ou serviço médico em condições de fazê-lo. Este é o nosso parecer, s.m.j. Conselheiro Krikor Boyaciyan APROVADO NA REUNIÃO DA CÂMARA TÉCNICA DE GINECOLOGIA E OBSTETRÍCIA, REALIZADA EM 15.09.2016. APROVADO NA REUNIÃO DA CÂMARA DE CONSULTAS, REALIZADA EM 14.10.2016. PEDIDO DE “VISTA” PELO CONSELHEIRO RENATO AZEVEDO JÚNIOR NA 4.747ª REUNIÃO PLENÁRIA REALIZADA EM 14.10.2016 HOMOLOGADO NA 4.754ª REUNIÃO PLENÁRIA, REALIZADA EM 06.12.2016.