AULA DE FILOSOFIA JURIDICA 1 BIMESTRE

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FILOSOFIA JURÍDICA
REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
ROCHA, José Manuel de Sacadura. Fundamentos de filosofia do direito: da
Antiguidade a nossos dias/ José Manuel de Sacadura Rocha. – São Paulo:
Atlas. 2007.
BITTAR, Eduardo Carlos Bianca. Curso de Filosofia do Direito/ Eduardo Carlos
Bianca Bittar, Guilherme Assis de Almeida. – 9º edição. São Paulo: Atlas, 2011.
NALINI, José Renato. Por que Filosofia/ José Renato Nalini. – 2º edição ver.
Atual. e ampl. . São Paulo: editora Revista dos Tribunais, 2010.
VADE Mecum Humanístico/ coordenação Alvaro de Azevedo Gonzaga, Nathaly
Campitelli Roque. – 2º edição. São Paulo: editora Revista dos Tribunais, 2011.
DINIZ, Maria Helena. Dicionário Jurídico Universitário. São Paulo: Editora
Saraiva, 2010.
Dicionário de Língua Portuguesa.
FILOSOFIA
Filosofia - O termo tem origem grega.
 FILO – significa “amigo”.
 SOFIA – significa “conhecimento”.
Deste modo, a filosofia significa “amizade pela sabedoria”, “amor
pelo saber”. Assim a filosofia indica um estado de espírito, da pessoa
que ama, isto é, deseja conhecimento, o estima o procura e o respeita.
A filosofia pode ser dividida em:
Lógica – pensamento.
Especulativa – olhar a realidade.
Prática – prática, ética.
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FILOSOFIA JURÍDICA
HISTÓRIA DA FILOSOFIA:
O berço da filosofia:
A filosofia tem início na civilização grega, com o esplendor do período
denominado Clássico, em Atenas, no século V a. C. Para compreendermos o
nascimento da filosofia, precisamos recompor o período anterior, no qual foram
moldados os elementos que consolidaram essa cultura.
A história da filosofia:
Podemos dividir a história da Grécia em quatro fases.
 Grécia Homérica, os 400 anos narrados pelo poeta Homero, em
seus dois grandes poemas, “Ilíada e Odisséia”.
 Grécia Arcaica, século VII ao século V antes de Cristo, quando os
gregos criaram cidades como Atenas, Esparta, Tebas, e
predomina a economia urbana, baseada no artesanato e
comércio.
 Grécia Clássica, séculos V e IV antes de Cristo, quando a
democracia se desenvolve, a vida intelectual e artística entra no
apogeu e Atenas domina a Grécia com seu império comercial e
militar.
 Helenismo, a partir do final do século IV antes de Cristo, quando a
Grécia é dominada por Alexandre da Macedônica, e, depois, pelo
Império Romano.
O pensamento mítico:
O pensamento mítico é a forma de conhecimento anterior à filosofia.
Nasce o desejo do homem de dominar o mundo e vencer o medo e a
insegurança diante das forças que ele não compreende ou não controla. É uma
crença, uma verdade intuída, ou seja, que não necessita de provas para ser
aceita.
Destacamos o que significa a filosofia para alguns importantes
pensadores:
 PLATÃO – a filosofia é um saber verdadeiro que deve ser usado em
beneficio dos seres humanos.
 DESCARTES – a filosofia é o estudo da sabedoria conhecimento
perfeito de todas as coisas que os humanos podem alcançar para o uso
da vida, a conservação da saúde e a invenção das técnicas e das artes.
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FILOSOFIA JURÍDICA
 KANT – a filosofia é o conhecimento que a razão adquire de si mesma
para saber o que pode conhecer e que pode fazer, tendo como
finalidade a felicidade humana.
 ESPINOSA – a filosofia é um cominho árduo e difícil, mas que pode ser
percorrido por todos, se desejarem a liberdade e felicidade.
 MARX – a filosofia havia passado muito tempo apenas contemplando o
mundo e que se tratava, agora de conhecê-lo, para transformação que
traria justiça, abundância e felicidade para todos.
 MERLEAU-PONTY – a filosofia é um despertar para ver e mudar nosso
mundo.
1 - ATITUDE CRÍTICA FILOSÓFICA:
a) A atitude filosófica dever ter uma postura negativa, pois o pensador deve
negar o senso comum, deve negar seus próprios pré-conceito, (pré)
juízo, enfim deve buscar a verdade sem se influenciar por tudo aquilo
que ouviu cotidianamente dado como verdade.
b) A atitude filosófica deve ter uma postura positiva no sentido de
interrogar, questionar constantemente sobre os “porquês” das coisas.
2 - A FUNÇÃO DA FILOSOFIA:
Busca despertar a reflexão que visa constantemente à verdade.
Acreditamos ser necessário existem pessoas que pensem o mundo, a fim de
adaptá-la às crescentes necessidades e mudanças que existem. A filosofia
contribui para que não flertemos com o velho constantemente, e com isso,
alcancemos o novo e possamos mudar ou melhorar as coisas.
3 - A UNIVERSALIDADE DA FILOSOFIA:
O filósofo busca, incessantemente, uma totalidade de sentidos,
integrando e situado o homem e o mundo.
Vê-se que a filosofia representa o esforço de sondagem das raízes dos
problemas. É uma ciência cujos cultores somente se consideram satisfeitos se
lhes é facultado atingir, com certeza e universalidade, todos os princípios ou
razões últimas e explicativas da realidade, em plena interpretação da
experiência humana.
4 - A IMPORTÂNCIA DA FILOSOFIA NO ESTUDO DO DIREITO:
Para o direito, a filosofia é muito importante, tanto para a formação
teórica como para a formação prática dos futuros juristas. O direito só é
possível por causa da filosofia.
Grande parte senão todos dos direitos existentes possuem raízes
filosóficas. E o direito continua sendo criado com uma forte dose filosófica,
direta ou indiretamente.
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FILOSOFIA JURÍDICA
É na filosofia do direito que encontramos o ponto de encontro reflexivo
de todas suas áreas (direito civil, direito penal, direito tributário entre outras) e
também o ponto de convergência do sistema jurídico: a busca pela justiça e
pela igualdade social.
Outrossim, a filosofia auxilia no desenvolvimento do raciocínio crítica e
na capacidade de criação de novas soluções para os problemas jurídicos.
5 - O QUE BUSCA A FILOSOFIA DO DIREITO:
 Proceder às criticas das práticas, das atitudes e atividades dos
operadores do direito e juristas;
 Avaliar e questionar a atividade legiferante, bem como oferecer suporte
reflexivo ao legislador;
 Proceder à avaliação do papel desempenhado pela ciência jurídica e o
próprio comportamento do jurista ante ela;
 Depurar a linguagem jurídica, os conceitos filosóficos e científicos do
direito, bem como analisar a estrutura lógica das preposições jurídicas;
 Investigar a eficácia dos institutos jurídicos, sua atuação social e seu
compromisso com as questões sociais;
 Desmascarar as ideologias que orientam a cultura da comunidade
jurídica, os pré-conceito que orientam as atitudes dos operadores do
direito.
6 - DISTINÇÃO ENTRE OPERADOR E FILOSOFO DO DIREITO:
Como vimos à ciência é construída a partir de pressupostos, ao passo
que a filosofia busca os pressupostos.
Entendemos que o jurista é um cientista do direito e que constrói a sua
ciência partindo de certos pressupostos, os quais, habitualmente, são
fornecidos pela lei. Por outro lado, o filósofo do direito converte tais
pressupostos em um problema, para poder encontrar uma verdade.
PARA REFLETIR:
Aqueles que não se valem da filosofia no seu
trabalho com o direito são apenas operadores do
direito, são peças facilmente substituíveis por outras;
por outro lado, os profissionais do direito que
refletem e se valem da filosofia para resolver suas
indagações jurídicas, são sem dúvida, verdadeiros
juristas,
e
jamais
serão substituídos,
pois
conseguiram um lugar exclusivo e indelével no
direito.
RESUMINDO
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FILOSOFIA JURÍDICA
É possível perceber que a filosofia
sempre busca a verdade por meio de
reflexão, que é o instrumento mais
seguro para encontrar, ou pelo menos
aproximar-se da verdade.
Filosofia: do senso comum ao senso crítico
O QUE É SENSO COMUM?
Em nossa conversa diária com as pessoas, surge uma série de opiniões
sobre os mais variados assuntos. Na maioria das vezes, essas opiniões
informais, que ouvimos ou emitimos em nossas conversas, refletem
conhecimentos vagos, superficiais ou ingênuos a respeito dos inúmeros lemas
que abordamos. Isto é, conhecimentos pouco profundos, adquiridos
ocasionalmente no cotidiano, sem uma procura séria e reflexiva por parte das
pessoas.
A título de ilustração, podemos dizer que faz parte do senso comum uma
infinidade de "frases feitas", repetidas irrefletidamente, rio cotidiano, como as
seguintes: homem que é homem não chora; o brasileiro é um povo pacífico;
querer é poder; filho de peixe, peixinho é; Deus é a única esperança etc.
Esse tipo de conhecimento mediano, compartilhado pela maioria das
pessoas, constitui o chamado senso comum. Pertence ao senso comum um
vasto conjunto de concepções a respeito dos mais diferentes temas.
Freqüentemente, essas concepções estão impregnadas de noções falsas,
parciais ou preconceituosas.
Entretanto, o senso comum não é formado, apenas, por concepções
falsas ou incorretas, mas, também, por concepções verdadeiras. O que as
caracteriza, portanto, é o fato de serem produzidas por conhecimentos soltos,
superficiais, que não nasceram de reflexões profundas e abertas.
O conhecimento do senso comum possui, habitualmente, as seguintes
características gerais:
 Imprecisão: conceitos vagos, sem rigor, que não definem
claramente seu conteúdo e seu alcance;
 Incoerência: associação, num mesmo raciocínio, de
conceitos contraditórios, que se anulam em termos lógicos;
 Fragmentação: conceitos soltos, que não abrangem, de modo
amplo e sistemático, o objeto estudado.
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FILOSOFIA JURÍDICA
O CAMPO DA FILOSOFIA NA ATUALIDADE:
Na época contemporânea, prossegue esse processo de especialização
do saber racional, pelo qual as diversas ciências particulares se desprendem
da Filosofia e delimitam, especificamente, seus objetos de investigação
científica. Assim, o antigo imenso domínio do conhecimento filosófico foi-se
restringido cada vez mais. Na antiguidade, todo o conhecimento racional
pertencia à Filosofia. Hoje, perguntamos: o que resta de característico para a
Filosofia que esteja fora do alcance das inúmeras ciências particulares?
Para dar uma resposta um tanto simplificada à questão, podemos dizer
que restam à Filosofia a busca da compreensão profunda de todos os seres, o
trabalho de reflexão sobre os conhecimentos desenvolvidos por todas as
ciências, a procura de respostas à finalidade, ao sentido e ao valor da vida e do
mundo. Assim, pertence à Filosofia o estudo geral dos seres, do nosso
conhecimento e do valor das coisas. Em termos mais específicos, podemos
situar dentro do campo filosófico aqueles estudos que se referem a temas
como: teoria do conhecimento, fundamentos do saber científico, lógica, política,
ética, estética etc.
O PAPEL EDUCACIONAL DA FILOSOFIA:
Em termos educacionais, a Filosofia tem uma urgente e grandiosa
missão a desempenhar em nossas escolas. Como parte essencial dessa
missão, está a tarefa de desenvolver no estudante o senso crítico, que implica
a superação das concepções ingênuas e superficiais sobre os homens, a
sociedade e a natureza, concepções estas forjadas pela "ideologia" social
dominante.
Para isso é necessário que o ensino da Filosofia estimule o desenvolvimento da reflexão do estudante e forneça-lhe um conjunto de informações
sobre reflexões já desenvolvidas na história do pensamento filosófico.
O resultado desse processo é a ampliação da consciência reflexiva do
estudante, voltada para dois setores fundamentais:
 A consciência de si mesmo: crítica de si próprio enquanto
pessoa e de seu papel individual e social (autocrítica);
 A consciência do mundo: compreensão do mundo natural e
social e de suas possibilidades de mudança.
“Quanto a este último aspecto, é necessário compreender claramente
que a Filosofia não deve servir, apenas, para’ ‘pensar contemplativamente o
mundo”, mas para transformá-lo.
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FILOSOFIA JURÍDICA
SÓCRATES
Retrato de Sócrates, mármore romano
(Louvre, Paris)
"A Morte de Sócrates", por JacquesLouis David (1787)
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FILOSOFIA JURÍDICA
Local onde Sócrates ficou preso
antes de morrer.
A
morte de Sócrates
1 - SÓCRATES E O NASCIMENTO DA FILOSOFIA
A história da Grécia antiga pode ser dividida em dois grandes períodos:
antes e depois de Sócrates (469 – 399 a. C.). Estamos no século V a. C., na
Grécia antiga, mais precisamente em Atenas.
Uma grande revolução está acontecendo no pensamento filosófico
grego: os Deuses estão perdendo a centralidade e o poder na compreensão da
existência humana. A centralidade do pensamento grego a partir deste
momento passará a ser o próprio homem. A filosofia passa da condição
teológica – mítica (desuses e mitos) para secular (humana e mundana) – de
teocêntrica para antropológica.
TEOCÊNTRICA – Deus é o centro do Universo.
ANTROPOCÊNTRICA – o homem é o centro do Universo.
2 - SOFISTAS E O PODER DA RETÓRICA:
O movimento sofístico aparece na Grécia no século V. São professores
ambulantes, que vão de cidade em cidade, ensinando os jovens; lecionam por
dinheiro, mediante retribuição, caso novo na Grécia e que surpreendeu
bastante. Tinham grande brilhantismo e êxito social; eram oradores e retóricos
e, fundamentalmente, pedagogos. Pretendiam saber e ensinar tudo, e
certamente qualquer coisa e seu contrário, tese e antítese. Tiveram forte
influência na vida grega e foram personagens importantes, alguns, de grande
inteligência.
Os porta – vozes desta nova mentalidade grega são os Sofistas. Eram
professores viajantes que, por determinado preço, vendiam ensinamento
prático do conhecimento. Levando em consideração os interesses dos alunos,
davam aulas de eloqüência e sagacidade mental.
Eles surgem discursando em praça pública, enaltecendo a capacidade e
a inteligência dos homens. Como tal, advogam a autossuficiência destes para
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FILOSOFIA JURÍDICA
resolverem os problemas do cotidiano existencial, até porque passam a serem
os homens os verdadeiros culpados pelos problemas que enfrentam.
As lições sofistas tinham por objetivos o desenvolvimento do poder de
argumentação retórica e do conhecimento de outras doutrinas. Segundo essas
concepções, não havia uma verdade única, absoluta, tinha apenas o ato de
convencer sua platéia que eram capazes de resolverem seus problemas
através da retórica, tornando assim egoísta e individualista.
Devido ao envolvimento com os interesses das novas classes, os
discursos sofistas vão ser repudiados pelos socráticos como sendo no mínimo
superficiais, não revelando a essência das coisas e menos ainda a essência
dos homens.
A sofística move-se num âmbito retórico. Trata-se de dizer as coisas de
modo que convençam, de dizer bem. Não importa a verdade; e por isso é uma
falsa filosofia. Diante disso, Sócrates e Platão reinvidicarão o bem pensar, ou
seja, a verdade.
Ademais, é algo público, dirigido ao cidadão; tem, portanto, uma clara
tendência política. E, por último, é uma Paidéia, uma pedagogia, a primeira a
propriamente existir.
Entre os sofistas, temos vários pensadores, como Protágoras, Leontinos,
Trasímico, Pródico, Hípias, Antifonte e Crítias.
RETÓRICA – poder de convencimento através da eloqüência, ou seja, arte de
convencer pelo uso de instrumento lingüístico.
3 – A FILOSOFIA E A DIALÉTICA SOCRÁTICA:
Sócrates é um “feroz” adversário dos sofistas. A sua antipatia, no
entanto, estava declaradamente circunscrita ao pensamento, ao conhecimento
e a ânsia de construir uma filosofia mais essencial, mais verdadeira.
Assim, para ele a essência do homem e a explicação do problema
existencial não podem ser buscadas na materialidade cotidiana, povoada que
está de interesses suspeitos e egoístas. A busca da virtude, o bem maior capaz
de resgatar a paz e a harmonia entre os homens, passa a ser vista como a luta
entre o bem e o mal, mas em um plano estritamente espiritual.
Na oposição ao discurso retórico, ao sofismo dos oradores
desvinculados da verdade, Sócrates propõe e utiliza, de forma magistral, o
discurso dialética.
4 – CONHECENDO A VERDADE (ALETHÉIA): A DIALÉTICA:
O termo grego alethéia significa a verdade ou o caminho para a verdade,
ou do esquecimento, pois lethe significa esquecimento. Sócrates acreditava
que conhecer a verdade seria retornar aos conceitos esquecidos para
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FILOSOFIA JURÍDICA
buscar a verdade. Todas as verdades estavam em nós, esquecidas. O meio
para que chegássemos à verdade absoluta.
5 – DIVISÃO DA DIALÉTICA:
A dialética divide-se em:
 Exortação – consiste no convite ao diálogo;
 Indagação – é o questionamento do tema que será dialogado;
 Refutação – que está na própria indagação consiste na exposição dos
preceitos para que possamos rebatê-los.
 Maiêutica – consiste em “parir” o conhecimento.
Exortação
DIALÉTICA
Indagação
Refutação
Maiêutica
MAIÊUTICA (parto) dentro do método dialético, Sócrates acreditava que
o conhecimento deveria ser parido, ou seja, deveria passar por um estágio de
gestação até chegar a seu nascedouro. Fazia uma analogia com a função de
sua mãe, parteira, e dizia que assim como as mulheres conseguem gerar uma
vida após um tempo de gestação, o homem pode gerar o conhecimento, a
verdade, a partir também de uma gestação. Enquanto as mulheres parem uma
vida, os homens parem uma verdade, um conhecer.
6 – A DIALÉTICA PARA O JURISTA:
O ato do jurista muito se assemelha com o sistema dialético socrático,
pois, exortamos um diálogo, normalmente, um caso concreto que se aplique ou
não a lei. Indagamos sobre o conceito de determinado instituto para sua
aplicação ou não no caso em tela e por fim nosso juízo final e apresentado,
nascendo uma idéia jurídica e uma tese que defendemos com a crença desta
ser a verdade.
7 - ÉTICA SOCRÁTICA:
O pensamento socrático é profundamente ético. Reveste-se, em todas
as suas latitudes, de preocupações ético-sociais, envolvendo-se em seu
método maiêutica todo tipo de especulação temática impossível de solução (o
que é justiça?; o que é o bem?; o que é coragem?...), o que aparece retratado
nos diálogos platônicos, sobretudo na Apologia de Sócrates (Platão), uma das
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FILOSOFIA JURÍDICA
únicas fontes de referência escrita a respeito da filosofia socrática, ao lado dos
Ditos e feitos memoráveis de Sócrates.
Isso porque a filosofia socrática possui um método, e esse método faz o
filósofo, como homem, radicar-se em meio aos homens, em meio à cidade. É
do convívio, da moralidade, dos hábitos e práticas coletivas, das atitudes do
legislador, da linguagem poética. Pode – se mesmo dizer que o modo de vida
socrático e a filosofia socrática não se separam. Pelo contrario, a filosofia
socrática reafirma-se pelo exemplo de vida de Sócrates; na mesma medida, a
doutrina ética e o ensino ético de Sócrates retiram-se de seu testemunho de
vida, corporificado que está em seus atos e palavras.
Sócrates, em verdade, pode ser dito o iniciador da filosofia moral e o
inspirador de tosa uma corrente de pensamento. O conhecimento, para
Sócrates, reside no próprio interior do homem.
Conhecendo-se a si mesmo, pode-se conhecer melhor o mundo. Isso se
adiciona o fato de Sócrates ter vislumbrado na linguagem um grande manancial
de dúvidas que gerou o fulcro da necessidade de depuração lógico-semântica
do que era exercitado em praça pública com discípulos ou terceiros, por meio
da parturição discursiva das idéias.
Assim é que, em poucas palavras, o ensinamento ético de Sócrates
reside no conhecimento e na felicidade.
Em primeiro lugar, ética significa conhecimento, tendo-se em vista que,
ao praticar o mal, crê-se praticar algo que leve à felicidade, e, normalmente,
esse juízo é falseado por impressões e aparências puramente externas. Para
saber julgar acerca do bem e do mal, é necessário conhecimento, este sim
verdadeira sabedoria e discernimento.
O conhecer-te a ti mesmo é esse mandamento que inscreve como
necessária a gnose interior para a construção de uma ética sólida.
Em segundo lugar, a felicidade, a busca de toda a ética, para Sócrates,
pouco tem a ver com a posse de bens materiais ou com o conforto e a boa
situação entre os homens; tem ela a ver com a semelhança com o que é
valorizado pelos deuses, pois parecem estes ser os mais beatos dos seres.
O cultivo da verdadeira virtude, consistente no controle efetivo das
paixões e na condução das forças humanas para a realização do saber, é o
que conduz o homem à felicidade.
8 - PRIMADO DA ÉTICA DO COLETIVO SOBRE A ÉTICA DO INDIVIDUAL:
A ética socrática impõe respeito, seja por sua logicidade, seja por seu
caráter. É certo que, se Sócrates desejasse, poderia ter fugido à aplicação da
pena de morte que lhe havia sido imposta, e os discípulos a seu lado estavam
para auxiliá-lo e acobertá-lo. No entanto, a ética do respeito às leis, e, portanto,
à coletividade, não permitia que assim agisse. E também, se durante toda a
sua vida distinguiu-se por seguir os conselhos dos deuses, não seria no
momento de sua morte que os desobedeceria, negando seu destino de união
coma a cidade e com a constituição.
Isso porque Sócrates vislumbra nas leis um conjunto de preceitos de
obediência incontornável, não obstante possam estas ser justas ou injustas. O
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FILOSOFIA JURÍDICA
direito, pois, aparece como um instrumento humano de coesão social, que visa
à realização do bem comum, consistente no desenvolvimento integral de todas
as potencialidades humanas, alcançável por meio do cultivo das virtudes. Em
seu conceito, que nos foi transmitido pelos diálogos platônicos de primeira
geração, as leis da cidade são inderrogáveis pelo arbítrio da vontade humana.
Concluindo assim que a filosofia socrática traduz uma ética, e sua
contribuição consiste em vislumbrar na felicidade o fim da ação. Essa ética tem
por fito a preparação do homem para conhecer-se, uma vez que o
conhecimento é a base do agir ético; só erra quem desconhece, de modo que a
ignorância é o maior dos males. Conhecer, porém, não é fiar-se nas aparências
é nos enganos e desenganos humanos, e sim fiar-se no que há de verdadeiro
e certo. Erradicar a ignorância, portanto, por meio da educação, é tarefa do
filósofo, que na certeza desses princípios, abdica até mesmo de sua vida para
reafirmar sua lição e seu compromisso com a divindade. A lição de vida da
ética socrática é já uma lição de justiça.
Portanto, um misterioso conjunto de elementos éticos, sociais e
religiosos permearem os ensinamentos socráticos, que permaneceram como
princípios perenes e modelares, apesar de não terem sido reduzidos a escritos,
mas que se transmitiram e se consubstanciaram principalmente no
pensamento platônico, surtindo seus reflexos nas demais escolas que se
firmaram na doutrina socrática.
Ao contrário de fomentar a desordem, o caos, a insurreição, sua filosofia
prima pela submissão, uma vez que a ética do coletivo está acima da ética do
individuo. Seu testemunho de vida bem provou essa convicção no acerto da
renúncia em prol da cidade-estado. Onde está à virtude esta a felicidade, e isso
independentemente dos julgamentos humanos a respeito.
A condenação de Sócrates, além de ter-lhes propiciando a oportunidade
de questionar com sua vida a justiça citadina, também produziu sérios efeitos e
deixou profundas marcas na história da filosofia. Platão incorporando esse
dilema haverá de legá-lo com toda força para a posteridade.
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FILOSOFIA JURÍDICA
PLATÃO
Platão, discípulo de Sócrates e um um dos mais influentes filósofos da
atualidade. É através de seus diálogos que se pode saber sobre a vida de
Sócrates.
1 - PLATÃO: UM DISCÍPULO GANDIOSO
Platão pertencia a uma tradicional família de Atenas e estava ligado,
pelo lado materno, a grandes personalidades do meio político. Sua genitora
descendia do grande legislador Sólon, era irmã de Carmides e prima de Crítias,
dois dos trinta tiranos que dominaram Atenas durante algum tempo.
Talvez seja possível atribuir o desapreço de Platão pelos políticos de
seu tempo ao convívio e, conseqüentemente, ao conhecimento dos bastidores
políticos, adquirido desde criança. Aos 20 anos, encontrou-se com Sócrates e
isso imprimiu novo rumo a sua vida.
Desiludido com a morte de Sócrates deixou Atenas e viveu em Mégara
antes de viajar pelo Egito e Cirene, Itália e Sicília.
Após a morte de Sócrates, Platão (427 – 347 a. C.). Continua a Filosofia
no quintal dos fundos de sua casa afastada. Ao criar a academia, Platão
resolve dois problemas de uma só vez: afasta a Filosofia do cotidiano egoísta e
interesseiro dos homens e protege a ciência do conhecimento do afrontamento
direto com as novas classes atenienses. Nas idéias inspiradas nos
ensinamentos de Sócrates.
Sua obra de maior importância para ciência política é A República ou Da
Justiça, na qual Platão organiza a cidade ideal. A cidade é composta por
homens de ouro, prata e bronze, respectivamente, os reis filósofos, os guardas
e os produtores. Todo na polis ideal de Platão eram submetidos a exames para
avaliar quais virtudes possuíam.
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FILOSOFIA JURÍDICA
O filósofo, para Platão, é o modelo mais adequado do estágio de
perfectibilidade que a educação humana pode atingir. “o amigo da sabedoria é
aquele que vive feliz porque é virtuoso, possui como ideal de vida viver a
justiça tanto individual quanto coletiva, seu objetivo é chegar à verdade que se
manifesta na transparência das coisas, por meio de uma consistente formação
dialética”. Por isso é que o filósofo é o único habilitado a governar a cidade com
justiça.
Como conseguir filósofo? Educando. E educar não é propiciar aquisição
de conhecimento técnico. Ensinar a decorar ou a colecionar informação.
Educar é formar um homem virtuoso. O que é virtude para Platão? Os
predicados morais, na visão platônica, representam o tesouro mais valioso, a
coisa mais importante da vida. A pessoa virtuosa é a pessoa boa.
2 – PENSAMENTO POLÍTICO:
Segundo sua filosofia idealista, o Estado deve ser em ponto maior o que
é o homem em ponto menor. Assim, como o homem é governado pela razão,
deveria o Estado ser governado pelos sábios filósofos.
Tal como o corpo, com suas paixões e instintos, segue o que é
determinado pela inteligência, os trabalhadores devem obedecer aos sábios
governantes que possuem os conhecimentos verdadeiros.
Finalmente, do mesmo modo que o ser humano segue os ditamos da
razão, mas quem decide é à vontade, haveria no Estado uma classe
encarregada de defender a polis contra a subversão dos trabalhadores, para se
cumprir os mandamentos dos sábios ou para repelir ameaças externas.
Compõem esta classe os guerreiros ou guardiões.
3 – A POLIS JUSTA:
Para que essa cidade tenha em seu corpo a justiça, cada ator, os
produtores, os guardiões e os sábios, deverão agir conforme seus papéis
sociais. Entretanto, caso algum indivíduo queira, por qualquer motivo, exercer
função diversa daquela para qual é apto, haverá, então, elementos para uma
cidade injusta.
4 – HOMENS E MULHERES SÃO IGUAIS:
No livro V de A República, Platão fala sobre o papel da mulher, que seria
vista como alguém que mereça espaço nessa sociedade justa.
Platão não leva em consideração a questão do gênero humano, mas sim
a natureza e, bem por isso, a mulher poderia exercer qualquer função na
cidade platônica, seja produtora, guardião ou sábia. Este aspecto é relevante,
pois todos deveriam participar da vida pública, tanto na esfera política como
militar, motivo inclusive pelo qual Platão administrava.
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FILOSOFIA JURÍDICA
5 – A MENTIRA:
Outro aspecto interessante seria a licitude de mentir conferida aos
dirigentes da cidade, seja para enganar os inimigos ou os próprios cidadãos,
desde que essa medida traga vantagem a comunidade.
Vale frisar que somente aos governantes é possibilitada a mentira. Aos
demais habitantes é proibido mentir, tende em vista que não tem a sabedoria
sobre seus atos.
6 – SOBRE A FORMA DE GOVERNO DEMOCRÁTICO:
Platão aprofundou sua descrença na democracia como a melhor forma
de governo. Para Platão, o mais sábio e mais justo de todos os homens, seu
mestre Sócrates, não poderia ter sido condenado injustamente, o que fez
Platão crer que não poderia haver um partido político que um homem pudesse
integrar sem abrir mão de seus princípios éticos.
Por conto disso, apresenta como modelo ideal essa sociedade
meritocrata.
Ouro – Reis filósofos--------------------------------sabedoria+ coragem+temperança
Prata – Guardiões----------------------------------------coragem+temperança
Bronze – Produtores-----------------------------------------------temperança
Temperança – uma das virtudes éticas de Aristóteles e consistente no uso
justo dos prazeres corpóreos.
Coragem – opinião reta e conforme a lei sobre o que se deve e sobre o que
não se deve temer (Platão).
Sabedoria – disciplina racional das atividades humanas. Comportamento
racional em todo domínio que é bom e aquilo que é mau para o homem. É o
conhecimento das atividades humanas e da melhor maneira de conduzi-las.
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FILOSOFIA JURÍDICA
Para Platão o governo ideal seria o filósofo – rei. Ele deveria ser
educado por um processo que Platão explicitou em A República e que pode Sr
resumido como segue:
“Os mais bem dotado dos guerreiros são escolhidos entre
os vinte e os trinta anos, e submetidos a uma particular
educação cientifica. Quem nela se distinguir é tomado e
introduzido na terceira classe, a dos “perfeitos guardiões”.
E agora percebemos propriamente a alma do Estado
platônico. Pois esses perfeitos guardiões devem tornar-se
perfeitos filósofos para estabelecer o Estado platônico nos
seus fundamentos de verdade e idealidade. Passam logo a
estudar, durante cinco anos, filosofia, matemática,
astronomia, bela arte, sobretudo dialética filosófica, para
se capacitarem de todas as leis, verdade e valores do
mundo. Passam depois, durante quinze anos, em altos
cargos políticos, para aprender a conhecer praticamente o
mundo e a vida. Aos cinquenta anos, esse circulo de
escolhidos se retira, vivendo então somente na
contemplação do vem em si e presta superior serviço de
expor as grandes ideias pelas quais o Estado deve dirigirse”.
7 - TRANSCENDÊNCIA E ALMA:
Afinal, o que é a essência nos homens? O espírito, a alma. Mas a alma
precisa do corpo para se desenvolver. A alma em Platão tem duas
características: ela é preexistente (existe antes do corpo) e subsistente (existirá
após o perecimento do corpo). Compõem a alma três partes: logística, a parte
superior, que corresponde à razão; Irascível, a parte mediana, que corresponde
às paixões; apetecível, a parte inferior, que corresponde aos vícios. Esta
mesma tríade é comparada pelo autor as três partes do corpo.
Platão ressalta-se ainda que a categoria mais importante seja metafísica
– alma – a visão idealista não recorre a nenhuma circunstância externa ao ser
humano para explicar ou justificar o mal e todas as imperfeições mais
escatológicas que dele derivam. Este compromisso com a compreensão da
condição humana em suas limitações, e mesmo sua capacidade de ultrapassálas, encontra-se absolutamente nas contradições que desde o inicio povoam os
espíritos do próprio homem. Neste sentido, os males da existência humana,
imateriais e materiais, advêm de dentro do próprio ser e só a partir desse
interior podem ser ultrapassado.
 Preexistente - existe antes do corpo.
 Subsistente - existirá após o perecimento do corpo.
Compõem a alma três partes:
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FILOSOFIA JURÍDICA
 LOGÍSTICA - parte superior, que corresponde à razão;
 IRASCÍVEL - parte mediana, que corresponde às paixões;
 APETECÍVEL - parte inferior, que corresponde aos vícios.
8 – O CICLO VIRTUOSO – ALMA E CORPO:
Qual a necessidade da alma de reencarnar? Por que as paixões e os
vícios só se manifestam enquanto a alma se encontra materializada no corpo?
Portanto, ela precisa do corpo para ser instigada a procurar a razão e assim
aprimorar-se permanentemente.
No mundo platônico o conhecimento é infinito e a sabedoria, ilimitada.
Esta infinidade move inexoravelmente a alma à reencarnação permanente.
Logo, a virtude é si mesma uma pretensão nunca alcançada dentro de um ciclo
virtuoso de aprimoramento e desenvolvimento espiritual.
Ainda que a luta entre o bem e o mal, a procura incessante do
predomínio da razão contra as paixões e vícios, se verifique no âmago do
próprio ser, a possibilidade do crescimento espiritual, aquele que
verdadeiramente interessa, se dá na transcendência da alma transmudada na
materialidade do corpo.
9 – O MITO DE “ER”:
Por outro lado, o que acontece quando a alma desencarna? Conta o
Mito de ER que a alma recobra a consciência de toda sua trajetória e é julgada
por seus atos enquanto estava encarnada. Julgada, é punida em um tipo de
purgatório muito parecido com nossa noção cristã de “inferno”.
Ao contrário do Cristianismo em que a alma fica aguardando o dia do
julgamento do julgamento final, a alma reencarna rapidamente, não como
cumprimento “carmático” especifico, mas como necessidade imperiosa e
infinita de continuar seu ciclo de virtuosidade.
Como sabemos da justiça no além e do que acontece com a alma
quando desencarna? Conta o mito que o esquecimento, ao incorporar o corpo,
se dá através da água de um lago que a alma se vê obrigada a beber. ER é
uma alma que não bebeu da água do lago do esquecimento, e assim saber
desta verdade.
Alma Reencarnada – Predomínio da Razão – Harmonia Espiritual – Ética –
Virtude – Sabedoria – Justiça.
O Mito de ER (Platão, República)
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FILOSOFIA JURÍDICA
A verdade que o que te vou narrar não é um conto de Alcínoo, mas de um
homem valente, Er o Arménio, Panfílio de nascimento. Tendo ele morrido em
combate, andavam a recolher, ao fim de dez dias, os mortos já putrefactos,
quando o retiraram em bom estado de saúde. Levaram-no para casa para lhe
dar sepultura, e, quando, ao décimo segundo dia, estava jazente sobre a pira,
tornou à vida e narrou o que vira no além. Contava ele que, depois que saíra
do corpo, a sua alma fizera caminho com muitas, e havia chegado a um lugar
divino, no qual havia, na terra, duas aberturas contíguas uma à outra, e no céu,
lá em cima, outras em frente a estas. No espaço entre elas, estavam sentados
juízes que, depois de pronunciarem a sua sentença, mandavam os justos
avançar para o caminho à direita, que subia para o céu, depois de lhes terem
atado à frente a nota do seu julgamento; ao passo que, os injustos,
prescreviam que tomassem à esquerda, e para baixo, levando também atrás a
nota de tudo quanto haviam feito. Quando se aproximou, disseram-lhe que ele
devia ser o mensageiro, junto dos homens, das coisas do além, e ordenaramlhe que ouvisse e observasse tudo o que havia naquele lugar. Ora ele viu que
ali, por cada uma das aberturas do céu e da terra, saíam as almas, depois de
terem sido submetidas ao julgamento, ao passo que pelas restantes, por uma
subiam as almas que vinham da terra, cheias de lixo e de pó, e por outra
desciam as almas do céu, em estado de pureza. E as almas, à medida que
chegavam, pareciam vir de uma longa travessia e regozijavam-se por irem para
o prado acampar, como se fosse uma panegíria1[1]; e as que se conheciam,
cumprimentavam-se mutuamente, e as que vinham da terra faziam perguntas
às outras, sobre o que se passava no além, e as que vinham do céu, sobre o
que sucedia na terra. Umas, a gemer e a chorar, recordavam quantos e quais
sofrimentos haviam suportado e visto na sua viagem por baixo da terra, viagem
essa que durava mil anos, ao passo que outras, as que vinham do céu,
contavam as suas deliciosas experiências e visões de uma beleza indescritível.
Referir todos os pormenores seria, ó Gláucon, tarefa para muito tempo. Mas o
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FILOSOFIA JURÍDICA
essencial dizia ele que era o que segue. Fossem quais fossem as injustiças
cometidas e as pessoas prejudicadas, pagavam a pena de tudo isso
sucessivamente, dez vezes por cada uma, quer dizer, uma vez em cada cem
anos, sendo esta a duração da vida humana – a fim de pagarem, decupilandoa, a pena do crime; por exemplo, quem fosse culpado da morte de muita gente,
por ter traído Estados ou exércitos e os ter lançado na escravatura, ou por ser
responsável por qualquer outro malefício, por cada um desses crimes
suportava padecimentos a duplicar; e, inversamente, se tivesse praticado boas
acções e tivesse sido justo e piedoso, recebia recompensas na mesma
proporção. Sobre os que morreram logo a seguir ao nascimento e os que
viveram pouco tempo, dava outras informações que não vale a pena lembrar.
Em relação à impiedade ou piedade para com os deuses e para com os pais, e
crimes de homicídio, dizia que os salários eram ainda maiores.
Contava ele, com efeito, que estivera junto de alguém a quem perguntaram
onde estava Ardieu o Grande. Este Ardieu tinha sido tirano numa cidade da
Panfília, havia já então mil anos; tinha assassinado o pai idoso e o irmão mais
velho, e perpetrado muitas outras impiedades, segundo se dizia. E o
interpelado respondera: “Não vem, nem poderá vir para aqui. Na verdade, um
dos espectáculos terríveis que vimos foi o seguinte: Depois de nos termos
aproximado da abertura, preparados para subir, e quando já tínhamos expiado
todos os sofrimentos, avistámos de repente Ardieu e outros, que eram tiranos,
na sua quase totalidade; mas também havia alguns que eram particulares que
tinham cometido grandes crimes – que, quando julgavam que já iam subir, a
abertura não os admitia, mas soltava um mugido cada vez que algum desses,
assim incuráveis na sua maldade ou que não tinham expiado suficientemente a
sua pena, tentava a ascensão. Estavam lá homens selvagens, que pareciam
de fogo, e que, ao ouvirem o estrondo, agarravam alguns pelo meio e levavamnos, mas, a Ardieu e outros, algemaram-lhes as mãos, pés e cabeça,
derrubaram-nos e esfolaram-nos, arrastaram-nos pelo caminho fora, cardandoos em espinhos, e declaravam a todos, à medida que vinham, por que os
tratavam assim, e que os levavam para os precipitar no Tártaro”. Então tinham
tido terrores múltiplos e variados, mas o maior de todos era o de cada um deles
ouvir o mugido, quando ia a subir, e foi com o maior gosto que cada um fez a
ascensão ante o silêncio daquele. Eram mais ou menos estas as penas e
castigos, e bem assim as vantagens que lhes correspondiam. Depois de cada
um deles ter passado sete dias no prado, tinham de se erguer dali, e partir ao
oitavo dia, para chegar, ao fim de mais quatro dias, a um lugar de onde se
avistava, estendendo-se desde o alto através de todo o céu e terra, uma luz,
direita com uma coluna, muito semelhante ao arco-íris, mas mais brilhante e
mais pura. Cegaram lá, depois de terem feito um dia de caminho, e aí mesmo,
viram, no meio da luz, pendentes do céu, as extremidades das suas cadeias
(efectivamente essa luz é uma cadeia do céu, que tal como as cordagens das
trirremes, segura o firmamento na sua revolução); dessas extremidades pendia
o fuso da Necessidade, por cuja acção giravam as esferas. A respectiva haste
e gancho eram de aço; o contrapeso, de uma mistura desse produto e de
outros. Quanto à natureza do contrapeso, era como segue. A sua configuração
era semelhante à dos daqui, mas, quanto à sua constituição, contava ele que
devíamos imaginá-la da seguinte maneira: era como se, num grande
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FILOSOFIA JURÍDICA
contrapeso oco e completamente esvaziado, estivesse outro semelhante,
maior, que coubesse exactamente dentro dele, como as caixas que se metem
umas nas outras; do mesmo modo, um terceiro, um quarto, e mais quatro. Com
efeito, eram oito ao todo, os contrapesos, encaixados uns nos outros, que, na
parte superior, tinham o rebordo visível com outros tantos círculos, formando
um plano contínuo de um só fuso em volta da haste. Esta atravessava pelo
meio, de lés-a-lés, o oitavo. Ora o primeiro contrapeso, o exterior, era o que
tinha o círculo de rebordo mais largo; o segundo lugar cabia ao sexto, o terceiro
ao quarto, o quarto ao oitavo, o quinto ao sétimo, o sexto ao quinto, o sétimo ao
terceiro, o oitavo ao segundo. O círculo do maior era cintilante, o do sétimo era
o mais brilhante, o do oitavo tinha a cor do sétimo, que o iluminava, o do
segundo e do quinto eram muito semelhantes entre si; um pouco mais
amarelados do que aqueles, o terceiro era o que tinha a cor mais branca, o
quarto era avermelhado, o sexto era o segundo em brancura2[2].O fuso inteiro
girava sobre si na mesma direcção, mas, na rotação desse todo, os sete
círculos interiores andavam à volta suavemente, em direcção oposta ao resto.
Dentre estes, o que andava com maior velocidade era o oitavo; seguiam-se, ao
mesmo tempo, o sétimo, o sexto, e o quinto; o quarto parecia-lhes ficar em
terceiro lugar nesta revolução em sentido retrógrado, o terceiro em quarto, e o
segundo em quinto. O fuso girava nos joelhos da Necessidade. No cimo de
cada um dos círculos, andava uma Sereia que com ele girava, e que emitia um
único som, uma única nota musical; e de todas elas, que eram oito, resultava
um acorde de uma única escala3[3]. Mais três mulheres estavam sentadas em
círculo, a distâncias iguais, cada uma em seu trono, que eram as filhas da
Necessidade, as Parcas4[4], vestidas de branco, com grinaldas na cabeça –
Láquesis, Cloto e Átropos – as quais estavam ao som da melodia das Sereias,
Láquesis, o passado, Cloto, o presente, e Átropos o futuro. Cloto, tocando
com a mão direita no fuso, ajudava a fazer girar o círculo exterior, de tempos a
tempos; Átropos, com a mão esquerda, procedia do mesmo modo com os
círculos interiores; e Láquesis tocava sucessivamente nuns e noutros com cada
uma das mãos. Ora eles, assim que chegaram, tiveram logo que ir para junto
de Láquesis. Primeiro, um profeta dispô-los por ordem. Seguidamente, pegou
em lotes e modelos de vidas que estavam no colo de Láquesis, subiu a um
estrado elevado e disse:
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FILOSOFIA JURÍDICA
“Declaração da virgem Láquesis, filha da Necessidade. Almas efémeras, vai
começar outro período portador da morte para a raça humana. Não é um
génio5[5] que vos escolherá, mas vós que escolhereis o génio.
“O primeiro a quem a sorte couber, seja o primeiro a escolher
uma vida a que ficará ligado pela necessidade. A virtude não
tem senhor, cada um terá em maior ou menor grau, conforme
a honrar ou desonrar. A responsabilidade é de quem escolhe.
O deus é isento de culpa”.
Ditas estas palavras, atirou com os lotes para todos e cada um apanhou o que
caiu perto de si, excepto Er, a quem isso não foi permitido. Ao apanhá-lo,
tornaram-se evidentes para cada um a ordem que lhe cabia para escolher.
Seguidamente, dispôs no solo, diante deles, os modelos de vida, em número
muito mais levado, do que os dos presentes. Havia-os de todas as espécies,
vida de todos os animais, e bem assim de todos os seres humanos. Entre elas,
havia tiranias, umas duradoiras, outras derrubadas a meio, e que acabavam na
pobreza, na fuga, na mendicidade. Havia também vidas de homens ilustres,
umas pela forma, beleza, força e vigor, outras pela raça e virtudes dos
antepassados; depois havia também as vidas obscuras, e do mesmo modo
sucedia com as mulheres. Mas não continham as disposições do carácter, por
ser forçoso que este mude, conforme a vida que escolhem. Tudo o mais estava
misturado entre si e com a riqueza e a indigência, a doença e a saúde, e bem
assim o meio termo entre estes predicados. É ai que está, segundo parece,
meu caro Gláucon, o grande perigo para o homem, e por esse motivo se
deve ter o máximo cuidado em que cada um de nós ponha de parte os outros
estudos para investigar e se aplicar a isto, a ver se é capaz de saber e
descobrir quem lhe dará a possibilidade e a ciência de distinguir uma vida
honesta da que é má e de escolher sempre em toda a parte tanto quanto
possível a melhor […]
Ora, então, anunciou o mensageiro do além, o profeta falou deste modo:
“Mesmo para quem vier em último lugar, se escolher com inteligência e viver
honestamente, espera-o uma vida apetecível, e não uma desgraçada. Nem o
primeiro deixe de escolher com prudência6[6], nem o último com coragem”.
Ditas estas palavras, contava Er, aquele a quem coube à primeira
sorte logo se precipitou para escolher a tirania maior, e, por
insensatez e cobiça, arrebatou-a, sem ter examinado capazmente
todas as conseqüências, antes lhe passou despercebido que o destino
que lá estava fixado comportava comer os próprios filhos e outras
desgraças. Mas, depois que a observou com vagar, batia no peito e
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FILOSOFIA JURÍDICA
lamentava a sua escolha, sem se ater às prescrições do profeta.
Efetivamente, não era a si mesmo que se acusava da desgraça,
mas à sorte e às divindades, e a tudo, mais do que a si mesmo. Ora,
esse era um dos que vinham do céu, e vivera, na encarnação
anterior, num Estado bem governado; a sua participação na virtude
devia-se ao hábito, não à filosofia. Pode-se dizer que não eram
menos numerosos os que vindos do céu, se deixavam apanhar em
tais situações, devido à sua falta de treino nos sofrimentos. Ao passo
que os que vinham da terra, na sua maioria, como tinham sofrido
pessoalmente e visto os outros sofrer, não faziam a sua escolha à
pressa. Por tal motivo, e também devido à sorte da escolha, o que
mais acontecia às almas era fazerem a permuta entre males e bens.
[…]
Era digno de se ver este espectáculo, contava ele, como cada uma das
almas escolhia a sua vida. Era, realmente, merecedor de piedade, mas
também ridículo e surpreendente. Com efeito, a maior parte fazia a sua opção
de acordo com os hábitos da vida anterior. Dizia ele que vira a alma que
outrora pertencera a Orfeu escolher uma vida de cisne, por ódio à raça das
mulheres, porque, devido a ter sofrido a morte às mãos delas, não queria
nascer de uma mulher; vira a de Tamiras7[7] escolher uma vida de rouxinol;
vira também um cisne preferir uma vida humana, e outros animais músicos
procederem do mesmo modo. [..]
Assim que todas as almas escolheram as suas vidas avançaram, pela
ordem da sorte que lhes coubera, para junto de Láquesis. Esta mandava a
cada uma o génio que preferira para guardar a sua vida e fazer cumprir o que
escolhera. O génio conduzia-a primeiro a Cloto, punha-a por baixo da mão dela
e do turbilhão do fuso a girar, para ratificar o destino que, depois da tiragem à
sorte, escolhera. Depois de tocar no fuso, conduzia-a a novamente à trama de
Átropos, que tornava irreversível o que fora fiado. Desse lugar, sem se poder
voltar para trás, dirigia-se para o trono da Necessidade, passando para o outro
lado. Quando as restantes passaram, todas se encaminharam para a planura
do Letes8[8], através de um calor e uma sufocação terríveis.
De fato, ela era despida de árvores e de plantas. Quando já entardecia,
acamparam junto do Rio Ameles9[9], cuja água nenhum vaso pode conservar.
Todas são forçadas a beber uma certa quantidade dessa água, mas aquelas a
quem a reflexão não salvaguarda bebem mais do que a medida. Enquanto se
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FILOSOFIA JURÍDICA
bebe, esquece-se tudo. Depois que se foram deitar e deu a meia-noite, houve
um trovão e um tremor de terra. De repente, as almas partiram dali, cada uma
para seu lado, para o alto, a fim de nascerem, cintilando como estrelas. Er,
porém, foi impedido de beber. Não sabia, contudo, por que caminho nem de
que maneira alcançara o corpo, mas, erguendo os olhos de súbito, viu, de
manhã cedo, que jazia na pira.
Foi assim, ó Gláucon, que a história se salvou e não pereceu.»
PLATÃO, República, Livro X, 614b-621c
10 - JUSTIÇA, ÉTICA E GOVERNABILIDADE:
A seguinte seqüência de aforismos pode fornecer uma explicação clara
da relação entre sabedoria e justiça:
 Na medida em que existe uma vida terrena para o espírito, os homens
fazem suas leis, desejando punir o que vêem e conforme o que
entendem;
 Assim, mesmo julgado pela lei dos homens, o ser espiritualmente será
julgado e punido no além, quando então terá a verdadeira oportunidade
de expiar seus males;
 Portanto, o inferno pode ser aqui, mas explicações e justificativas dos
descaminhos da humanidade não podem ser buscadas e avaliadas a
partir desta materialidade existencial e sim da fragilidade espiritual dos
homens;
 Finalmente, num plano absolutamente terreno, o melhor caminho é o
comportamento ético absoluto fundamentalmente dirigido ao outro e á
coletivamente. Desvinculando de interesses imediatos e exclusivamente
pessoais.
O Mito da Caverna
Aprofundando o Estudo: A República - O Mito da Caverna
Na República, Platão formula seu modelo ideal de cidade, a cidade justa,
que serve de contraste para a cidade concreta, Atenas, cujo sistema político
é injusto, corrupto e decadente. Para definir o que é a cidade justa, Platão
começa a examinar o que é a justiça, o que o leva a investigar o
conhecimento da justiça e, por fim, o próprio conhecimento. A Alegoria, ou
Mito da Caverna, que se encontra no início do livro VII deste diálogo
consiste precisamente em uma imagem construída por Sócrates para
explicar a seu interlocutor, Glauco, o processo pelo qual o indivíduo passa
ao se afastar do mundo do senso comum e da opinião em busca do saber e
da visão do Bem e da Verdade. É este precisamente o percurso do
23
FILOSOFIA JURÍDICA
prisioneiro até transformar-se no sábio, no filósofo, devendo depois retomar
a caverna para cumprir sua tarefa político-pedagógica de indicar a seus
antigos companheiros o caminho.
SÓCRATES: Agora imagine a nossa natureza, segundo o grau de
educação que ela recebeu ou não, de acordo com o quadro que vou fazer.
Imagine, pois, homens que vivem em uma espécie de morada subterrânea
em forma de caverna. A entrada se abre para a luz em toda a largura da
fachada. Os homens estão no interior desde a infância, acorrentados pelas
pernas e pelo pescoço, de modo que não podem mudar de lugar nem voltar
à cabeça para ver algo que não esteja diante deles. A luz lhes vem de um
fogo que queima por trás deles, ao longe, no alto. Entre os prisioneiros e o
fogo, há um caminho que sobe. Imagine que esse caminho é cortado por
um pequeno muro, semelhante ao tapume que os exibidores de marionetes
dispõem entre eles e o público, acima do qual manobram as marionetes e
apresentam o espetáculo.
GLAUCO: Entendo.
SÓCRATES: Então, ao longo desse pequeno muro, imagine homens que
carregam todo tipo de objetos fabricados, ultrapassando a altura do muro;
estátua de homens figura de animais, de pedra, madeira ou qualquer outro
material. Provavelmente, entre os carregadores que desfilam ao longo do
muro, alguns falam, outros se calam.
GLAUCO: Estranha descrição e estranhos prisioneiros!
SÓCRATES: Eles são semelhantes a nós. Primeiro você pensa que, na
situação deles, eles tenham visto algo mais do que as sombras de si
mesmos e dos vizinhos que o fogo projeta na parede da caverna à sua
frente?
GLAUCO: Como isso seria possível, se durante toda a vida eles estão
condenados a ficar com a cabeça imóvel?
SÓCRATES: Não acontece o mesmo com os objetos que desfilam?
GLAUCO: É claro.
SÓCRATES: Então, se eles pudessem conversar, não acha que, nomeando
as sombras que vêem, pensariam nomear seres reais?
GLAUCO: Evidentemente.
SÓCRATES: E se, além disso, houvesse um eco vindo da parede diante
deles, quando um dos que passam ao longo do pequeno muro falasse, não
acha que ele tomaria essa voz pela da sombra que desfila à sua frente?
24
FILOSOFIA JURÍDICA
GLAUCO: Sim, por Zeus.
SÓCRATES: Assim sendo, os homens que estão nessas condições não
poderiam considerar nada como verdadeiro, a não serem as sombras dos
objetos fabricados.
GLAUCO: Não poderia ser de outra forma.
SÓCRATES: Veja agora o que aconteceria se eles fossem libertados de
sua corrente e curados de sua desrazão. Tudo não aconteceria
naturalmente como vou dizer? Se um desses homens fosse solto, forçado
subitamente a levantarem-se, a virar a cabeça, a andar, a olhar para o lado
da luz, todos esses movimentos o fariam sofrer; ele ficaria ofuscado e não
poderia distinguir os objetos, dos quais via apenas as sombras,
anteriormente. Em sua opinião. O que ele poderia responder se lhe
dissessem que, antes, ele só via coisas sem consistência, que agora ele
está mais perto da realidade, voltado para objetos mais reais, e que está
vendo melhor? O que ele responderia se lhe designassem cada um dos
objetos que desfilam, obrigando-o, com perguntas, a dizer o que são? Não
acha que ele ficaria embaraçado e que as sombras que ele via antes lhe
pareceriam mais verdadeira" do que os objetos que lhe mostram agora?
GLAUCO: Certamente, elas lhe pareceriam mais verdadeiras.
SÓCRATES: E se o forçassem a olhar para a própria luz, não achas que os
olhos lhe doeriam, que ele viraria as costas e voltaria para as coisas que
pode olhar e que as consideraria verdadeiramente mais nítidas do que as
coisas que lhe mostram?
GLAUCO: Sem dúvida alguma.
SÓCRATES: E se o tirassem de lá à força. Se o fizessem subir o íngreme
caminho montanhoso, se não o largassem até arrastá-lo para a luz do sol,
ele não sofreria e se irritaria ao ser assim empurrado para fora? E.
Chegando à luz, com os olhos ofuscados pelo seu brilho, não seria capaz
de ver nenhum desses objetos, que nós afirmamos agora serem
verdadeiros.
GLAUCO: Ele não poderá vê-los, pejo menos nos primeiros momentos.
SÓCRATES: É preciso que ele se habitue, para que possa ver as coisas do
alto. Primeiro, ele distinguirá mais facilmente as sombras, depois, as
imagens dos homens e dos outros objetos refletidas na água, depois os
próprios objetos. Em segundo lugar, durante a noite, ele poderá contemplar
as constelações e o próprio céu, e voltar o olhar para a luz dos astros e da
lua mais facilmente que durante o dia para o sol e para a luz do sol.
GLAUCO: Sem dúvida
25
FILOSOFIA JURÍDICA
SÓCRATES: Finalmente, ele poderá contemplar o sol, não o seu reflexo
nas águas ou em outra superfície lisa, mas o próprio sol, no lugar do sol, o
sol tal como é.
GLAUCO: Certamente.
SÓCRATES: Depois disso, poderá raciocinar a respeito cio sol, concluir que
é ele que produz as estações e os anos, que governa tudo no mundo
visível, e que é de algum modo, a causa de tudo o que ele e seus
companheiros viam na caverna.
GLAUCO: É indubitável que ele chegará a essa conclusão.
SÓCRATES: Nesse momento. Se ele se lembrar de sua primeira morada,
da ciência que ali se possuía e de seus antigos companheiros, não acha
que ficaria feliz com a mudança e teria pena deles?
GLAUCO: Claro que sim.
SÓCRATES: Quanto às honras e louvores que eles se atribuíam
mutuamente outrora, quanto às recompensas concedidas àquele que fosse
dotado de uma visão mais aguda para discernir a passagem das sombras
na parede e de uma memória mais fiel para se lembrar com exatidão
daquelas que precedem certas outras ou que lhes sucedem. As que vêm
juntas. E que, por isso mesmo, era o mais hábil para conjeturar a que viria
depois, acha que nosso homem teria inveja dele, que as honras e a
confiança assim adquiridas entre os companheiros lhe dariam inveja? Ele
não pensaria antes, como o herói de Homero, que mais vale "viver como
escravo de um lavrador" e suportar qualquer provação do que voltar à visão
ilusória da caverna e viver como se vive lá?
GLAUCO: Concordo com você. Ele aceitaria qualquer provação para não
viver como se vive lá.
SÓCRATES: Reflita ainda nisto: suponha que esse homem volte à caverna
e retome o seu antigo lugar. Desta vez, não seria pelas trevas que ele teria
os olhos ofuscados, ao vir diretamente do sol?
GLAUCO: Naturalmente.
SÓCRATES: E se ele tivesse que emitir de novo um juízo sobre as sombras
e entrar em competição com os prisioneiros que continuaram acorrentados,
enquanto sua vista ainda está confusa, seus olhos ainda não se
recompuseram, enquanto lhe deram um tempo curto demais para
acostumar-se com a escuridão, ele não ficaria ridículo? Os prisioneiros não
diriam que, depois de ter ido até o alto, voltou com a vista perdida, que não
vale mesmo a pena subir até lá? E se alguém tentasse retirar os seus laços,
26
FILOSOFIA JURÍDICA
fazê-los subir, você acredita que, se pudessem agarrá-lo e executá-la, não
o matariam?
GLAUCO: Sem dúvida alguma, eles o matariam.
SÓCRATES: E agora, meu caro Glauco, é preciso aplicar exatamente essa
alegoria ao que dissemos anteriormente. Devemos assimilar o mundo que
apreendemos pela vista à estada na prisão. A luz do fogo que ilumina a
caverna à ação do sol. Quanto à subida e à contemplação do que há no
alto, considera que se trata da ascensão da alma até o lugar inteligível, e
não te enganarás sobre minha esperança, já que desejas conhecê-la. Deus
sabe se há alguma possibilidade de que ela seja fundada sobre a verdade.
Em todo o caso eis o que me aparece tal como me aparece; nos últimos
limites do mundo inteligível aparece-me a idéia do Bem, que se percebe
com dificuldade, mas que não se pode ver sem concluir que ela é a causa
de tudo o que há de reto e de belo. No mundo visível, ela gera a luz e o
senhor da luz. No mundo inteligível ela própria é a soberana que dispensa a
verdade e a inteligência. Acrescento que é preciso vê-Ia se quer comportarse com sabedoria, seja na vida privada. Seja na vida pública.
GLAUCO: Tanto quanto sou capaz de compreender-te, concordo contigo.
O MITO DE PANDORA
MITOLOGIA
Prometeu, deus cujo nome em grego significa "aquele que vê o futuro",
doou aos homens o fogo e as técnicas para acendê-lo e mantê-lo. Zeus, o
soberano dos deuses, se enfureceu com esse ato, porque o segredo do fogo
deveria ser mantido entre os deuses. Por isso, ordenou a Hefesto [1], que
criasse uma mulher que fosse perfeita, e que a apresentasse à assembléia dos
deuses. Atena, a deusa da sabedoria e da guerra, vestiu essa mulher com uma
roupa branquíssima e adornou-lhe a cabeça com uma guirlanda de flores,
montada sobre uma coroa de ouro. Hefesto a conduziu pessoalmente aos
deuses, e todos ficaram admirados; cada um lhe deu um dom particular:
Atena lhe ensinou as artes que convêm ao seu sexo, como a arte de
tecer;
Afrodite lhe deu o encanto, que despertaria o desejo dos homens;
As Cárites, deusas da beleza, e a deusa da persuasão ornaram seu
pescoço com colares de ouro;
Hermes, o mensageiro dos deuses, lhe concedeu a capacidade de falar,
juntamente com a arte de seduzir os corações por meio de discursos
insinuantes.
Depois que todos os deuses lhe deram seus presentes, ela recebeu o
nome de Pandora, que em grego quer dizer "todos os dons".
27
FILOSOFIA JURÍDICA
Finalmente, Zeus lhe entregou uma caixa bem fechada, e ordenou que
ela a levasse como presente a Prometeu. Entretanto, ele não quis receber nem
Pandora, nem a caixa, e recomendou a seu irmão, Epimeteu, que também não
aceitasse nada vindo de Zeus. Epimeteu, cujo nome significa "aquele que
reflete tarde demais", ficou encantado com a beleza de Pandora e a tomou
como esposa.
A caixa de Pandora foi então aberta e de lá escaparam a Senilidade, a
Insanidade, a Doença, a Inveja, a Paixão, o Vício, a Praga, a Fome e todos os
outros males, que se espalharam pelo mundo e tomaram miserável a
existência dos homens a partir de então. Epimeteu tentou fechá-la, mas só
restou dentro a Esperança, uma criatura alada que estava preste a voar, mas
que ficou aprisionada na caixa [...] e é graças a ela que os homens conseguem
enfrentar todos os males e não desistem de viver.
O MITO DE GIGES
Platão. A República, II, 359b-360a
Para provar que só se pratica a justiça contra a própria vontade e pela
incapacidade de cometer a injustiça, não poderíamos fazer nada melhor do que
imaginar o seguinte. Demos ao homem de bem e ao iníquo igual poder de fazer
o que quiserem e os sigamos para ver onde a paixão os vai conduzir.
Surpreenderemos o homem de bem tomando o mesmo caminho que o iníquo,
levado pelo desejo de ter sempre mais, desejo que toda natureza persegue
como um bem, mas que a lei sujeita, à força, ao respeito e à igualdade. O
melhor meio de lhes dar o poder de que falo é lhes emprestar o privilégio que,
dizem,Giges, o antepassado do Rei da Lídia, possuiu outrora.
Giges era um pastor a serviço do rei que reinava então na Lídia. Em
consequência de uma grande tempestade e de um terremoto, o solo tinha se
fendido e uma medonha abertura tinha se formado no lugar onde ele
apascentava seu rebanho. Admirado com o que via, desceu pela abertura, e
conta-se que, entre outras maravilhas, viu um cavalo de bronze, oco, com
portinholas e, tendo passado a cabeça através de uma delas, viu um homem
que estava morto, segundo toda a aparência, e cuja estatura ultrapassava a
estatura humana. Esse morto estava nu; tinha somente um anel de ouro na
mão. Giges o pegou e saiu. Ora, tendo-se reunido os pastores como de
costume para fazer ao rei o seu relatório mensal sobre o estado dos rebanhos,
Giges veio à assembleia, trazendo no dedo o seu anel.
Tendo tomado o lugar entre os pastores, girou, por acaso, o anel de tal
modo que a pedra ficou do lado de dentro de sua mão e, imediatamente, ele se
tornou invisível para os seus vizinhos, e falava-se dele como se tivesse partido,
o que o encheu de espanto. Girando de novo o seu anel, virou a pedra para
fora e imediatamente tornou a ficar visível. Atônito com o efeito, ele repetiu a
experiência para ver se o anel realmente tinha esse poder, e constatou que,
virando a pedra para dentro, tornava-se invisível; para fora, visível. Tendo essa
certeza, fez-se incluir entre os pastores que seriam enviados até o rei como
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FILOSOFIA JURÍDICA
representantes. Foi ao palácio, sequestrou a rainha e atacou e matou o rei; em
seguida, apoderou-se do trono.
Suponhamos, agora, dois anéis como esse; coloquemos um no dedo do
homem justo e outro no do injusto. Segundo o que tudo indica, não
encontraremos em nenhum dos dois uma força de caráter suficientemente forte
para permanecerem fiéis à justiça e resistirem à tentação de se apoderar do
bem que quisessem, já que poderiam, impunemente, pegar n mercado o que
quisessem, e fazer o que bem entendessem em qualquer lugar, como se
fossem deuses entre os homens, pois não seriam punidos por nada que
viessem a fazer. Penso que, quanto a isso, nada distinguiria o homem justo do
injusto, e os dois tenderiam para o mesmo fim,e poderíamos ver nisso uma
grande prova de que não se é justo por escolha, mas por imposição, e não é a
justiça como um bem individual, pois sempre que julgamos poder ser injustos,
não o deixamos de ser.
Todos os homens, com efeito, creem que a injustiça lhes é muito mais
vantajosa individualmente do que a justiça, e têm razão para acreditar nisso, se
nos referimos àquele que é partidário da doutrina que exponho. De fato, se um
homem que tivesse tal poder nãoconsentisse nunca em praticar uma injustiça e
em apoderar-se de um bem de outrem, seria considerado por aqueles que
estivessem a par do segredo como o mais infeliz e o mais insensato dos
homens. Nem por isso deixaria de elogiar em público a sua virtude, mas como
intento de se enganarem mutuamente, no temor de sofrerem, eles mesmos,
alguma injustiça.
ARISTÓTELES
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FILOSOFIA JURÍDICA
Aristóteles, detalhe da Escola de Atenas, afresco de Rafael, 1509. Museus do Vaticano, Roma.
Aristóteles foi provavelmente o mais erudito e sábio dos filósofos gregos
clássicos ou antigos. Familiarizou-se com todo o desenvolvimento do
pensamento grego anterior a ele. Em sua obra pessoal, considerou, resumiu,
criticou e desenvolveu ainda mais toda a rica tradição que herdara.
É autor de grande número de tratados de lógica, política, história natural e
física. Sua obra é a fonte do tomismo e da escolástica. Ele e seu professor
Platão são em geral considerados os dois mais importantes filósofos gregos da
antiguidade.
1 - VIDA
Aristóteles nasceu em Estagira, pequena cidade do norte da Grécia. Seu
pai, Nicômaco, era médico de Amintas II, rei da Macedônia, país vizinho.
Amintas foi pai de Filipe da Macedônia e avô de Alexandre, o Grande. Quando
seus pais morreram, Aristóteles, ainda uma criança, passou a ser criado por
um tutor chamado Proxeno.
Por volta dos 18 anos, Aristóteles ingressou na escola ateniense de
Platão, conhecida como a Academia. Ali ficou por cerca de 20 anos. Platão
considerava Aristóteles o mais brilhante e instruído discípulo da Academia, e
chamava-o a inteligência da escola e o leitor.
Com a morte de Platão, em 347 a.C., Aristóteles deixou a Academia
para se juntar a um pequeno grupo de discípulos de Platão que viviam com
30
FILOSOFIA JURÍDICA
Hérmias, antigo estudante da Academia. Hérmias tornara-se o senhor de
Atarnéia e Asso, cidades costeiras da Ásia Menor. Aristóteles passou cerca de
três anos com Hérmias, e casou-se com sua filha adotiva, Pítia.
Em 343 ou 342 a.C., Filipe II, rei da Macedônia, convidou Aristóteles
para supervisionar a educação de seu filho Alexandre. Este, mais tarde,
conquistou toda a Grécia, venceu o Império Persa, e tornou-se conhecido como
Alexandre, o Grande. Alexandre teve Aristóteles como preceptor até 336 a.C.,
ocasião em que o jovem subiu ao trono, após seu pai ter sido assassinado.
Após 334 a.C., Aristóteles voltou a Atenas e fundou uma escola
chamada o Liceu. A escola de Aristóteles, sua filosofia e seus adeptos foram
chamados peripatéticos (da palavra grega que significa dar voltas), porque
Aristóteles ensinava passeando com seus discípulos.
Pouco depois da morte de Alexandre, em 323 a.C., Aristóteles foi
acusado de impiedade (desrespeito aos deuses) pelos atenienses. Estes
provavelmente se ressentiam de sua amizade com Alexandre, o homem que
conquistara seu país.
Aristóteles não esquecera o destino do filósofo Sócrates, condenado à
morte por uma acusação semelhante feita pelos atenienses em 399 a.C. Fugiu
então para a cidade de Cálcis, para que os atenienses não pudessem como ele
disse, "pecar duas vezes contra a filosofia". Ali morreu um ano depois.
2 – OBRA ESCRITA DE ARISTÓTELES:
A obra escrita de Aristóteles é geralmente dividida em três grupos: obras
populares; memorandos; tratados.
As obras populares são, em sua maioria, diálogos sobre o modelo dos
diálogos de Platão, e foram produzidas enquanto Aristóteles ainda freqüentava
a Academia. Tais obras se destinavam a um público geral externo à escola. Eis
por que Aristóteles a elas se referia como exotéricas. Esses escritos não
sobreviveram, mas autores posteriores se referiram a eles muitas vezes,
inclusive com citações.
Os memorandos foram, em grande parte, coleções de materiais de
pesquisa e registros históricos. Preparados por Aristóteles com a ajuda de seus
discípulos, destinavam-se a servir de fonte de informação para os estudiosos.
Tal como sucedeu com os escritos populares, os memorandos perderam-se,
com poucas exceções.
Os tratados constituem quase toda a parte da obra de Aristóteles
conservada até hoje. Foram provavelmente escritos para servir como
anotações de aula ou manuais para o Liceu. Ao contrário das obras populares,
os tratados se destinavam aos estudantes na escola. Por isso, os tratados são
chamados obras esotéricas. (eso- em grego significa interno).
3 – ÉTICA E POLÍTICA:
Para Aristóteles, tanto a ética como a política estudam o conhecimento
prático, isto é, o conhecimento que capacita o homem a agir adequadamente e
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FILOSOFIA JURÍDICA
a viver feliz. As obras de Aristóteles sobre este tema incluem a Ética a
Nicômaco e a Política.
Diz Aristóteles que a meta do homem é a felicidade, e que ele alcança a
felicidade quando desempenha plenamente sua função. Logo, é preciso
determinar qual é a função do homem. A função de uma coisa é aquilo que só
ela pode fazer, ou o que ela pode fazer melhor. Por exemplo, a função do olho
é ver, e a função da faca é cortar. Aristóteles declarou que o homem é o
"animal racional", cuja função é raciocinar. Assim, segundo Aristóteles, para
o homem uma vida feliz é a vida governada pela razão.
Aristóteles acreditava que um homem que tem dificuldade em proceder
eticamente (de acordo com a moral) é moralmente imperfeito. Seu homem
ideal exercita-se no comportamento razoável e adequado, até poder fazê-lo
com naturalidade e sem esforço. Aristóteles acreditava que a virtude moral é
uma questão de evitar os extremos no comportamento, procurando, ao
contrário, o meio-termo que fica entre os extremos. Por exemplo, a virtude da
coragem é o meio-termo entre os vícios da covardia, de um lado, e do outro
uma louca ousadia.
Para Aristóteles:
Ser feliz e ser útil à comunidade eram dois objetivos
sobrepostos, e ambos estavam presentes na atividade
pública. O melhor governo, dizia ele, seria:
“Aquele em que cada um melhor encontra o que
necessita para ser feliz”.
Aristóteles
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FILOSOFIA JURÍDICA
4 - ÉTICA E JUSTIÇA:
Aristóteles escreveu diversos tratados sobre a ética podemos citar a
Ética Eudemos, a Ética Maior e a Ética a Nicômaco. A obra de Ética a
Nicômaco, especialmente no Livro V é a mais importante.
5 - A QUESTÃO DO BEM E BEM FINAL:
Aristóteles acreditava que o bem é aquilo que todas as coisas visam.
Assim, todas as coisas têm uma finalidade, que pode ser em si mesma (na
ação) ou distinta da ação, mas todas as finalidades devem visar algum bem,
pois, desse modo, agiremos conforme os preceitos da Ética. Tais finalidades
devem seguir algum bem, ou melhor, destes bens (bem supremo final e
autossuficiente).
6 - AS DUAS PARTES DA ALMA:
Apresenta a bipartição da alma em excelência ou virtude moral e
excelência ou virtude intelectual. A primeira é a parte irracional da alma e a
segunda, a racional. A conjugação das duas excelências leva – nos a ética.
7 - EXCELÊNCIA OU VIRTUDE MORAL:
Relaciona–se com os sentimentos (emoções). Para atingi–la, devemos
buscar o meio termo, a justa medida, a fim de conseguirmos o equilíbrio.
8 - EXCELÊNCIA OU VIRTUDE INTELECTUAL:
Refere-se às capacidades intelectuais e a todos os campos que
envolvam a razão, tais como a ciência, a técnica e a sabedoria filosófica.
9 - A QUESTÃO DO MEIO TERMO E A DEFICIÊNCIA MORAL:
Devemos buscar o meio termo a fim de encontrarmos o equilíbrio e nos
tornamos pessoas eqüidistantes. Caso não encontremos o meio termo,
teremos uma alma deficiente e consequentemente não buscaremos a
felicidade.
No campo da virtude ou excelência, aquele que não busca o meio termo
é um deficiente moral vivendo com excesso ou a falta de alguma coisa.
Exemplo:
Excesso
Meio Termo
Falta
Prodigalidade
Liberalidade
Avareza
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FILOSOFIA JURÍDICA
Comer muito
Comer o suficiente
Comer pouco
10 - A DEFICIÊNCIA INTELECTUAL:
A falta de excelência intelectual gera o medo, a insegurança e a
dependência, transformando a pessoa em deficiência intelectual.
11 - A JUSTIÇA:
Em relação ao homem, a excelência moral considerada mais elevada e
perfeita é a justiça, pois nela se resume toda a excelência. Além de sintetizar
as outras excelências, ela é ao mesmo tempo individua e coletiva, sendo a
prática efetiva da excelência moral. Assim, ao praticarmos um ato justo,
deliberadamente, tem-se a excelência moral como um todo.
12 - O BOM JUIZ:
Para Aristóteles, o juiz é uma figura fundamental para efetivação da
justiça. Por conta disso deve se valer constantemente de todos os
conhecimentos para que possa alcançar a verdade, e consequentemente
decidir de maneira justa.
Acreditava que o juiz devesse ser experiente, não podendo ser jovens
em experiências, ou seja, a experiência não se liga com idade, mas se liga com
imaturidade, ou juventude de vivencias. Aristóteles acreditava que cada juiz
julga corretamente os assuntos que conhece, sendo um bom juiz em cada
assunto de sua especialidade. Portanto, o homem instruído a respeito de um
assunto é um bom juiz em relação ao mesmo, e o homem que recebeu uma
instrução geral será um bom magistrado.
É importante salientar que para ser um bom juiz é necessária
experiência que se traduz em vivencia, ou seja, deve o candidato à
magistratura ou qualquer outra carreira não se guiar pelas paixões ou por
falsas opiniões. Daí a necessidade de existência de carreiras em órgãos
públicos, nos quais o iniciante começa sua carreira como substituto, avança
como juiz titular, muda de entrância podendo até galgar cargos nos Tribunais.
Para Aristóteles o juiz é uma figura fundamental para a efetivação da
justiça. Por conta disso deve se valer constantemente de todos os
conhecimentos para que possa alcançar a verdade, e consequentemente
decidir de maneira justa.
Acreditava que o juiz devesse ser experiente, não podendo ser jovens
em experiências, ou seja, experiência não se relaciona apenas e tão somente
com idade, mas com imaturidade, ou juventude de vivencias.
13 - COMO ATINGIR A VERDADE:
Existem três elementos e cinco disposições da verdade.
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FILOSOFIA JURÍDICA
14 - OS TRÊS ELEMENTOS DA ALMA:
Que governo a ação refletida e a percepção da verdade:
 Primeiro é a sensação, que esta ligada a alma cientifica ou a intuição;
 Segundo é o pensamento, que esta ligada a alma deliberativa ou
calculativa consistindo no pensamento racional;
 Terceiro é o desejo, que esta ligada a alma deliberativa e cientifica
ligando-se ao cultural.
15 - AS CINCO DISPOSIÇÕES DA ALMA:
Que fazem com que alcance-se a verdade por meio da afirmação ou da
negação:
 Primeira é a arte, disposição ligada à criação não a ação;
 Segunda é a ciência ou conhecimento cientifico;
 Terceira e o discernimento, que consiste nos caminhos que devo utilizar
para chegar à verdade;
 Quarto e a sabedoria filosófica, que consiste no conhecimento da
maturidade; é junção de algumas destas disposições;
 Quinto é a inteligência que liga nossa essência com Deus.
16 - NINGUÉM NASCE VIRTUOSO:
A virtude, para Aristóteles, é uma prática e não um dado da natureza de
cada um, tampouco o mero conhecimento do que é virtuoso, como para Platão
(427-347 a.C.). Para ser praticada constantemente, a virtude precisa se tornar
um hábito. Embora não se conheça nenhum estudo de Aristóteles sobre o
assunto, é possível concluir que o hábito da virtude deve ser adquirido na
escola.
Grande parte da obra que originou o legado aristotélico se desenvolveu
em oposição à filosofia de Platão, seu mestre e fundador da Academia
ateniense, que Aristóteles frequentou durante duas décadas.
Posteriormente ele fundaria uma escola própria, o Liceu. Uma das duas
grandes inovações do filósofo em relação ao antecessor foi negar a existência
de um mundo supra-real, onde residiriam as ideias. Para Aristóteles, ao
contrário, o mundo que percebemos é suficiente, e nele a perfeição está ao
alcance de todos os homens. A oposição entre os dois filósofos gregos – ou
entre a supremacia das ideias (idealismo) ou das coisas (realismo) – marcaria
para sempre o pensamento ocidental.
Lógica.
As obras de Aristóteles sobre lógica são chamadas, em conjunto,
Organon, que significa instrumento, porque investiga o pensamento,
instrumento do conhecimento.
35
FILOSOFIA JURÍDICA
O Organon abrange As Categorias, As Analíticas Anterior e Posterior,
Os Tópicos e Sobre a Interpretação. Aristóteles foi o primeiro filósofo a analisar
o processo pelo qual se pode, através da lógica, inferir que certas proposições
são verdadeiras, a partir do fato de que certas outras proposições também o
são. Acreditava que esse processo de inferência lógica se baseava em uma
forma de argumento, a que chamou silogismo.
Em um silogismo, argumenta-se ou infere-se logicamente que uma
proposição é verdadeira, pelo fato de duas outras proposições serem
verdadeiras. Por exemplo, dos fatos de que todos os homens são mortais e
Sócrates é um homem, pode-se logicamente argumentar que Sócrates é
mortal. O silogismo continuou a desempenhar importante papel na filosofia
posterior.
Filosofia da Natureza.
Para Aristóteles, o aspecto mais impressionante da natureza eram as
mudanças. Em sua Física, chegou a definir a filosofia da natureza como o
estudo das coisas que mudam. Aristóteles dizia que, para compreender a
mudança, deve-se distinguir entre a forma e a matéria de uma coisa. Por
exemplo, uma escultura pode ter a forma de um homem e ter o bronze como
matéria. Aristóteles acreditava que a mudança consiste essencialmente no fato
de a mesma matéria adquirir nova forma. Em nosso exemplo, ocorre mudança
quando a escultura de bronze é moldada em nova forma.
Para melhor compreensão das mudanças, Aristóteles estudou suas
causas: materiais, eficientes, formais, finais. A causa material da escultura é o
material de que é feita. Sua causa eficiente é a atividade do escultor que a faz.
Sua causa formal é a forma em que o bronze é moldado. Sua causa final é o
plano ou projeto que o escultor tem em mente.
Aristóteles estudou o movimento como uma espécie de mudança, e
escreveu sobre o movimento dos corpos celestes em sua obra Do Céu. Em Da
Geração e Corrupção, investigou as alterações que ocorrem quando alguma
coisa parece ser criada ou destruída.
A filosofia de Aristóteles sobre a natureza estende-se à psicologia e à
biologia. Em Da Alma, investigou as várias funções da alma e a relação entre a
alma e o corpo. Aristóteles foi o primeiro grande biologista do mundo.
Colecionou uma vasta quantidade de informações acerca da variedade,
estrutura e comportamento de animais e vegetais. Analisou as partes dos
organismos vivos teleologicamente, isto é, buscando suas finalidades.
Metafísica.
Em sua Metafísica, Aristóteles tentou desenvolver uma ciência das
coisas que nunca mudam, investigando os princípios básicos e mais gerais da
realidade e do conhecimento. Considerando que a mais importante dessas
coisas imutáveis é Deus, Aristóteles às vezes chamava essa ciência de
teologia, o estudo de Deus. Também chamava a esse ramo de sua filosofia a
36
FILOSOFIA JURÍDICA
primeira filosofia, em razão de sua importância fundamental. Aristóteles,
pessoalmente, nunca usou o nome metafísico, que literalmente significa depois
da física.
Esse nome foi dado àquela obra, séculos mais tarde, simplesmente
porque se seguia à Física na edição escrita das obras de Aristóteles. Mas a
palavra metafísica passou a significar qualquer estudo filosófico dos princípios
básicos de realidade e conhecimento. O termo é também usado comumente no
sentido de transcendência.
Crítica Literária.
A Poética de Aristóteles foi provavelmente à obra que, considerada
isoladamente, exerceu maior influência em toda a crítica literária. A Poética
examina a natureza da tragédia, e toma como primeiro exemplo a tragédia
Édipo Rei, de Sófocles.
Aristóteles acreditava que a tragédia afeta profundamente o espectador,
despertando-lhe as emoções de piedade e medo, para depois purificá-lo e livrálo dessas emoções. A esse processo Aristóteles deu o nome de catarse.
O Lugar de Aristóteles no Pensamento Ocidental.
Após a morte de Aristóteles, sua filosofia continuou a ser ensinada na
escola Peripatética por uma longa série de continuadores. Um desses, Critolau,
foi para Roma em 155 a.C. e proporcionou aos romanos seu primeiro contato
com a filosofia grega.
Cerca de 50 a.C., Andronico de Rodes publicou as obras de Aristóteles.
Essa edição deu grande estímulo à análise da filosofia aristotélica,
particularmente em Alexandria.
Entre os anos 500 e 1100 de nossa era, o conhecimento da filosofia de
Aristóteles quase desapareceu totalmente no Ocidente. Durante esse período,
foi preservado pelos eruditos árabes e sírios, que tornaram a introduzi-lo na
cultura cristã da Europa ocidental nos séculos XII e XIII.
Aristóteles gozou de enorme prestígio nessa época. Alguns dos maiores
eruditos cristãos e árabes da Idade Média consideravam que a obra de
Aristóteles continha à soma total do conhecimento humano.
Santo Tomás de Aquino, um dos mais influentes filósofos da Idade
Média, considerava Aristóteles O Filósofo. Dante Alighieri, talvez o maior poeta
da Idade Média, chamava Aristóteles de O Mestre dos Que Sabem.
A autoridade de Aristóteles tem declinado desde a Idade Média, mas
muitos filósofos do período moderno muito lhe devem. A extensão da influência
de Aristóteles é difícil de avaliar, porque muitas de suas idéias foram
absorvidas pela linguagem da ciência e da filosofia.
Cultivo da perfeição
“A educação, para Aristóteles, é um caminho para a vida pública”. Cabe
à educação a formação do caráter do aluno. Perseguir a virtude significaria, em
todas as atitudes, buscar o “justo meio”. A prudência e a sensatez se
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FILOSOFIA JURÍDICA
encontrariam no meio-termo, ou medida justa – “o que não é demais nem muito
pouco”, afirma Aristóteles.
Um dos fundamentos do pensamento aristotélico é que todas as coisas
têm uma finalidade. É isso que, segundo o filósofo, leva todos os seres vivos a
se desenvolver de um estado de imperfeição (semente ou embrião) a outro de
perfeição (correspondente ao estágio de maturidade e reprodução). Nem todos
os seres conseguem ou têm oportunidade de cumprir o ciclo em sua plenitude,
porém. Por ter potencialidades múltiplas, o ser humano só será feliz e dará sua
melhor contribuição ao mundo se desfrutar das condições necessárias para
desenvolver o talento. A organização social e política, em geral, e a educação,
em particular, têm a responsabilidade de fornecer essas condições.
A verdade científica
A segunda inovação de Aristóteles foi ao campo da lógica. De acordo
com o filósofo, determinar uma verdade comum a todos os componentes de um
grupo de coisas é a condição para conceber um sistema teórico. Para a
construção de tal conhecimento, Aristóteles não se satisfez com a dialética de
Platão, segundo a qual o caminho para chegar à verdade era a depuração dos
argumentos e pontos de vista por intermédio do diálogo.
Aristóteles quis criar um método mais seguro e desenvolveu o sistema
que ficou conhecido como silogismo. Ele consiste de três proposições – duas
premissas e uma conclusão, que para ser validada, decorre das duas
anteriores necessariamente, sem que haja outra opção. Exemplo clássico de
silogismo é o seguinte. Todos os homens são mortais. Sócrates é um homem.
Portanto, Sócrates é mortal. Isso não basta, porém, para que a lógica se torne
ciência.
Um silogismo precisa partir de verdades, como as contidas nas duas
proposições iniciais. Elas não se sujeitam a um raciocínio que as demonstre.
Demonstram-se a si mesmas na realidade e são chamadas de axiomas. A
observação empírica – isto é, a experiência real – ganha, assim, papel central
na concepção de ciência de Aristóteles, em contraste com o pensamento de
Platão.
Imitação, o princípio do aprendizado.
Aristóteles não era, como Platão, um crítico da sociedade e da
democracia de Atenas. Ao contrário, considera a família como se constituía na
época o núcleo inicial da organização das cidades e a primeira instância da
educação das crianças.
Atribuía, no entanto, aos governantes e aos legisladores o dever de
regular e vigiar o funcionamento das famílias para garantir que as crianças
crescessem com saúde e obrigações o princípio do aprendizado seria a
imitação.
Segundo ele, os bons hábitos se formavam nas crianças pelo exemplo
dos adultos. Quanto ao conteúdo dos estudos, Aristóteles via com
desconfiança o saber “útil”, uma vez que cabia aos escravos exercer a maioria
dos ofícios, considerados indignos dos homens livres.
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FILOSOFIA JURÍDICA
Charge desenhada para livro didático do curso a distância de Filosofia da
Unisulvirtual – Educação Superior a Distância
“Lembrando aos senhores (as) que este material é resumo das
referencias bibliográfica já mencionados em sala de aula”.
Para melhor aprendizado é necessário à leitura dos livros
citados nas referencias bibliográficas.
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