OVOS FRITOS EM 2100 O aquecimento global está aí batendo à nossa porta. Parece que veio para ficar. E o que mais me assusta nessa história toda são as atitudes dos cientistas que já não falam em evitá-lo ou fazê-lo retroceder, mas em adaptar a nossa vida ao que entendem inevitável. Há nessas ações, a meu ver, a lógica capitulacionista da irreversibilidade. Eu explico melhor a partir de uma notícia que li na internet e que transcrevo parte dela: “O Ministério da Agricultura do Japão anunciou que desenvolverá um novo tipo de arroz resistente ao calor e à falta de água, em antecipação a períodos de escassez ocasionados pelo aquecimento global. A medida faz parte de um estudo que prevê quedas na produção de arroz e perdas de florestas se os níveis de dióxido de carbono na atmosfera duplicarem e o aumento do nível de mercúrio, segundo a agência Kyodo”. A notícia tratava ainda de percentagens sobre o aumento do nível de dióxido de carbono na atmosfera até o final do século, mas a mim, leigo como a maioria dos que a leram, causou um profundo mal-estar. Não consegui aplaudir os esforços dos cientistas em tentar tirar coelhos da cartola para que a espécie humana continue sobrevivendo malgrado os estragos que causa ao planeta. Estamos mesmo com os dias contados ou vamos nos adaptar e sobreviver? Apesar de toda a inteligência, vamos perecer como os dinossauros? São questões que alarmam a todos nós hoje, ainda é cedo para ter respostas, e alarmarão ainda muito mais nossos netos daqui a 30 ou 40 anos se em vez de providências para frear essa insanidade que é a poluição e a devastação de nosso planeta, preferirem paliativos para conviver com ela. Temo que realizem a proeza de desenvolver não somente um arroz mais resistente ao calor, mas, aproveitando o excessivo calor do aquecimento global, consigam com que esse cereal seja já produzido cozido. Enquanto deixava minhas preocupações tomarem conta de mim e divagava em devaneios, meu filho - que dormia no sofá - acordou e veio ter comigo em busca de aconchego. Tem dez anos e é um dos que vai herdar esse magnífico planeta e as transformações perpetradas por nós que lentamente lhe vão alterando a face. Ele veio, esfregando o olho com as costas da mão, ainda sonolento e bocejou longamente enquanto se aninhava em meu colo. Olhou-me e sorriu agradecido pela receptividade e o carinho recebido. Mas disse algo que me deixou sombrio e pensativo: “Pai, eu sonhei que em 2100 as galinhas vão botar ovos fritos.” Franzi o cenho, não disse nada a ele, mas imaginei cá com os meus botões: “Faz sentido”.