EXMO. SR. DR. DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO TRIBUNAL

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EXMO. SR. DR. DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE
JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO.
O DEFENSOR PÚBLICO abaixo assinado, no uso de
suas atribuições legais, com fundamento no artigo 5º, LXV e LXVIII, da
CR/88 e artigo 648, II, do CPP, vem, por meio desta, impetrar ordem de
HABEAS CORPUS
(COM EXPRESSO PEDIDO DE CONCESSÃO LIMINAR DA ORDEM)
em favor de XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX, atualmente custodiada na
Penitenciária Talavera Bruce, localizada no Complexo de Gericinó (Bangu,
Rio de Janeiro), apontando como autoridade coatora o JUÍZO DA XX VARA
CRIMINAL DA COMARCA DE XXXXXXXXXXXXXX, pelos fatos e
fundamentos que passa a expor.
I. INTRÓITO:
1.
A paciente se encontra presa desde dia 5 de Julho de
2015, eis que detida em razão de suposta situação de flagrância.
2.
Em 1º/12/2015 foi proferida sentença condenatória, a
qual entendeu que a paciente cometeu a conduta descrita no art. 157, §2º, II
do Código Penal, nos seguintes termos:
“(transcrever o conteúdo essencial da sentença condenatória)”. grifamos
3.
Ao afirmar que persistem os motivos que ensejam a
manutenção da custódia cautelar, o Juízo da xª Vara Criminal da Comarca
de XXXXXXXX caracteriza-se como autoridade coatora na medida em que a
paciente encontra-se, hoje, no 7º mês de gestação (29ª semana) –
conforme laudo anexado – fazendo jus, portanto, à PRISÃO
DOMICILIAR, conforme art. 318, IV do Código de Processo Penal.
Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro – Sede - Avenida Marechal Câmara, 314, Castelo, Centro,
CEP: 20020-080, Rio de Janeiro – RJ. Telefones: (21) 2332-6354/6190 /6224 Fax:2332-6217
II. PRETENSÃO:
4.
O presente habeas, apoia-se, portanto, no fato de que,
grávida, no 7º mês de gestação, quase todos cumpridos no cárcere, tem
direito à substituição da preventiva por prisão domiciliar (CPP, art. 318, IV).
5.
Some-se a estes singelos motivos, ad argumentandum
tantum, a presunção constitucional de não-culpabilidade até o trânsito em
julgado da sentença penal condenatória. Tudo a recomendar que lhe seja
concedido o direito subjetivo, senão de recorrer em liberdade, ao menos
de fazê-lo na condição de presa domiciliar.
6.
Com o advento da Lei nº 13.257/16, o conteúdo
normativo do inciso IV passou a ser ainda mais incisivo, não se
exigindo mais nada além da comprovação da gestação. Eis o atual teor
do art. 318 do Código de Processo Penal no ponto em análise:
Art. 318. Poderá o juiz substituir a prisão preventiva pela domiciliar
quando o agente for:
(...)
IV – gestante (redação dada pela Lei 13.257/16)1;
(...)
Parágrafo único. Para a substituição, o juiz exigirá prova idônea dos requisitos
estabelecidos neste artigo. (redação dada pela Lei 13.257/16)
ENCARCERAMENTO DE MULHERES GRÁVIDAS NO ESTADO DO RIO
DE JANEIRO. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. RECRUDESCIMENTO
PUNITIVO VINCULADO AO GÊNERO:
7.
A paciente, como já se sabe, encontra-se na 29ª
semana de gestação, o que exige acompanhamento detido. Tal
circunstância é de extrema importância na análise da pretensão ora
deduzida e deve ser levada em consideração na busca de alternativas ao
encarceramento da mulher gestante.
A redação anterior do inciso IV assim dispunha: “gestante a partir do 7º (sétimo) mês de gravidez
ou sendo esta de alto risco”.
1
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8.
São
notórias
as
condições
deploráveis
de
encarceramento das mulheres no Estado do Rio de Janeiro. O cenário de
omissão sistemática do Estado na garantia da integridade das presas
ensejou, inclusive, a propositura de ação coletiva por parte da Defensoria
Pública (0220470-75.2014.8.19.0001), no intuito de assegurar minimamente
atendimento médico especializado às mulheres privadas de liberdade
(ginecológico e obstétrico).
9.
Além disso, em recente inspeção do Núcleo de
Direitos Humanos da Defensoria Pública no Presídio Talavera Bruce,
realizada aos 11 de novembro de 2015 (DOC. 1), foi constatado, por
exemplo, que (i) as presas grávidas são alocadas em celas sem qualquer
acomodação específica para as suas necessidades; (ii) recebem a mesma
alimentação, sem diferenciação, do coletivo geral de presas; (iii) têm acesso
limitado à água potável; (iv) são transportadas às unidades de saúde na
viatura comum do SOE/SEAP, algemadas, e não em ambulância; (v) estão
sujeitas ao isolamento em cela infecta, escura e quente; (vi) dependem de
um longo tempo de espera e de muita insistência para receberem
atendimento médico de urgência.
10.
A administração prisional, em suma, não destina
qualquer política específica de acolhimento às mulheres grávidas privadas
de liberdade, o que resulta nos abomináveis episódios de horror relatados à
equipe do Núcleo de Defesa de Direitos Humanos na referida visita, dentre
os quais destacamos pelo menos dois partos realizados no interior das
celas da Penitenciária nos últimos meses: o primeiro, realizado pelas
próprias detentas, que acudiram a companheira de cela e tiveram de
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desenrolar o cordão umbilical do pescoço do recém-nascido; e o
segundo, divulgado amplamente na mídia nacional2, o de uma gestante
que foi colocada na solitária e ali deu à luz, em total abandono, apesar
dos gritos de socorro. Não desconsideremos os relatos de partos que
ocorreram no interior das viaturas do SOE/SEAP.
11.
Ora, é inegável que as mulheres grávidas privadas
de liberdade encontram especiais dificuldades para, em toda sua plenitude,
exercer perante o sistema de justiça os direitos reconhecidos pelo
ordenamento jurídico e estão no epicentro da convergência de fatores
diversos de vulnerabilidades3 (gênero, gestação, privação de liberdade,
situação de pobreza, pertencimento a grupo étnico racial subalternizado
etc.). A consequência desta constatação é o reforço do dever estatal de
proteção destes sujeitos, como se extrai das Regras de Brasília sobre o
Acesso à Justiça das Pessoas em Condição de Vulnerabilidade e da
jurisprudência do sistema internacional de proteção de direitos humanos.
12.
Apenas a partir do olhar atento do julgador,
abraçando sua função constitucional de garantidor de direitos fundamentais,
é possível combater a discriminação de gênero no sistema prisional,
desmantelando a situação de exclusão em que se encontram as “mulheres
2
Fato noticiado em http://oglobo.globo.com/rio/juiz-da-vep-pede-afastamento-de-diretora-do-talavera-bruce17882963, acesso aos 23/11/2015, às 16h20min.
3
Valemo-nos aqui do conceito de vulnerabilidade contido na seção 2a das Regras de Brasília sobre Acesso à
Justiça das pessoas em situação de vulnerabilidade, documento elaborado no seio da Conferência Judicial
Ibero-americana, no intuito de orientar a promoção de políticas públicas que garantam o acesso à justiça das
pessoas que encontram especiais dificuldades de exercitar com plenitude perante o sistema de justiça os
direitos que lhes são conferidos pelo ordenamento jurídico. As chamadas “100 Regras de Brasília”
recomendam ainda uma série de medidas relacionadas ao trabalho cotidiano de todos os operadores do
sistema judiciário, com o fito de concretizar a melhoria das condições de acesso à justiça das pessoas em
condições de vulnerabilidade.
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invisíveis”4 e evitar que a condição de mulher seja um fator de agravamento
da sanção penal.
PROTEÇÃO DAS VIDAS EM JOGO (FETO E GESTANTE) NO DIREITO
CONSTITUCIONAL BRASILEIRO E NO DIREITO INTERNACIONAL DOS
DIREITOS HUMANOS:
13.
Aprisionar gestantes em condições indignas e
desumanas tal qual se tem observado no Estado do Rio de Janeiro
representa, sem dúvida alguma, violação da dignidade humana, da vida, da
integridade psicofísica e do direito a não ser submetido a tratamento cruel,
desumano ou degradante, em violação frontal do disposto na Constituição
Cidadã de 1988, que erigiu a proteção da pessoa humana como finalidade
última do Estado Brasileiro (art. 1o, III, art. 5o, incisos III, X, XLVII, alínea “e”,
e XLIX) e em contrariedade ainda aos arts. 3o e 14 da Lei de Execução
Penal.
14.
Como se não bastassem os direitos fundamentais
da mulher presa, o princípio constitucional da intranscendência das
penas (art. 5o, inciso XLV, CRFB/88) também resta indiscutivelmente
vulnerado pelo tratamento degradante dispensado às grávidas no sistema
prisional, uma vez que se impõe, por via reflexa, ofensa à integridade física e
à vida do nascituro, que também é tutelada no ordenamento jurídico
brasileiro (inclusive por meio do tipo penal do aborto).
4
A expressão é da mestra em Direito pela PUC Rio, Débora Cheskys, que defendeu a dissertação Mulheres
Invisíveis: uma análise da influência dos estereótipos de gênero na ida de mulheres encarceradas. “A
discriminação de gênero, quase sempre, passa despercebida, e, quando atinge uma categoria de mulheres
discriminada por outros fatores, posta à margem da sociedade por terem cometido crimes e sem qualquer
representação política relevante, torna essa categoria de mulheres invisível, à medida em que quase nenhuma
preocupação política, jurídica ou social é dispensada a elas”.
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15.
Já no plano do Direito Internacional dos Direitos
Humanos, encontramos vasto arcabouço normativo para a proteção
diferenciada das mulheres grávidas privadas de liberdade, inclusive no que
diz respeito à excepcionalidade de sua prisão.
16.
Dentre as Regras Mínimas para o Tratamento dos
Reclusos da ONU, destacamos os itens 22.1 e 23.1:
22.1. Cada estabelecimento penitenciário terá à sua disposição os
serviços de pelo menos um médico qualificado, que deverá ter certos
conhecimentos de psiquiatria. Os serviços médicos deverão ser organizados
em estreita ligação com a administração geral de saúde da comunidade ou
nação. Deverão incluir um serviço de psiquiatria para o diagnóstico, e em
casos específicos, para o tratamento de estados de anomalia.
23.1. Nos estabelecimentos prisionais para mulheres devem existir
instalações especiais para o tratamento de presas grávidas, das que
tenham acabado de dar à luz e das convalescentes. Desde que seja
possível,
deverão
ser
tomadas
medidas para que o parto ocorra em um hospital civil. Se a criança nascer
num estabelecimento prisional, tal fato não deverá constar no seu registro
de nascimento.
17.
Já as Regras de Bangkok (normas internacionais
para o tratamento de mulheres encarceradas extraídas da 65a Assembléia
da Organização das Nações Unidas) preconizam:
Regra 5
A acomodação de mulheres presas deverá conter instalações e materiais
exigidos para satisfazer as necessidades de higiene específicas das
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mulheres, incluindo absorventes higiênicos gratuitos e um suprimento
regular de água disponível para cuidados pessoais das mulheres e crianças,
em particular mulheres que realizam tarefas na cozinha e mulheres
gestantes, lactantes ou durante o período de menstruação.
Regra 22
Não se aplicarão sanções de isolamento ou segregação disciplinar a
mulheres gestantes, nem a mulheres com filhos/as ou em período de
amamentação.
Regra 42
1. Mulheres presas deverão ter acesso a um programa amplo e equilibrado
de atividades que considerem as necessidades específicas de gênero.
2. O regime prisional deverá ser flexível o suficiente para atender às
necessidades de mulheres gestantes, lactantes e mulheres com filhos/as.
Nas prisões serão oferecidos serviços e instalações para o cuidado das
crianças a fim de possibilitar às presas a participação em atividades
prisionais.
3. Haverá especial empenho na elaboração de programas apropriados para
mulheres gestantes, lactantes e com filhos/as na prisão.
Regra 48. 1.
Mulheres gestantes ou lactantes deverão receber orientação sobre dieta e
saúde dentro de um programa a ser traçado e supervisionado por um
profissional da saúde qualificado. Deverão ser oferecidos gratuitamente
alimentação adequada e pontual um ambiente saudável e oportunidades
regulares de exercícios físicos para gestantes, lactantes, bebês e crianças.
Regra 64
Penas não privativas de liberdade para as mulheres gestantes e
mulheres com filhos/as dependentes serão preferidas sempre que for
possível e apropriado, sendo a pena de prisão considerada apenas
quando o crime for grave ou violento ou a mulher representar ameaça
contínua, sempre velando pelo melhor interesse do/a filho/a ou
filhos/as e assegurando as diligências necessárias para seu cuidado.
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18.
Dos Princípios e Boas Práticas para a Proteção das
Pessoas Privadas de Liberdade nas Américas – Resolução n.º 01/08 da
Comissão Interamericana de Direitos Humanos – extraímos o dever estatal
de dispensar proteção especial às presas gestantes, como decorrência
do direito à igualdade como não discriminação:
Princípio II
Igualdade e não discriminação
Em nenhuma circunstância as pessoas privadas de liberdade serão
discriminadas por motivos de raça, origem étnica, nacionalidade, cor, sexo,
idade, idioma, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional
ou social, posição econômica, nascimento, deficiência física, mental ou
sensorial, gênero, orientação sexual ou qualquer outra condição social.
Será, por conseguinte, proibida qualquer distinção, exclusão ou restrição
que tenha por objetivo ou promova a redução ou anulação do
reconhecimento,
gozo
ou
exercício
dos
direitos
internacionalmente
reconhecidos às pessoas privadas de liberdade. Não serão consideradas
discriminatórias
as
medidas
que
se
destinem
a
proteger
exclusivamente os direitos das mulheres, em especial as mulheres
grávidas ou as mães lactantes; das crianças; dos idosos; das pessoas
doentes ou com infecções, como o HIV/AIDS; das pessoas com deficiência
física,
mental
ou
sensorial;
bem
como
dos
povos
indígenas,
afrodescendentes e minorias. Essas medidas serão aplicadas no âmbito da
lei e do Direito Internacional dos Direitos Humanos e estarão sempre
sujeitas ao exame de um juiz ou outra autoridade competente, independente
e imparcial.
Princípio X
Saúde
As mulheres e as meninas privadas de liberdade terão direito de acesso a
atendimento
médico
especializado,
que
corresponda
a
suas
características físicas e biológicas e que atenda adequadamente a suas
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necessidades em matéria de saúde reprodutiva. Em especial, deverão
dispor de atendimento médico ginecológico e pediátrico, antes,
durante e depois do parto, que não deverá ser realizado nos locais de
privação de liberdade, mas em hospitais ou estabelecimentos
destinados a essa finalidade. Caso isso não seja possível, não se
registrará oficialmente que o nascimento ocorreu no interior de um local de
privação de liberdade. Os estabelecimentos de privação de liberdade para
mulheres e meninas deverão dispor de instalações especiais bem como de
pessoal e recursos apropriados para o tratamento das mulheres e meninas
grávidas e das que tenham recém dado à luz.
DAS ALTERNATIVAS AO APRISIONAMENTO DA MULHER GRÁVIDA.
DEVER
ESTATAL
DE
PROTEÇÃO
DIFERENCIADA
DAS
ESPECIFICIDADES DE GÊNERO:
19.
Na busca por reverter a dramática realidade
carcerária nacional, o Conselho Nacional de Justiça, o Ministério da Justiça e
o próprio Supremo Tribunal Federal5 têm adotado medidas integradas para
minimizar os danos do encarceramento em massa, com a adoção de
relevantes medidas, tais como as audiências de custódia, que têm
possibilitado maior apuro na análise da necessidade-adequação da prisão
preventiva, ampliando a aplicação de medidas cautelares diversas da prisão.
20.
No tocante às presas gestantes, mais do que nunca,
exige-se do Poder Judiciário que deixe o lugar contemplativo e asséptico que
5
No julgamento da cautelar solicitada na ADPF 347, a Corte concedeu parcialmente as providências
requeridas para combater a crise prisional do país e determinou que juízes e tribunais passem a realizar
audiências de custódia, no prazo máximo de 90 dias, de modo a viabilizar o comparecimento do preso perante
a autoridade judiciária em até 24 horas contadas do momento da prisão. Os ministros também entenderam que
deve ser liberado, sem qualquer tipo de limitação, o saldo acumulado do Fundo Penitenciário Nacional para
utilização na finalidade para a qual foi criado, proibindo a realização de novos contingenciamentos. Fonte:
portal de notícias do STF http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=299385, acesso
em 23/11/2015, às 16h27min.
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sugere
a
dogmática
processual
penal
tradicional,
para
assumir
definitivamente o nobre papel de guardião dos direitos fundamentais da
pessoa humana.
21.
Releva, quanto ao alcance do disposto no art.
318, IV do Código de Processo Penal
transcrito, mencionar a
fundamentação de recente decisão monocrática proferida em sede de
Habeas Corpus pelo eminente Min. ROGERIO SCHIETTI na qual o mesmo,
amparado no escólio de GUSTAVO BADARÓ (ainda que com as ressalvas
declinadas na decisão) assim fundamenta a concessão da ordem em caráter
liminar:
“Vale registrar a doutrina de Gustavo Badaró, para quem, não obstante a
redação do art. 318 do CPP use o verbo "poderá", demonstrada a
hipótese de incidência desse dispositivo cujo ônus da prova recai
sobre a defesa, é dever do juiz determinar o cumprimento da prisão
preventiva em prisão domiciliar. Confira-se:
‘[...] A Lei 12.403/11 passou a prever a prisão domiciliar. Não se
trata, porém, de uma modalidade autônoma de medida cautelar
pessoa, mas de uma forma especial de cumprir a medida de
prisão preventiva. Trata-se de uma "substituição" da medida
cautelar de prisão preventiva, como deixa claro do caput do art.
318 "Poderá o juiz substituir a prisão preventiva pela domiciliar
quando [...].
A questão não é meramente terminológica, havendo reflexos
práticos em considerar a prisão domiciliar verdadeira
modalidade de prisão. Por exemplo, o tempo de prisão
domiciliar será considerado para fins de detração, nos termos
do art. 42 do CP, que se refere à "prisão provisória". A prisão
domiciliar é, por certo, espécie de prisão provisória. No máximo,
poder-se-ia considerar que a prisão domiciliar (CPP, arts. 317 e
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318) é uma medida substitutiva da prisão preventiva, e não
uma medida alternativa à prisão.
[...] As hipóteses de cabimento da prisão domiciliar, inspiradas em
razões humanitárias, estão previstas no art. 318 do CPP:
[...] Embora o art. 318 utilize o verbo "poderá", é de considerar
que, demonstra a hipótese de incidência do art. 318, o juiz
deverá determinar o cumprimento da prisão preventiva em
prisão domiciliar. Trata-se de direito subjetivo do preso,
independentemente de o preceito empregar o verbo "poder" a
indicar inexistente poder discricionário do juiz. Ou seja, devese ler o "poderá" como deverá.
Para a sua concessão, o ônus da prova incumbirá ao requerente,
normalmente o investigado ou acusado que tenha a prisão
preventiva decretada contra si. Todavia, nada impede que, desde
que no momento em que se decrete a prisão preventiva, o juiz
determine o seu cumprimento em prisão domiciliar, caso a
hipótese legal já esteja demonstrada (p. ex.: se no inquérito
policial já houve cópia da certidão de nascimento ou de
documento de identidade, comprobatório de que o investigado é
maior de 80 anos).’ (Processo Penal. Rio de Janeiro: Campus:
Elsevier, 2012, p. 746-747)
Eu não chegaria, necessariamente, a tal conclusão, porquanto semelhante
interpretação acabaria por gerar uma vedação legal ao emprego da cautela
máxima em casos nos quais se mostre ser ela a única hipótese a tutelar,
com eficiência, situação de evidente e imperiosa necessidade da prisão.
Outrossim, importaria em assegurar a praticamente toda pessoa com prole
na idade indicada no texto legal o direito a permanecer sob a cautela
alternativa.
Feita a ressalva, entendo que, no caso ora examinado, a substituição
da prisão preventiva se justifica, em conformidade com as razões que
passo a expor. (...)
Há que se ressaltar a posição central, em nosso ordenamento
jurídico, da doutrina da proteção integral e do princípio da prioridade
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absoluta, previstos no art. 227 da Constituição Federal, no ECA e,
ainda, na Convenção Internacional dos Direitos da Criança, ratificada
pelo Decreto Presidencial n. 99.710/90.
Nessa quadra, constato a necessidade de, atendidos os requisitos
legais, e em nome da dignidade da pessoa humana e da proteção
integral à criança, deferir a tutela de urgência. (STJ - HC nº 339.356 SP
– Rel. Min. Rogério Schietti Cruz, Publicado em 20.10.2015) – grifamos.
22.
A documentação que instrui o presente não deixa
margem a quaisquer dúvidas de que a manutenção da prisão da paciente
nestas condições é, no mínimo, arriscada, sendo certo que a lei
processual lhe garante, in casu, a prisão domiciliar.
III.
CONCLUSÃO
E
POSTULAÇÃO,
INCLUÍDO
PLEITO
PELA
CONCESSÃO LIMINAR DA ORDEM:
23.
Não há notícia de interposição de apelação pelo
Ministério Público, sendo certo que na presente data a Defensoria Pública
interpõe apelação irresignada com a sentença condenatória.
24.
Nesse diapasão, deve ser conferido à paciente o direito
de recorrer em liberdade, com a imediata expedição de alvará de soltura em
favor da mesma. O fumus boni juris e o periculum in mora estão presentes
no caso em análise. Como se extrai do aqui exposto, a prisão preventiva
não pode subsistir diante da avançada gestação da paciente.
25.
Assim, a aparência de bom direito é inequívoca e os
fatos a serem analisados não comportam qualquer valoração subjetiva
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negativa, bastando conferir o ordenamento jurídico e a jurisprudência dos
Tribunais Superiores.
26.
Por outro lado, há perigo de demora, na medida em que
eventual delonga no processamento e julgamento deste habeas corpus
permitirá que a liberdade da paciente continue a ser cerceada, submetendoo ao regime fechado quando se lhe vislumbra mais justa a substituição
por restritiva de direitos.
27.
Assim, o perigo de dano irreparável é patente,
mormente quando se aduz à trágica equação que se pretende resolver
com a concessão liminar da ordem o fato de que, quando da apreciação
do mérito da apelação interposta, a paciente estará bem próxima do
momento de dar à luz uma criança (feitas as contas, hoje está na 29ª
semana de gestação, repise-se). O nascituro – pelo princípio da
intranscendência (CR, art. 5º, XLV) – nada necessita sofrer a título de pena,
sendo certo que a lei garante seus direitos, assim como os da criança (Lei
8.069/90). E, como é notório, as condições de parto no cárcere e as
circunstâncias periféricas que estão a envolver a logística de
transporte e encaminhamento hospitalar da gestante são quase sempre
insalubres, impróprias e, por tudo isso, evidentemente arriscadas.
28.
Cumpre, portanto, ante o constrangimento consistente
em manter a custódia cautelar da grávida em avançado estado de gestação,
deve-se conceder a ordem do presente habeas corpus em caráter LIMINAR,
para, desde logo, se restabelecer a liberdade do paciente, o que ora se
requer.
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29.
À conta de tais fundamentos, REQUER o impetrante, em
ordem sucessiva, seja concedida a ordem no presente habeas corpus,
inicialmente sob a forma de LIMINAR independente do pedido de
informações, confirmando-a ao final para:
a) autorizar que a paciente recorra em liberdade,
concedendo-lhe LIBERDADE PROVISÓRIA, ainda que acompanhada de
cautelares diversas da prisão, como por exemplo a de monitoração
eletrônica (CPP, art. 319, IX), determinando-se a imediata expedição de
ALVARÁ DE SOLTURA;
b) na eventualidade de não concessão do pleito supra,
que se garanta à paciente a PRISÃO DOMICILIAR na forma do art. 318, IV
do Código de Processo Penal, sob pena de responsabilização pessoal,
expedindo-se o competente ALVARÁ DE SOLTURA.
É o que se espera.
Rio de Janeiro, 9 de Março de 2016.
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