Vivências: Revista Eletrônica de Extensão da URI ISSN 1809-1636 DO CONHECIMENTO QUE TEMOS À INTERVENÇÃO QUE FAZEMOS: REFLEXÃO SOBRE A ATUAÇÃO DA EQUIPE DE SAÚDE FRENTE AO PACIENTE EM FASE TERMINAL E A MORTE1 Knowledge we intervention that we do: reflection on the work of the team of patient health front in phase and death Neila Fabrício ABADI2 Carmen Lucia ZUSE3 RESUMO Este tema foi abordado pela relevância que tem o contato do profissional da área de saúde, especificamente profissionais da Unidade de Terapia Intensiva, frente às situações encontradas no tratamento de pacientes terminais e seus familiares. Na UTI encontra-se uma infinidade de pessoas com doenças graves em fase quase terminal, sendo a morte uma constante. Este estudo teve como objetivo descrever como os profissionais de saúde reagem frente aos familiares dos pacientes em estagio terminal; descrever os sentimentos da equipe ao deparar-se com o agravamento do quadro clínico do paciente; investigar como os profissionais noticiam o agravo ou a morte do paciente a seus familiares e comparar os tipos de informações repassadas pelos diferentes profissionais. O presente estudo teve abordagem qualitativa, tendo como sujeitos 09 profissionais da área da saúde que trabalham na UTI adulto de um hospital de determinado município da Região Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul, no mês de março de 2009. A análise dos dados revelou que a principal sensação entre os profissionais entrevistados foi a de impotência, resumindo o medo da morte, até mesmo o de relutar em pronunciar a palavra morte. Palavras-chave: Morte. Equipe de Saúde. Unidade de Terapia Intensiva. ABSTRACT This topic is being studied due to relevance of the direct contact of a health professional, specially the professionals of the Intensive Therapy Unit when dealing with terminal patients and their families. In any UTI, people with serious illnesses can be found and death is a constant. This research aims to analyze the way health professionals react when confronted with the families involved with the patient; to describe the sentiments of the health professionals when the sickness gets worse; to investigate how the professionals transmit the final outcome of death to the families and to compare the different kinds of information given by the professionals. The present study has a qualitative approach, dealing with 09 professionals who work in a UTI, in a hospital located in this region of Rio Grande do Sul. The research was undertaken in March 2009. The analysis of the data showed that the main sensation among the professionals is of impotence, fear of death, even trying to avoid the utterance of the word death. 1 Artigo apresentado e aprovado no Curso de Graduação em Enfermagem da Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões – URI – Campus Santo Ângelo, Departamento de Ciências da Saúde, como requisito parcial para obtenção do título de Enfermeiro 2 Acadêmica do Curso de Enfermagem da Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões URI, Campus Santo Ângelo/RS. E-mail: [email protected] 3 Membro do GEPESE. Mestre em Saúde e Gestão do Trabalho pela Universidade do Vale do Itajaí-UNIVALI. Professora do Curso de Enfermagem da Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões, campus de Santo Ângelo/RS. Enfermeira da Fundação de Atendimento Sócio Educativo do RS-FASE. E-mail: [email protected] Vivências. Vol.6, N.9: p.96-102, Maio/2010 96 Vivências: Revista Eletrônica de Extensão da URI ISSN 1809-1636 Key words: Death. Health Team. Intensive Therapy Unit. 1 INTRODUÇÃO A morte sempre foi um assunto cercado de tabus e mistérios, mesmo sabendo que a mesma é a única certeza que temos na vida. O processo de morte é crescente, com a diminuição e modificação das funções vitais que termina com a morte do ser humano ( JUNIOR, ROLIN e MORRONE , 2005). Desse modo, a morte é um tema com sinônimo de fracasso para quem atua na área da saúde, isso porque não faz parte do dia-a-dia do mundo familiar. E, continua sendo um grande mistério para o homem. Por isso, é tempo de entender que a morte faz parte da vida, um acontecimento triste, com intensa sensação de perda, onde deve ser respeitado toda dor e sofrimento de qualquer ser humano (COSTA e GAR, 2005). Geralmente os pacientes com diagnóstico previsível de morte, são encaminhados para a Unidade de Terapia Intensiva, neste ambiente recebem cuidados paliativos. Entende-se por cuidados paliativos quando a doença não responde ao tratamento curativo, sobretudo, a prevenção, alívio de sofrimento, controle da dor, suporte bio-psicosócio-espiritual holístico até o final da vida (MADRUGA, 2007). Mesmo estando cientes do grande avanço tecnológico dos dias de hoje, com relação à modernidade dos equipamentos hospitalares, não é suficiente para impedirmos o óbito de um paciente, que ocorre devido inúmeras causas. Por mais que façamos tudo que é necessário para evitar a perda, não depende somente de nós. Nos hospitais, encontra-se uma infinidade de pacientes com doenças graves em fase avançada, sendo a morte, um problema constante. Desse modo, os profissionais de saúde precisam estar preparados para cuidar dessas pessoas e de suas famílias, compreendendo todas as reações e o comportamento apresentado diante da morte, Abadi, N.F.; Zuse, C.L. para poder auxiliá-los de forma eficaz, durante esse processo (COSTA e GAR, 2005). A experiência de perder um ente querido e de sentir o impacto na reorganização da vida, após a morte dessa pessoa, não deve ser vista de forma individual, mas também a nível familiar. Sendo assim, pensando no ciclo de vida da família, cada membro compreende a morte com um significado diferente. Seja um pai, uma mãe, um filho pequeno, a morte na família sempre será um processo tanto grupal, quanto individual (BROMBERG, 2000). Assim sendo, o luto sempre será uma reação à perda de algo afetivamente importante nas nossas vidas. Seja de um ente querido, a perda de emprego, o rompimento de uma relação amorosa, ele vai estar presente com menor ou maior intensidade, como um processo normal de reação a determinadas situações. O isolamento familiar, ou seja, uma impermeabilidade as redes de apoio de amigos, trabalho, pode intensificar ainda mais a sensação de impotência frente a algo mais poderoso, acarretando assim maior tensão emocional, estresse físico e mental. O que não aconteceria, se os familiares buscassem maior apoio para esse tipo de problemas. Um estudo intitulado “O preparo do médico e a comunicação com familiares sobre a morte” revelou que aproximadamente um quarto das famílias mostrou-se insatisfeita com a maneira como foi transmitida a notícia do óbito do familiar, por demonstrar descaso da parte médica neste difícil momento de suas vidas. Este estudo também demonstrou que apenas 18,9% desses profissionais se consideraram aptos a enfrentar essa situação de forma humanizada de acordo com sua formação acadêmica (JUNIOR, ROLIN e MORRONE, 2005). Nesse processo de perda, os profissionais de enfermagem, têm pouco conhecimento para auxiliar, tem suas ações voltadas mais para a parte técnica e prática, com pouco embasamento sobre as reais necessidades dos familiares em relação ao processo de morte 97 Vivências: Revista Eletrônica de Extensão da URI ISSN 1809-1636 e morrer. Por isso, quando se deparam frente a um paciente com alguma doença grave e/ou terminal, eles tentam desempenhar suas tarefas da melhor maneira possível, encontrando dificuldades em confortar a família. Desse modo, quando um profissional de saúde se depara com a morte, é difícil para falar ao familiar que o paciente foi a óbito, que foi feito tudo quanto possível para salvá-lo, sem sucesso. Por mais que estejam “acostumados” com a morte de pacientes todos os dias, mas sempre é um momento difícil. A motivação para realização desse estudo emerge da reflexão de como os profissionais da saúde agem no momento de comunicar a situação de saúde ou até mesmo o óbito de um paciente aos familiares. Acredita-se que este estudo irá contribuir para a melhoria da atuação desses profissionais ao informar o nível de agravo de saúde de um paciente ou até o fato consumado. O local escolhido foi em razão da experiência vivenciada durante a realização de um estágio do curso de enfermagem. 2 OBJETIVOS 2.1 Objetivo Geral Descrever como os profissionais de saúde reagem frente aos familiares do paciente em fase terminal. 2.2 Objetivos Específicos Descrever os sentimentos da equipe ao deparar-se com o agravamento do quadro clínico do paciente; Investigar com os profissionais como eles noticiam o agravo ou a morte do paciente a seus familiares; Comparar os tipos de informações repassadas pelos diferentes profissionais. O presente estudo é de caráter descritivo com abordagem qualitativa, o qual se ocupa das ciências sociais com um nível que não deve ser quantificado, como valores, crenças e atitudes. Esses fenômenos humanos são como parte da realidade social, sendo que o homem distinguese por pensar e compreender suas atitudes, a partir da realidade vivenciada e compartilhada com os demais indivíduos (MINAYO, DESLANDES e ROMEU, 2007). Logo, o objetivo principal do estudo descritivo é delinear as características de uma população que visa estabelecer a reação entre variáveis (GIL, 1999). 3.2 Sujeitos de Estudo Para a consecução do objetivo proposto para este estudo, foram entrevistados 9 (nove) profissionais de saúde que trabalham em diferentes turnos da UTI Adulto, com idades entre 18 e 55 anos, residentes em Santo Ângelo, RS, sendo 7 (sete) do sexo feminino e 2 (dois) do sexo masculino. Dentre os sujeitos entrevistados temos 6 (seis) casados e 3 (três) solteiros. A equipe de saúde desta unidade está composta por 4 (quatro) médicos que trabalham em regime de plantão, 4 (quatro) enfermeiros e 19 (dezenove) técnicos de enfermagem, que trabalham em regime de 36 horas semanais. Eles aceitaram participar do estudo mediante assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. 3.3 Local e Período do Estudo O presente estudo foi realizado na UTI Adulto de um hospital de determinado município da Região Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul, no mês de maio de 2009, conforme agendamento prévio. 3.3.1 A seguir descrevo o local onde desenvolvi meu projeto de estágio 3 PERCURSSO METODOLÓGICO 3.1 Tipos de Estudo Vivências. Vol.6, N.9: p.96-102, Maio/2010 A UTI proporciona atendimento a pacientes de alto risco, com perigo eminente de morte, oferece assistência médica e enfermagem 98 Vivências: Revista Eletrônica de Extensão da URI ISSN 1809-1636 em tempo integral, tendo fácil acesso aos serviços essenciais de imagem e laboratório, além de saídas de emergência, como elevadores e rampa. Conta com 10 (dez) leitos, sendo que um é destinado a pacientes que necessitam de isolamento ou de realizar hemodiálise. Também possui equipamentos que auxiliam os profissionais no cumprimento de suas tarefas, como desfibrilador, respiradores artificiais, monitores cardíacos, entre outros. 3.4 Métodos de Coleta de Dados Os dados foram coletados através de entrevista semi-estruturada, sendo algumas realizadas em local reservado e outras na recepção da unidade com o uso de gravador, mediante consentimento dos sujeitos envolvidos. As entrevistas semi-estruturadas são fundamentadas no uso de guias de entrevistas, onde é obtida uma lista de perguntas ou temas que precisam ser enfocadas durante a mesma. A seqüência exata e o texto das questões não necessitam ser iguais. No decorrer da entrevista, o pesquisador pode se deparar com novos temas, no entanto, o guia compreende varias instruções claras em ralação as principais perguntas realizadas ou ao tema pesquisado (TOBAR, 2004). Para cada sujeito pesquisado foi atribuído um codinome com o mês do ano, do mês de Janeiro a Setembro. 3.5 Considerações Éticas Este estudo foi baseado nos preceitos éticos, respeitando a Resolução 196/96 do CNS, sendo garantido a privacidade e o anonimato dos participantes desta pesquisa. Neste caso foi fornecido aos entrevistados, um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. O estudo somente foi iniciado após o parecer de aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões, bem como, da autorização do responsável legal da instituição hospitalar e da gerente de enfermagem da instituição (BRASIL, 1996) Abadi, N.F.; Zuse, C.L. 3.6 Métodos de Apresentação e Análise de Dados O processo de pesquisa realizado foi um acordo desafiador, com algumas etapas bem definidas, que foram desde a organização do referencial teórico a ser utilizado, a realização das entrevistas e por fim a organização dos discursos orais coletados. Com estes resultados, elaboramos a discussão em tópicos de acordo com as respostas das perguntas dos roteiros de entrevistas por nós definidos no estudo. A análise dos dados aconteceu mediante a análise do conteúdo das falas, organizando os dados com significado definido por frase, expressão ou palavra (LEOPARDI, 2001). 4 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS A análise das respostas à pergunta “Quem noticia aos familiares o agravamento da saúde ou a morte do paciente e de que forma é transmitido?” permitiu a identificação nas falas que a equipe não sabe com clareza a resposta para essa questão, identificando-se a divergência nas respostas. Essa situação concorre às afirmações de Silva e Ruiz (2003) ao esclarecerem que é inconteste o fato de que o profissional em saúde confronta-se, de modo inevitável, com suas próprias convicções e vivências frente à morte, no momento em que informa alguém sobre a morte de parentes, conhecidos e/ou amigos. Abaixo, algumas citações dos informantes: Agravamento é o médico assistente. Óbito eminente é o médico plantonista. Os técnicos de enfermagem ou médico chamam os familiares para dar a notícia do óbito. O óbito não pode ser dado por telefone pois é uma notícia muito grave. Não se sabe quem está do outro lado da linha. Tem que explica essa notícia sempre pessoalmente independente de qualquer coisa. (Fevereiro) O agravamento os técnicos e enfermeiros até podem falar, mas o óbito é exclusivo da equipe médica. Quando o paciente vai a óbito é ligado por um funcionário e pedido para comparecer na UTI, não dizendo o que aconteceu. A forma é verbal, sem muita conversa, pois é um momento difícil, de agonia na sala de recepção mesmo. (Março) 99 Vivências: Revista Eletrônica de Extensão da URI ISSN 1809-1636 Só o médico é autorizado para dar a notícia. A gente liga e diz que houve uma piora, pedindo para o familiar comparecer na UTI. É verbal que transmite a notícia. A gente dá apoio psicológico no momento da visita, tira as dúvidas dentro dos limites. (Julho) Observamos nas falas acima que se tornou rotina que apenas o médico possa dar a notícia, necessitando talvez maiores discussões entre a equipe de saúde desta Unidade sobre atribuições relativas ao tema. Essa fala desarticulada ou omissão por parte de alguns profissionais pode ser interpretada como um bloqueio da comunicação, evidenciando angústia, podendo ser compreendida nesta pesquisa como uma resistência ao abordar a questão da terminalidade. A meta do profissional de saúde é a melhora do paciente, mas ocorrendo o percurso contrário, a morte é encarada sempre como uma derrota. Ao acompanhar o paciente hospitalizado, a equipe de saúde se empenha em lutar contra a doença. Dessa forma, percebe-se que esse seria definido como um fator marcante que eleva a dificuldade de lidar com os pacientes terminais, pois a impossibilidade de cura passa a ser sentida como sinal de fracasso. Ao presenciar o processo de morte, a função de qualquer profissional de saúde é a de propor um ambiente tranqüilo, respeitando sua privacidade, acatando o tempo de despedida, comunicando sutilmente o óbito, favorecendo uma experiência menos dolorosa aos familiares (GUTIERREZ, 2001). Na análise das respostas à segunda pergunta do questionário foi se na UTI existe um local destinado à comunicação da morte do paciente a seus familiares e se os mesmos recebem algum tipo de apoio psicológico. Percebemos que a resposta a essa questão revela que o principal cuidado da equipe de saúde é manter o paciente vivo, não percebendo o familiar do paciente como extensão do tratamento como podemos observar nas falas abaixo: Vivências. Vol.6, N.9: p.96-102, Maio/2010 Não, a notícia do óbito é na recepção mesmo, independente de ter ou não mais pessoas no local. Apoio psicológico tem durante o dia no hospital. Se o familiar passar mal é encaminhado para a emergência. (Janeiro) Não tem lugar apropriado, é na recepção mesmo. Se necessário os familiares terem apoio psicológico a psicóloga atende no hospital. Nós demos apoio psicológico, conforto, mesmo que seja em momento rápido. (Fevereiro) Não tem sala especialmente para dar a notícia de óbito. Nos casos de precisar de apoio psicológico, encaminhamos os familiares para a psicóloga do hospital e se passarem mal é encaminhado ao ambulatório. Nós cuidamos os pacientes em si, da UTI .(Setembro) Observa-se que a comunicação desse ato ainda é tratada com frieza, não sendo oferecido um mínimo de privacidade, tornando o ato mais penoso do que ele realmente já é, o que leva a necessidade de os familiares receberem apoio psicológico para saber como lidar com esse momento (ALVES, KANTORSKI e PRADO, 2003). A humanização do morrer reforça o sentido de que a morte não é algo a ser combatido, pois faz parte do ciclo da vida, mas também temos que ter em mente que o cuidado aos familiares é imprescindível para a tranqüilidade e o acolhimento das mesmas (BORGES et al, 2006). Desse modo há uma maior compreensão de como a vida da família foi modificada pela doença, fazendo com que os profissionais de saúde atendam as necessidades da mesma em todas as dimensões (SMELTZER, BRUNNER & SUDDARTH, 2006). Outra pergunta foi relativa a identificar alguns sentimentos que envolvem os entrevistados no seu cotidiano de trabalho na UTI, citados a seguir: Uma das principais preocupações relatadas nas falas é a de que não se pode 100 Vivências: Revista Eletrônica de Extensão da URI ISSN 1809-1636 envolver emocionalmente com o paciente. Pequenos gestos no ato de cuidar, como um simples toque, um gesto de carinho, faz o paciente apreciar pequenas ações e momentos, dando uma maior qualidade ao tempo de vida que o paciente tem (CARVALHO e MERIGHI, 2005). Os relatos abaixo esclarecem esse pensar: Preocupação, fazer tudo, usar todos os métodos científicos na tentativa de melhorar, independente do paciente. Na maioria das vezes não se sabe nada da vida pessoal do paciente. Não se pode envolver emocionalmente, mas quando é uma criança ou idoso é complicado separar isso. (Fevereiro) rapidamente o seu status social por meio do atestado de óbito (BELLATO e CARVALHO, 2005). A principal sensação entre os profissionais entrevistados foi a de impotência, resumindo o medo da morte, até mesmo o de relutar em pronunciar a palavra morte. Isto resulta no afastamento emocional do paciente, de não ter realizado tudo que estava ao seu alcance, colocando somente as possibilidades terapêuticas como algo que o profissional poderia ter feito, sublimando o lado humano com mecanismos psicológicos de defesa frente ao paciente grave. 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Preocupação, porque é uma busca para a recuperação do paciente. Fizemos de tudo, o possível e o impossível para fazer com que o paciente saia o mais breve da UTI. Ficamos com atenção em qualquer alteração que pode ocorrer e tomamos atitude. (Março) Você tem que estar com a consciência tranqüila de que você fez tudo que estava dentro das possibilidades terapêuticas. Muitas vezes não conseguimos ir contra as leis da natureza, pois o quadro clínico terminal já não está dentro de nossas possibilidades. Acredito que tudo que está ao alcance deve ser feito. (Abril) Percebe-se que as pessoas cada vez mais dão a morte um sentido ocasional nominado-a como doenças, infecções, acidentes. Este fenômeno revela uma tendência grupal de não reconhecer a dimensão necessária que a morte apresenta como necessidade para a continuação da espécie. Em unidades hospitalares, principalmente nas UTIs, onde se está cercado de recursos científicos e tecnológicos, fica cada vez mais difícil para os profissionais perceberem a morte como sendo um avanço natural da vida para os pacientes ali internados, sendo vista pelo profissional pela ótica do fracasso ou da imperícia (SHIMIZU, 2007). Dentro do hospital a equipe de saúde encobre a morte, até mesmo para os familiares, preparando rapidamente o corpo e o passando Abadi, N.F.; Zuse, C.L. Não podemos encarar a morte como o fim da vida terrena e o começo da vida eterna, nos afastando cada vez mais da certeza de que a morte é um processo natural da vida. Percebemos que os profissionais da saúde não estão preparados para encarar a morte como sendo algo que pode acontecer com qualquer paciente em estado grave. Da mesma forma como estado grave não significa exatamente a morte eminente, mas principalmente que a morte não deve ser encarada como falha profissional ou sentimento de que poderia ter feito mais do que realmente se fez. Deve-se sim ter em mente que a humanização da morte deve ser encarada como fato sério, e que isso deve ser discutido com todos os profissionais que estão envolvidos com esse momento, principalmente na hora da comunicação da morte, a qual deve ser em lugar reservado, para que não ocorra exposição desnecessária dos familiares. Também deve ser levado em conta o papel dos cursos de formação desses profissionais no sentido de prepará-los para esse momento, não somente fazendo profissionais para o ato de salvar, pois esquecemos que o ser humano é um ser para a morte. Como profissionais de saúde não podemos somente pensar no cuidado terapêutico realizado com o paciente, mas também no cuidado emocional do mesmo e seus familiares, que ficam desassistidos durante esse processo, e 101 Vivências: Revista Eletrônica de Extensão da URI ISSN 1809-1636 mais ainda após a morte. A vida continua para os familiares, que devem receber cuidados redobrados, visto que não foi apenas mais um procedimento e sim o final de uma vida, que tinha família, amigos e uma séria de variáveis que serão afetados diretamente pelo acontecimento. É nesta perspectiva que se sente a necessidade de discutir mais os temas considerados como tabu, como é o caso da morte, em nosso dia-a-dia e na sociedade em geral. Isso com a intenção de formar cidadãos mais críticos e pensadores dos problemas sociais do mundo. A contribuição de pesquisas em diferentes áreas do conhecimento, nos fornecendo subsídios importantes para compreender a evolução histórica e social da morte e para refletirmos sobre a melhor abordagem do tema no mundo moderno, posicionando-se a favor de um investimento educacional em relação às atitudes diante da morte no meio acadêmico, refletindo diretamente nos futuros profissionais. 6 REFERÊNCIAS Azevedo Norlai Alves And Kantorski, Luciane Prado. A família e o cuidado prestado em domicilio ao paciente em tratamento quimioterápico. Ano: 2003. Disponível em: <http://www.calvados.c3sl.ufpr.br>. Acesso em abr. 2009. Bellato R, Carvalho EC. O jogo existencial e a ritualização da morte. Ribeirão Preto. (SP): Universidade Federal de Mato Grosso; 2005. Borges ADVS, Silva EF, Mazer SM, Toniollo PG, Valle ERM, Santos MA. Percepção da morte pelo paciente oncológico ao longo do desenvolvimento. [Dissertação]: Maringá. (PR): Universidade Estadual de Maringá/UEM; 2006. Brasil. 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