Quanto vale a vida de um ser humano

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Quanto vale a vida de um ser humano?
Infelizmente não existe sociedade rica o suficiente para garantir a toda a população o acesso aos
recursos disponíveis no arsenal da medicina. O custo crescente das novas e sofisticadas armas que
dispomos para combater as doenças estão nos forçando a encarar esta realidade. Como
compatibilizar o uso deste arsenal com um orçamento limitado? O problema é simples de
enunciar mas difícil de resolver. Dada uma quantidade limitada de dinheiro e os tratamentos
disponíveis, qual a melhor maneira de empregar este dinheiro para melhorar a saúde da
população? Que doenças, tratamentos e medidas de prevenção devem ser custeados e para que
pessoas? E o mais difícil, que tratamentos devem ser negados e para que grupos de pacientes?
Estudos que tentam resolver este problema acabam colocando um preço na vida humana. Na
Inglaterra, que possui um dos melhores sistemas públicos de saúde, existe um órgão
governamental independente cuja função é fazer este tipo de recomendação. É o NICE (National
Institute for Health and Clinical Excellence, http://www.nice.org.uk ). Recentemente o NICE
decidiu que só aprovaria tratamentos que prolongam a vida de pacientes com câncer se o custo de
prolongar a vida do paciente por seis meses custasse menos que 22.750 dólares. Em outras
palavras, para o NICE, a vida de um cidadão com câncer não vale mais que 125 dólares por dia.
Para o NICE caso o custo seja maior que US$ 125 o dinheiro é melhor empregado em outros
programas. É interessante compreender o raciocínio por trás do trabalho do NICE.
Imagine um país com um milhão de habitantes em que só existem dois problemas de saúde, uma
doença infecciosa para a qual existe uma vacina e uma doença que requer um transplante de
órgão. Com o orçamento disponível é possível vacinar toda a população conta a doença
infecciosa ou tratar as 10 pessoas que necessitam de transplantes todos os anos. O que você faria?
A decisão parece simples, proteger todas as crianças parece mais importante que salvar as 10
pessoas que necessitam de transplantes. Mas o problema pode se complicar. Imagine que a
doença apesar de desagradável se cure sozinha, como é o caso do sarampo? Talvez seja melhor
fazer os transplantes e salvar 10 vidas. E se agora eu descobrisse que apesar da doença se curar
sozinha, em 0,0001% dos casos ela causa a morte da criança. Sem a vacinação 10 crianças
poderiam morrer. Você escolheria salvar 10 crianças ou 10 adultos? Imagine agora o mesmo
problema em um país como o Brasil, com centenas de doenças, tratamentos, métodos de
diagnóstico e medidas de prevenção. O problema que o NICE tenta solucionar é no mínimo
complicadíssimo, mas sem os estudos do NICE as decisões provavelmente serão tomadas de
maneira totalmente aleatória ou pior guiadas por motivações político-eleitorais.
Quando defrontados com este problema a maioria das pessoas (médicos inclusive) tende a
responder que é necessário aumentar o orçamento da saúde e diminuir o custo dos tratamentos.
Sem dúvida isto mitiga o problema, mas com o custo da saúde crescendo a cada ano e já
consumindo entre 10 e 30% do PIB nos países desenvolvidos será cada vez mais difícil fugir dos
dilemas éticos envolvidos na escolha das vidas devemos salvar e quanto a sociedade esta disposta
a investir para prolongar a vida de cada um de nós.
Mais informações no livro “Who should we treat?” de Christopher Newdick, Oxford University
Press 2005
Fernando Reinach ([email protected])
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