Compreensão da prescrição no Sistema Único de Saúde de um município do sul de Santa Catarina: a identificação dos fatores relacionados à prescrição e ao paciente Talita Aparecida Calegario1, Maria Tereza Mattos Monteiro2, Dayani Galato3 1 – Acadêmicas do Curso de Farmácia e bolsistas do Programa de Iniciação Científica da Unisul (PUIC) 2 – Professora do Curso de Farmácia e Orientadora do projeto de pesquisa Núcleo de Pesquisa em Atenção Farmacêutica e Estudos de Utilização de Medicamentos (NAFEUM), Curso de Farmácia, Universidade do Sul de Santa Catarina (UNISUL) Resumo Objetivo: avaliar a compreensão das prescrições elaboradas no Sistema Único de Saúde de um município do sul de Santa Catarina. Método: Estudo transversal através de entrevista com usuários de 10 unidades de saúde. Resultados: Foram entrevistados 300 pacientes/cuidadores coletando-se dados a respeito da prescrição. O número de medicamentos por prescrição variou de 1 a 11. Os indicadores da OMS demonstraram que 91,2% dos medicamentos estavam prescritos por nome genérico; 84,1% pertenciam a Rename, 81,0% pertencem a Remume, 13,7% eram antibióticos e apenas 0,7% eram injetáveis. Para avaliar a compreensão da prescrição foram avaliados vários critérios, entre eles: consegue ler (59,3%); sabe indicação (80,7%); sabe a dose (73,7%); frequência entre doses (72,3%) e duração do tratamento (72,7%), por fim é importante destacar que foi considerado que houve compreensão da prescrição quando todos os parâmetros anteriores foram respeitados sendo, portanto, de 46,3%. Conclusão: Os resultados apontam para prescrições que apresentam indicadores próximos aos recomendados pela Organização Mundial da Saúde, no entanto, que os pacientes ou cuidadores pouco compreendem. Palavras-chave: Indicadores de prescrição, compreensão da prescrição, adesão ao tratamento Introdução A prescrição médica é um instrumento essencial para a terapêutica, nela devem estar contidos informações de identificação do paciente e do tratamento a ser utilizado, seja ele baseado em medicamentos ou em outras estratégias como orientações de mudanças dos hábitos alimentares (OMS, 1998). Quando indicar medicamentos deverá conter informações como: a dose, a freqüência e a duração do tratamento adequado ao perfil e condição de saúde do paciente (FARIAS et al, 2007; SILVA et al, 2000; OMS, 1998). A falta de informações na prescrição ou a sua compreensão equivocada podem ser consideradas como as principais razões para a não-adesão ao tratamento medicamentoso, fazendo com que a maioria dos pacientes não utilize os medicamentos de forma adequada e com isso, não obtenha o melhor benefício terapêutico (WHO, 2003; OMS, 1998). Um outro ponto que pode ser investigado nas prescrições e que revelam muitos resultados são os Indicadores de Uso de Medicamentos. A Organização Mundial da Saúde (OMS) desenvolveu esses indicadores com o intuito de descrever e avaliar aspectos que afetam a prática clínica nos centros de saúde (OMS 1993). Os indicadores permitem conhecer as práticas terapêuticas correntes, comparar parâmetros entre instituições similares e descrever as necessidades de medicamentos da população atendida, tudo através da análise da prescrição médica (FARIAS et al., 2007). Há ainda a possibilidade de através deles identificar o uso abusivo e desnecessário de antibióticos que causam o desenvolvimento de bactérias muito resistentes e também quantificar as prescrições que contêm medicamentos com o nome genérico, pois essa denominação facilita a educação e a orientação, já que não traz dificuldades de identificação do medicamento (GIROTTO; SILVA, 2006; SANTOS; NITRINI, 2004). Dessa forma, devido à escassez de dados a respeito deste tema, seguida pela possibilidade de fornecer informações sobre a prescrição de medicamentos, ocorreu a motivação para realização deste projeto que tem como objetivo avaliar a compreensão das prescrições elaboradas no Sistema Único de Saúde de um município do sul de Santa Catarina. Métodos Este estudo tem caráter transversal baseado na técnica de entrevista. A população do estudo foi representada por usuários do Sistema Único de Saúde do município em estudo ou por seus cuidadores que aceitarem participar da pesquisa. O município em estudo possui 21 Unidades Básicas de Saúde (UBS), sendo que, inicialmente, foram selecionadas junto a Secretaria Municipal de Saúde, 10 (dez) UBS distribuídas geograficamente. Estas foram visitadas em dias alternados, sendo entrevistados pacientes ou cuidadores até completar a amostragem que segundo dados da Organização Pan-Americana de Saúde, é necessário realizar uma amostragem onde sejam avaliadas 30 prescrições por Unidade de Saúde (PAHO, 1995), sendo adotado este número em cada uma das Unidades, totalizando 300 entrevistas. O instrumento adotado possibilitou a coleta de dados relacionados ao perfil dos entrevistados, à compreensão da prescrição segundo Silva e colaboradores (2000) e aos indicadores da OMS (OMS, 1993). Os dados coletados foram inseridos em um banco de dados no programa EpiData e analisados no programa EpiInfo. Este projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em pesquisa da Universidade do Sul de Santa Catarina. Resultados Os resultados parciais (obtidos através do banco) indicam que das 300 entrevistas realizadas, 85,0% foram realizadas com os pacientes e o restante com cuidadores. Dos pacientes avaliados 66,3% eram representados por mulheres, a idade dos pacientes variou de 0,9 a 84 anos com idade média de 48,0 (±17,3) anos. A renda obtida é relativamente baixa comparada com outros estudos de utilização de medicamentos, variando de A2 a E, sendo as mais prevalentes a C1 (28,7%), seguido de D (23,3%), B2 (23,0%) e C2 (21,3%). Quanto à escolaridade verificou-se que a mesma variou de zero a 22 anos de estudo, tendo como média 6,4 (± 3,9) anos. O número de medicamentos por prescrição variou de 1 a 11, sendo que comumente as prescrições possuíam até três medicamentos (90,4%). Destaca-se que a grande maioria (99,0%) dos entrevistados referiu estar utilizando pelo menos um medicamento no momento da entrevista. Analisando as prescrições segundo os indicadores da OMS observou-se que dos medicamentos prescritos: 500 (91,2%) estavam prescritos por nome genérico; 461 (84,1%) pertenciam a Rename, 443 (81,0%) pertencem a Remume, 41 (13,7%) possuíam antibióticos e apenas 2 (0,7%) continham medicações injetáveis. Para avaliar a compreensão da prescrição foram avaliados vários critérios, entre eles: consegue ler (59,3%); sabe indicação (80,7%); sabe a dose (73,7%); frequência entre doses (72,3%) e duração do tratamento (72,7%), por fim é importante destacar que foi considerado que a compreensão quando todos os parâmetros anteriores foram respeitados sendo, portanto, de 46,3%. Discussão Quanto aos indicadores de prescrição identificou-se que os mesmos estão de acordo com as recomendações da OMS, no entanto, chama-se a atenção para a prescrição de medicamentos fora da Remume (19,3%), isto causa a falta de acesso aos mesmos e muitas vezes podem levar a judicialização da saúde. A falta de compreensão que deveria ser uma exceção na verdade não o é segundo os resultados deste trabalho, em que se observa que mais da metade dos pacientes não compreende a prescrição como um todo. Num estudo realizado por Silva e colaboradores (2000) em um ambulatório hospitalar universitário, observou-se que cerca de 20% e 30% dos pacientes entrevistados demonstraram não saber a dose e a freqüência de administração dos medicamentos contidos na prescrição, respectivamente. Isto ainda é mais relevante quando se identificou que a maioria desses pacientes já estava utilizando os medicamentos prescritos. Esta falta de compreensão a respeito da terapêutica prescrita pode ter como conseqüência os retornos precoces aos consultórios, a realização de novos exames, o agravamento de quadros e o surgimento de possíveis seqüelas (FOLLADOR, 2001). Isso não é ruim apenas ao paciente, que terá seu tratamento prejudicado, como também à gestão de saúde do município, que terá que elevar os gastos para suprir as necessidades dos pacientes (MARIN et al., 2003). Devido a isso autores como Walson e colaboradores (1993) citam a importância de se detalhar a forma de utilização da medicação prescrita de forma legível, bem como a de explicar qual é a doença e o que se espera dos medicamentos. Isso porque o bom relacionamento do prescritor e do paciente influenciará na compreensão da prescrição e na adesão ao tratamento. Assim, além de evidenciar que a não-adesão existe é de importância determinar suas causas, para alertar os envolvidos em todo o processo, desde o prescritor até o dispensador. Referências FARIAS, A.D.; CARDOSO, M.A.A.; MEDEIROS, A.C.D.; BELÉM, L.F. Indicadores de prescrição médica nas unidades básicas de Saúde da Família no município de Campina Grande, PB. Revista Brasileira de Epidemiologia, v. 10, n. 2, p. 149-156, 2007. 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