Contextualizacao_Musicas_Regime_Militar

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O Golpe Militar
Era 1964. O mundo vivia os efeitos da tensão gerada pela Guerra Fria que, na América Latina,
fomentava ameaças de subversão interna e de guerra revolucionária, ambas oriundas de países como
Cuba, que inspiravam o ‘perigo comunista’ no continente. È nesse contexto que o Brasil sofre o golpe
militar que tira do poder o então presidente João Goulart, que vinha passando por freqüentes desgastes. A
partir daí, instaura-se um regime militar de governo, que vigoraria até 1985.
A MÚSICA
Durante o regime, a censura à produção cultural passa a perseguir qualquer idéia que fosse
contrária aos interesses dos militares – mesmo aquela que não tivesse conteúdo diretamente político.
Atinge, em cheio, o teatro, o cinema, a literatura, a imprensa e a música.
Nadando contra a maré, o cenário artístico cresce e se profissionaliza. Grandes festivais ascendem
com suas músicas de protesto . Os órgãos censores, porém, não se interessam por divergências estéticas
ou
ideológicas.
Ações
são
intensificadas
e
tomam
forma
nada
flexível.
Com o País nas mãos, os militares implantam um projeto repressivo composto por um forte
esquema de informações intragoverno. No artigo Prezada Censura: cartas ao regime militar, o historiador
Carlos Fico explica esse plano com base no conteúdo da seqüência de atos: “O grupo militar conseguiu
impor, ainda durante o governo de Castello Branco, o Ato Institucional n. 2, que reabriu a temporada de
punições (o primeiro ato institucional permitiu punições por pouco tempo). Mas foi a subida de Costa e
Silva à Presidência da República, e o AI-5, que indicaram a vitória indiscutível da linha dura”.
É importante, no entanto, ressaltar que a censura musical, inserida no setor com a denominação de
Divisão de Censura de Diversões Públicas, não é algo novo. “Desde o Estado Novo a censura prévia
vigiava de perto a música popular. Canções de teor político só eram divulgadas pelo rádio quando
elogiosas ao Estado”, afirma Carlos Fico no mesmo artigo.
A censura à música está diretamente ligada à tradição dos bons costumes, calcada em torno de
valores conservadores e, por isso, condenando veementemente o obsceno e o pornográfico. Além do
cunho moral, há um olhar crítico para supostas idéias tendenciosas sobre o âmbito político.
Odette Lanziotti, ex-técnica de censura, relata que o Departamento de Censura designava certos censores
para acompanhar as criações de determinados compositores. “Existiam censores mais específicos para
determinados autores, para analisar as canções políticas”.
DIVISÃO DE CENSURA DE DIVERSÕES PÚBLICAS (DCDP)
Órgão responsável pela censura de produções artísticas durante o regime militar, a Divisão de
Censura de Diversões Públicas (DCDP), tem sua gênese em um decreto de 1934, com o qual Getúlio
Vargas criou o Departamento de Propaganda e Difusão Cultural. Em 1939, surge um outro braço de sua
inspiração: o Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP).
Em entrevista ao censuramusical.com, a historiadora Maika Lóis conta que a legislação montada
pelos militares a partir de 1964 foi adaptada, construída com base nas leis do Estado Novo. “Com o golpe,
logo nos primeiros momentos se tem a visão de que era necessário centralizar essa censura. Em 1966 é
promulgada uma lei que concentrava o departamento de censura em Brasília”. Com a necessidade de
racionalização dos serviços, muitos funcionários são remanejados de outros departamentos
governamentais, criando assim uma equipe improvisada e muitas vezes desqualificada.
Para o pesquisador Alexandre Stephanou, em razão disso o ato de vetar determinada obra acaba se
tornando uma questão pessoal. “A censura é uma decisão de foro íntimo, misturada com as necessidades
sociais do momento e com padrões estéticos e artísticos”.Instalada oficialmente no ano de 1972, a Divisão
de Censura de Diversões Públicas (DCDP), subordinada ao Departamento de Polícia Federal do
Ministério da Justiça, sofre forte crítica por parte da sociedade.
Processo de aprovação
O processo de aprovação das músicas tinha como passo inicial o envio da letra à DCDP, por parte
da gravadora ou do próprio artista. Caso a música não fosse liberada, a gravadora poderia recorrer em
grau de recurso que seria julgado pelos censores de Brasília, onde a divisão se concentrava inicialmente.
Mais tarde, a demanda mudou, como explica a ex-técnica de censura Odette Lanziotti: “A censura
no início ficou concentrada em Brasília mas, depois, com o aumento do trabalho, houve a necessidade de
criar um departamento também no Rio”.
Embora na maioria das vezes influenciada por percepções particulares, as decisões seguiam uma
‘lógica’ interna. “Os censores tinham que tomar muito cuidado com as orientações dos chefes, que
distribuíam as músicas. Ás vezes a recomendação era para prestar mais atenção na política, no duplo
sentido. Em outras era para ficar atento na preservação da moral e dos bons costumes”, relata a ex-técnica
de censura.
GRAVADORAS x DCDP
Depois da determinação da obrigatoriedade do envio de toda e qualquer obra artística para análise
na DCDP, as gravadoras passam a dispor de um profissional especializado nessa função. Geralmente, essa
atribuição era designada a um advogado com bom trânsito no referido órgão do governo – aliado ideal
para trabalhar na liberação dos processos.
Dr. João Carlos Muller Chaves, na época advogado da Phonogram e Odeon-EMI, é nome muito
citado nos documentos obtidos nos Arquivos de Brasília e Rio de Janeiro. “Acabei ficando muito próximo
das pessoas que atuavam na censura. Eram seres humanos normais, só estavam desempenhando funções
que lhes eram atribuídas. Um bom relacionamento com os censores facilitava o processo de liberação”.
Muller Chaves também ressalta a questao do critério no órgão de censura. “O critério era não ter
critério. Às vezes eles barravam determinada música por não entenderem o que estava escrito ali. Não
estavam preparados para aquela atividade, foram remanejados de outros departamentos e caíram em uma
função jamais imaginada por eles”.
O FIM DA CENSURA
Com a abertura política de 1979, possibilitada após a anistia concedida pelo general João Batista
Figueiredo, é criado o CSC (Conselho Superior de Censura) que tem como objetivo abrandar a forte
atuação dos censores. É o primeiro passo para a extinção, gradual, dos órgãos censores do governo
federal.
Por meio do Decreto nº 83.973, de 13 de setembro de 1979, o ministro da Justiça Petrônio Portella
cria o conselho, que teria a competência de apenas rever, em grau de recurso, as decisões censórias
proferidas pelo diretor-geral do DPF (Departamento de Polícia Federal) e da DCDP (Divisão de Censura
de Diversões Públicas).
O historiador e jornalista Ricardo Cravo Albin, no livro Driblando a Censura, relata o
abrandamento trazido pelo novo conselho. “O CSC era o órgão de recursos das partes censuradas, das
decisões tomadas pela DCDP. Funcionava como uma instituição de colegiado instituído pelo ministro da
Justiça para dirimir, amenizar, tornar mais digerível a brutalidade do órgão onde a censura era
exercitada, a famigerada DCDP”.
O CSC é representado por organizações governamentais e instituições da sociedade civil, que com
ele passam a participar da liberação de obras artísticas. Participavam do conselho o governo (Ministério
da Justiça, do Itamaraty, das Comunicações, Conselhos Federais de Cultura e Educação e Embrafilme) e
instituições não-governamentais (Associação Brasileira de Imprensa, Academia Brasileira de Letras,
Associação Brasileira dos Críticos de Cinema e Abert)
Muitas letras, no entanto, continuaram sendo censuradas pela DCDP. É o caso de composições de
astros da MPB como Chico Buarque e Raul Seixas, bem como autores menos conhecidos. Taiguara e
Chico Julião, por exemplo, sofreram vetos de suas criações musicais por meio da censura política.
O ano de 1985 é marcado pelo final do último governo militar, que tinha como presidente o
general João Baptista Figueiredo. Todos esperam, com a mudança de regime, o fim da censura no
governo do novo presidente, que viria a ser José Sarney, vice de Tancredo Neves – eleito pelo Colégio
Eleitoral.
No entanto, o deputado Fernando Lyra, nomeado para o Ministério da Justiça – órgão responsável
pela DCDP e pelo CSC –, surpreende: decide manter toda a estrutura da DCDP e desativar o CSC.
Somente em abril de 1987, data em que Lyra é substituído pelo deputado Paulo Brossard, o CSC volta a
funcionar, dando início, enfim, ao fim dos tempos de censura.
Esse processo se completa com a nova Constituição, promulgada pelo deputado Ulisses
Guimarães no dia 5 de outubro de 1988. É, finalmente, decretada a extinção da censura, atendendo às
antigas e constantes reivindicações da classe artística.
Tropicalismo
"A Tropicália foi o avesso da Bossa Nova". Assim o compositor e cantor Caetano Veloso define o
movimento que, ao longo de 1968, revolucionou o status quo da música popular brasileira. Dessa
corrente, liderada pelo baiano de Santo Amaro da Purificação, também participaram ativamente os
compositores Gilberto Gil e Tom Zé, os letristas Torquato Neto e Capinam, o maestro e arranjador
Rogério Duprat, o trio Mutantes e as cantoras Gal Costa e Nara Leão. Diferentemente da Bossa Nova, que
introduziu uma forma original de compor e interpretar, a Tropicália não pretendia sintetizar um estilo
musical, mas sim instaurar uma nova atitude: sua intervenção na cena cultural do país foi, antes de tudo,
crítica.
A intenção dos tropicalistas não era superar a Bossa Nova, da qual Veloso, Gil, Tom Zé e Gal
foram discípulos assumidos, especialmente do canto suave e da inovadora batida de violão de João
Gilberto, conterrâneo dos quatro. No início de 1967, esses artistas sentiam-se sufocados pelo elitismo e
pelos preconceitos de cunho nacionalista que dominavam o ambiente da chamada MPB. Depois de várias
discussões concluíram que, para arejar a cena musical do país, a saída seria aproximar de novo a música
brasileira dos jovens, que se mostravam cada vez mais interessados no pop e no rock dos Beatles, ou
mesmo no iê-iê-iê que Roberto Carlos e outros ídolos brazucas exibiam no programa de TV Jovem
Guarda. Argumentando que a música brasileira precisava se tornar mais "universal", Gil e Caetano
tentaram conquistar adesões de outros compositores de sua geração, como Dori Caymmi, Edu Lobo,
Chico Buarque de Hollanda, Paulinho da Viola e Sérgio Ricardo. Porém, a reação desses colegas mostrou
que, se aderissem mesmo à música pop, tentando romper a hegemonia das canções de protesto e da MPB
politizada da época, os futuros tropicalistas teriam que seguir sozinhos.
Consideradas como marcos oficiais do novo movimento, as canções Alegria, Alegria (de Caetano)
e Domingo no Parque (de Gil) chegaram ao público já provocando muita polêmica, no III Festival da
Música Popular Brasileira da TV Record, em outubro de 1967. As guitarras elétricas da banda argentina
Beat Boys, que acompanhou Caetano, e a atitude roqueira dos Mutantes, que dividiram o palco com Gil,
foram recebidas com vaias e insultos pela chamada linha dura do movimento estudantil. Para aqueles
universitários, a guitarra elétrica e o rock eram símbolos do imperialismo norte-americano e, portanto,
deviam ser rechaçados do universo da música popular brasileira.
Afinados com a contracultura da geração hippie, os tropicalistas também questionaram os padrões
tradicionais da chamada boa aparência, trocando-a por cabelos compridos e roupas extravagantes.
No entanto, não só o júri do festival mas grande do público aprovou a nova tendência. A canção de Gil
saiu como vice-campeã do festival, que foi vencido por Ponteio (de Edu Lobo e Capinam). E, embora
tenha terminado como quarta colocada, Alegria, Alegria tornou-se um sucesso instantâneo nas rádios do
país, levando o compacto simples com a gravação de Caetano a ultrapassar a marca de 100 mil cópias
vendidas – número alto para a época.
Confrontos
Com tantas provocações ao status quo, as reações à Tropicália também tornaram-se mais
contundentes. Num debate organizado pelos estudantes da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo de São
Paulo, em junho de 1968, Caetano, Gil, Torquato e os poetas concretos Augusto de Campos e Décio
Pignatari, que manifestavam simpatia pelo movimento, foram hostilizados com vaias, bombinhas e
bananas pela linha dura universitária. O confronto foi mais violento ainda durante o III Festival
Internacional da Canção, no Teatro da Universidade Católica de São Paulo, em setembro. Ao defender
com os Mutantes a canção É Proibido Proibir, que compôs a partir de um slogan do movimento
estudantil francês, Caetano foi agredido com ovos e tomates pela platéia. O compositor reagiu com um
discurso. “Mas é isso que é a juventude que diz que quer tomar o poder?", desafiou o baiano.
Morte decretada
Nessa época, com o endurecimento do regime militar no país, as interferências do Departamento
de Censura Federal já haviam se tornado costumeiras; canções tinham versos cortados, ou eram mesmo
vetadas integralmente. A decretação do Ato Institucional nº 5, em 13 de dezembro de 1968, oficializou de
vez a repressão política a ativistas e intelectuais. As detenções de Caetano e Gil, em 27 de dezembro,
precipitaram o enterro da Tropicália, embora sua morte simbólica já tivesse sido anunciada, nos eventos
do grupo.
1-Alegria, Alegria
Autor: Caetano Veloso
Intérprete: Caetano Veloso e Beat Boys
Gênero: Rock
Ano: 1967
Canção lançada em Caetano Veloso, álbum de 1967, foi apresentada ao vivo no III Festival da TV
Record, em 1967. A canção chocou os chamados "tradicionalistas" da música popular brasileira devido a
simples presença de guitarras. No ambiente político-cultural da época, setores de esquerda classificavam a
influência do Rock como alienação cultural, o que também foi sentido por Gilberto Gil quando
apresentou Domingo no Parque no mesmo festival.
O ideal exposto pela letra foi reforçado pelo rock cru do grupo argentino Beat Boys, que ainda
colaborou com a estética visual. "O aspecto do grupo de rapazes de cabelos longos portando guitarras
coloridas representava de modo gritante tudo o que os nacionalistas da MPB mais odiavam e temiam",
explica Caetano no livro Verdade Tropical. A idéia de Caetano - já pensando na introdução do
tropicalismo, ao lado de Gilberto Gil - era a de fazer uma espécie de "marcha de carnaval transformada",
cuja letra expusesse as referências pop da época. O arranjo foi fortemente influenciado pelo trabalho dos
Beatles.
Alegria, Alegria" foi a música que apresentou o movimento tropicalista ao Brasil. Radicalmente
inovativo no cenário musical, o movimento assimilou a cultura pop aos gêneros nacionais;
Profundamente crítico nos níveis políticos e morais, o tropicalismo finalizou sendo reprimido pelo regime
autoritário militar.
Caminhando contra o vento
Sem lenço, sem documento
No sol de quase dezembro
Eu vou
O sol se reparte em crimes,
Espaçonaves, guerrilhas
Em cardinales bonitas
Eu vou
Em caras de presidentes
Em grandes beijos de amor
Em dentes, pernas, bandeiras
Bomba e brigitte bardot
O sol nas bancas de revista
Me enche de alegria e preguiça
Quem lê tanta notícia
Eu vou
Por entre fotos e nomes
Os olhos cheios de cores
O peito cheio de amores vãos
Eu vou
Por que não, por que não
Ela pensa em casamento
E eu nunca mais fui à escola
Sem lenço, sem documento,
Eu vou
Eu tomo uma coca-cola
Ela pensa em casamento
E uma canção me consola
Eu vou
Por entre fotos e nomes
Sem livros e sem fuzil
Sem fome sem telefone
No coração do brasil
Ela nem sabe até pensei
Em cantar na televisão
O sol é tão bonito
Eu vou
Sem lenço, sem documento
Nada no bolso ou nas mãos
Eu quero seguir vivendo, amor
Eu vou
Por que não, por que não...
2- É proibido proibir
Autor: Caetano Veloso
Intérprete: Caetano Veloso e os Mutantes
Gênero: Rock
Ano: 1968
Um ano depois do impacto causado pelas guitarras nas canções “Alegria, alegria” (Caetano) e
“Domingo no parque” (Gil), apresentadas no III Festival de Música Popular Brasileira da TV Record,
Caetano Veloso e Gilberto Gil voltaram a surpreender o público no III FIC, Festival Internacional da
Canção, promovido pela Rede Globo.
Caetano, acompanhado pelos Mutantes, defendeu “É proibido proibir” e Gilberto Gil, com os Beat
Boys, “Questão de Ordem”. A apresentação de “É proibido proibir” acabou se transformando numa
grande confusão naquela noite de domingo, 15 de setembro de 1968. Na final paulista do FIC, realizada
no Teatro da Universidade Católica de São Paulo, a música de Caetano foi recebida com furiosa vaia pelo
público que lotava o auditório.
A musica, fora inspirada pelos grafites que cobriram os muros de paris na rebelião estudantil de
68.Exatos três meses após a apresentação de Caetano e os Mutantes , o general Costa e Silva decretou o
AI-5, o ato que permitiria a censura submeter a cultura nacional à extrema censura
Menos de um ano depois da apresentação, Caetano e Gil foram presos pelo governo militar. Assim
como Chico Buarque (o mais censurado dos compositores brasileiros), foram exilados de seu país.
A bossa nova e o cinema novo já tinham ficado velhos, e o tropicalismo daria seus ultimos suspiros.
Depois deles o dilúvio da censura.
A mãe da virgem diz que não
E o anúncio da televisão
E estava escrito no portão
E o maestro ergueu o dedo
E além da porta há o porteiro, sim
E eu digo não
E eu digo não ao não
Eu digo
É proibido proibir
É proibido proibir
É proibido proibir
É proibido proibir
Me dê um beijo, meu amor
Eles estão nos esperando
Os automóveis ardem em chamas
Derrubar as prateleiras
As estantes, as estátuas
As vidraças, louças, livros, sim
E eu digo sim
E eu digo não ao não
E eu digo
É proibido proibir
É proibido proibir
É proibido proibir
É proibido proibir
3- Pra não dizer que eu não falei das flores
Autor: Geraldo Vandré
Gênero: MPB
Ano:1968
Canção escrita e interpretada por Geraldo Vandré. Ficou em segundo lugar no III Festival
Internacional da Canção de 1968 e, depois disso, teve sua execução proibida durante anos, pela ditadura
militar brasileira. A melodia da canção tem o ritmo de um hino, e sua letra possui versos de rima fácil
(quase todos em não), que facilitam memorizá-la, logo era cantada nas ruas. O sucesso de uma canção
que incitava o povo à resistência levou os militares a proibi-la, usando como pretexto a "ofensa" à
instituição contida nos versos "Há soldados armados, amados ou não / Quase todos perdidos de armas na
mão / Nos quartéis lhes ensinam uma antiga lição / de morrer pela pátria e viver sem razão". Em 1979 a
gravadora RGE/FERMATA incluiu a música “Pra não dizer que não falei das flores” (Caminhando),
gravado ao vivo no Maracanãzinho durante o 3º Festival Internacional da Canção, cuja proibição impediu
o seu lançamento desde o ano de 1968.
Caminhando e cantando e seguindo a canção,
Somos todos iguais braços dados ou não,
Nas escolas, nas ruas, campos, construções,
Caminhando e cantado e seguindo a canção,
Vem, vamos embora que esperar não é saber,
Quem sabe faz a hora, não espera acontecer,
Pelos campos a fome em grandes plantações,
Pelas ruas marchando indecisos cordões,
Ainda fazem da flor seu mais forte refrão,
E acreditam nas flores vencendo o canhão,
Vem, vamos embora que esperar não é saber,
Quem sabe faz a hora, não espera acontecer,
Há soldados armados, amados ou não,
Quase todos perdidos de armas na mão,
Nos quartéis lhes ensinam uma antiga lição:
De morrer pela pátria e viver sem razão,
Vem, vamos embora que esperar não é saber,
Quem sabe faz a hora, não espera acontecer,
Nas escolas, nas ruas, campos, construções,
Somos todos soldados, armados ou não,
Caminhando e cantando e seguindo a canção,
Somos todos iguais, braços dados ou não,
Os amores na mente, as flores no chão,
A certeza na frente, a história na mão,
Caminhando e cantando e seguindo a canção,
Aprendendo e ensinando uma nova lição,
Vem, vamos embora que esperar não é saber,
Quem sabe faz a hora, não espera acontecer.
4 - Apesar de você
Autor e Intérprete: Chico Buarque
Gênero: Samba / MPB
Ano: 1970
Canção escrita e originalmente interpretada por Chico Buarque em 1970. Lançada neste mesmo,
atingiu a marca de cem mil cópias vendidas. Além disso, o samba estourou nas rádios de todo o país,
virando mania nacional. Foi regravado por Clara Nunes em 7 de janeiro de 1971. Assim como a maioria,
a cantora acreditava que a letra da canção se tratava de uma briga entre namorados.
Em fevereiro de 1971, o jornalista Sebastião Nery, do Tribuna da Imprensa, publicou uma nota em
sua coluna dizendo que seu filho e os colegas dele cantavam "Apesar de Você" como se estivessem
cantando o Hino Nacional. Como resultado, Nery foi chamado para depor na polícia. Semanas depois, a
execução pública da canção foi vetada pelo governo, que finalmente compreendeu sua mensagem. Os
oficiais do regime invadiram a sede da Philips e destruíram as cópias restantes do disco. O censor que
aprovou a canção também foi punido. Os oficiais do governo, no entanto, não destruíram a matriz, o que
possibilitou a reedição da versão original da gravação. Num interrogatório, Buarque foi indagado sobre
quem era o "você" da letra da canção. "É uma mulher muito mandona, muito autoritária", teria respondido
o cantor.
A censura de "Apesar de Você" teve um impacto negativo no relacionamento entre Chico e os
censores, que duraria até o final da ditadura. Chico seria implacavelmente marcado pelos censores,
sofrendo suas letras as mais absurdas rejeições. A situação chegou ao ponto de ele se disfarçar, sob os
pseudônimos de Julinho da Adelaide e Leonel Paiva, para aprovar três composições, uma das quais,
"Acorda Amor", foi incluída no LP Sinal Fechado de 1974. Descoberta a farsa, a censura criou novas
exigências: toda letra apresentada teria que ser acompanhada de cópias da carteira de identidade e do CPF
do compositor. Devido à censura, a canção só seria incluída num álbum do cantor em 1978, quando foi
lançada como última faixa de Chico Buarque (1978).
Consequências para Clara Nunes
De maneira semelhante, o presidente da Odeon, Henry Jessen, que era advogado, foi intimado para dar
explicações sobre as intenções de Clara Nunes ao regravar a canção. Jessen, que mantinha um ótimo
relacionamento com os militares, fez um acordo com o governo para colocar um fim ao mal-entendido e
provar que Clara não teve qualquer intenção político-partidária ao regravar "Apesar de Você". Ficou
combinado que a cantora gravaria, num compacto simples, o "Hino das Olimpíadas do Exército",
composto por Miguel Gustavo, publicitário responsável por "Pra frente, Brasil". Também interpretaria a
canção na cerimônia de abertura das Olimpíadas do Exército de 1971 em Belo Horizonte.
Assim como Clara, outros artistas se viram obrigados a fazer publicidade para o governo. Em 1972, Elis
Regina foi convocada pelos militares para cantar o Hino Nacional durante as festividades do
sesquicentenário da Independência. Isto porque havia declarado à imprensa holandesa que o Brasil era
governado por "gorilas". Temendo represálias, aceitou o "convite".
(Crescendo) Amanhã vai ser outro día x 3
Hoje você é quem manda
Falou, tá falado
Não tem discussão, não.
A minha gente hoje anda
Falando de lado e olhando pro chão.
Viu?
Você que inventou esse Estado
Inventou de inventar
Toda escuridão
Você que inventou o pecado
Esqueceu-se de inventar o perdão.
(Coro) Apesar de você
amanhã há de ser outro dia.
Eu pergunto a você aonde vai se esconder
Da enorme euforia?
Como vai proibir
Quando o galo insistir em cantar?
Água nova brotando
E a gente se amando sem parar.
Quando chegar o momento
Esse meu sofrimento
Vou cobrar com juros. Juro!
Todo esse amor reprimido,
Esse grito contido,
Esse samba no escuro.
Você que inventou a tristeza
Ora tenha a fineza
de “desinventar”.
Você vai pagar, e é dobrado,
Cada lágrima rolada
Nesse meu penar.
(Coro2) Apesar de você
Amanhã há de ser outro dia.
Ainda pago pra ver
O jardim florescer
Qual você não queria.
Você vai se amargar
Vendo o dia raiar
Sem lhe pedir licença.
E eu vou morrer de rir
E esse dia há de vir
antes do que você pensa.
Apesar de você
(Coro3)Apesar de você
Amanhã há de ser outro dia.
Você vai ter que ver
A manhã renascer
E esbanjar poesia.
Como vai se explicar
Vendo o céu clarear, de repente,
Impunemente?
Como vai abafar
Nosso coro a cantar,
Na sua frente.
Apesar de você
(Coro4)Apesar de você
Amanhã há de ser outro dia.
Você vai se dar mal, etc e tal
05 - Pra Frente Brasil
Composição: Miguel Gustavo
Intérpretes: Os incríveis
Gênero: Hino de Futebol
Ano: 1970
Em 1970, o povo acompanhou a seleção em jogos transmitidos pela primeira vez pela televisão.
O impacto era visível. Poucos privilegiados deram-se ao luxo de ver a transmissão em cores, adiantandose em dois anos à chegada da tecnologia ao país, que se confirmaria em 1972. No meio da vibração do
povo, ecoava com grande sucesso por todo o país, o hino da copa, “Pra Frente Brasil”, de autoria de
Miguel Gustavo.
O sucesso do hino e a empolgação extasiante do povo, fizeram com que o governo começasse a
usar a seleção como objeto de propaganda política.
Ao vencer o tri-campeonato mundial de futebol em junho 1970, no México, o Brasil assistiu a uma
das maiores campanhas publicitárias de massa de sua história. A máquina de propaganda do regime
militar nunca foi tão bem-sucedida como naquele ano, tendo como elemento principal a vitória da
seleção, e a imagem heróica dos seus jogadores.
Na época da Copa de 1970, o Brasil vivia o auge do que foi chamado de “Milagre Econômico”,
que aconteceu de 1969 a 1973, no governo do presidente general Emílio Garrastazu Médici.
O milagre econômico proporcionou o aumento do Produto Interno Bruto (PIB), que atingiu um
crescimento anual de cerca de 11,2%, e uma inflação estabilizada em 18%. A produção industrial
aumentou, proporcionando melhores níveis de emprego. A época coincidia com os juros baixos no
mercado internacional, que passava por um momento de tranqüilidade, investindo fortemente nos países
em desenvolvimento, visando os grandes recursos naturais dessas nações como fiança aos empréstimos
concedidos. Também as multinacionais faziam os seus investimentos no país. A facilidade de créditos
internacionais levaria o Brasil a contrair, na época do regime militar, a maior dívida externa da sua
história.
Diante da prosperidade que parecia infindável, o governo militar aumentou a arrecadação de
impostos. Para permanecer no poder, os militares investiam em fortes campanhas de propaganda. Frases
que evidenciavam a exaltação militar eram vinculadas nas rádios, televisões e jornais, como “Brasil, Ameo ou Deixe-o” , “Ninguém Segura Este País”, ou “Pra Frente Brasil”. A propaganda era estimulada
através da música, de programas de televisão, jornais, revistas e rádios.
Aproveitando-se da facilidade dos empréstimos internacionais, o milagre econômico gerou a era
das obras monumentais, como a construção da Transamazônica, da ponte Rio-Niterói, da usina nuclear de
Angra dos Reis, de barragens gigantescas, como a de Itaipu.
No avesso da era do milagre, que beneficiou apenas a uma classe média emergente, estavam os
arrochos salariais, favorecendo poucos capitalistas brasileiros e essencialmente, aos capitalistas de
multinacionais. Os grandes investimentos estatais em obras colossais geraram mais o endividamento do
país do que empregos seguros. Durante o período, houve quase que um abandono do governo aos
programas sociais.
"Noventa Milhões em Ação
Pra Frente Brasil
Do Meu Coração
Todos juntos vamos
Pra Frente Brasil
Salve a Seleção!
De repente é aquela corrente pra frente
Parece que todo Brasil deu a mão
Todos ligados na mesma emoção
Tudo é um só coração
Todos juntos vamos
Pra frente Brasil! Brasil!
Salve a seleção!"
06-Eu te amo meu Brasil
Autores: Dom e Ravel
Intérpretes: Os incríveis
Gênero: MPB
Ano: 1970
Ingressando na carreira artística por volta do início dos anos 1960, a dupla, já como Dom & Ravel,
lançou em 1969 o primeiro LP, "Terra boa", que trazia " Você também é responsável", transformada, dois
anos depois, pelo ex-ministro da Educação, Jarbas Passarinho, em hino do Mobral, o Movimento
Brasileiro de Alfabetização. Mas seria na virada dos anos 1970 que dupla atingiria seu maior sucesso,
através de sua composição "Eu te amo meu Brasil", gravada pelo conjunto Os incríveis. A obra rendeulhes, ao mesmo tempo, sucesso e rotulações de bajuladores da direita. Tais críticas ocorreram devido ao
caráter ufanista,daquela canção, que foi utilizada, no contexto político daquele momento, em pleno auge
da ditadura, pelos governos militares.
O sucesso de "Eu te amo meu Brasil" teria levado o então governador de São Paulo, Roberto de
Abreu Sodré, a sugerir ao ex-presidente da República, Emílio Garrastazu Médici, que a citada canção
fosse transformada em hino nacional. Médici nada teria respondido. Mas a notícia teria sido divulgada na
imprensa e os artistas começaram a ser apontados como arautos da ditadura. A música, segundo Ravel, foi
composta, na verdade, para aproveitar a onda do tricampeonato da seleção de futebol.
O nome de Dom & Ravel está, até os dias de hoje, ligado ao sucesso “Eu te amo meu Brasil”. A
canção, que ecoou pelo país durante os tempos em que se alardeava o milagre brasileiro e se comemorava
os bons resultados do futebol, foi rotulada como símbolo de um governo militar que comemorava a
vitória para si próprio.
Patrulha Ideológica
Durante a ditadura os chamados patrulheiros ideológicos defendiam a “arte engajada”. A censura e
a intolerância não eram exclusividade da direita ou do regime. Artistas, estudantes e jornalistas engajados
eram tão repressivos quanto os censores da ditadura. Vigiando toda a produção cultural do país,
condenavam qualquer possível simpatizante do regime militar ou omissos politicamente. As críticas eram
tão duras que muitas vezes encerravam a carreira de determinados artistas os os obrigavam por vias tortas
a se posicionarem. Para o jornalista Henfil, um dos colaboradores de O Pasquim, importante semanário
publicado de 1969 a 1991, não havia meio termo: ou se é contra ou a favor da ditadura. Em sua coluna
entitulada “o cemitério dos mortos vivos” ele fazia o enterro daqueles que simpatizavam ou se omitiam ao
regime militar.
O Pasquim, teve papel importante para sacramentar o fim de carreira prematura dos irmãos Dom e
Ravel. Não que os artistas não tivessem sua parcela de culpa, mas como formadores de opinião, os
jornalistas foram implacáveis e não pouparam críticas diante dos fatos. Bastou para que O Pasquim os
taxassem de mediocres. Eles foram rejeitados pelo público de esquerda que associou suas composições
como ufanistas.
"As praias do Brasil ensolaradas,
O chão onde o país se elevou,
A mão de Deus abençoou,
Mulher que nasce aqui tem muito mais amor.
O céu do meu Brasil tem mais estrelas.
O sol do meu país, mais esplendor.
A mão de Deus abençoou,
Em terras brasileiras vou plantar amor.
Eu te amo, meu Brasil, eu te amo!
Meu coração é verde, amarelo, branco, azul anil.
Eu te amo, meu Brasil, eu te amo!
Ninguém segura a juventude do Brasil.
As tardes do Brasil são mais douradas.
Mulatas brotam cheias de calor.
A mão de Deus abençoou,
Eu vou ficar aqui, porque existe amor.
No carnaval, os gringos querem vê-las,
No colossal desfile multicor.
A mão de Deus abençoou,
Em terras brasileiras vou plantar amor.
Adoro meu Brasil de madrugada,
Nas horas que estou com meu amor.
A mão de Deus abençoou,
A minha amada vai comigo aonde eu for.
As noites do Brasil tem mais beleza.
A hora chora de tristeza e dor,
Porque a natureza sopra
E ela vai-se embora, enquanto eu planto amor."
07 - Debaixo dos Caracóis dos Seus Cabelos
Autores: Roberto Carlos / Erasmo Carlos
Intérprete: Roberto Carlos
Gênero: MPB Romântico
Ano: 1971
Esta letra é uma homenagem a Caetano Veloso feita por Roberto Carlos e Erasmo Carlos, ela foi
composta como uma forma de ser solidário ao Caetano, que encontrava-se no exílio, em Londres, para
onde fora deportado em 1969 pela Ditadura Militar. Caetano já havia composto para Roberto algumas
músicas que se tornaram clássicos. Com o amigo em desgraça, resolveu fazer algo para homenageá-lo.
Roberto nunca teve problemas com a censura, muito menos com a repressão militar. Então, como fazer
um texto que fosse ao mesmo tempo engajado politicamente, e romântico, como sempre foram suas
letras? a saída encontrada foi em nenhum momento citar o nome do Caetano, mas enfatizar sua marca
registrada naquela época: seus enormes cabelos encaracolados (aliás, até pouco tempo atrás pouquíssimas
pessoas tinham conhecimento que a saudosa personagem do poema era o Caetano, e não uma figura
feminina, marca registrada do Roberto).
A letra é bem simples e não foge às suas características. O legal está justamente no inusitado da
coisa; o clima romântico da melodia nos faz imaginar que é a saudade de uma pessoa apaixonada pela
ausência da outra, e não o protesto de um amigo solidário. E na estrutura da letra o Roberto procurou
colocar justamente aquilo que o Caetano possivelmente mais sentia saudade na fria Londres: o mar da
Bahia, o que só ajudou para fixar a marca dos famosos caracóis de Caetano.
Um dia a areia branca seus pés irão tocar
E vai molhar seus cabelos a água azul do mar
Janelas e portas vão se abrir pra ver você chegar
E ao se sentir em casa, sorrindo vai chorar
Debaixo dos caracóis dos seus cabelos
Uma historia pra contar de um mundo tão distante
Debaixo dos caracóis dos seus cabelos
Um soluço e a vontade de ficar mais um instante
As luzes e o colorido
Que você vê agora
Nas ruas por onde anda,
na casa onde mora
Você olha tudo e nada
Lhe faz ficar contente
Você só deseja agora
Voltar pra sua gente
Você anda pela tarde
E o seu olhar tristonho
Deixa sangrar no peito
Uma saudade, um sonho
Um dia vou ver você
Chegando num sorriso
Pisando a areia branca
Que é seu paraíso.
08 - Ouro de Tolo
Autor e Intérprete: Raul Seixas
Gênero: Rock
Ano: 1973
A canção foi uma bofetada no conformismo nacional diante das vantagens ilusórias oferecidas pela
ditadura. “Ouro de tolo” é o nome que se dava na Idade Média às promessas de falsos alquimistas.
Transpondo a idéia para a década de 1970, Raul Seixas reduz a nada as aspirações da classe média que
apoiou o milagre econômico da ditadura: a euforia regada pela estabilidade social do cidadão respeitável e
por uma visão religiosa conformista era simplesmente um “ouro de tolo”.
Eu devia estar contente
Porque eu tenho um emprego
Sou um dito cidadão respeitável
E ganho quatro mil cruzeiros por mês
Eu devia agradecer ao Senhor
Por ter tido sucesso na vida como artista
Eu devia estar feliz
Porque consegui comprar um Corcel 73
Eu devia estar alegre e satisfeito
Por morar em Ipanema
Depois de ter passado fome por dois anos
Aqui na Cidade Maravilhosa
Ah! Eu devia estar sorrindo e orgulhoso
Por ter finalmente vencido na vida
Mas eu acho isso uma grande piada
E um tanto quanto perigosa
Eu devia estar contente
Por ter conseguido tudo o que eu quis
Mas confesso abestalhado
Que eu estou decepcionado
Porque foi tão fácil conseguir
E agora eu me pergunto: E daí?
Eu tenho uma porção de coisas grandes
Pra conquistar, e eu não posso ficar aí parado
Eu devia estar feliz pelo Senhor
Ter me concedido o domingo
Pra ir com a família ao Jardim Zoológico
Dar pipoca aos macacos
Ah! Mas que sujeito chato sou eu
Que não acha nada engraçado
Macaco praia, carro, jornal, tobogã
Eu acho tudo isso um saco
É você olhar no espelho
Se sentir um grandessíssimo idiota
Saber que é humano, ridículo, limitado
Que só usa dez por cento de sua
Cabeça animal
E você ainda acredita que é um doutor, padre ou policial
Que está contribuindo com sua parte
Para nosso belo quadro social
Eu que não me sento
No trono de um apartamento
Com a boca escancarada cheia de dentes
Esperando a morte chegar
Porque longe das cercas embandeiradas que separam quintais
No cume calmo do meu olho que vê
Assenta a sombra sonora de um disco voador
Eu que não me sento
No trono de um apartamento
Com a boca escancarada cheia de dentes
Esperando a morte chegar
Porque longe das cercas embandeiradas que separam quintais
No cume calmo do meu olho que vê
Assenta a sombra sonora de um disco voador
09 - Como Nossos Pais
Autor: Belchior
Intérprete: Elis Regina
Gênero: MPB
Ano:1976
A discussão sempre presente na relação entre pais e filhos é a alma dessa canção. Quando somos
jovens sempre achamos que nossos pais estão errados, que a educação que recebemos poderia ter sido
melhor, porém quando crescemos e temos filhos repetimos o mesmo que nossos pais faziam conosco. É
isso que Belchior quer mostrar na letra dessa bela música. Os versos “ainda somos os mesmos e vivemos
como os nossos pais” deixam tudo bem claro. Nós até mudamos, mas ainda vivemos do mesmo modo
como os nossos pais viviam.
Alem de tudo isso, Belchior também quer mostrar que o mundo pouco mudou. Por mais que as
tentativas de mudanças fossem aplicadas, o modo como vemos o mundo é o mesmo.
Como os nossos pais é um hino à juventude que amadurece percebendo que o mundo é uma constante,
porque é feito de homens que se acomodam e de outros que lutam por mudança”.
Não quero lhe falar meu grande amor das coisas que aprendi nos discos
Quero lhe contar como eu vivi e tudo o que aconteceu comigo
Viver é melhor que sonhar, eu sei que o amor é uma coisa boa
Mas também sei que qualquer canto é menor do que a vida de qualquer pessoa
Por isso cuidado meu bem, há perigo na esquina
Eles venceram e o sinal está fechado prá nós que somos jovens
Para abraçar seu irmão e beijar sua menina na rua
É que se fez o seu braço, o seu lábio e a sua voz
Você me pergunta pela minha paixão
Digo que estou encantada com uma nova invenção
Eu vou ficar nesta cidade, não vou voltar pro sertão
Pois vejo vir vindo no vento o cheiro da nova estação
Eu sei de tudo na ferida viva do meu coração
Já faz tempo eu vi você na rua, cabelo ao vento, gente jovem reunida
Na parede da memória essa lembrança é o quadro que dói mais
Minha dor é perceber que apesar de termos feito tudo o que fizemos
Ainda somos os mesmos e vivemos como nossos pais
Nossos ídolos ainda são os mesmos e as aparências não enganam não
Você diz que depois deles não apareceu mais ninguém
Você pode até dizer que eu 'tô por fora', ou então que eu 'tô inventando'
Mas é você que ama o passado e que não vê
É você que ama o passado e que não vê
Que o novo sempre vem
Hoje eu sei que quem me deu a idéia de uma nova consciência e juventude
Tá em casa guardado por Deus contando vil metal
Minha dor é perceber que apesar de termos feito tudo, tudo, tudo o que fizemos
Nós ainda somos os mesmos e vivemos
Nós ainda somos os mesmos e vivemos
Ainda somos os mesmos e vivemos
como nossos pais
10 - Cálice
Autores: Chico Buarque e Gilberto Gil
Interpretação: Chico Buarque e Milton Nascimento
Gênero: MPB
Ano: 1978
"Cálice" é uma canção escrita e originalmente interpretada por Chico Buarque e Gilberto Gil em
1973. Na canção percebe-se um elaborado jogo de palavras para despistar a censura da ditadura militar. A
palavra-título, por exemplo, é cantado pelo coral que acompanha o cantor de forma a soar como um
raivoso "Cale-se!".
A música foi composta para o show Phono 73, que a gravadora Phonogran (ex-Philips, e depois
Polygram) organizou no Palácio das Convenções do Anhembi, em São Paulo, em maio de 1973. No dia
do show, quando os dois começaram a cantar "Cálice" tiveram os microfones desligados. De acordo com
Gil, a canção havia sido apresentada à censura e eles foram recomendados a não cantá-la. Os dois haviam
decidido, então, cantar apenas a melodia da canção, pontuando-a com a palavra "cálice", mas isto também
não foi possível. Segundo o relato do Jornal da Tarde, a Phonogram resolveu cortar o som dos
microfones, para evitar que a música, mesmo sem a letra, fosse apresentada. Irritado, Chico tentou os
microfones mais próximos, que também foram cortados em seguida.
A canção foi liberada cinco anos depois, tendo sido lançada em Chico Buarque (1978) ao lado de
"Apesar de Você" e "Tanto Mar", outras canções censuradas pelo regime. Na gravação, as estrofes de
Gil, que trocou a PolyGram pela WEA, foram interpretadas por Milton Nascimento, fazendo coro com o
MPB4.
(refrão)
Pai, afasta de mim esse cálice
Pai, afasta de mim esse cálice
Pai, afasta de mim esse cálice
De vinho tinto de sangue
Como beber dessa bebida amarga
Tragar a dor, engolir a labuta
Mesmo calada a boca, resta o peito
Silêncio na cidade não se escuta
De que me vale ser filho da santa
Melhor seria ser filho da outra
Outra realidade menos morta
Tanta mentira, tanta força bruta
(refrão)
Como é difícil acordar calado
Se na calada da noite eu me dano
Quero lançar um grito desumano
Que é uma maneira de ser escutado
Esse silêncio todo me atordoa
Atordoado eu permaneço atento
Na arquibancada pra a qualquer momento
Ver emergir o monstro da lagoa
(refrão)
De muito gorda a porca já não anda
De muito usada a faca já não corta
Como é difícil, pai, abrir a porta
Essa palavra presa na garganta
Esse pileque homérico no mundo
De que adianta ter boa vontade
Mesmo calado o peito, resta a cuca
Dos bêbados do centro da cidade
(refrão)
Talvez o mundo não seja pequeno
Nem seja a vida um fato consumado
Quero inventar o meu próprio pecado
Quero morrer do meu próprio veneno
Quero perder de vez tua cabeça
Minha cabeça perder teu juízo
Quero cheirar fumaça de óleo diesel
Me embriagar até que alguém me esqueça
11 - O bêbado e a equilibrista
Autor: João Bosco e Aldir Blanc
Intérprete: Elis Regina
Gênero: MPB
Gravadora: WEA (compacto simples)
Ano:1979
O samba de Aldir Blanc e João Bosco, gravado pela primeira vez por Elis Regina, em 1979,
tornou-se uma espécie de hino da luta pela anistia ampla, geral e irrestrita que ganhou grande impulso no
Brasil e no exterior no final da década de 70.
No segundo semestre de 1979, diante do crescimento do clamor pela anistia, o novo presidente,
general João Baptista Figueiredo, propôs ao Congresso a aprovação de uma lei inicialmente limitada
apenas aos que não tivessem cometido “crimes de sangue”, o que excluía os que pegaram em armas
contra o regime militar. Na prática, porém, as restrições foram sendo derrubadas pela pressão da
sociedade e todos os presos, exilados e banidos políticos acabaram beneficiados.
Alguns esclarecimentos: a) provavelmente o verso “caía a tarde como um viaduto” é uma
referência à súbita e inexplicada queda do viaduto Paulo de Frontin, no Rio de Janeiro, em 1971, no auge
da ditadura militar; b)Henfil era um dos principais cartunistas do país e seu traço uma das mais
importantes manifestações de resistência ao regime militar. Seu irmão Herbert de Souza, o Betinho,
estava então exilado no Canadá. Depois de retornar ao Brasil, Betinho lideraria no anos 90 uma das
maiores campanhas sociais do país, a campanha contra a fome; c) as Marias e Clarisses da música
simbolizam as mulheres dos presos políticos mortos sob tortura. Clarisse é o nome da mulher do jornalista
Vladimir Herzog; Maria, o da esposa do operário Manuel Fiel Filho. Os dois tinham sido assassinados
sob tortura nas dependências do Exército, em São Paulo, nos anos anteriores.
Caía a tarde feito um viaduto
E um bêbado trajando luto
Me lembrou Carlitos
A lua, tal qual a dona do bordel,
Pedia a cada estrela fria
Um brilho de aluguel
E nuvens, lá no mata-borrão do céu,
Chupavam manchas torturadas, que sufoco!
Louco, o bêbado com chapéu-coco
Fazia irreverências mil pra noite do Brasil.
Meu Brasil
Que sonha com a volta do irmão do Henfil.
Com tanta gente que partiu num rabo de foguete.
Chora a nossa pátria mãe gentil,
Choram Marias e Clarisses no solo do Brasil.
Mas sei que uma dor assim pungente
Não há de ser inutilmente, a esperança
Dança na corda bamba de sombrinha
E em cada passo dessa linha pode se machucar
Azar, a esperança equilibrista
Sabe que o show de todo artista
Tem que continuar.
12 - E vamos à Luta
Autor e Intérprete: Gonzaguinha
Gênero: Samba
Ano:1980
Pelo fato de compor quase sempre músicas com forte apelo denunciando as injustiças sociais,
Gonzaguinha foi "chamado" muitas vezes ao DOPS Departamento de Ordem Política e Social e teve suas
músicas censuradas. Aliás, essa era uma marca em sua carreira. Suas letras eram provocativas e, em
virtude do regime militar, estava sempre tendo que driblar a censura. Em 73 se apresentou no programa
de Flávio Cavalcante e causou grande espanto pelo teor de suas músicas. Recebeu uma advertência da
censura e muitas críticas, mas teve um lado positivo. Seu compacto que estava encalhado nas prateleiras
foi rapidamente vendido.
EM meados dos anos 80, com o crescimento dos movimentos sociais no país e a gradual abertura
política, a Música “E vamos à luta”, foi incendiária!
Eu acredito é na rapaziada
Que segue em frente e segura o rojão
Eu ponho fé é na fé da moçada
Que não foge da fera, enfrenta o leão
Eu vou à luta com essa juventude
Que não corre da raia a troco de nada
Eu vou no bloco dessa mocidade
Que não tá na saudade e constrói
A manhã desejada
Aquele que sabe que é negro
o coro da gente
E segura a batida da vida o ano inteiro
Aquele que sabe o sufoco de um jogo tão duro
E apesar dos pesares ainda se orgulha de ser
brasileiro
Aquele que sai da batalha
Entra no botequim, pede uma cerva gelada
E agita na mesa logo uma batucada
Aquele que manda o pagode
E sacode a poeira suada da luta e faz a brincadeira
Pois o resto é besteira
E nós estamos por aí...
Eu acredito é na rapaziada...
13-Carimbador Maluco
Autor e Intérprete: Raul Seixas
Gênero: Música Infantil
Ano: 1983
Em 1983, Raul Seixas participou do especial infantil da Rede Globo com a música O Carimbador
Maluco. Raul, fantasiado, dançou entre criancinhas na Rede Globo de Televisão. A música foi um
sucesso e entrou no recém-lançado LP Raul Seixas, que acabou ganhando Disco de Ouro. Contudo, foi
também motivo de muitas críticas a Raul. Acusavam-no de ter se vendido ao sistema com uma música
imbecil.
Foram poucos aqueles perceberam que a música continha pesadas críticas à burocracia do governo
militar, que teimava em selar, registrar, carimbar, avaliar, rotular, adiando e atrapalhando todo tipo de
atividade. Abaixo, umas das fontes de inspiração de Raul Seixas, um texto de Pierre-Joseph Proudhon um
dos mais influentes teóricos do anarquismo:
“Ser governado é ser guardado à vista, inspecionado, espionado, dirigido, legislado, regulamentado,
parqueado, endoutrinado, predicado, controlado, calculado, apreciado, censurado, comandado, por seres
que não têm o título, nem a ciência, nem a virtude (...).
Ser governado é ser, a cada operação, a cada transação, a cada movimento, notado, registrado,
recenseado, tarifado, selado, medido, cotado, avaliado, patentiado, licenciado, autorizado, rotulado,
admoestado, impedido, reformado, reenviado, corrigido. (...)”
5… 4… 3… 2…
– Parem! Esperem aí.
Onde é que vocês pensam que vão?
Plunct Plact Zum
Não vai a lugar nenhum!!
Plunct Plact Zum
Não vai a lugar nenhum!!
Tem que ser selado, registrado, carimbado
Avaliado, rotulado se quiser voar!
Se quiser voar….
Pra Lua: a taxa é alta,
Pro Sol: identidade
Mas já pro seu foguete viajar pelo universo
É preciso meu carimbo dando o sim,
Sim, sim, sim.
O seu Plunct Plact Zum
Não vai a lugar nenhum!
Plunct Plact Zum
Não vai a lugar nenhum!
Tem que ser selado, registrado, carimbado
Avaliado, rotulado se quiser voar!
Se quiser voar….
Pra Lua: a taxa é alta,
Pro Sol: identidade
Mas já pro seu foguete viajar pelo universo
É preciso meu carimbo dando o sim,
Sim, sim, sim.
Plunct Plact Zum
Não vai a lugar nenhum!
Plunct Plact Zum
Não vai a lugar nenhum!
Mas ora, vejam só, já estou gostando de vocês
Aventura como essa eu nunca experimentei!
O que eu queria mesmo era ir com vocês
Mas já que eu não posso:
Boa viagem, até outra vez.
Agora…
O Plunct Plact Zum
Pode partir sem problema algum
Plunct Plact Zum
Pode partir sem problema algum
(Boa viagem, meninos.
Boa viagem).
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