NEGAÇÃO PÓS-VERBAL E PERIFERIA ESQUERDA DA SENTENÇA Rerisson Cavalcante, Universidade de São Paulo, Brasil Essa pesquisa investiga o comportamento das duas construções de negação pós-verbal do português brasileiro, [Não V não] e [V não], em estruturas que envolvam a periferia esquerda da sentença (1). Pode-se identificar, nas línguas românicas e germânicas, dois tipos de negação pós-verbal em função da posição do marcador em relação ao núcleo verbal (flexionado) e aos elementos do VP: (i) línguas de negação pós-Iº, como o inglês e francês, em que o marcador negativo coloca-se imediatamente após o verbo flexionado (2); e (ii) línguas de negação pós-VP, como o português brasileiro (PB), em que o marcador ocorre em posição final da sentença, seguindo todos os complementos verbais (3). Em Cavalcante (2007), defendi a hipótese de que as partículas negativas pós-verbais, juntamente com outras partículas de confirmação e denegação proposicional, são geradas em uma categoria acima do sistema CP, e que a posição visível é resultado do movimento de toda a sentença por sobre elas, uma operação que apresenta uma série de restrições. Neste trabalho, analiso a interação das negativas pós-VP do PB com construções sintáticas que envolvam a ativação de categorias do sistema CP, como topicalização e focalização de constituintes, interrogativas polares e interrogativas QU, além de sentenças encaixadas e imperativas. Os resultados apontam para a agramaticalidade dessas negativas em contextos em que ocorre um movimento visível de um constituinte para qualquer categoria do CP. Há, contudo, exceções a serem melhor examinadas. Mais especificamente, tanto [Não V não] quanto [V não] são agramaticais em interrogativas QU (4), em sentenças com focalização (5) e em algumas sentenças encaixadas, como as adverbiais (9a-b). Pelo contrário, ambas são possíveis e bastante produtivas com interrogativas polares e com imperativas (10). Entretanto, essas duas negativas apresentam um comportamento distinto em outros contextos: [V não] é agramatical também com a topicalização de complementos (6) e nas demais encaixadas (8), como as completivas, enquanto [Não V não] é plenamente gramatical (7; 9c-d). Exemplos (1) (a) (b) Não / num quero sair hoje não. Quero sair hoje não. Línguas de negação pós-Iº (a) John will not travel (b) yesterday (Inglês) (c) Jonh (ne) va pas voyager (d) (Francês) [Não V não] [V não] (2) John did not buy this book Jonh (ne) peut pas nager (3) PB – Língua de negação pós-VP (a) Eu num vou viajar para Londres com Marta não. (b) Eu num dei autorização pra que ele saísse não. (c) Eu num vi se ele chegou atrasado não. (4) [Não V não] e [V não] em interrogativas QU (5) (a) * O que (foi que) ele não fez não? (b) * O que (foi que) ele fez não? (c) * Por que ele não saiu de casa não? (d) * Por que ele saiu de casa não? (e) * Que horas você não está ocupado não? (f) * Que horas você está ocupado não? [Não V não] e [V não] com focalização (a) * EU que não vi não. (b) * EU que vi não. (c) * ONTEM que eu não fui não. (d) * ONTEM que eu fui não. (6) [V não] em construções de topicalização (a) * Esse livro comprei não. (b) * Com o arame eu preocupo não. (c) * Feijão gosto não (d) * Show de Ivete eu vi não (e) * Esse ladrão o policial prendeu não (7) [Não V não] em construções de topicalização (a) Esse livro não comprei não. (b) Com o arame eu não preocupo não. (c) Feijão não gosto não (d) Show de Ivete eu não vi não (e) Esse ladrão o policial não prendeu não (8) [V não] em sentenças encaixadas (a) * Se a banda tocar não, o show vai ser cancelado. (b) * Me ligue quando você estiver ocupado não (c) ?? Tenho vários alunos que gostam de sintaxe não (d) * Ele disse que conseguiu não (9) [Não V não] em sentenças encaixadas (a) * Se a banda não tocar não, o show vai ser cancelado. (b) * Me ligue quando você não estiver ocupado não (c) ? Tenho vários alunos que não gostam de sintaxe não (d) Ele disse que não conseguiu não (10) Negação em sentenças imperativas (a) Não faça / faz isso não! (b) Faça / faz isso não! Referências CAVALCANTE, Rerisson. (2007). A negação pós-verbal no português brasileiro: análise descritiva e teórica de dialetos rurais de afro-descendentes. Salvador: UFBA. Dissertação de Mestrado. FONSECA, Hely D. Cabral. (2004). Marcador negativo final no Português Brasileiro. Cadernos de estudos lingüísticos. Campinas, 46(1): 5-19, jan/jun. LAKA, Itziar. (1990). Negation in syntax: on the nature of functional categories and Projetions. MIT, Tese de Doutorado. MARTINS, Eneida Esteves. (1997). Sentential negation in spoken Brazilian Portuguese. Washington: Georgetown University. MIOTO, Carlos. (1991). Negação sentencial no português brasileiro e a teoria da gramática. Campinas: UNICAMP, Tese de Doutorado. POLLOCK, Jean-Yves. (1989). Verb movement, universal grammar, and the structure of IP. Linguistic Inquiry 20, 365-424. RIZZI, Luigi. (1997). The fine structure of the left periphery. In: HAEGEMAN, Liliane. (ed.). Elements of grammar: handbook in generative syntax. Dordrechet / Boston / London: Kluwer Academic. ZANUTTINI, Raffaella. (1995). Reflexes of clausal estructures in the syntax of negation: a comparative study of romance languages. Georgetown University.